PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Quarta Câmara Cível Gabinete da Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. CASSI. ENTE DE AUTOGESTÃO. NÃO INCIDÊNCIA DO CDC. SÚMULA N.º608 DO STJ. PRESCRIÇÃO DECENAL. TEMA N.º610 DO STJ. PRAZO TRIENAL PARA PRETENSÃO CONDENATÓRIA ADVINDA DA DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA CLÁUSULA DE REAJUSTE. PREJUDICIAL REJEITADA. AUMENTOS ANUAIS, TÉCNICOS E ETÁRIOS. PACTO NÃO ADAPTADO À LEI N.º9.656/98. TEMAS N.º 1.016 E N.º952 DO STJ. RELAÇÃO JURÍDICA DE TRATO SUCESSIVO. POSSIBILIDADE DE REVISÃO APÓS ADVENTO DO ESTATUTO DO IDOSO. RESTITUIÇÃO SIMPLES DO VALOR PAGO A MAIOR, OBSERVADA A PRESCRIÇÃO TRIENAL. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame: 1. Trata-se de agravo interno contra a decisão que proveu, em parte, a apelação do idoso, para, ratificando a liminar e a improcedência quanto aos aumentos entre 1997 e 2003, reconhecer a ilegalidade dos reajustes etários e técnicos posteriores ao Estatuto do Idoso e daqueles anuais que suplantem os índices contratuais da FIPE-SAÚDE, condenando, a ré, à restituição simples dos valores pagos a maior, observada a prescrição trienal. II. Questão em discussão. 2. Há duas questões em debate: o prazo da prescrição para declaração de nulidade de cláusula de reajuste de plano de saúde, e; a abusividade, ou não, dos aumentos, após o advento do Estatuto do Idoso, de acordo com os cálculos atuariais. III. Razões de decidir. 3. Tratando-se de relação de trato sucessivo, renovada a cada ano, é possível, a qualquer tempo (ou seja, não se aplica a prescrição decenal, por não atingir o fundo de direito), a revisão ou anulação de cláusula de reajuste contrária ao Ordenamento Jurídico, à luz do Tema n.º610 do STJ, por consistir pedido meramente declaratório, ainda que a pretensão autoral de repetição de indébito dos valores pagos a maior (pleito de cunho condenatório) deva observar a prescrição trienal. Prejudicial meritória rejeitada. 4. Nada obstante a não incidência do CDC, às entidades de autogestão, o Tema n.º 952 do STJ assegura a revisão da abusividade dos reajustes etários, técnicos e anuais de planos de saúde – ainda que não adaptados à Lei n.º9.656/98 – em especial, a partir do Estatuto do Idoso (em 01.01.2004), quando restou vedado o aumento discriminatório de valores, em razão da idade. 5. De acordo com a cláusula 19ª do contrato (ID n.º26933179, fl.05), há expressa previsão de adequação dos reajustes etários à “mudanças de legislação e/ou economia do país, que afetem os custos do plano, ou alteração da idade do participante, que importe mudança de faixa etária”, aí incluído o Estatuto do Idoso, a partir da sua vigência. 6. In casu, o plano de saúde foi contratado em 08.09.1997 e, após o autor ter completado 60 anos, em 22.12.1994, sofreu reajustes anuais, técnicos e etários, que aumentaram as mensalidades em demasia, o que gerou onerosidade excessiva ao idoso. 7. Logo, a decisão manteve a improcedência da pretensão, quanto aos aumentos entre 1997 a 2003 (previsão contratual e não provada a abusividade), mas, a partir do Estatuto do Idoso, reconheceu a abusividade dos reajustes etários e técnicos praticados pela Operadora, além de declarar inválidos os aumentos anuais que suplantem aqueles contratualmente previstos (índice da FIPE SAÚDE, cláusula 20ª), a serem apurados em liquidação de sentença. Ademais, acolheu, em parte, o pedido de restituição simples dos valores pagos a maior, observada a prescrição trienal. IV. DESPROVIMENTO DO RECURSO. Dispositivos relevantes citados: art.15, §3º da Lei n.º 10.741/2003; Jurisprudência relevante citada: Temas n.º 610, 952, 1.016 do STJ; Súmula n.º608 do STJ; resultado parcial do Tema n.º381 do STF. STJ, R.Esp. n.º 1.568.244/RJ item 7, (iii), “a”; Rel. Min. Ricardo Cueva, 2ª Seção, DJE 19.12.2016; STJ, REsp n. 1.360.969/RS, Rel. Ministro Marco Bellizze, 2ª Seção, julgado em 10.08.2016 Vistos, relatados e discutidos estes autos, preambularmente identificados, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, conforme certidão de julgamento, em rejeitar a prejudicial de prescrição decenal e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo, in totum, a decisão objurgada, na forma do quanto fundamentado no voto da excelentíssima Relatora, adiante registrado e que a este se integra. Salvador, data registrada no sistema.
Processo: AGRAVO INTERNO CÍVEL n. 0546378-12.2018.8.05.0001.2.AgIntCiv
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
Relator: Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel
AGRAVANTE: CAIXA DE ASSISTENCIA DOS FUNCIONARIOS DO BANCO DO BRASIL
Advogado(s): DANNIEL ALLISSON DA SILVA COSTA
AGRAVADO: JOSE CARLOS REIS LOPES
Advogado(s): CARLOS HENRIQUE SANTANA REIS LOPES, SIMEIA PASSOS DE ANDRADE, LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA, MARIA EMILIA GONCALVES DE RUEDA
ACÓRDÃO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
QUARTA CÂMARA CÍVEL
DECISÃO PROCLAMADA |
Rejeitada a prefacial meritória de prescrição e, no mérito, negado provimento por maioria. Divergiu o Des. Ângelo Jeronimo e Silva Vita.
Salvador, 4 de Novembro de 2024.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Quarta Câmara Cível Gabinete da Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel Trata-se de agravo interno interposto por Caixa de Assistência dos Funcionários do Banco do Brasil, contra a decisão que deu parcial provimento à apelação de José Carlos Reis Lopes, “para, ratificando a tutela de urgência de ID n.º 27238977 e a improcedência quanto aos aumentos entre 1997 e 2003, reformar, em parte, o veredicto objurgado, para, com lastro nos temas n.º952 e 1.016 do STJ, reconhecer a ilegalidade dos reajustes etários e técnicos posteriores ao Estatuto do Idoso, como também, aqueles anuais que porventura suplantem os índices contratuais da FIPE SAÚDE, julgando procedente, em parte, a restituição simples dos valores pagos a maior pelo idoso, observada a prescrição trienal, com juros de mora de 01%, a partir da citação, e correção monetária, a partir da data do vencimento da mensalidade, pelo IPCA”. Inconformada, a Operadora interpôs o recurso, sob o argumento de legalidade da cláusula de reajuste de mensalidade, para contratos firmados antes da Lei n.º10.741/2003. Arguiu, para tanto, a prescrição decenal para discussão das cláusulas do plano de saúde. Aduziu que os índices aplicados para os reajustes anuais e de faixa etária obedeceram aos cálculos atuariais, nos moldes do contrato não adaptado à Lei n.º9.656/98. Prosseguiu afirmando que a decisão agravada, a partir do Estatuto do Idoso, acolheu em parte a pretensão autoral, por se tratar de norma cogente e de ordem pública. Obtemperou, no entanto, que deveria ser demonstrada a abusividade, em tais casos, à luz da boa-fé objetiva e equidade. Destacou que, em sendo reconhecida a excessividade, deverá haver apuração por cálculo atuarial, na fase de liquidação de sentença, por não estar sujeito aos índices da ANS. Ao final, visou ao provimento do recurso. Instada a se pronunciar, a Agravada apresentou contrarrazões no ID de n.º59263929, em que pugnou pelo desprovimento da insurgência. Este é o relatório que encaminho à Secretaria da Quarta Câmara Cível, para oportuna inclusão em pauta de julgamento, nos termos dos artigos 931, caput e 934, caput, ambos do CPC/15. Salvador, 07 de outubro de 2024. DESª. DINALVA GOMES LARANJEIRA PIMENTEL 05
Processo: AGRAVO INTERNO CÍVEL n. 0546378-12.2018.8.05.0001.2.AgIntCiv
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
Relator: Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel
AGRAVANTE: CAIXA DE ASSISTENCIA DOS FUNCIONARIOS DO BANCO DO BRASIL
Advogado(s): DANNIEL ALLISSON DA SILVA COSTA
AGRAVADO: JOSE CARLOS REIS LOPES
Advogado(s): CARLOS HENRIQUE SANTANA REIS LOPES, SIMEIA PASSOS DE ANDRADE, LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA, MARIA EMILIA GONCALVES DE RUEDA
RELATÓRIO
Relatora
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Quarta Câmara Cível Gabinete da Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel Trata-se de agravo interno interposto pela Operadora de saúde, em face da decisão monocrática, que dera provimento parcial à apelação do beneficiário, diante da aparente abusividade do reajuste etário, à luz do item 7, (iii), a, do Recurso Especial Repetitivo n.º 1568244/RJ, de observância obrigatória, além dos Temas n.º952, n.º1.016 e n.º610 do STJ. Após detida análise dos autos, extrai-se que as razões que embasam a decisão agravada são suficientes por seus próprios fundamentos, eis que devidamente cotejadas com súmula e consenso jurisprudencial acerca da matéria. Diante da extensa motivação do julgado objurgado, faz-se necessário ratificar o quanto ali fundamentado, trazendo a íntegra do seu teor do crivo deste Órgão colegiado, nos seguintes termos. Com efeito, na apelação, infere-se que a Operadora de Saúde pretende a reforma do julgdo que reconheceu a ilegalidade dos reajustes anuais e etários aplicados no plano de saúde da idosa. Passo, inicialmente, a analisar a preambular de prescrição decenal. Com efeito, a despeito das alegações da Operadora, a sentença recorrida se encontra em consonância ao Tema n.º610 do STJ, que assim estabelece: “Na vigência dos contratos de plano ou de seguro de assistência à saúde, a pretensão condenatória decorrente da declaração de nulidade de cláusula de reajuste nele prevista prescreve em 20 anos (art. 177 do CC/1916) ou em 3 anos (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002), observada a regra de transição do art. 2.028 do CC/2002”. Ademais, em se tratando de relação jurídica de trato sucessivo que se renova a cada ano, é possível a revisão ou anulação, a qualquer tempo (ou seja, não se aplica a prescrição decenal, por não atingir o fundo de direito), de cláusula contratual contrária ao Ordenamento Jurídico em vigor, por consistir pedido meramente declaratório, ainda que a pretensão de repetição de indébito dos valores pagos a maior (pleito de cunho condenatório) deva observar necessariamente a prescrição trienal para eventual ressarcimento. Dessarte, independentemente da natureza jurídica do contrato de assistência à saúde (plano ou seguro), basta que esteja esse vigente, para exsurgir o enriquecimento sem causa, a atrair, pela doutrina de divisão do instituto (art.884 do CC/02), a observância do prazo prescrional trienal, para a restituição dos valores eventualmente pagos a maior pelo beneficiário. Tudo porque, conforme precedente do STJ citado no decisum embargado, “Nas relações jurídicas de trato sucessivo, quando não estiver sendo negado o próprio fundo de direito, pode o contratante, durante a vigência do contrato, a qualquer tempo, requerer a revisão de cláusula contratual que considere abusiva ou ilegal, seja com base em nulidade absoluta ou relativa. Porém, sua pretensão condenatória de repetição do indébito terá que se sujeitar à prescrição das parcelas vencidas no período anterior à data da propositura da ação, conforme o prazo prescricional aplicável”. Cite-se o precedente do STJ: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CIVIL. CONTRATO DE PLANO OU SEGURO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE. PRETENSÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULA DE REAJUSTE. ALEGADO CARÁTER ABUSIVO. CUMULAÇÃO COM PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. EFEITO FINANCEIRO DO PROVIMENTO JUDICIAL. AÇÃO AJUIZADA AINDA NA VIGÊNCIA DO CONTRATO. NATUREZA CONTINUATIVA DA RELAÇÃO JURÍDICA. DECADÊNCIA. AFASTAMENTO. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. ART. 206, § 3º, IV, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRETENSÃO FUNDADA NO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. 2. CASO CONCRETO: ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL A QUO CONVERGE COM A TESE FIRMADA NO REPETITIVO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO ÂNUA PREVISTA NO ART. 206, § 1º, II DO CC/2002. AFASTAMENTO. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Em se tratando de ação em que o autor, ainda durante a vigência do contrato, pretende, no âmbito de relação de trato sucessivo, o reconhecimento do caráter abusivo de cláusula contratual com a consequente restituição dos valores pagos indevidamente, torna-se despicienda a discussão acerca de ser caso de nulidade absoluta do negócio jurídico - com provimento jurisdicional de natureza declaratória pura, o que levaria à imprescritibilidade da pretensão - ou de nulidade relativa - com provimento jurisdicional de natureza constitutiva negativa, o que atrairia os prazos de decadência, cujo início da contagem, contudo, dependeria da conclusão do contrato (CC/2002, art. 179). Isso porque a pretensão última desse tipo de demanda, partindo-se da premissa de ser a cláusula contratual abusiva ou ilegal, é de natureza condenatória, fundada no ressarcimento de pagamento indevido, sendo, pois, alcançável pela prescrição. Então, estando o contrato ainda em curso, esta pretensão condenatória, prescritível, é que deve nortear a análise do prazo aplicável para a perseguição dos efeitos financeiros decorrentes da invalidade do contrato. 2. Nas relações jurídicas de trato sucessivo, quando não estiver sendo negado o próprio fundo de direito, pode o contratante, durante a vigência do contrato, a qualquer tempo, requerer a revisão de cláusula contratual que considere abusiva ou ilegal, seja com base em nulidade absoluta ou relativa. Porém, sua pretensão condenatória de repetição do indébito terá que se sujeitar à prescrição das parcelas vencidas no período anterior à data da propositura da ação, conforme o prazo prescricional aplicável. 3. Cuidando-se de pretensão de nulidade de cláusula de reajuste prevista em contrato de plano ou seguro de assistência à saúde ainda vigente, com a consequente repetição do indébito, a ação ajuizada está fundada no enriquecimento sem causa e, por isso, o prazo prescricional é o trienal de que trata o art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002. 4. É da invalidade, no todo ou em parte, do negócio jurídico, que nasce para o contratante lesado o direito de obter a restituição dos valores pagos a maior, porquanto o reconhecimento do caráter ilegal ou abusivo do contrato tem como consequência lógica a perda da causa que legitimava o pagamento efetuado. A partir daí fica caracterizado o enriquecimento sem causa, derivado de pagamento indevido a gerar o direito à repetição do indébito (arts. 182, 876 e 884 do Código Civil de 2002). 5. A doutrina moderna aponta pelo menos três teorias para explicar o enriquecimento sem causa: a) a teoria unitária da deslocação patrimonial; b) a teoria da ilicitude; e c) a teoria da divisão do instituto. Nesta última, basicamente, reconhecidas as origens distintas das anteriores, a estruturação do instituto é apresentada de maneira mais bem elaborada, abarcando o termo causa de forma ampla, subdividido, porém, em categorias mais comuns (não exaustivas), a partir dos variados significados que o vocábulo poderia fornecer, tais como o enriquecimento por prestação, por intervenção, resultante de despesas efetuadas por outrem, por desconsideração de patrimônio ou por outras causas. 6. No Brasil, antes mesmo do advento do Código Civil de 2002, em que há expressa previsão do instituto (arts. 884 a 886), doutrina e jurisprudência já admitiam o enriquecimento sem causa como fonte de obrigação, diante da vedação do locupletamento ilícito. 7. O art. 884 do Código Civil de 2002 adota a doutrina da divisão do instituto, admitindo, com isso, interpretação mais ampla a albergar o termo causa tanto no sentido de atribuição patrimonial (simples deslocamento patrimonial), como no sentido negocial (de origem contratual, por exemplo), cuja ausência, na modalidade de enriquecimento por prestação, demandaria um exame subjetivo, a partir da não obtenção da finalidade almejada com a prestação, hipótese que mais se adequada à prestação decorrente de cláusula indigitada nula (ausência de causa jurídica lícita). 8. Tanto os atos unilaterais de vontade (promessa de recompensa, arts. 854 e ss.; gestão de negócios, arts. 861 e ss.; pagamento indevido, arts. 876 e ss.; e o próprio enriquecimento sem causa, art. 884 e ss.) como os negociais, conforme o caso, comportam o ajuizamento de ação fundada no enriquecimento sem causa, cuja pretensão está abarcada pelo prazo prescricional trienal previsto no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil de 2002. 9. A pretensão de repetição do indébito somente se refere às prestações pagas a maior no período de três anos compreendidos no interregno anterior à data do ajuizamento da ação (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002; art. 219, caput e § 1º, CPC/1973; art. 240, § 1º, do CPC/2015). 10. Para os efeitos do julgamento do recurso especial repetitivo, fixa-se a seguinte tese: Na vigência dos contratos de plano ou de seguro de assistência à saúde, a pretensão condenatória decorrente da declaração de nulidade de cláusula de reajuste nele prevista prescreve em 20 anos (art. 177 do CC/1916) ou em 3 anos (art. 206, § 3º, IV, do CC/2002), observada a regra de transição do art. 2.028 do CC/2002. 11. Caso concreto: Recurso especial interposto por Unimed Nordeste RS Sociedade Cooperativa de Serviços Médicos Ltda. a que se nega provimento. (STJ, REsp n. 1.360.969/RS, relator Ministro Marco Buzzi, relator para acórdão Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, DJe de 19/9/2016.) Dessarte, refuto a prefacial meritória de prescrição decenal, reafirmando, no entanto, que a pretensão autoral de repetição dos valores pagos a maior deverá observar o triênio antecedente à distribuição da demanda. Avançando no julgamento do recurso, cumpre esclarecer não incidirem, sobre a hipótese vertente, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, porquanto a Operadora ré se enquadre no conceito de entidade de autogestão, em que o plano de saúde é ofertado a grupo fechado de pessoas, não estando disponível no mercado de consumo para qualquer interessado. Eis a Súmula n.º608 do STJ, a reger o presente caso: Súmula n.º608 do STJ: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão”. Com efeito, em tratando-se de plano de saúde coletivo por adesão, é sabido que os contratos são meramente monitorados pela ANS, sem que possam ser utilizados os índices incidentes para os planos individuais ou familiares. Neste sentido, o "Superior Tribunal de Justiça possui orientação no sentido de que, no plano coletivo, o reajuste anual é apenas acompanhado pela ANS, para fins de monitoramento da evolução dos preços e de prevenção de abusos, não havendo que se falar, portanto, em aplicação dos índices previstos aos planos individuais", vide STJ, AgInt no AREsp 1894750/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 29/11/2021, DJe 01/12/2021. Partindo-se dessa compreensão, foram consagrados os seguintes Temas pelo STJ: Tema n.º1.016 do STJ:“(a) Aplicabilidade das teses firmadas no Tema 952/STJ aos planos coletivos, ressalvando-se, quanto às entidades de autogestão, a inaplicabilidade do CDC; (b) A melhor interpretação do enunciado normativo do art. 3°, II, da Resolução n. 63/2003, da ANS, é aquela que observa o sentido matemático da expressão 'variação acumulada', referente ao aumento real de preço verificado em cada intervalo, devendo-se aplicar, para sua apuração, a respectiva fórmula matemática, estando incorreta a simples soma aritmética de percentuais de reajuste ou o cálculo de média dos percentuais aplicados em todas as faixas etárias”. Tema n.º 952 do STJ: “O reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que (i) haja previsão contratual, (ii) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores e (iii) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso”. Outrossim, entendo que o Tema n.º952 do STJ assegurou que a abusividade seja cotejada à luz das normas protetivas do Estatuto do Idoso. Cite-se, para tanto, o precedente de observância obrigatória: RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CIVIL. PLANO DE SAÚDE. MODALIDADE INDIVIDUAL OU FAMILIAR. CLÁUSULA DE REAJUSTE DE MENSALIDADE POR MUDANÇA DE FAIXA ETÁRIA. LEGALIDADE. ÚLTIMO GRUPO DE RISCO. PERCENTUAL DE REAJUSTE. DEFINIÇÃO DE PARÂMETROS. ABUSIVIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EQUILÍBRIO FINANCEIRO-ATUARIAL DO CONTRATO. 1. A variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário deverá estar prevista no contrato, de forma clara, bem como todos os grupos etários e os percentuais de reajuste correspondentes, sob pena de não ser aplicada (arts. 15, caput, e 16, IV, da Lei nº 9.656/1998). 2. A cláusula de aumento de mensalidade de plano de saúde conforme a mudança de faixa etária do beneficiário encontra fundamento no mutualismo (regime de repartição simples) e na solidariedade intergeracional, além de ser regra atuarial e asseguradora de riscos. 3. Os gastos de tratamento médico-hospitalar de pessoas idosas são geralmente mais altos do que os de pessoas mais jovens, isto é, o risco assistencial varia consideravelmente em função da idade. Com vistas a obter maior equilíbrio financeiro ao plano de saúde, foram estabelecidos preços fracionados em grupos etários a fim de que tanto os jovens quanto os de idade mais avançada paguem um valor compatível com os seus perfis de utilização dos serviços de atenção à saúde. 4. Para que as contraprestações financeiras dos idosos não ficassem extremamente dispendiosas, o ordenamento jurídico pátrio acolheu o princípio da solidariedade intergeracional, a forçar que os de mais tenra idade suportassem parte dos custos gerados pelos mais velhos, originando, assim, subsídios cruzados (mecanismo do community rating modificado). 5. As mensalidades dos mais jovens, apesar de proporcionalmente mais caras, não podem ser majoradas demasiadamente, sob pena de o negócio perder a atratividade para eles, o que colocaria em colapso todo o sistema de saúde suplementar em virtude do fenômeno da seleção adversa (ou antisseleção). 6. A norma do art. 15, § 3º, da Lei nº 10.741/2003, que veda "a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade", apenas inibe o reajuste que consubstanciar discriminação desproporcional ao idoso, ou seja, aquele sem pertinência alguma com o incremento do risco assistencial acobertado pelo contrato. 7. Para evitar abusividades (Súmula nº 469/STJ) nos reajustes das contraprestações pecuniárias dos planos de saúde, alguns parâmetros devem ser observados, tais como (i) a expressa previsão contratual; (ii) não serem aplicados índices de reajuste desarrazoados ou aleatórios, que onerem em demasia o consumidor, em manifesto confronto com a equidade e as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da especial proteção ao idoso, dado que aumentos excessivamente elevados, sobretudo para esta última categoria, poderão, de forma discriminatória, impossibilitar a sua permanência no plano; e (iii) respeito às normas expedidas pelos órgãos governamentais: a) No tocante aos contratos antigos e não adaptados, isto é, aos seguros e planos de saúde firmados antes da entrada em vigor da Lei nº 9.656/1998, deve-se seguir o que consta no contrato, respeitadas, quanto à abusividade dos percentuais de aumento, as normas da legislação consumerista e, quanto à validade formal da cláusula, as diretrizes da Súmula Normativa nº 3/2001 da ANS. b) Em se tratando de contrato (novo) firmado ou adaptado entre 2/1/1999 e 31/12/2003, deverão ser cumpridas as regras constantes na Resolução CONSU nº 6/1998, a qual determina a observância de 7 (sete) faixas etárias e do limite de variação entre a primeira e a última (o reajuste dos maiores de 70 anos não poderá ser superior a 6 (seis) vezes o previsto para os usuários entre 0 e 17 anos), não podendo também a variação de valor na contraprestação atingir o usuário idoso vinculado ao plano ou seguro saúde há mais de 10 (dez) anos. c) Para os contratos (novos) firmados a partir de 1º/1/2004, incidem as regras da RN nº 63/2003 da ANS, que prescreve a observância (i) de 10 (dez) faixas etárias, a última aos 59 anos; (ii) do valor fixado para a última faixa etária não poder ser superior a 6 (seis) vezes o previsto para a primeira; e (iii) da variação acumulada entre a sétima e décima faixas não poder ser superior à variação cumulada entre a primeira e sétima faixas. 8. A abusividade dos aumentos das mensalidades de plano de saúde por inserção do usuário em nova faixa de risco, sobretudo de participantes idosos, deverá ser aferida em cada caso concreto. Tal reajuste será adequado e razoável sempre que o percentual de majoração for justificado atuarialmente, a permitir a continuidade contratual tanto de jovens quanto de idosos, bem como a sobrevivência do próprio fundo mútuo e da operadora, que visa comumente o lucro, o qual não pode ser predatório, haja vista a natureza da atividade econômica explorada: serviço público impróprio ou atividade privada regulamentada, complementar, no caso, ao Serviço Único de Saúde (SUS), de responsabilidade do Estado. 9. Se for reconhecida a abusividade do aumento praticado pela operadora de plano de saúde em virtude da alteração de faixa etária do usuário, para não haver desequilíbrio contratual, faz-se necessária, nos termos do art. 51, § 2º, do CDC, a apuração de percentual adequado e razoável de majoração da mensalidade em virtude da inserção do consumidor na nova faixa de risco, o que deverá ser feito por meio de cálculos atuariais na fase de cumprimento de sentença. 10. TESE para os fins do art. 1.040 do CPC/2015: O reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que (i) haja previsão contratual, (ii) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores e (iii)não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso. (…) 12. Recurso especial não provido. (STJ, REsp 1568244/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, 2ª SEÇÃO, DJe 19/12/2016) Ademais, tratando-se de relação jurídica continuada, entende-se que os parâmetros de razoabilidade de aumento de faixa etária deverão observar a vedação do art.15, §3º da Lei n.º 10.741/2003, apenas a partir da data de sua entrada em vigor, em 01.01.2004, in verbis: "Art. 15 do Estatuto do Idoso: (...) § 3º -É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade" Dessarte, estando a relação jurídica sob o manto protetivo do Estatuto do Idoso, ainda que a partir de 2004, há a possibilidade de o Magistrado aferir se, efetivamente, os reajustes contratuais sobejam, ou não, a razoabilidade, gerando um desiquilíbrio excessivo ao ancião, que justifique a sua revisão na seara judicial. Isso porque, de acordo com o art.15, §3º, do Estatuto do Idoso (pessoa a quem a lei conferiu proteção especial), o recorrido não poderia sofrer danos ou discriminação pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade. Logo, com o advento do Estatuto do Idoso em 2004, as disposições contratuais lhe anteriores que vierem a contrariá-lo deverão ser readequadas às novas disposições legais protetivas, passando, a partir de sua vigência, a produzir efeitos imediatos nas relações jurídicas de trato sucessivo. De dizer, ainda que a pretensão ressarcitória do indébito se submeta à prescrição trienal, é salutar a declaração, a qualquer tempo, da nulidade de quaisquer aumentos etários ou técnicos posteriores ao Estatuto do Idoso, impondo o recálculo da evolução das mensalidades a partir desse marco legal, porquanto interferirá tanto no atual preço do serviço, como na mensuração dos valores pagos a maior pelo consumidor no triênio antecedente à propositura da demanda. Destaque-se, ainda, que esse é o entendimento prevalente (tese com mais votos, em julgamento ainda não finalizado), até o momento, pelo Supremo Tribunal Federal, no tema n.º381, em que, destacando a dupla vulnerabilidade do idoso, assim tem apregoado: “Após os votos dos Ministros Rosa Weber (Relatora), Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes e Celso de Mello, que conheciam do recurso extraordinário e negavam-lhe provimento, fixando a seguinte tese (tema 381 da repercussão geral): “A garantia constitucional do ato jurídico perfeito não elide a incidência da Lei 10.741/2003 - a vedar a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade -, quando o ingresso em faixa etária diferenciada for posterior à vigência do denominado Estatuto do Idoso (1º.1.2004), ainda que se trate de contratos de plano de saúde anteriormente firmados”; e do voto do Ministro Marco Aurélio, que dava provimento ao recurso para, reformando o acórdão recorrido, assentar a validade da cláusula contratual mediante a qual determinado o reajuste de valores pagos a plano de saúde em razão da mudança de faixa etária, ajustada em momento anterior à edição do Estatuto do Idoso, e fixava a seguinte tese: “Surge incompatível, com a Constituição Federal, a observância do Estatuto do Idoso em relação a contrato de plano de saúde firmado em momento anterior à vigência do diploma”, pediu vista dos autos o Ministro Dias Toffoli (Presidente) (...) Impedido o Ministro Luiz Fux. Afirmou suspeição o Ministro Roberto Barroso. Plenário, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020”. Inclusive, a cláusula 19ª do contrato de adesão litigado (ID n.º 26933179, fl.05) faz expressa menção à adequação dos reajustes etários à “mudanças de legislação e/ou economia do país, que afetem os custos do plano, ou alteração da idade do participante, que importe mudança de faixa etária”, pelo que resta, mais que evidente, a incidência do Estatuto do Idoso, ainda que a partir de sua vigência, ao caso concreto. Tecidos esses esclarecimentos, da análise dos autos, infere-se que o plano de saúde foi contratado em 08.09.1997 (ID n.º 26933179, fl.02), de modo que, após ter completado 60 anos, em 22.12.1994 (ID n.º26933176, fl.02), sofreu reajustes anuais, técnicos e etários, que aumentaram as mensalidades em demasia, o que gerou onerosidade excessiva ao idoso. Conforme a planilha de todas as prestações pagas pelo idoso, que fora apresentada pela Operadora com a contestação (ID n.º26933206), em agosto/2000, o autor pagava R$143,66 e, no mês seguinte, em setembro/2000, incidiu o reajuste anual de 30,79%, elevando o preço para R$187,89. Todavia, apenas 04 meses depois, em janeiro/2001, foi aplicado novo percentual por “mudança de faixa etária”, de 66-70 anos, passando a mensalidade para R$292,82. Ainda assim, foram implementados dois reajustes em 2001 (técnico de 5,29% e anual de 4,08%), que ensejaram em elevação consecutiva de R$292,82 para R$308,31 e, logo no mês seguinte, R$320,89. Àquela época, ainda não havia sido promulgado o Estatuto do Idoso, cuja vigência se dera em 1º de janeiro de 2004, que atualmente veda o aumento abusivo, quando o beneficiário se tornava sexagenário. Bem por isso, com arrimo no Recurso Especial que dera ensejo ao tema n.º952 do STJ, há de serem considerados válidos os reajustes previstos no contrato, desde que observadas as diretrizes da Súmula Normativa n.º 03/2001 da ANS e a variação do índice FIPE SAÚDE (cláusula 20ª). Partindo-se dessas premissas e não sendo aplicável o CDC, por ser a Cassi entidade de autogestão, entendo ser, do autor, o ônus de demonstrar eventual contrariedade das cláusulas contratuais ao referido enunciado da Agência Regulamentadora e aos percentuais da FIPE SAÚDE, desde a sua contratação até o dia anterior ao advento do Estatuto do Idoso (31.12.2003). Logo, em relação aos aumentos praticados, a qualquer título (anual, técnico e etário), entre 08.09.1997 a 31.12.2003, é de se manter a sentença de improcedência, porquanto não tenha o idoso se desincumbido do seu ônus probatório sobre a alegada ilicitude. Todavia, tal conclusão não se aplica aos reajustes posteriores ao advento da Lei n.º10.741/2003 (ou seja, de 2004 à data presente), quando o nosso Ordenamento Jurídico optou por estabelecer regras que beneficiam os hipossuficientes anciões e, com isso, passou a igualmente reger as relações jurídicas de trato continuado, em que sejam partes pessoas com mais de 60 anos, como na hipótese vertente. Desse modo, a Operadora aplicou reajustes anuais de 2003 a 2005 (13,88%, 16,81% e 17,21%), e, nada obstante a vedação do art.15, §3º do Estatuto do Idoso, aplicou “mudança de faixa etária”, em janeiro/2006, ao ter o acionante atingido 71 anos, o que majorou o preço de R$554,06 para R$683,23. A partir de então, a ré só exigiu os percentuais pelo aniversário do plano de 2006/2008 e 2010/2018, respectivamente de 7,99%, 5,21%, 6,61%, 6,73%, 8,69%, 17,73%, 12,71%, 9,90%, 11,24%, 16,60%, 12,43%, 15,87%. Assim, a partir de 01.01.2004, a relação de trato continuado deveria se submeter ao predito artigo que veda a discriminação por faixa etária. Dessarte, incumbiria a ré, pela teoria da distribuição dinâmica, o ônus de demonstrar a legalidade dos índices alterados, de forma unilateral, encargo processual que nunca se desvencilhou a contento, malgrado tenha sido oportunizado pelo despacho de ID n.º 26933213 e certidão de decurso de prazo n.º26933218. Ademais, a incidência da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova se justifica, no caso concreto, haja vista que não há meios técnicos ou jurídicos à disposição do recorrido, para indicar a validade dos reajustes anuais e etários praticados desde janeiro/2001, quiçá os fatores que os embasaram eventuais recomposições das mensalidades, cujo conhecimento de custos e outras variáveis dos preços apenas seria da Operadora. Sobre o tema, trago à colação relevante lição de Fredie Didier Júnior, in verbis: “A prova diabólica é aquela que é impossível, senão muito difícil, de ser produzida. (...) é expressão que se encontra na doutrina para fazer referência àqueles casos em que a prova da veracidade da alegação a respeito de um fato é extremamente difícil, nenhum meio de prova sendo capaz de permitir tal demonstração” (…) A jurisprudência usa a expressão prova diabólica, outrossim, para designar a prova de algo que não ocorreu, ou seja, a prova de fato negativo. (…) Quando se está diante de uma prova diabólica deste viés, insusceptível de ser produzida por aquele que deveria fazê-lo, de acordo com a lei, mas apta a ser realizada pelo outro, o ônus probatório deverá ser distribuído dinamicamente”. (in Curso de Direito Processual Civil, Vol. II, Ed. JusPodvm, 4ª Edição, 2009, p. 89/90) Outrossim, especialmente no âmbito dos planos de assistência à saúde, a Operadora é a única a dispor dos meios de comprovar eventual razoabilidade dos percentuais de aumento, pelo aniversário do contrato ou pela sinistralidade atrelada a determinada faixa etária, devendo-lhe ser, portanto, atribuído o ônus de produzir a prova pericial atuarial, em juízo, para demonstrar a validade dos preços exigidos. Assim, pela teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova, incumbiria, à ré, o encargo processual de demonstrar a forma de cálculo atuarial e a alegada coadunância dos percentuais exigidos, seja a título anual ou etário, com ampla defesa e contraditório ao idoso, sobre todos os aspectos que nortearam a estipulação das mensalidades. De dizer, desde a vigência do Estatuto do Idoso, em 01.01.2004, não mais se justificariam reajustes “técnicos” ou por “faixa etária”, porquanto o autor já tivesse mais de 60 anos desde 1995. Logo, em tese, apenas incidiram os aumentos anuais, que, aparentemente, poderiam, ou não, variar de acordo com custos atuariais e administrativos da CASSI e índice FIPE SAÚDE (cláusula 20ª do contrato), circunstâncias e dados inexistentes nos autos e de que a parte idosa não deteria pleno acesso, para comprovar, em juízo, eventual excesso da mensalidade. Há indicativos de demasiada elevação do prêmio mensal, com o passar dos anos, implicando na cobrança de R$2.365,61 (ID n.º 26933206), em setembro/2018, quando pagava apenas R$1.273,89, em agosto/2014. O preço do serviço quase dobrou em 04 anos, o que se revela, por ora, abusivo. Não fosse isso, após a liminar e até dezembro de 2021 (ID n.º 26933225), a mensalidade remontava R$2.021,70, enquanto, após a sentença de improcedência, a CASSI está aparentemente cobrando R$ 3.170,47, ID n.º26933226, para a manutenção do plano de saúde, só a corroborar a verossimilhança da abusividade do aumento de mais de 50% para janeiro de 2022. Faz-se pertinente transcrever precedente do Superior Tribunal de Justiça, em caso de similitude fática ao presente, que definiu a extrema necessidade de ser feita a prova pericial atuarial, para que pudesse ser cotejada, de forma efetiva, a tese de abusividade dos reajustes de plano coletivo por adesão. Neste sentido: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. PREVISÃO CONTRATUAL DE REAJUSTE POR AUMENTO DE SINISTRALIDADE. POSSIBILIDADE. AFIRMAÇÃO GENÉRICA DE ABUSIVIDADE. INVIABILIDADE. APURAÇÃO NO CASO CONCRETO. NECESSIDADE. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO CONFIGURAÇÃO. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. "É 'possível o reajuste de contratos de saúde coletivos sempre que a mensalidade do seguro ficar cara ou se tornar inviável para os padrões da empresa contratante, seja por variação de custos ou por aumento de sinistralidade' (AgRg nos EDcl no AREsp 235.553/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 2/6/2015, DJe de 10/6/2015)." (AgInt nos EDcl no REsp 1481925/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe 15/06/2018) 2. Por um lado, o Juízo de primeira instância, sem proceder à instrução processual requerida pelo caso, perfilha entendimento contrário à jurisprudência do STJ, aduzindo serem aplicáveis os percentuais fixados pela ANS que incidirem sobre os planos de saúde individuais e familiares. Por outro lado, o acórdão recorrido, a par de confirmar integralmente a sentença, limita-se a afirmar genericamente que, no tocante ao reajuste de plano de saúde coletivo o aumento de sinistralidade foi definido unilateralmente pela prestadora de serviços. 3. Consoante entendimento sufragado em recurso especial repetitivo 1.124.552/RS, julgado pela Corte Especial, o melhor para a segurança jurídica consiste em não admitir que matérias de fato ou eminentemente técnicas sejam tratadas como se fossem exclusivamente de direito, resultando em deliberações arbitrárias ou divorciadas do exame probatório do caso concreto. É dizer, quando o juiz ou o Tribunal, ad nutum, afirmar abusividade, sem antes verificar, no caso concreto, a ocorrência, há ofensa aos arts. 131, 333, 335, 420, 458 ou 535 do CPC/1973. 4. Registre-se que, na vigência do CPC/2015, o art. 375 do Códex estabelece que o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras da experiência técnica, "ressalvado, quanto a estas, o exame pericial". As regras da experiência técnica devem ser de conhecimento de todos, principalmente das partes, exatamente porque são vulgarizadas; se se trata de regra de experiência técnica, de conhecimento exclusivo do juiz ou "apanágio de especialistas", que por qualquer razão a tenha (o magistrado também tem formação em atuária, por exemplo), torna-se indispensável a realização da perícia. Essa é a razão pela qual se faz a ressalva, no final do texto, ao exame pericial. (DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil. Vol. 2. 12 ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 78) 5. Com efeito, em vista da inexistência de instrução processual para aferir a higidez do substancioso percentual de reajuste por aumento de sinistralidade, a tornar temerária a imediata solução do litigio para julgamento de total improcedência, é de rigor a anulação do acórdão recorrido e da sentença, para que a parte ré possa demonstrar a legalidade dos reajustes, apurando-se, com a produção de prova pericial, concretamente, eventual abusividade do reajuste aplicado. 6. A jurisprudência desta Corte Superior tem entendimento sedimentado segundo o qual para o julgamento da lide, sendo reputada pelo magistrado a produção de prova pericial, não há que se falar em preclusão pro judicato, considerando a inaplicabilidade do respectivo instituto, no campo probatório, para o magistrado. Precedentes. (STJ, AgInt no REsp n. 1.956.481/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 29/4/2022.) AGRAVO INTERNO. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. AVENÇAS COLETIVAS E INDIVIDUAIS. NÍTIDAS DIFERENÇAS NA ATUÁRIA E NA FORMAÇÃO DOS PREÇOS. SOLUÇÃO ESTABELECENDO A APLICAÇÃO DE ÍNDICES DE REAJUSTE FIXADOS PELA ANS A PLANO DE SAÚDE COLETIVO E AFASTANDO A PREVISÃO CONTRATUAL DE REAJUSTE POR AUMENTO DE SINISTRALIDADE E/OU VARIAÇÃO DE CUSTOS. PATENTE ERROR IN JUDICANDO. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS PARA CONSTATAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRECEDENTES DAS DUAS TURMAS DE DIREITO PRIVADO. AFIRMAÇÃO GENÉRICA DE ABUSIVIDADE. INVIABILIDADE. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL ATUARIAL. NECESSIDADE. (...) 2. O "Superior Tribunal de Justiça possui orientação no sentido de que, no plano coletivo, o reajuste anual é apenas acompanhado pela ANS, para fins de monitoramento da evolução dos preços e de prevenção de abusos, não havendo que se falar, portanto, em aplicação dos índices previstos aos planos individuais. Precedentes" (AgInt no AREsp 1894750/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 29/11/2021, DJe 01/12/2021). Em suma, é "possível o reajuste de contratos de saúde coletivos sempre que a mensalidade do seguro ficar cara ou se tornar inviável para os padrões da empresa contratante, seja por variação de custos ou por aumento de sinistralidade" (AgRg nos EDcl no AREsp 235.553/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 2/6/2015, DJe de 10/6/2015)" (AgInt no AREsp 1848568/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 22/11/2021, DJe 25/11/2021). 3. Por um lado, "Os planos de saúde variam segundo o regime e o tipo de contratação: (i) individual ou familiar, (ii) coletivo empresarial e (iii) coletivo por adesão (arts. 16, VII, da Lei nº 9.656/1998 e 3º, 5º e 9º da RN nº 195/2009 da ANS), havendo diferenças, entre eles, na atuária e na formação de preços dos serviços da saúde suplementar" (REsp 1.471.569/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 1º/03/2016, DJe de 07/03/2016)'. Com efeito, é claramente inviável, em vista da preservação do equilíbrio econômico-financeiro da avença e da segurança jurídica, simplesmente transmutar uma avença coletiva em individual [...]" (AgInt no REsp 1876459/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/09/2020, DJe 30/09/2020). Por outro lado, se ocorrem motivos que justifiquem a intervenção judicial em lei permitida, há de realizar-se para a decretação da nulidade ou da resolução do contrato, nunca para a modificação do seu conteúdo - o que se justifica, ademais, como decorrência do próprio princípio da autonomia da vontade, uma vez que a possibilidade de intervenção do juiz na economia do contrato atingiria o poder de obrigar-se, ferindo a liberdade de contratar (REsp n. 1.915.528/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 17/11/2021.). 4. Consoante entendimento sufragado em recurso especial repetitivo 1.124.552/RS, julgado pela Corte Especial, o melhor para a segurança jurídica consiste em não admitir que matérias de fato ou eminentemente técnicas sejam tratadas como se fossem exclusivamente de direito, resultando em deliberações arbitrárias ou divorciadas do exame probatório do caso concreto. É dizer, quando o juiz ou o Tribunal, ad nutum, afirmar abusividade no reajuste por aumento de sinistralidade, sem antes verificar, no caso concreto, a ocorrência, há ofensa aos arts. 131, 333, 335 e 420 do CPC/1973[correspondentes aos arts. 371, 373, 375 e 464 do CPC/2015]. Por conseguinte, em vista da inexistência de instrução processual para aferir a higidez do substancioso percentual de reajuste por aumento de sinistralidade, a tornar temerária a imediata solução do litigio para julgamento de total improcedência, aplicando-se o direito à espécie (art. 1.034 do CPC/2015 e Súmula 456/STF), é de rigor a anulação do acórdão recorrido e da sentença, para que a parte autora possa demonstrar os fatos constitutivos de seu direito, apurando-se, com a produção de prova pericial atuarial, concretamente, eventual abusividade do reajuste aplicado (AgInt no REsp 1676857/CE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe 19/10/2018)" (AgInt no REsp n. 1.710.487/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 1/2/2019.). 5. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no REsp n. 1.989.741/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 17/6/2022.) Dessarte, não tendo a ré se desincumbido do ônus processual que lhe competia, à luz dos Temas n.º952 e 1.016 do STJ e art.15, §3º, do Estatuto do Idoso, reconheço a abusividade dos reajustes etários e técnicos praticados pela Operadora, a partir de 2004, além de também declarar inválidos, para igual período, os aumentos anuais que porventura suplantem aqueles contratualmente previstos (índice da FIPE SAÚDE – cláusula 20ª). Ademais, entendo que a Operadora não provou, em juízo e de forma concreta, que seus percentuais não eram desarrazoados ou aleatórios, com base atuarial idônea (conforme despacho de ID n.º 26933213 e certidão de decurso de prazo n.º26933218), razão pela qual os percentuais devidos, após 2004, deverão ser objeto de liquidação de sentença. Por isso, julgo procedente, em parte, a pretensão autoral de repetição de indébito, com a restituição simples dos valores pagos a maior pelo idoso, quanto às mensalidades devidas após 01.01.2004, observada a prescrição trienal, à luz do tema n.º610 do STJ. Impõe-se, assim, a manutenção da decisão agravada, com a rejeição da prefacial meritória de prescrição, à luz do Tema n.º610 do STJ, improcedência quanto aos aumentos entre 1997 e 2003 e, com lastro nos temas n.º952 e 1.016 do STJ, reconhecer a ilegalidade dos reajustes etários e técnicos posteriores ao Estatuto do Idoso, como também, aqueles anuais que porventura suplantem os índices contratuais da FIPE SAÚDE, julgando procedente, em parte, a restituição simples dos valores pagos a maior pelo idoso, observada a prescrição trienal. Confluente às razões expostas, VOTO no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso, para manter inalterada a decisão recorrida. Salvador, data registrada no sistema. DESª. DINALVA GOMES LARANJEIRA PIMENTEL
Processo: AGRAVO INTERNO CÍVEL n. 0546378-12.2018.8.05.0001.2.AgIntCiv
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
Relator: Desa. Dinalva Gomes Laranjeira Pimentel
AGRAVANTE: CAIXA DE ASSISTENCIA DOS FUNCIONARIOS DO BANCO DO BRASIL
Advogado(s): DANNIEL ALLISSON DA SILVA COSTA
AGRAVADO: JOSE CARLOS REIS LOPES
Advogado(s): CARLOS HENRIQUE SANTANA REIS LOPES, SIMEIA PASSOS DE ANDRADE, LIA MAYNARD FRANK TEIXEIRA, MARIA EMILIA GONCALVES DE RUEDA
VOTO
Relatora