PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Primeira Câmara Cível 



ProcessoAPELAÇÃO CÍVEL n. 0000196-67.2011.8.05.0034
Órgão JulgadorPrimeira Câmara Cível
APELANTE: COMPANHIA BAIANA DE ELETRICIDADE - COELBA
Advogado(s)MILENA GILA FONTES, PAULO MARCEL DOS SANTOS MARQUES, PAULO ABBEHUSEN JUNIOR
APELADO: ALOÍSIO FERREIRA DAMASCENO
Advogado(s):ADILSON AFONSO DE CASTRO JUNIOR, FERNANDA BARRETTO DE ARAUJO MENDONCA

 

ACORDÃO

 

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INCORPORAÇÃO DE REDE ELÉTRICA PARTICULAR POR CONCESSIONÁRIA OU PERMISSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA.

A Resolução nº 229/06 da ANEEL, que regulamenta o Decreto nº 5.163/04, prevê, expressamente, em seu art. 3º, que as redes particulares que não dispuserem de ato autorizativo do Poder Concedente, na forma desta Resolução, deverão ser incorporadas ao patrimônio da respectiva concessionária ou permissionária de distribuição que, a partir da efetiva incorporação, se responsabilizará pelas despesas de operação e manutenção de tais redes.

Majoração dos honorários sucumbenciais.

 

IMPROVIMENTO DO RECURSO.

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de n. 0000196-67.2011.8.05.0034, em que figuram como apelante COMPANHIA BAIANA DE ELETRICIDADE - COELBA e como apelado ALOÍSIO FERREIRA DAMASCENO.


ACORDAM os magistrados integrantes da 
Primeira Câmara Cível do Estado da Bahia, por unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, pelas razões expostas no voto condutor.

 

Sala de Sessões,

 

 PRESIDENTE

 

 

DESA. MARIA DA PURIFICAÇÃO DA SILVA

 

RELATORA

 

 

PROCURADOR(A) DA JUSTIÇA

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e não provido Por Unanimidade

Salvador, 27 de Setembro de 2021.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Primeira Câmara Cível 

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0000196-67.2011.8.05.0034
Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível
APELANTE: COMPANHIA BAIANA DE ELETRICIDADE - COELBA
Advogado(s): MILENA GILA FONTES, PAULO MARCEL DOS SANTOS MARQUES, PAULO ABBEHUSEN JUNIOR
APELADO: ALOÍSIO FERREIRA DAMASCENO
Advogado(s): ADILSON AFONSO DE CASTRO JUNIOR, FERNANDA BARRETTO DE ARAUJO MENDONCA

 

RELATÓRIO

 

 

 

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença proferida pelo Juízo da Comarca de Cachoeira/BA, que julgou parcialmente procedente a ação, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar a requerida a restituir ao autor os valores gastos na construção do sistema de energia, os quais deverão ser apurados em liquidação de sentença, corrigidos monetariamente, desde a data da propositura da ação e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação. Por fim, condenou o réu ao pagamento das custas e honorários advocatícios estes fixados em 10% (dez por cento), sobre o valor da condenação, ante a complexidade da causa, ex vi do artigo 85, § 2º, do NCPC.

 

Acrescento apenas que o réu opôs embargos de declaração (documento ID nº 17864522) alegando existir omissões a serem sanadas. Na forma da decisão ID nº 17864528, os embargos foram rejeitados.

 

Irresignado, o réu interpôs o presente recurso aduzindo merecer reforma a sentença que condenou a requerida a restituir ao autor os valores gastos na construção do sistema de energia.

 

Afirma que a sentença proferida, além de pautar seu resultado nas meras alegações desprovidas de qualquer lastro probatório, ainda imputou à COELBA um exíguo e desarrazoado prazo para cumprimento da obrigação de pagar imposta, uma vez que não há documento legível capaz de comprovar as alegações presentes da exordial.

 

Entende ter inexistido ato ilícito na medida em que a obrigação de fazer objeto desta demanda reflete sobre todo o interesse coletivo.

 

Defende a necessidade de se levar em consideração que a rede de energia elétrica do Apelado foi instalada há mais de TRÊS DÉCADAS e as alegações dessa suposta “incorporação” são de mais de 15 ANOS atrás. Admitir exercício do pleito à indenização neste momento é ir de encontro à boa-fé. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça formou precedentes no sentido de que o não exercício de um direito ao longo do tempo, ainda que não se tenha consumado o prazo prescricional, faz incidir o instituto da supressio.

 

Conclui que os documentos que constam anexados à inicial estão totalmente ilegíveis, não sendo aptos a comprovar os devidos pagamentos da instalação de energia elétrica. Portanto, não há como evidenciar a restituição ora referida pelo juiz a quo, já que não houve nos autos a comprovação de qualquer eventual dano.

 

Pediu a redução do valor da condenação e o provimento do apelo.

 

Em suas contrarrazões, a parte apelada frisou que o dano decorre do consumidor da Recorrente ter sido compelido a arcar com todas às despesas para instalação de rede elétrica em seu imóvel, e após tal fato, a recorrente passou a utilizar a rede daquele para fornecer energia para outros consumidores.

 

Pugnou pelo improvimento do apelo.

 

Em cumprimento do art. 931 do CPC, restituo os autos à Secretaria, pedindo a sua inclusão em pauta para julgamento, salientando que se trata de recurso passível de sustentação oral, nos termos do art. 937, I, do CPC, c/c art. 187, I, do RITJBA.



Salvador, 26 de agosto de 2021.



DESA. MARIA DA PURIFICAÇÃO DA SILVA

 

RELATORA

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Primeira Câmara Cível 



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0000196-67.2011.8.05.0034
Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível
APELANTE: COMPANHIA BAIANA DE ELETRICIDADE - COELBA
Advogado(s): MILENA GILA FONTES, PAULO MARCEL DOS SANTOS MARQUES, PAULO ABBEHUSEN JUNIOR
APELADO: ALOÍSIO FERREIRA DAMASCENO
Advogado(s): ADILSON AFONSO DE CASTRO JUNIOR, FERNANDA BARRETTO DE ARAUJO MENDONCA

 

 

 

VOTO

 

 

Cuida-se de Recurso de Apelação interposto contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação, nos termos do art. 487, I, do CPC, para condenar a requerida a restituir ao autor os valores gastos na construção do sistema de energia, os quais deverão ser apurados em liquidação de sentença


Conheço do recurso porque presentes os requisitos de admissibilidade.


Alegou o autor em suas razões iniciais que, no ano de 1908, em razão da inexistência de serviço de fornecimento de energia elétrica na região onde o seu sítio está localizado, contratou com a Companhia de Eletrificação Rural (COBER), a implantação do serviço de energia elétrica.


Afirmou que em meados de 1998, a Apelante solicitou aos moradores a doação desses sistemas de transmissão de energia à particulares, mas a parte autora não aceitou. Mesmo assim, alega que houve incorporação indevida e que a Coelba passou a utilizar a sua rede particular para transmitir energia aos demais consumidores.


Inicialmente, cumpre esclarecer que quando o particular construir rede elétrica mediante recursos próprios, sem acordo com a concessionária, translativo da propriedade ou renunciativo ao direito à restituição, o termo inicial do prazo prescricional é a data da incorporação da rede.


Neste sentido, cumpre esclarecer que o STJ, submeteu o Recurso Especial 1.249.321/RS ao rito dos repetitivos (CPC, art. 543-C), com o escopo de pacificar a matéria. Veja-se:


FINANCIAMENTO DE REDE DE ELETRIFICAÇÃO RURAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. CUSTEIO DE OBRADE EXTENSÃO DE REDE ELÉTRICA PELO CONSUMIDOR. AÇÃO DE RESTITUIÇÃODOS VALORES APORTADOS. PRESCRIÇÃO.

Para efeitos do art. 543-C do CPC:

1. Nas ações em que se pleiteia o ressarcimento dos valores pagos a título de participação financeira do consumidor no custeio de construção de rede elétrica, a prescrição deve ser analisada, separadamente, a partir de duas situações: (i) pedido relativo a valores cujo ressarcimento estava previsto em instrumento contratual e que ocorreria após o transcurso de certo prazo a contar do término da obra (pacto geralmente denominado de "CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO");(ii) pedido relativo a valores para cujo ressarcimento não havia previsão contratual (pactuação prevista em instrumento, em regra,nominado de "TERMO DE CONTRIBUIÇÃO").

1.2.) No primeiro caso (i), "prescreve em 20 (vinte) anos, na vigência do Código Civil de 1916, e em 5 (cinco) anos, na vigência do Código Civil de 2002, a pretensão de cobrança dos valores aportados para a construção de rede de eletrificação rural, [...]respeitada a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil de 2002" (REsp 1.063.661/RS, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em24/02/2010);

1.3.) No segundo caso (ii), a pretensão prescreve em 20 (vinte)anos, na vigência do Código Civil de 1916, e em 3 (três) anos, na vigência do Código Civil de 2002, por se tratar de demanda fundada em enriquecimento sem causa (art. 206, § 3º, inciso IV), observada, igualmente, a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil de 2002.

2. No caso concreto, para o pedido de ressarcimento dos valores previstos no CONVÊNIO DE DEVOLUÇÃO, o prazo prescricional findaria em 11 de janeiro de 2008 (cinco anos, a contar da vigência do novo Código). Por outro lado, para o pedido de ressarcimento dos valores previstos no TERMO DE CONTRIBUIÇÃO, o prazo prescricional findaria em 11 de janeiro de 2006 (três anos, a contar da vigência do novo Código). Tendo o autor ajuizado a ação em 15 de janeiro de 2009, a totalidade de sua pretensão está alcançada pela prescrição.

3. Recurso especial a que se dá provimento

(STJ - REsp: 1.249.321 RS 2011/0086178-2, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 10/04/2013, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/04/2013)


Nos casos em que não houve a celebração de Convênio de Devolução nem tampouco Termo de Contribuição, ou qualquer outro instrumento que transfira a propriedade da rede elétrica para a concessionária, o bem em comento passa a integrar sua esfera patrimonial.


Assim, quando a causa de pedir for a incorporação de rede elétrica particular sem a prévia indenização, é a partir desse evento que deve deflagrar-se a contagem do prazo prescricional.


Justifica-se esta afirmativa pelo fato de que, segundo o art. 189 do Código Civil, a pretensão nasce com a violação do direito substantivo, no caso, o direito de propriedade (CF, art. 5º, XXII), de um lado, e a vedação do enriquecimento ilícito (CC, art. 884), de outro.


A Resolução nº 229/06 da ANEEL, que regulamenta o Decreto nº 5.163/04, prevê, expressamente, em seu art. 3º, que as redes particulares que não dispuserem de ato autorizativo do Poder Concedente, na forma desta Resolução, deverão ser incorporadas ao patrimônio da respectiva concessionária ou permissionária de distribuição que, a partir da efetiva incorporação, se responsabilizará pelas despesas de operação e manutenção de tais redes.


A partir do momento da incorporação da rede, nasce para o particular o direito à restituição do valor aportado para sua construção (art. 9º, §1º). Corrobora este entendimento o disposto no art. 71, § 5°, II do Decreto 5.163/04, que também aponta que somente com a incorporação de rede elétrica sem prévia indenização é que nasce o direito à pretensão indenizatória:


§ 5º A partir de 1º de janeiro de 2006, as redes particulares que não dispuserem de ato autorizativo serão incorporadas ao patrimônio das concessionárias de serviços públicos de distribuição de energia elétrica, conforme as respectivas áreas de concessão, mediante processo formal a ser disciplinado pela ANEEL, observadas as seguintes condições:

[...]

II - avaliação prévia das instalações, para o fim de fixação do valor a ser indenizado ao titular da rede particular a ser incorporada.


Note que competia à Coelba produzir prova de que construiu rede própria e que não fez uso da rede do particular para distribuir energia. Observe-se que o seu preposto confessou a existência da rede particular e o uso para transmitir energia a terceiros:


DEPOIMENTO PESSOAL DA PARTE REQUERIDA: Sr. Gilberto Monteiro Oliveira, perguntado, respondeu: que antigamente a Coelba cobrava para implantação do sistema de energia e depois do programa luz para todos, é feita de forma gratuita; que não sabe dizer quanto tempo o autor levou pagando e quanto pagou, mas que a instalação foi custeada pelo autor. Que a rede feita e paga pelo autor serve para atender outras localidades; que na época COBER o cliente paga e esta instalava a linha de transmissão; que não sabe dizer há quanto tempo a linha de transmissão do autor passou a ser utilizada para distribuir na localidade vizinha;

[…]

Que o cliente pagava a instalação em parcelas, não sabendo especificamente em quantas parcelas;

[…]

(trechos do depoimento pessoal do réu, documento ID nº 8346584)


Restou, portanto, incontroversa a comprovação tanto do custeio de toda instalação por parte do autor, quanto a utilização da rede por parte da acionada.


A incorporação de rede elétrica particular sem prévia indenização também ofende a legislação de regência (art. 71, § 5º, II do Decreto 5.163/04 e art. 9º, § 1º, da Resolução 229/06/ANEEL), que prevê que a incorporação de rede elétrica particular deve ser precedida de indenização.


Tal situação caracteriza o enriquecimento ilícito por parte da Apelante que cobra dos usuários o fornecimento de energia elétrica que é realizado mediante utilização dos recursos do autor.


Com a incorporação de rede elétrica particular, nasce o direito do autor em ser indenizado.


Ciente da sua obrigação processual, a concessionária não produziu prova no sentido de demonstrar a dimensão dos custos pagos, ainda que de forma parcelada, relativos à instalação da rede particular.



Observe-se que a inversão do ônus da prova é medida compatível com a situação de hipossuficiência da parte, sendo amplamente aceita pela jurisprudência pátria em causas em que se discute a extensão e validade do próprio negócio jurídico.



Em relação ao valor indenizatório, não merece prosperar a pretensão do apelante, na medida em que a sua quantificação foi diferida para a fase de liquidação, considerando que nenhuma das partes conseguiu produzir prova acerca do efetivo valor dispendido.


Apurada a dimensão das despesas com construção da rede, tem o autor direito de ser indenizado por quem a incorpora e dela se beneficia. A insurgência da recorrente contra o valor ainda pendente de apuração, denota que a concessionária busca lucro fácil, invocando que a distribuição da rede é de evidente e claro interesse social, pois realizada em benefício dos necessitados.


Considerada a sucumbência recursal, de acordo com o disposto no § 11, do art. 85, do CPC, o Tribunal elevará os honorários advocatícios, de acordo com o trabalho realizado pela parte após a sentença, respeitando, e somado já o percentual fixado na sentença recorrida. Veja-se:


Art. 85. […]

§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento.


Assim, considerando que a sentença fixou a verba no percentual de 10%, devem os honorários advocatícios ser majorados em 2% (dois por cento), perfazendo o total de 12% (doze por cento) do valor da condenação.


Pelas razões indicadas, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, mantendo inalterados os termos da sentença.


Salvador,


DESA. MARIA DA PURIFICAÇÃO DA SILVA


RELATORA