Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460



 




PROCESSO Nº 0091731-74.2014.8.05.0001


ÓRGÃO: 1ª TURMA RECURSAL DO SISTEMA DOS JUIZADOS

CLASSE: RECURSO INOMINADO

RECORRENTE/

AUTOR: LOURIVALDO FIGUEIREDO MASCARENHAS

ADVOGADO: RAQUEL MENDES NOGUEIRA E OUTRO

RECORRENTE/

RÉU: BRADESCO SAÚDE

ADVOGADO: MARCELO NEUMANN MOREIRAS PESSOA

ORIGEM: 11ª VSJE DO CONSUMIDOR (MATUTINO)

RELATORA: JUÍZA NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS




JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSOS SIMULTÂNEOS. PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL. EXCLUSÃO DO SEGURADO EX-EMPREGADO, QUE JÁ ERA APOSENTADO. AÇÃO PROPOSTA CONTRA A OPERADORA. SOLIDARIEDADE. DECISÃO QUE ALCANÇA A ESTIPULANTE RESPONSÁVEL DIRETA PELO CANCELAMENTO. REINCLUSÃO POR TEMPO INDETERMINADO. EMPREGADO IDOSO QUE NÃO SERÁ FACILMENTE ACOLHIDO PELOS PLANOS COMO NOVO BENEFICIÁRIO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ASSUNÇÃO INTEGRAL DO PRÊMIO. REAJUSTES AUTORIZADOS PELA ANS. CONSEQUÊNCIA LÓGICA DA MANUTENÇÃO DO PLANO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. AMBOS RECURSOS IMPROVIDOS.

1. A Resolução nº 279 da ANS (já revogada pela Resolução 488/2022 da ANS) não se sobrepõe às normas protecionistas do Código de Defesa do Consumidor, art. 51, inciso IV, gerando direito ao ex-empregado já aposentado de manutenção no plano nas mesmas condições quando da ativa, mediante pagamento integral do prêmio.

2. O valor do prêmio corresponderá à quantia paga pelo usuário, acrescida da cota-parte custeada pela antiga empregadora, eis que assume integralmente seu pagamento.

3. Quanto aos reajustes autorizados pela ANS mencionados na decisão dos embargos de declaração (evento 146), não há reparo a se fazer, pois consequência lógica da manutenção do plano. Ademais, como a liminar trouxera um valor fixo, sem ressalvar a possibilidade de reajustes, poderia ensejar a interpretação equivocada de que o prêmio não seria atualizado. parte autora que não poderia pagar indefinidamente um valor fixo e já o fez durante muito tempo, eis que a quantia de R$ 376,06 foi fixada em sede liminar deferida no ano de 2006.

4. "No conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade, havendo uma norma superior - geral e outra norma inferior especial, não será possível estabelecer uma meta - regra geral, preferindo o critério hierárquico ao da especialidade ou vice-versa, sem contrariar a adaptabilidade do direito. Poder-se-á, então, preferir qualquer um dos critérios, não existindo, portanto, qualquer prevalência. Todavia, segundo Bobbio, dever-se-á optar, teoricamente, pelo hierárquico; uma lei constitucional geral deverá prevalecer sobre uma lei ordinária especial, pois se admitisse o princípio de que uma lei ordinária especial pudesse derrogar normas constitucionais, os princípios fundamentais do ordenamento jurídico estariam destinados a esvaziar - se, rapidamente, de seu conteúdo...." [DINIZ, 2003, p.50].

5. Por fim, não há danos morais indenizáveis. O mero dissabor decorrente de uma violação de relação negocial, mesmo com repercussão econômica, por si só, não gera direito ao recebimento de indenização por dano moral eis que não foi violado direito personalíssimo.

6. Quanto ao falecimento do autor, noticiado no evento 190, não modifica o panorama da decisão, tendo o E. STJ pacífico posicionamento a respeito do direito subjetivo dos dependentes em manter o plano durante o período de extensão previsto no arts. 30 e 31 da lei 9656/98, portanto, deverá o plano ser mantido em face da dependente do autor, sendo cobrado, a partir do falecimento deste, o valor do prêmio atinente à sua dependente. Constata-se, dessa forma, que não merece extinção sem julgamento do mérito o processo em razão do falecimento do autor, mormente pela habilitação dos herdeiros conforme evento nº 190, devendo o plano ser mantido ativo em face de sua esposa/dependente.

AMBOS RECURSOS IMPROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA.



RELATÓRIO

A ação foi ajuizada com vista na iminente exclusão do autor e sua dependente do plano coletivo empresarial do qual fazia parte quando empregado da estipulante.

Deferiu-se liminar para restabelecimento do plano, autorizando-se os depósitos judiciais no valor de R$ 376,06 (evento 1, doc. 1, fls. 45).

A tese defensiva é de que o autor não fazia jus à manutenção do plano, eis que a estipulante não solicitara sua permanência na subfatura de aposentados ou demitidos.

A sentença (evento 1, doc. 5, fls. 5 a 9) acolheu parcialmente o pedido para determinar a manutenção do plano por tempo indeterminado.

Recorreu a acionada, pugnando pela improcedência do pedido (evento 1, doc. 5, fls.37 a 41).

Apreciando os embargos de declaração opostos, decidiu o Juízo a quo pela retificação da sentença para esclarecer a base de cálculo do prêmio "para determinar à ré que, no prazo de 10 dias, passe a emitir os boletos de pagamento das respectivas parcelas mensais com a incidência dos reajustes previstos pela ANS, a partir de outubro de 2006, sob pena de aplicação de multa diária de R$ 100,00 (cem reais). Por sua vez, caso reste detectado valores pagos a maior, mesmo após a aplicação dos referidos reajustes anuais, que ditos valores eventualmente encontrados sejam devolvidos ao embargante" (evento 146).

Recorreu a parte autora, conforme evento 153, pugnando pelo deferimento de indenização por danos morais, alegando ainda que a sentença ultrapassou o pedido ao determinar a correção pelos índices autorizados pela ANS.

Ratificou a acionada seu recurso (evento 155).



VOTO

A sentença recorrida decidiu por determinar a manutenção do autor e sua dependente, por tempo indeterminado, assumindo o pagamento integral do prêmio com as respectivas atualizações autorizadas pela ANS.

Não merece reparo a sentença.

Trata-se do direito á manutenção do empregado na apólice de demitidos ou aposentados por tempo de serviço, direito adquirido seu, quer seja em decorrência do vínculo laboral, com amparo na regra ordinária da Lei 9.656/98, artigos 30 e 31 ou pela aplicação do Código de Defesa do Consumidor (art. 4º).

A operadora e Estipulante têm obrigações solidarias que surgem do vinculo de contrato empresarial cujo objetivo é prestar assistência à saúde aos trabalhadores que são destinatários finais de seus serviços e neste mister devem observar as regras regenciais de proteção ao consumidor, a doutrina e a jurisprudência em vigor.

Assim, é garantido ao trabalhador demitido sem justa causa ou ao aposentado que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de manutenção como beneficiário nas mesmas condições de cobertura assistencial que gozava quando da vigência do contrato de trabalho desde que assuma o seu pagamento integral (arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998).

A doutrina autorizada e a jurisprudência não amparam a pretensão da Ré de emprestar interpretação mais restritiva aos artigos 30 e 31, da Lei 9.656/98.

A forma da contratação, com a intermediação do estipulante, FACILITA A CRIAÇÃO E O EXERCÍCIO DO VÍNCULO JURÍDICO, mas não descaracteriza a natureza consumerista do ajuste. Não havendo qualquer negativa ao disposto nos artigos 436 e 767, do Código Civil pois, finda a relação de trabalho o vinculo passa a ser direto com o consumidor.

Art. 436. O que estipula em favor de terceiro pode exigir o cumprimento da obrigação. Parágrafo único. Ao terceiro, em favor de quem se estipulou a obrigação, também é permitido exigi-la, ficando, todavia, sujeito às condições e normas do contrato, se a ele anuir, e o estipulante não o inovar nos termos do art. 438.

Art. 767. No seguro à conta de outrem, o segurador pode opor ao segurado quaisquer defesas que tenha contra o estipulante, por descumprimento das normas de conclusão do contrato, ou de pagamento do prêmio.

Esta relação contratual com o intuito de criar um vínculo jurídico tem a finalidade de estabelecer o dever de prestar um benefício (assistência à saúde) a terceiros, inicialmente estranhos ao contrato, mas que, posteriormente, quando manifestam sua concordância com o negócio entabulado pelas outras duas partes, passam a ser credores diretos de uma delas (a operadora), passando a estipulante a mera gestora contratual, com funções administrativas e deveres legais que visam garantir a permanência do vínculo, cujo objeto contratual é direito essencial e fundamental do trabalhador, além de ter natureza consumerista. É o que leciona a doutrina mais autorizada.

Assim, a circunstância de os beneficiários do plano coletivo não participarem inicialmente na formação do vínculo não lhes retira direito algum; tanto assim que desfeito o vinculo formal com a apólice poderão realizar contratação diretamente, na forma de planos individuais.

Os consumidores não intervêm na formação do vínculo contratual, pois a contratação não é feita por eles, e sim pela empresa empregadora (ou entidade representativa deles), mas os direitos que nascem da contratação, dentre os quais o de auferir prestação continuada de serviços e cobertura de custos de assistência à saúde, revertem em favor deles. O sujeito de direito dessa relação contratual é o empregado (segurado) e, como tal, pode exigir o cumprimento das normas e condições pactuadas no contrato, conforme já proclamado pela jurisprudência do STJ que era favorável ao consumidor:

PROCESSO CIVIL - LEGITIMIDADE AD CAUSAM - BENEFICIÁRIO DE PLANO DE SAÚDE - O beneficiário de plano de saúde, seja por contratação direta, seja por meio de estipulação de terceiros, tem legitimidade para exigir a prestação dos serviços contratados; se o ajuste contiver cláusula abusiva, poderá também contrastá-la, como resultado da premissa de que os contratos não podem contrariar a lei, no caso o Código de Defesa do Consumidor. Embargos de declaração rejeitados. (STJ, EDcl-Ag 431464/GO, Rel. Min. Ari Pargendler).


Por outro lado, a circunstância de os contratos privados de assistência à saúde gozarem de uma regulamentação específica, na Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, bem como através das resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, não afasta a conclusão de que fazem parte efetivamente da categoria dos contratos de consumo. Este entendimento é pacífico.

Aliás, é bom lembrar da velha e sempre bem vinda hierarquia da leis, a natureza principiológica do Código de Defesa do Consumidor, que em obediência à Constituição Federal, elevou o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana a princípio catalisador de todos os demais, veda qualquer interpretação que viole esta máxima argumentativa.

O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) permanece como uma lei básica, de caráter geral. É o mesmo fenômeno que acontece em relação a outras subespécies de contratos de consumo, a exemplo dos contratos bancários, de seguro e os que regulam as relações com os concessionários de serviços públicos. Não importa que cada um tenha uma regulamentação específica; o CDC continua como a lei de caráter geral aplicável a todos eles.

A questão de se tratar o contrato de Plano de Saúde de Contrato Relacional, Cativo de longa duração, de prazo indeterminação estas características também alcançam os CONTRATOS COLETIVOS, com ou sem estipulantes.

Esta interpretação tem origem no princípio da conservação dos contratos e a abusividade da cláusula que autoriza sua rescisão unilateral .

Os planos de saúde estão submetidos a certos princípios que regulam as relações consumeristas, em especial, o princípio da conservação dos contratos, que tem aplicação mais especificamente voltada para os contratos de longa duração. Alias o Código Civil também veda a ação abusiva que se lastreie na quebra da confiança e da boa-fé objetiva (deslealdade).

Além da contratação coletiva - assim entendida aquela feita por meio de uma empresa estipulante (empregadora ou representativa de classe) - criar vínculos contratuais com os próprios segurados/beneficiários, a continuidade da prestação dos serviços como obrigação da operadora mesmo após o prazo inicial de vigência do contrato (ou retirada do estipulante) emerge em consequência desse princípio, que se caracteriza pela perpetuidade do vínculo contratual nas sociedades de consumo e de necessidades várias.

Com efeito, uma vez expirado o prazo inicial de vigência de contrato dessa natureza, as partes contratantes - a empresa empregadora e a operadora do plano - não se liberam ad nutum do liame obrigacional, pois a extinção do vínculo contratual depende do consentimento dos segurados (os empregados, pessoas físicas). Ao filiar-se a plano dessa natureza, o empregado envolve-se numa relação de confiança com a operadora (e também com a empresa empregadora, no que tange à expectativa de seu cumprimento quanto ao pagamento de sua cota), tornando-se parte ¿cativa¿ dessa relação, que não pode sofrer solução de continuidade, sob pena de levá-lo (o segurado) à uma situação de insegurança e instabilidade. A consequência lógica do princípio da conservação dos contratos é a indeterminação de prazo do contrato de plano de saúde. O fenômeno da catividade.

Segundo Claudia Lima Marques1 os contratos de planos de saúde são contratos atípicos, de prestação de serviços. São contratos de adesão, sinalagmáticos, onerosos e formais, e execução diferida e prazo indeterminado. Destaca o aspecto da cooperação para fundamentar a indeterminação de prazo que caracteriza os contratos de assistência à saúde. Ensina ela que os contratos dessa espécie são ¿contratos de cooperação¿, no sentido de que a operadora tem o dever de solidariedade com os consumidores, de cooperação para a manutenção dos vínculos e do sistema suplementar de saúde, de forma a possibilitar a realização das expectativas legítimas do contratante mais fraco. Por força dessa norma, passando o contrato de plano ou seguro-saúde a vigorar por prazo indeterminado, é nula (por abusiva) a cláusula que confere o direito de rescisão unilateral e sem direito à indenização à outra parte, através de simples pré-aviso pelo interessado.

A citada autora explica que, nesse tipo de contrato peculiar, a manutenção do vínculo é o interesse prevalente e abusivas são as cláusulas que permitem rescisão, denúncia ou cancelamento do contrato, face ao passar do tempo e às anteriores contribuições dos consumidores justamente para assegurar segurança em caso de um futuro evento saúde. Continua explicando que ¿com o avançar da idade do consumidor, com o repetir de contribuições ao sistema e com o criar de expectativas legítimas de transferência de riscos futuros de saúde, os consumidores só têm a perder saindo de um plano. Assim, por exemplo, passados mais de 15 anos de convivência e cooperação contratual, rescindir o contrato ou terminar a relação contratual seria altamente negativo para os consumidores. Há o dever de boa-fé de cooperar para a manutenção do vínculo e para a realização das expectativas legítimas dos consumidores¿. (grifos postos).

A conseqüência dessa vulnerabilidade especial criada pela catividade e a necessidade de determinar a abusividade de cláusulas de fim de vínculo concorreram para a positivação do princípio da conservação dos contratos. Para evitar que o fornecedor se libere do vínculo contratual, sempre que este não lhe seja mais favorável ou interessante (rescindindo, denunciando, resolvendo o vínculo, cancelando o plano etc.), sobreveio a regra do art. 22, X (parte final), do Decreto nº 2.181, de 20 de março de 1997, que, complementando a lista de cláusulas abusivas do art. 51 do CDC, prevê a aplicação de multa ao fornecedor que fizer inserir cláusula que lhe permita, nos contratos de longa duração ou trato sucessivo (inclusive nos que envolvem operação securitária), ¿o cancelamento sem justa causa ou motivação, mesmo que dada ao consumidor a mesma opção¿.

Tal impedimento ao desligamento do vínculo só cede diante de um justo motivo, devidamente comprovado e que impeça a continuidade das relações obrigacionais em plena comutatividade, como, aliás, está a indicar a própria redação do dispositivo normativo mencionado (art. 22, X, do Decreto nº 2.181/1997), o que inocorreu no presente caso.

A jurisprudência ainda vai mais longe, identificando na regra do art. 51, inc. IV - regra geral de abusividade - a fonte legal para a invalidação de cláusulas de fim de vínculo.

A idéia é de que a cláusula que permite a rescisão unilateral do contrato de assistência à saúde viola regras do Código de Defesa do Consumidor, por conferir vantagem exagerada em favor da operadora do plano, colocando, por outro lado, o consumidor em posição de desvantagem acentuada, além de se mostrar incompatível com a boa-fé é nula de pleno direito, podendo ser revista de plano e de ofício pelo Juiz.

O próprio STJ já decidia sobre a impossibilidade de rescisão unilateral do contrato de plano de saúde:

CONSUMIDOR - PLANO DE SAÚDE - CLÁUSULA ABUSIVA - NULIDADE - RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO PELA SEGURADORA - LEI Nº 9.656/1998 - É nula, por expressa previsão legal, e em razão de sua abusividade, a cláusula inserida em contrato de plano de saúde que permite a sua rescisão unilateral pela seguradora, sob simples alegação de inviabilidade de manutenção da avenca. Recurso provido ((STJ, REsp 602397/RS, 3ª T., Rel. Min. Castro Filho, DJ 01.08.2005, p. 443).


A própria Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998) prevê o princípio da conservação dos contratos em seu art. 13: ¿têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação¿.

Assim, se o CDC já continha linhas de manutenção do vínculo e proibição de cláusulas rescisórias em contratos de saúde coletivos, hoje há uma complementaridade entre o Código (lei geral) e a lei especial (Lei nº 9.656/1998), quer sejam celebrados por estipulação, por conta de contratos trabalhistas (a ambientação contratual não lhes retira a especificidade).

Há quem sustente que a regra da renovação automática, tal qual prevista no art. 13, somente tem aplicação em relação aos planos de saúde de contratação individual, em razão da norma do parágrafo único, inciso II, do mesmo artigo, que faz referência expressa somente a essa categoria. Existe inclusive jurisprudência apoiando essa interpretação. Mas, a despeito desses posicionamentos, resta evidente que a regra da indeterminação de prazo aplica-se indistintamente aos contratos coletivos e aos contratos individuais de assistência à saúde. É a corrente mais aceita pelos Magistrados, doutrinadores e especialistas.

A melhor técnica legislativa ensina que o parágrafo é sempre referente à regra da cabeça do artigo, podendo exprimir tanto um complemento, uma explicação ou uma exceção. No caso do art. 13, a regra da indeterminação do prazo está contida no seu caput, que não faz distinção entre contratos negociados coletiva ou individualmente, nos seguintes termos: ¿Art. 13. Os contratos de produtos que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou de qualquer outro valor no ato da renovação.¿

Observe-se que a regra transcrita, ao se referir aos ¿contratos¿ (no plural) submetidos à renovação automática, não separa as categorias de plano, o que só ocorre a partir do § 1º e seus incisos, estes, sim, de aplicação restrita aos planos contratados individualmente.

A unificação de tratamento jurídico quanto a ambas as modalidades só cede a partir daí, onde foram estabelecidas regras específicas, dentre elas a do prazo mínimo de vigência (inicial) de um ano (para o plano individual).

Por força dessa norma contida no caput do art. 13 da Lei nº 9.656/1998, a operadora não pode simplesmente desistir do contrato, vez que, exaurido o prazo inicial de vigência estabelecido contratualmente, o plano ou seguro coletivo de assistência à saúde se renova automaticamente, sem limite de prazo.

A importância da manutenção da assistência à saúde aos consumidores de planos coletivos é certa e indiscutível.

No caso deste processo, aplica-se os artigo 31 da Lei 9656/98.

Nos artigos 30 e 31 da referida norma ordinária, encontramos duas situações específicas em que o legislador revelou sua preocupação em não deixar desamparado o contribuinte de plano coletivo. A primeira é a perda do vínculo trabalhista (rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa), disciplinada no art. 30, e a segunda refere-se à hipótese de aposentadoria do empregado. Não há caso sem solução, se a regra é a da proteção pela manutenção do contrato.2

No sistema de manutenção do segurado, há, possibilidade de contratações individuais, nas mesmas condições, liberada a carência, mantida as condições do plano no que respeita a pagamento.

Em qualquer das situações, é garantido ao contribuinte o direito de manter a condição de beneficiário, nas mesmas condições anteriores à dispensa ou aposentadoria (desde que preenchidas algumas condições).

Essas regras, como se disse, revelam a preocupação do legislador em não deixar desamparado o consumidor de plano de saúde na modalidade de contratação coletiva.

O Conselho de Saúde Suplementar - CONSU, órgão instituído pela Lei nº 9.656/1998, para desempenhar as atribuições normativas da prestação do serviços de saúde suplementar - antes da criação da ANS -, levou em consideração a importância da manutenção da assistência à saúde aos consumidores de planos coletivos e baixou resolução estabelecendo como obrigação das operadoras a absorção do universo de consumidores oriundos de planos coletivos liquidados ou encerrados. De fato, a Resolução nº 19 do CONSU estabelece, no seu art. 1º, que:

¿As operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adesão para empresas que concedem esse benefício a seus empregados, ou ex-empregados, deverão disponibilizar plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficiários, no caso de cancelamento desse benefício, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência.¿


O § 2º desse mesmo artigo estende a obrigação da operadora, quanto à continuidade da prestação dos serviços de assistência à saúde, a todo o grupo familiar vinculado ao beneficiário titular. A continuidade da prestação dos serviços em planos individuais é direito do consumidor, devendo o empregador (estipulante) informar aos seus empregados no prazo oportuno para que possam exercer essa opção (art. 2º e parágrafo único).

¿A Resolução nº 19 do Consu contém apenas um único dispositivo que deve ser afastado, por ser contrário às disposições e princípios da Lei nº 9.656/1998 e do CDC. Trata-se do seu art. 3º, que dispensa da obrigação da continuidade da prestação dos serviços, em caso de cancelamento do contrato coletivo, as operadoras que não mantenham plano na modalidade individual ou familiar. Tal artigo é incompatível com o princípio da conservação do contrato de consumo de longa duração e representa uma válvula de escape para operadoras, para fugirem às suas obrigações de continuidade da prestação do serviço de assistência à saúde¿. (Trecho da sentença prolatada nos autos nº 0026256-06.2016.8.05.0001, Juíza Mariana Teixeira Lopes, 8ª VSJE DO CONSUMIDOR (VESPERTINO).

Como se vê, se por qualquer motivo o plano coletivo vem a ser encerrado, aos beneficiários deve ser assegurada a opção pela Resolução nº 19 do CONSU contém apenas um único dispositivo que deve ser afastado, por ser contrário às disposições e princípios da Lei nº 9.656/1998 e do CDC.

Até mesmo para os casos de encerramento do Plano coletivo há previsão de manutenção do segurado em plano individual, o que importa é a continuidade do contrato relacional3.

Em resumo Ronaldo Porto Macedo Junior, em obra já anotada, explica bem a conceituação dos contratos relacionais, que, na sociedade moderna são constantes e vinculam as partes pela necessidade premente do objeto regulado.

Diz o renomado que o realismo norte-americano denominou estas relações de contratos de "relacionais" (relational contracts) , destacando os elementos sociológicos que condicionam o nascimento e a estabilidade dos contratos complexos de longa duração. A contribuição destes estudos, que remontam a 1974, foi grande, pois observando as relações "não-contratuais", as projeções de troca dos empresários e sua organização em networks, baseadas mais na confiança, solidariedade e cooperação no que em vínculos contratuais expressos, desenvolveu a noção de um contrato aberto, de uma relação contínua, duradora ao mesmo tempo em que modificável pelos usos e costumes ali desenvolvidos e pelas atuais necessidades das partes.

E segue em sua obra, chamando atenção para o potencial deste modelo de pensamento contratual, que além de fascinante, retrata com fidedignidade, um contrato relacional como aquele onde há vinculo, mas não necessariamente contratual, como nas parcerias econômicas furtivas e momentâneas de hoje. Identificar um contrato relacional, onde o vínculo oficialmente já acabou, mas há relacionamento a posterior, como em um contrato cumprido, não renovado, mas novado ou mesmo reescrito. Identificar um contrato relacional onde existem vários contratos, com várias e diferentes pessoas jurídicas, como os contratos com bancos múltiplos, contratos em um só, ou um contrato com pessoas diferentes, banco, corretora, financeira, seguradora de saúde, com estipulador, ou fornecedora de serviços outros, tudo em um só relacionamento finalístico de consumo!

¿Identificar um contrato de troca real, onde há na teoria um contrato unilateral clássico, como no mútuo, destacando a reciprocidade intrínseca das prestações, dos direitos e deveres principais e anexos, faz com que o nexo (Finalnexus) que liga a prestação oficialmente única e a contra-prestação escondida (pagamento de juros pelo capital colocado a disposição e o tempo) re-apareça, criando um sinalagma fantasma, uma bilateralidade real, bilateralidade relacional, ousada e absolutamente não-clássica.4¿

¿Note-se, porém, que este modelo contratual foi criado em virtude de dificuldades específicas e imanentes ao sistema da commom law com as relações de longa duração. 56 Estas dificuldades de englobar na relação contratual as promessas e informações não formais ou não escritas, de preencher as lacunas contratuais com uma interpretação integrativa pelo Judiciário são menores em um sistema contratual não solene como o brasileiro ou o continental europeu. Os demais problemas apresentados podem ser solucionados, no direito brasileiro, pelos princípios da confiança, da boa-fé, da acessoriedade das relações de pré-consumo ou pela teoria da aparência.

Sendo assim, a mais importante contribuição destes estudos para a nova teoria contratual brasileira é a criação de um modelo teórico contínuo que engloba as constantes renegociações e as novas promessas, bem destacando que a situação externa e interna de catividade e interdependência dos contratantes faz com que as revisões, novações ou renegociações contratuais naturalmente continuem ou perenizem a relação de consumo, não podendo estas, porém, autorizar abusos da posição contratual dominante, ou -pior- validar prejuízos sem causa ao contratante mais fraco ou tentar superar e descumprir deveres de cooperação, de solidariedade e de lealdade que integram a relação em toda a sua duração.

¿Em resumo, a teoria do contrato relacional pode contribuir, especialmente nos contratos de mútuo e em geral de fornecimento de serviços, para uma nova compreensão da confiança despertada pela atividade dos fornecedores e para a aceitação de uma readaptação constante das relações de longa duração de forma a não frustar as expectativas legítimas das partes, apesar da limitada da vontade manifestada inicialmente5.¿

Consta da jurisprudência em vigor o seguinte entendimento:

¿CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE - NOVA CONTRATAÇÃO - MERA CONTINUAÇÃO DO CONTRATO ORIGINALMENTE PACTUADO - APROVEITAMENTO DE CARÊNCIA DO PLANO ANTERIOR. Quando há encerramento do plano de saúde coletivo e esse vem a ser cancelado, tem o segurado o direito de optar pela continuação de cobertura de plano individual. As empresas que atuam no setor de planos de seguro e assistência à saúde suplementar devem garantir ao consumidor, no caso de cancelamento de seguro de saúde empresarial, um plano de saúde individual ou familiar e aproveitar o prazo de carência já contado durante o plano de saúde empresarial. Recurso improvido. Unânime6.

A este respeito, também já se manifestou o STJ, em Voto da Ministra Nancy Andrighi:

DIREITO DO CONSUMIDOR ¿ CONTRATO DE SEGURO DE VIDA, RENOVADO ININTERRUPTAMENTE POR DIVERSOS ANOS ¿ CONSTATAÇÃO DE PREJUÍZOS PELA SEGURADORA, MEDIANTE A ELABORAÇÃO DE NOVO CÁLCULO ATUARIAL ¿ NOTIFICAÇÃO, DIRIGIDA AO CONSUMIDOR, DA INTENÇÃO DA SEGURADORA DE NÃO RENOVAR O CONTRATO, OFERECENDO-SE A ELE DIVERSAS OPÇÕES DE NOVOS SEGUROS, TODAS MAIS ONEROSAS ¿ CONTRATOS RELACIONAIS ¿ DIREITOS E DEVERES ANEXOS ¿ LEALDADE, COOPERAÇÃO, PROTEÇÃO DA SEGURANÇA E BOA FÉ OBJETIVA ¿ MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE SEGURO NOS TERMOS ORIGINALMENTE PREVISTOS ¿ RESSALVA DA POSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO DO CONTRATO, PELA SEGURADORA, MEDIANTE A APRESENTAÇÃO PRÉVIA DE EXTENSO CRONOGRAMA, NO QUAL OS AUMENTOS SÃO APRESENTADOS DE MANEIRA SUAVE E ESCALONADA ¿ 1- No moderno direito contratual reconhece-se, para além da existência dos contratos descontínuos, a existência de contratos relacionais, nos quais as cláusulas estabelecidas no instrumento não esgotam a gama de direitos e deveres das partes. 2- Se o consumidor contratou, ainda jovem, o seguro de vida oferecido pela recorrida e se esse vínculo vem se renovando desde então, ano a ano, por mais de trinta anos, a pretensão da seguradora de modificar abruptamente as condições do seguro, não renovando o ajuste anterior, ofende os princípios da boa fé objetiva, da cooperação, da confiança e da lealdade que deve orientar a interpretação dos contratos que regulam relações de consumo. 3- Constatado prejuízos pela seguradora e identificada a necessidade de modificação da carteira de seguros em decorrência de novo cálculo atuarial, compete a ela ver o consumidor como um colaborador, um parceiro que a tem acompanhado ao longo dos anos. Assim, os aumentos necessários para o reequilíbrio da carteira têm de ser estabelecidos de maneira suave e gradual, mediante um cronograma extenso, do qual o segurado tem de ser cientificado previamente. Com isso, a seguradora colabora com o particular, dando-lhe a oportunidade de se preparar para os novos custos que onerarão, ao longo do tempo, o seu seguro de vida, e o particular também colabora com a seguradora, aumentando sua participação e mitigando os prejuízos constatados. 4- A intenção de modificar abruptamente a relação jurídica continuada, com simples notificação entregue com alguns meses de antecedência, ofende o sistema de proteção ao consumidor e não pode prevalecer. 5- Recurso especial conhecido e provido.7 (grifos nossos).



Donde se conclui que o Superior Tribunal de Justiça já proferiu decisões bem mais favoráveis ao consumidor.

Atualmente, alguns entendimentos do Superior Tribunal de Justiça não prestigiam as normas do Código de Defesa do Consumidor:

PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL ¿ EX¿EMPREGADO APOSENTADO ¿ ASSISTÊNCIA MÉDICA ¿ MANUTENÇÃO ¿ ¿Agravo interno no recurso especial. Civil - Plano de saúde coletivo empresarial. Ex-empregado aposentado. Assistência médica. Manutenção. Art. 31 da Lei nº 9.656/1998. Requisitos não preenchidos. Contrato de trabalho. Vigência. Contribuição exclusiva do empregador. 1. É assegurado ao trabalhador demitido sem justa causa ou ao aposentado que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de manutenção como beneficiário nas mesmas condições de cobertura assistencial que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral (arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998). 2. Nos planos de saúde coletivos custeados exclusivamente pelo empregador não há direito de permanência do ex-empregado aposentado ou demitido sem justa causa como beneficiário, salvo disposição contrária expressa, prevista em contrato ou em convenção coletiva de trabalho, sendo irrelevante a tão só existência de coparticipação, pois esta não se confunde com contribuição. 3. Agravo interno não provido.¿ (STJ ¿ AgInt-REsp 1.593.594 ¿ (2016/0087616-0) ¿ 3ª T. ¿ Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva ¿ DJe 25.11.2016).

PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL ¿ EX¿EMPREGADO APOSENTADO ¿ ASSISTÊNCIA MÉDICA ¿ MANUTENÇÃO ¿ ¿Recurso especial. Civil. Plano de saúde coletivo empresarial. Ex-empregado aposentado. Manutenção da assistência médica. Art. 31 da Lei nº 9.656/1998. Requisitos não preenchidos. Vigência do contrato de trabalho. Contribuição exclusiva do empregador. Coparticipação do usuário. Irrelevância. Fator de moderação. Salário indireto. Descaracterização. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se o ex-empregado aposentado ou demitido sem justa causa faz jus à manutenção no plano de saúde coletivo empresarial quando, na atividade, a contribuição foi suportada apenas pela empresa empregadora. 2. É assegurado ao trabalhador demitido sem justa causa ou ao aposentado que contribuiu para o plano de saúde em decorrência do vínculo empregatício o direito de manutenção como beneficiário nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral (arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998). 3. Nos termos dos arts. 30, § 6º, e 31, § 2º, da Lei nº 9.656/1998, não é considerada contribuição a coparticipação do consumidor, única e exclusivamente, em procedimentos, como fator de moderação, na utilização dos serviços de assistência médica ou hospitalar. 4. Contribuir para o plano de saúde significa, nos termos da lei, pagar uma mensalidade, independentemente de se estar usufruindo dos serviços de assistência médica. A coparticipação, por sua vez, é um fator de moderação, previsto em alguns contratos, que consiste no valor cobrado do consumidor apenas quando utilizar o plano de saúde, possuindo, por isso mesmo, valor variável, a depender do evento sucedido. Sua função, portanto, é a de desestimular o uso desenfreado dos serviços da saúde suplementar. 5. O plano de assistência médica, hospitalar e odontológica concedido pelo empregador não pode ser enquadrado como salário indireto, sejam os serviços prestados diretamente pela empresa ou por determinada operadora (art. 458, § 2º, IV, da CLT). Com efeito, o plano de saúde fornecido pela empresa empregadora, mesmo a título gratuito, não possui natureza retributiva, não constituindo salário-utilidade (salário in natura), sobretudo por não ser contraprestação ao trabalho. Ao contrário, referida vantagem apenas possui natureza preventiva e assistencial, sendo uma alternativa às graves deficiências do Sistema Único de Saúde (SUS), obrigação do Estado. 6. Nos planos de saúde coletivos custeados exclusivamente pelo empregador não há direito de permanência do ex-empregado aposentado ou demitido sem justa causa como beneficiário, salvo disposição contrária expressa, prevista em contrato ou em convenção coletiva de trabalho, sendo irrelevante a tão só existência de coparticipação, pois esta não se confunde com contribuição. 7. Recurso especial provido.¿ (STJ ¿ REsp 1.594.346 ¿ (2016/0086407-7) ¿ Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva ¿ DJe 16.08.2016).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL ¿ CIVIL ¿ PLANO DE SAÚDE COLETIVO EMPRESARIAL ¿ EX-EMPREGADO APOSENTADO ¿ ASSISTÊNCIA MÉDICA ¿ MANUTENÇÃO ¿ ART. 31 DA LEI 9.656/98 ¿ REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS ¿ CONTRATO DE TRABALHO ¿ VIGÊNCIA ¿ CONTRIBUIÇÃO EXCLUSIVA DO EMPREGADOR ¿ 1- A Quarta Turma, em recente julgado, posicionou-se no sentido de que "os valores pagos pelo ex-empregado, única e exclusivamente, a título de coparticipação ou franquia em procedimentos, como fator de moderação na utilização dos serviços, não caracterizam contribuição e, consequentemente, não ensejam o exercício do direito de manutenção no plano de saúde coletivo empresarial previsto nos artigos 30 e 31 da Lei 9.656/98" (REsp 1.608.346/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/10/2016, DJe de 30/11/2016). 2- No caso, tendo o plano de saúde sido financiado integralmente pela ex-empregadora, não estão caracterizados os requisitos necessários para sua manutenção nas mesmas condições do plano de saúde coletivo de quando empregado. 3- Agravo interno não provido. (STJ ¿ AGInt-AGInt-REsp 1.615.164 ¿ (2016/0190648-7) ¿ 4ª T. ¿ Rel. Min. Raul Araújo ¿ DJe 14.03.2017 ¿ p. 1490).

Estas decisões ainda não têm força vinculante. Suas teses ferem frontalmente o Código de Defesa do Consumidor, pois expulsam da proteção do Seguro de Saúde pessoa que geralmente se encontra em idade avançada e por esta razão encontrará dificuldades de ser aceita em outros planos de saúde.

Nesta fase da vida é que o empregado mais necessita da cobertura do plano de saúde, não podendo a empresa, simplesmente, suprimir o plano assistencial, ao fundamento de que não era contributário. Esta condição é moderada pela assunção integral do premio pelo demitido ou aposentado.

Este entendimento também é acolhido por outros Tribunais que amparam a pretensão do consumidor, aposentado ou demitido, de se manter na apólice após seu desligamento, com base nas regras protecionistas consumeristas como a seguir se demonstra:

PLANO DE SAÚDE ¿ RESTABELECIMENTO ¿ APOSENTADORIA ¿ A Lei 9.656/98, no artigo 31, assegura ao empregado aposentado a manutenção do plano de saúde para o qual contribuiu pelo prazo mínimo de dez anos, em decorrência da relação de emprego. O benefício será assegurado sob as mesmas condições de cobertura assistencial vigentes no curso do contrato de trabalho, desde que o empregado assuma o pagamento integral. Por tal motivo, não se admite alteração que implique modificação das condições vigentes durante o vínculo empregatício, sob pena de violação da lei referida e, ainda, do artigo 468 da CLT. (TRT 03ª R. ¿ RO 0010615-21.2016.5.03.0021 ¿ 1ª T. ¿ Rel. Jose Eduardo Resende Chaves Jr ¿ J. 30.01.2017).

EMPREGADO APOSENTADO ¿ PLANO DE SAÚDE ¿ LEI 9.656/98 ¿ BENEFICIÁRIO DO PLANO EMPRESA (ART. 16, VII, "B") ¿ RESPONSABILIDADE PÓS-CONTRATUAL DO EMPREGADOR ¿ SUBSISTÊNCIA ¿ Após a aposentadoria do empregado subsiste a responsabilidade do empregador quanto à manutenção da exobreira e seus dependentes como usuários do plano de saúde. O direito de manutenção da condição de beneficiário com as mesmas coberturas está previsto no art. 31 da Lei 9.656/98. (TRT 22ª R. ¿ RO 0000995-11.2016.5.22.0003 ¿ Rel. Manoel Edilson Cardoso ¿ DJe 27.02.2017 ¿ p. 337).

Também não prosperam os pleitos formulados no recurso da parte autora.

Quanto aos reajustes autorizados pela ANS mencionados na decisão dos embargos de declaração (evento 146), não há reparo a se fazer, pois consequência lógica da manutenção do plano. Ademais, como a liminar trouxera um valor fixo, sem ressalvar a possibilidade de reajustes, poderia ensejar a interpretação equivocada de que o prêmio não seria atualizado.

Por fim, não há danos morais indenizáveis. O mero dissabor decorrente de uma violação de relação negocial, mesmo com repercussão econômica, por si só, não gera direito ao recebimento de indenização por dano moral eis que não foi violado direito personalíssimo.

Quanto ao falecimento do autor, noticiado no evento 190, não modifica o panorama da decisão, tendo o E. STJ pacífico posicionamento a respeito do direito subjetivo dos dependentes em manter o plano durante o período de extensão previsto no arts. 30 e 31 da lei 9656/98, portanto, deverá o plano ser mantido em face da dependente do autor, sendo cobrado, a partir do falecimento do autor, 50% do valor a ser apurado pelo prêmio do plano de saúde.

Neste sentido:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO. FALECIMENTO DA TITULAR. BENEFICIÁRIA AGREGADA. PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO DO BENEFÍCIO. ART. 30 DA LEI 9.656/1998. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA DOS DISPOSITIVOS E PRECEITOS LEGAIS. JULGAMENTO: CPC/15. 1. Ação de obrigação de fazer c/c compensação por dano moral ajuizada em 22/05/2018, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 30/07/2019 e atribuído ao gabinete em 01/07/2020. Julgamento: CPC/15. 2. O propósito recursal consiste em decidir sobre a manutenção de membro pertencente a grupo familiar (beneficiário agregado) em plano de saúde coletivo, após o falecimento do beneficiário titular. 3. A Terceira Turma decidiu que, na hipótese de falecimento do titular do plano de saúde coletivo, seja este empresarial ou por adesão, nasce para os dependentes jáì inscritos o direito de pleitear a sucessão da titularidade, nos termos dos arts. 30 ou 31 da Lei 9.656/1998, a depender da hipótese, desde que assumam o seu pagamento integral ( REsp 1.871.326/RS, julgado em 01/09/2020, DJe 09/09/2020). 4. Apesar de o § 3º do art. 30, que trata da hipótese de permanência em caso de morte do beneficiário titular, fazer uso da expressão "dependentes", o § 2º assegura a proteção conferida pelo referido art. 30, de manutenção do plano de saúde nas hipóteses de rompimento do contrato de trabalho do titular, obrigatoriamente, a todo o grupo familiar, sem fazer nenhuma distinção quanto aos agregados. 5. De acordo com o art. 2º, I, b da Resolução ANS 295/2012, beneficiário dependente é o beneficiário de plano privado de assistência à saúde cujo vínculo contratual com a operadora depende da existência de relação de dependência ou de agregado a um beneficiário titular. 6. No caso de morte do titular, os membros do grupo familiar - dependentes e agregados - podem permanecer como beneficiários no plano de saúde, desde que assumam o pagamento integral, na forma da lei. 7. O direito do beneficiário dependente de permanecer no plano de saúde após o falecimento do beneficiário titular tem prazo certo, este previsto na Lei 9.656/1998 e, no particular, no contrato do convênio e no regulamento do plano, sem prejuízo do exercício do direito à portabilidade de carências, nos termos dos arts. 6º e 8º, I e § 1º, da Resolução ANS 438/2018. 8. Recurso especial conhecido e desprovido. (STJ - REsp: 1841285 DF 2019/0295842-5, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 23/03/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/03/2021)

Constata-se, dessa forma, que não merece extinção sem julgamento do mérito o processo em razão do falecimento do autor, mormente pela habilitação dos herdeiros conforme evento nº 190, devendo o plano ser mantido ativo em face de sua esposa.

Diante do exposto, VOTO PELO IMPROVIMENTO DE AMBOS OS RECURSOS, mantendo a sentença em todos os seus termos. Custas e honorários, estes em 20% do valor da causa a cargo dos recorrentes vencidos. Contudo, em virtude do deferimento da assistência judiciária gratuita, tal pagamento fica suspenso nos termos do art. 98, § 3º, do CPC 2015, somente em relação à parte autora.


NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS

Juíza Relatora








1 LIMA MARQUES, CLAUDIA. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 4ª edição revisada e ampliada, São Paulo, RT, 2002, páginas 394 e seguintes.

2 RECURSO IMPROVIDO ¿ PLANO DE SAÚDE ¿ CONTRATO CATIVO DE LONGA DURAÇÃO ¿ Rescisão contratual sem justa causa com a empresa a qual era beneficiária de plano coletivo. Responsabilidade da empresa de saúde força da essência do ajuste. Pedido de manutenção de plano de saúde após a vinculação. Prova de co-participação nos autos. Sentença mantida nos seus próprios fundamentos. (TJBA ¿ Rec. 0037881-62.2001.805.0001-1 ¿ 2ª T. ¿ Rel. Juiz Aurelino Otacilio Pereira Neto ¿ DJe 17.03.2011 ¿ p. 849)v88. NO mesmo sentido e relator no processo de número 032.2008.573-1, julgamento sistema PROJUDI em 05-06-2009. Acesso em 2 de dezembro de 2011.

3 MACEDO JR., Ronaldo Porto. Contratos relacionais e defesa do consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

4 CONTRATOS BANCÁRIOS EM TEMPOS PÓS-MODERNOS - PRIMEIRAS REFLEXÕES 1 - Claudia Lima Marques, (Publicada na Revista da Faculdade de Direito da UFRGS Vol. 15 - 1998, pág. 33.

5 CONTRATOS BANCÁRIOS EM TEMPOS PÓS-MODERNOS - PRIMEIRAS REFLEXÕES 1 - Claudia Lima Marques, (Publicada na Revista da Faculdade de Direito da UFRGS Vol. 15 - 1998, pág. 33.

6/font> TJDF, AC 2001.01.1.103462-7, 6ª T.Cív., Rel. Des. Otavio Augusto, J. 08.11.2004.

7 STJ ¿ REsp 1.073.595 ¿ (2008/0150187-7) ¿ 2ª S. ¿ Relª Minª Nancy Andrighi ¿ DJe 29.04.2011 ¿ p. 338, v89.