PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 



ProcessoREVISÃO CRIMINAL n. 8061222-75.2024.8.05.0000
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal
REQUERENTE: JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO
Advogado(s): ANTONIO AUGUSTO GRACA LEAL, ANTONIO CARLOS ANDRADE LEAL, BRENA AMORIM COSTA, MARCUS VINICIUS OLIVEIRA RIOS
REQUERIDO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):


ACORDÃO


 

EMENTA. REVISÃO CRIMINAL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. PEDIDO QUE OBJETIVA ALTERAÇÃO DO FUNDAMENTO DA ABSOLVIÇÃO. HIPÓTESE QUE NÃO ENCONTRA AMPARO NO ART. 621 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ROL TAXATIVO. IMPOSSIBILIDADE. HIPÓTESES QUE RESTRINGEM A NATUREZA CONDENATÓRIA DA DECISÃO, SALVO ABSOLVIÇÃO IMPRÓPRIA. PRECEDENTES. PARECER DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA PELO NÃO CONHECIMENTO. REVISÃO CRIMINAL NÃO CONHECIDA.

1. Versam os presentes autos sobre Revisão Criminal requerida por JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO, contra sentença proferida pelo Juízo da Vara de Auditoria Militar da comarca de Salvador/BA, que, nos autos tombados sob n. 0113723-33.20210.8.05.0001, foi reconhecida a prescrição dos crimes dos arts. 160, 177 e 210 do CPM e a ausência de provas em relação ao delito capitulado no art. 158, §§1º e 2º do CPM.

2. Informa o Requerente que a presente revisão criminal é cabível, sem, contudo, elencar a hipótese de cabimento disposta no art. 621 do Código de Processo Penal, apontando genericamente que a medida se torna cabível para impugnar o resultado do processo transitado em julgado.

3. Sabe-se que a Revisão Criminal é um importante remédio processual de combate às sentenças condenatórias transitadas em julgado, que busca conciliar os valores justiça e segurança, funcionando como um possível instrumento de reparação em caso de condenações transitadas em julgado que são posteriormente verificadas como injustas. Melhor explicando, a revisão criminal nada mais é do que a desconstituição da coisa julgada, ante a prevalência, no juízo penal, do princípio da verdade real sobre o da verdade formal, revelando-se como instituto com vocação à correção de erros de fato ou de direito, ocorridos em processos finalizados, quando se encontrem provas da suposta inocência ou de circunstância que devesse ter influenciado na reprimenda.

4. Ao contrário, pressupõe-se que o instrumento processual em questão somente poderá modificar a decisão condenatória se ela tiver sido fundada em uma manifesta injustiça, em total desprezo à norma legal ou à prova dos autos. A Revisão Criminal atém-se a aspectos relativos à afronta da legislação vigente ou se existente uma condenação sem o mínimo lastro probatório, diferentemente de uma Apelação, em que existirá um exame aprofundado da suficiência das provas, podendo o Órgão Julgador fazer uma análise de cada uma delas e fazer uma interpretação diversa, de acordo com o livre convencimento motivado.

5. Ab initio, observa-se que o Requerente fora absolvido, com trânsito em julgado em 23 de abril de 2020, requerendo, nesta oportunidade, tão somente a reformulação da fundamentação da sentença proferida, eis que a sentença absolutória na insuficiência probatória e prescrição não teria repercussões a seu favor na esfera cível e administrativa.

6. De pronto, destaque-se que não assiste razão ao Requerente, eis que, como dito, as razões defensivas apresentadas não se baseiam em nenhuma das hipóteses dispostas no art. 621 do Código de Processo Penal, que, registre-se, é taxativa. Note-se que, ao contrário dos entendimentos exposados pelo Requerente, o texto legal restringe as hipóteses de cabimento às sentenças condenatórias, não se admitindo, em sede de revisão criminal, a descontinuação de sentença de natureza absolutória, salvo em caso de absolvição imprópria.

7. Assim, considerando que no caso em tela o Requerente objetiva exclusivamente modificar o conteúdo da sentença absolutória, a via eleita se mostra totalmente inadequada, resultando no não conhecimento do requerimento.

8. Rememore-se que a Revisão Criminal não pode ser confundida com uma nova apelação, naquela só é admitido o desfazimento do julgado se houver certeza aferível de plano (sem revolvimento de eventual dissonância probatória) de que se apresenta em descompasso o que provado e o que decidido, ou se novas provas surgirem.

9. Nesse sentido, compreende-se que esse instrumento processual possui finalidades específicas, as quais não estão evidenciadas no presente caso, mormente a inexistência de contrariedade na decisão condenatória ao texto expresso da lei penal ou à prova constante nos autos, sendo certo que todas as teses da defesa foram exaustivamente tratadas com maestria na decisão combatida, restando caracterizada a mera pretensão do revisionando de rediscutir matéria de defesa já examinada e exaurida na decisão que se pretende rever.

10. Dessa forma, ausentes fatos novos ou teses jurídicas diversas que permitam a análise do caso sob outro enfoque, não são dignas de acolhida as alegações do Revisionando, não merecendo qualquer reparo o édito condenatório, já transitado em julgado.

11. Parecer da Procuradoria de Justiça pelo não conhecimento.

12. REVISÃO CRIMINAL NÃO CONHECIDA.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Revisão Criminal nº 8061222-75.2024.8.05.0000, em que figuram como requerente JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO e requerido o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA.


ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça da Bahia, à unanimidade, em NÃO CONHECER a presente Revisão Criminal, nos termos do voto do Relator.


Sala das Sessões,



Presidente

Des. Geder Luiz Rocha Gomes

Relator

Procurador(a) de Justiça

 

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Não conhecido Por Unanimidade

Salvador, 28 de Novembro de 2024.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 

Processo: REVISÃO CRIMINAL n. 8061222-75.2024.8.05.0000
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal
REQUERENTE: JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO
Advogado(s): ANTONIO AUGUSTO GRACA LEAL, ANTONIO CARLOS ANDRADE LEAL, BRENA AMORIM COSTA, MARCUS VINICIUS OLIVEIRA RIOS
REQUERIDO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s): 


RELATÓRIO


 

Versam os presentes autos sobre Revisão Criminal requerida por JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO, contra sentença proferida pelo Juízo da Vara de Auditoria Militar da comarca de Salvador/BA, que, nos autos tombados sob n. 0113723-33.20210.8.05.0001, reconheceu a prescrição dos crimes dos arts. 160, 177 e 210 do CPM e a ausência de provas em relação ao delito capitulado no art. 158, §§1º e 2º do CPM.


Informa o Requerente que: embora seja absolutória, não trouxe repercussões na esfera administrativa, eis que baseada na insuficiência probatória e prescrição. Dito isto, é nítido que a decisão se encontra eivada em sua fundamentação, devendo ser reformulada (...)”


Aduz que: não há elementos que indiquem a oposição mediante violência ou grave ameaça, a tese de lesão corporal em sua forma culposa, que nas definições do código penal, se dá com a negligência, imprudência ou imperícia, torna-se injustificada. Com isso, a aludida tese de lesão corporal culposa, encontra-se totalmente rechaçada, dando espaço ao entendimento mais adequado, que seria o da legítima defesa putativa”, restando “evidente a existência de uma legítima defesa putativa, principalmente pelo demonstrado excesso policial no momento de imobilização, que gerou uma reação totalmente levada pela intenção de autodefesa do autor”.


Explica que: A legítima defesa (art.23, III do CP) como se sabe, configura-se como uma excludente de ilicitude, elemento necessário para a existência de crime. Como não há ilicitude, é necessário que a sentença seja fundamentada na inexistência de crime (art.386 do CPP)”.


Ao final, requer, no mérito, a procedência do pedido contido nesta ação de revisão criminal, para que se reformule a fundamentação da sentença proferida.


Distribuídos os autos a esta Colenda Câmara Criminal, coube-me a relatoria.


Remetidos os autos à Douta Procuradoria de Justiça, a ilustre Procuradora de Justiça Tânia Regina Oliveira Campo, converteu-se o feito em diligência para que o Requerente providenciasse a colação dos autos originais, na íntegra, à presente Revisão Criminal, além da juntada de certidão comprobatória do trânsito em julgado da decisão hostilizada.


Em certidão de Id. 71802829, atestou-se que não houve manifestação ao quanto determinado.


Remetidos novamente os autos à Douta Procuradoria de Justiça, opinou-se pelo não conhecimento, nos termos do parecer ministerial de Id. 72833747.


Assim, examinados os autos, lancei o presente relatório, encaminhando-os à Secretaria da Segunda Câmara Criminal para inclusão do feito em pauta de julgamento.


Salvador, data da assinatura eletrônica.


Des. Geder Luiz Rocha Gomes

Relator

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 



Processo: REVISÃO CRIMINAL n. 8061222-75.2024.8.05.0000
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal
REQUERENTE: JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO
Advogado(s): ANTONIO AUGUSTO GRACA LEAL, ANTONIO CARLOS ANDRADE LEAL, BRENA AMORIM COSTA, MARCUS VINICIUS OLIVEIRA RIOS
REQUERIDO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s): 


VOTO


1. DA ADMISSIBILIDADE


Inicialmente, é impositivo ressaltar o caráter de ação autônoma da revisão criminal, conforme ensinamento de Nucci1: “É uma ação penal de natureza constitutiva e sui generis, de competência originária dos tribunais, destinada a rever, como regra, decisão condenatória, com trânsito em julgado, quando ocorreu erro judiciário. Trata-se de autêntica ação rescisória na esfera criminal, indevidamente colocada como recurso no Código de Processo Penal2. É ação sui generis, pois não possui polo passivo, mas somente o autor, questionando um erro judiciário que o vitimou3”.


Sobre a origem histórica, ensina João Martins De Oliveira que4: “nos primórdios da organização da justiça criminal, o socorro aos injustiçados em sentenças errôneas era simples providência administrativa. Levava-se o fato ao conhecimento do soberano, a quem se suplicava a mercê de corrigir a decisão injusta. Nestes afastados tempos, o provimento revisional era ‘graça’ do príncipe, que anulava a sentença injusta e ordenava outra fosse proferida, com atenção aos novos elementos apresentados pelo condenado. Além de precária, pela sujeição a influências dos cortesãos; de incerta, por depender muito mais da benevolência do príncipe; e de morsa, à vista do acúmulo de atribuições do soberano, a interferência deste nos serviços da justiça somente era justificada, pela absorção de poderes ainda não perfeitamente distribuídos entre órgãos diversos, como aconteceu, posteriormente, na evolução da estrutura do Estado5”.


No contexto do Brasil, importante colacionar os ensinamentos de Câmara Leal6: ”pela Constituição Federal de 1891, a revisão dos processos criminais findos, com sentença condenatória passada em julgado, competiria privativamente ao Supremo Tribunal Federal (art. 81). A Constituição de 1934, conferindo à Corte Suprema o julgamento das revisões criminais, deu à lei ordinária competência para criar tribunais federais, podendo atribuir-lhes o julgamento final das revisões criminais (art. 78). A Constituição do Estado Novo não enumerou entre os processos da competência privativa do Supremo Tribunal Federal, as revisões criminais. Eis por que o Código de Processo Penal só conferiu ao Supremo Tribunal a revisão das condenações por ele próprio proferidas, cometendo aos Tribunais de Apelação dos Estados as demais revisões (art. 624).”7


Prosseguem Grinover, Magalhães e Scarance Fernandes8, sobre a natureza jurídica da revisão criminal: “Erroneamente rotulada entre os recursos pelo código, que seguiu a tradição, a revisão criminal, entre nós, é induvidosamente ação autônoma impugnativa da sentença passada em julgado, de competência originária dos tribunais. A relação processual atinente à ação condenatória já se encerrou e pela via da revisão instaura-se nova relação processual, visando a desconstituir a sentença (juízo rescindente) ou revidente) e a substituí-la por outra (juízo rescisório ou revisório). (…) Por isso, trata-se em regra de ação com dúplice pedido (art. 626, caput, CPP, nas três primeiras hipóteses: alterar a classificação, absolver o réu ou modificar a pena), levando a uma sentença objetivamente complexa (constitutiva, no juízo rescindente e declaratória – de absolvição, ou de alteração da classificação e/ou da pena – no rescisório).”


Em se tratando, a revisão criminal, de ação autônoma de impugnação e não de um recurso e, conforme a doutrina de Renato Brasileiro9, “mister se faz analisar as condições impostas pelo ordenamento jurídico para o exercício regular desse direito”:



Legitimidade ativa e passiva


“De acordo com o art. 623 do CPP, a revisão pode ser pedida pelo próprio acusado ou por procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do acusado, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, quando se tem a denominada reabilitação da memória.

Apesar de não constar expressamente do rol do art. 623 do CPP, prevalece, no âmbito da doutrina, o entendimento de que o Ministério Público também tem legitimidade para ingressar com pedido de revisão criminal, desde que o faça, logicamente, em favor do acusado.

A legitimidade passiva é do Estado ou da União, a depender da Justiça responsável pelo decreto condenatório: se a condenação tiver sido proferida pela Justiça Federal, pela Justiça Militar da União, pela Justiça Eleitoral ou pela Justiça Comum do Distrito Federal, a legitimação recairá sobre a União; caso a condenação tenha sido proferida pela Justiça Estadual, aí compreendida a Justiça Militar Estadual, o estado-membro ocupará o polo passivo. Afinal, como é possível que, do julgamento da revisão criminal, resulte a condenação do referido ente a uma indenização pelo erro judiciário, deve ser reconhecida sua legitimidade passiva”. pp. 1900-1901


Interesse de agir: coisa julgada


“A revisão criminal só pode ser ajuizada quando presente o trânsito em julgado de sentença condenatória ou absolutória imprópria. Quando o art. 621, caput, do CPP, utiliza-se da expressão processos findos, refere-se a processos com sentenças passadas em julgado. Na mesma linha, segundo o art. 625, § 1º, do CPP, a revisão criminal deve ser instruída com a certidão de haver passado em julgado a sentença condenatória e com as peças necessárias à comprovação dos fatos arguidos”. p.1902



Possibilidade jurídica do pedido: sentença condenatória ou absolutória imprópria, inclusive após o cumprimento da pena e/ou morte do acusado


“Em sede de revisão criminal, a possibilidade jurídica do pedido estará configurada a partir da presença de uma sentença condenatória ou absolutória imprópria. Os três incisos do art. 621 referem-se expressamente à natureza da decisão que admite o ajuizamento da revisão criminal: sentença condenatória. Enquanto os incisos I e II do art. 621 fazem menção expressa à necessidade de uma sentença condenatória, o inciso III faz referência à descoberta de novas provas de inocência do condenado. A doutrina é pacífica no sentido de também se admitir o ajuizamento da revisão criminal em face de sentença absolutória imprópria com trânsito em julgado. Afinal, tal decisão, conquanto classificada como absolutória, tem inegável carga condenatória, já que submete o acusado ao cumprimento de medida de segurança (CPP, art. 386, parágrafo único, III), verdadeira espécie de sanção penal.” p.1902


In casu, verificada a presença dos requisitos de admissibilidade exigidos para o manejo desta Revisão Criminal, razão pela qual deverá ser conhecida, passa-se à análise do mérito.


2. DO MÉRITO


Versam os presentes autos sobre Revisão Criminal requerida por JOSE ROBERTO BRITO DA PAIXAO, contra sentença proferida pelo Juízo da Vara de Auditoria Militar da comarca de Salvador/BA, que, nos autos tombados sob n. 0113723-33.20210.8.05.0001, foi reconhecida a prescrição dos crimes dos arts. 160, 177 e 210 do CPM e a ausência de provas em relação ao delito capitulado no art. 158, §§1º e 2º do CPM.


Informa o Requerente que a presente revisão criminal é cabível, sem, contudo, elencar a hipótese de cabimento disposta no art. 621 do Código de Processo Penal, apontando genericamente que a medida se torna cabível para impugnar o resultado do processo transitado em julgado.


Sabe-se que a Revisão Criminal é um importante remédio processual de combate às sentenças condenatórias transitadas em julgado, que busca conciliar os valores justiça e segurança, funcionando como um possível instrumento de reparação em caso de condenações transitadas em julgado que são posteriormente verificadas como injustas.


Sobre o tema, interessante as lições de Eugênio Pacelli de Oliveira10: “A ação de revisão criminal tem precisamente este destino: permitir que a decisão condenatória passada em julgado possa ser novamente questionada, seja a partir de novas provas, seja a partir da atualização da interpretação do direito pelos tribunais, seja, por fim, pela possibilidade de não ter sido prestada, no julgamento anterior, a melhor jurisdição”.


Melhor explicando, a revisão criminal nada mais é do que a desconstituição da coisa julgada, ante a prevalência, no juízo penal, do princípio da verdade real sobre o da verdade formal, revelando-se como instituto com vocação à correção de erros de fato ou de direito, ocorridos em processos finalizados, quando se encontrem provas da suposta inocência ou de circunstância que devesse ter influenciado na reprimenda.


De acordo com o art. 621 do Código de Processo Penal, as hipóteses de cabimento de Revisão Criminal são taxativas e voltadas para rever decisões por demais injustas, a exemplo de sentença condenatória contrária ao texto expresso de lei ou à evidência dos autos, bem como quando surgirem novas provas em favor do condenado. Importante colacionar o dispositivo:


Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.


Do excerto, extrai-se que o instrumento da Revisão Criminal possui hipóteses claras de cabimento, não podendo funcionar como um supedâneo recursal, apto a contestar por um novo julgamento.


Encontra-se claro que a Revisão Criminal funciona como uma ferramenta destinada, unicamente, à revisão de decisões que não deixem dúvidas acerca de a condenação ter sido injusta.


Nessa linha de intelecção, o Supremo Tribunal Federal, na Revisão Criminal nº 5475/AM, entendeu que o réu “não tem o direito subjetivo de perseguir a desconstituição do título penal condenatório fora da destinação legal do meio de impugnação”. Veja-se:


Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. MEDIDA CAUTELAR. EFEITOS DA CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE FUMUS BONI IURIS. FUNDAMENTOS ANALISADOS E AFASTADOS PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRETENSÃO DE CANDIDATURA A CARGO PÚBLICO. ALEGAÇÃO DE PERICULUM IN MORA. IMPERTINÊNCIA. MEDIDA CAUTELAR NÃO REFERENDADA. 1. A Revisão Criminal, por conta da sua natureza excepcional, somente deve ser utilizada quando preenchidos os requisitos legais para o seu conhecimento, afinal, do contrário estar-se-ia utilizando a referida ação de impugnação como verdadeiro substitutivo de um recurso. 2. Os fundamentos invocados pelo Relator, Min. NUNES MARQUES, na decisão proferida na Medida Cautelar na RvC 5.487/AM, são os mesmos já analisados pelo Min. EDSON FACHIN na RvC 5.475/AM, oportunidade em que esta CORTE analisou as impugnações envolvendo a dosimetria da pena do requerente em seus vários aspectos (dosimetria da pena em sentido amplo, inclusive no que diz respeito às circunstâncias judiciais do art. 59, caput, do art. 65, III, "b" e do art. 16, todos do Código Penal) , mantendo-a incólume. 3. A análise prévia realizada pelo Plenário desta SUPREMA CORTE nos autos da RvC 5.475/AM e nas demais ações ajuizadas pelo requerente (RvC 5.480/AM, RvC 5.488/AM e RvC 5.493/AM) serve de fundamento idôneo para afastar o requisito do fumus boni iuris da medida cautelar. 4. Ausência do periculum in mora alegado pelo requerente (suspensão dos efeitos da condenação para poder se candidatar a cargo eletivo), uma vez que não há qualquer risco de dano irreparável de se analisar a 5ª (quinta) Revisão Criminal proposta pelo requerente Acir Marcos Gurgacz, em especial quando os fundamentos desta já foram analisados pelo Plenário do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 5. Medida cautelar não referendada. (STF. Plenário. RvC 5475/AM, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 6/11/2019).


Desse modo, entende-se que a Revisão Criminal não funciona como um Recurso de Apelação, em que o Órgão Colegiado, analisando as provas dos autos e com base na persuasão racional, poderá modificar a sentença condenatória, de acordo com a sua livre convicção.


Ao contrário, pressupõe-se que o instrumento processual em questão somente poderá modificar a decisão condenatória se ela tiver sido fundada em uma manifesta injustiça, em total desprezo à norma legal ou à prova dos autos.


A Revisão Criminal atém-se a aspectos relativos à afronta da legislação vigente ou se existente uma condenação sem o mínimo lastro probatório, diferentemente de uma Apelação, em que existirá um exame aprofundado da suficiência das provas, podendo o Órgão Julgador fazer uma análise de cada uma delas e fazer uma interpretação diversa, de acordo com o livre convencimento motivado.


É nesse contexto que a Revisão Criminal somente será julgada procedente se a violação à lei ou a ausência de lastro probatório para a condenação for indene de dúvida.


Feita esta digressão, passo à análise do mérito desta Revisão Criminal.


Ab initio, observa-se que o Requerente fora absolvido, com trânsito em julgado em 23 de abril de 2020, requerendo, nesta oportunidade, tão somente a reformulação da fundamentação da sentença proferida, eis que a sentença absolutória na insuficiência probatória e prescrição não tem repercussões a seu favor na esfera cível e administrativa.


Narra que a presente revisão criminal é cabível em decorrência de ter ocorrido o trânsito em julgado da decisão absolutória hostilizada, v.g.: “(...) a medida que se torna cabível para impugnar o resultado do processo transitado em julgado é a ação de revisão criminal, diante do evidente cerceamento de defesa, unido à ausência de outros meios capazes de modificar os pontos a seguir citados”, requerendo, em suma, que seja julgada procedente a presente revisão, para que se reformule a fundamentação da sentença proferida, fundamentando na inexistência de crime, com fulcro no disposto no art. 386 do CPP.


De pronto, destaque-se que não assiste razão ao Requerente, eis que, como dito, as razões defensivas apresentadas não se baseiam em nenhuma das hipóteses dispostas no art. 621 do Código de Processo Penal, que, registre-se, é taxativa:


Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida:

I quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;

II quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial de pena.


Note-se que, ao contrário dos entendimentos exposados pelo Requerente, o texto legal restringe as hipóteses de cabimento às sentenças condenatórias, não se admitindo, em sede de revisão criminal, a descontinuação de sentença de natureza absolutória, salvo em caso de absolvição imprópria.


Sobre o tema, Renato Brasileiro, ratificando o tema exposado, leciona, v.g.: “Os três incisos do art. 621 referem-se expressamente à natureza da decisão que admite o ajuizamento da revisão criminal: sentença condenatória. Enquanto os incisos I e II do art. 621 fazem menção expressa à necessidade de uma sentença condenatória, o inciso III faz referência à descoberta de novas provas de inocência do condenado. A doutrina é pacífica no sentido de também se admitir o ajuizamento da revisão criminal em face de sentença absolutória imprópria com trânsito em julgado. Afinal, tal decisão, conquanto classificada como absolutória, tem inegável carga condenatória, já que submete o acusado ao cumprimento de medida de segurança (CPP, art. 386, parágrafo único, III), verdadeira espécie de sanção penal.”


Neste sentido, a Douta Procuradoria de Justiça, em Id. 66870415, manifestou-se pelo não conhecimento da revisional, por não vislumbrar, nos autos, hipótese de cabimento, vejamos: “Ora, é lição comum que o pressuposto primordial da revisão é a existência de um processo criminal com sentença condenatória transitada em julgado, comprovada por certidão, conforme expressa orientação do art. 621, caput, e do § 1º, do artigo 625, ambos do Código de Processo Penal.1 Em outros termos, a revisão criminal constitui uma ação desconstitutiva sobre decisões de natureza CONDENATÓRIA, não havendo, por sua vez, que se falar em extensão do cabimento da revisional às sentenças absolutórias, como ocorre na hipótese dos autos. (...) Bem é de se ver, portanto, que, como no caso dos autos o requerente almeja, tão somente, ver alterado o fundamento da sentença absolutória proferida em seu favor, a presente ação revisional não se revela a via adequada para tanto. Considerando os fundamentos acima expendidos, compreende o Ministério Público ser hipótese de NÃO CONHECIMENTO da presente revisão criminal.”


Assim, considerando que no caso em tela o Requerente objetiva exclusivamente modificar o conteúdo da sentença absolutória, a via eleita se mostra totalmente inadequada, resultando no não conhecimento do requerimento.


Aliás, esse é o entendimento adotado em precedentes dos Tribunais pátrios, vejamos:


EMENTA AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO QUE NÃO ADMITIU REVISÃO CRIMINAL. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. ALTERAÇÃO DO FUNDAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Nas três hipóteses de cabimento de revisão criminal previstas no artigo 621 do Código de Processo Penal há expressa menção a sentença condenatória ou a condenado, de modo que é imprescindível para a viabilidade da ação revisional que o acusado tenha sido condenado ou que a ele tenha sido imposta medida de segurança. 2. Diante disso, não se admite Revisão Criminal ajuizada para modificação do fundamento de sentença absolutória. Precedentes. 3. Agravo interno conhecido e não provido. (TJ-DF 07199046620188070000 DF 0719904-66.2018.8.07.0000, Relator: MARIA IVATÔNIA, Data de Julgamento: 26/02/2019, Câmara Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 26/02/2019 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)


“Portanto, as hipóteses de cabimento da ação revisional perfazem rol taxativo, não se admitindo o juízo rescisório para alteração de decisão judicial de natureza absolutória, salvo a hipótese de absolvição imprópria. Nesse sentido, destaca-se preclara lição pretoriana: “Na esteira da jurisprudência do STJ, a revisão criminal não deve ser adotada como um segundo recurso de apelação, pois nada mais é que a desconstituição da coisa julgada em face da prevalência, na seara penal, do princípio da verdade real sobre a verdade formal. O acolhimento da pretensão revisional deve ser excepcional, cingindo-se às hipóteses em que a contradição à evidência dos autos seja manifesta, estreme de dúvidas, dispensando, pois, a interpretação ou análise subjetiva das provas produzidas” (STJ, AgRg no REsp 1.295.387/MS, 5ª T., rel. Min. Jorge Mussi, j. 11-11-2014, DJe de 18-11-2014).” (TJ-SP - RVCR: 00682584320158260000 SP 0068258-43.2015.8.26.0000, Relator: Alcides Malossi Junior, Data de Julgamento: 04/05/2017, 4º Grupo de Direito Criminal, Data de Publicação: 09/05/2017)


Rememore-se que a Revisão Criminal não pode ser confundida com uma nova apelação, naquela só é admitido o desfazimento do julgado se houver certeza aferível de plano (sem revolvimento de eventual dissonância probatória) de que se apresenta em descompasso o que provado e o que decidido, ou se novas provas surgirem.


Nesta dicção, cito as lições doutrinárias de Eugênio Pacelli11: “a ação de revisão criminal tem precisamente este destino: permitir que a decisão condenatória passada em julgado possa ser novamente questionada, seja a partir de novas provas, seja a partir da atualização da interpretação do direito pelos tribunais, seja, por fim, pela possibilidade de não ter sido prestada no julgamento anterior, a melhor jurisdição.


Nesse sentido, compreende-se que esse instrumento processual possui finalidades específicas, as quais não estão evidenciadas no presente caso, mormente a inexistência de contrariedade na decisão condenatória ao texto expresso da lei penal ou à prova constante nos autos, sendo certo que todas as teses da defesa foram exaustivamente tratadas com maestria na decisão combatida, restando caracterizada a mera pretensão do revisionando de rediscutir matéria de defesa já examinada e exaurida na decisão que se pretende rever.


Dessa forma, ausentes fatos novos ou teses jurídicas diversas que permitam a análise do caso sob outro enfoque, não são dignas de acolhida as alegações do Revisionando, não merecendo qualquer reparo o édito condenatório, já transitado em julgado.


3. DA CONCLUSÃO


Diante do exposto, em consonância com o parecer ministerial, voto no sentido de NÃO CONHECER a presente Revisão Criminal, mantendo incólume a sentença objurgada.


Salvador, data da assinatura eletrônica.



Des. Geder Luiz Rocha Gomes

Relator

 GLRG VI 235

 

1 Curso de direito processual penal / Guilherme de Souza Nucci. – 17. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 1478.

2 “De fato, a revisão é, no fundo, verdadeira ação, ou tipo especial de ação rescisória em sede penal, obedecendo, contudo, à forma dos recursos. Como a ação rescisória, participa da natureza das ações e dos recursos. A diferença consiste em que nas ações rescisórias é prevalente o caráter de ação, com o juízo prévio rescindente e rescisório; nas revisões criminais é prevalente o caráter de recurso” (Ary de Azevedo Franco, Código de Processo Penal, v. 2, p. 334). Para Jorge Alberto Romeiro, trata-se do “reexame jurisdicional de um processo penal já encerrado por decisão transitada em julgado, mirando à sua reforma, quando contenha erro cuja reparação pelo próprio Judiciário, possa valorizá-lo como órgão do Estado gerador da coisa julgada” (Da revisão, p. 67).

3 Como ensina Maria Elisabeth Queijo, “o termo ‘revisão’ é oriundo da palavra ‘rever’ que significa ‘ver novamente’, ‘examinar de novo’. Mais que um instituto de direito processual, a revisão é medida humanitária para correção dos erros judiciários” (Queijo, Da revisão criminal, p. 79).

4 Apud Curso de direito processual penal / Guilherme de Souza Nucci. – 17. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020, p. 1480

5 Revisão criminal, p. 65-66.

6 Apud Curso de direito processual penal / Guilherme de Souza Nucci. – 17. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020, pp. 1480-1481.

7 Câmara Leal (Comentários ao Código de Processo Penal, v. IV, p. 134)

8 Recurso no processo penal: teoria geral dos recursos, recursos em espécie, ações de impugnação / Antônio Magalhães Gomes Filho, Antonio Scarance Fernandes, Ada Pellegrini Grinover. - 2. ed. rev. e atual., 4. tir, - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, pp. 307-308.

9 Manual de processo penal: volume único / Renato Brasileiro de Lima – 8. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: Ed. JusPodivm, 2020.

10 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 10 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 748.

11 OLIVEIRA, Eugenio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 925-926