PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Conselho da Magistratura 



ProcessoAPELAÇÃO CÍVEL n. 8000973-13.2021.8.05.0244
Órgão JulgadorConselho da Magistratura
APELANTE: BANCO RCI BRASIL S.A
Advogado(s) 
APELADO: 2º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SENHOR DO BONFIM/BA
Advogado(s): 

 

ACORDÃO

 

APELAÇÃO EM PROCEDIMENTO DE DÚVIDA REGISTRAL. CONTRATO DE PENHOR. VEÍCULOS DADOS EM GARANTIA. DÍVIDA CONTRAÍDA PARA MANUTENÇÃO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL. NATUREZA MERCANTIL. REGISTRO NO OFÍCIO DE IMÓVEIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.448 DO CC/02. RECURSO PROVIDO.

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de n. 8000973-13.2021.8.05.0244, em que figuram como apelante BANCO RCI BRASIL S.A e como apelado 2º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SENHOR DO BONFIM/BA.


ACORDAM os magistrados integrantes da 
Conselho da Magistratura do Estado da Bahia, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. 

 JR18

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 CONSELHO DA MAGISTRATURA

 

DECISÃO PROCLAMADA

"Dado, à unanimidade, Provimento ao recurso".

Salvador, 14 de Março de 2022.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Conselho da Magistratura 

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8000973-13.2021.8.05.0244
Órgão Julgador: Conselho da Magistratura
APELANTE: BANCO RCI BRASIL S.A
Advogado(s):  
APELADO: 2º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SENHOR DO BONFIM/BA
Advogado(s):  

 

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por Banco RCI Brasil S/A em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara de Registros Públicos da comarca de Senhor do Bonfim que, nos autos do procedimento de dúvida registral suscitada por Humberto Santos de Moraes Lima, Oficial Titular do Registro do 2º Ofício de Imóveis daquela comarca, manteve incólume a recusa do registro de contrato de penhor mercantil de veículos automotores (ID 16438656 – p. 113/114).

 

Narra, em resumo, que “o juízo a quo entendeu que a competência para registro do contrato seria do cartório de títulos e documentos pois a garantia apresentada seriam veículos, o que faria com que o contrato devesse seguir o rito previsto para o penhor de veículos”.

 

Afirma que, de acordo com o art. 1.448 do Código Civil e o art. 1.050 da Portaria n. CGJ 65/2018-GSEC, o penhor mercantil deve ser registrado em Cartório de Registro de Imóveis.

 

Destaca, por fim, que “o penhor mercantil se destina à garantia de uma dívida ligada à atividade da empresa devedora, e não de um débito decorrente da aquisição de automotor”.

 

Com essas considerações, requer o provimento do recurso.

 

No parecer ofertado, a Procuradoria de Justiça opina pelo acolhimento do apelo (ID 19413970).

 

Elaborado o relatório, os autos foram restituídos à Secretaria para inclusão em pauta de julgamento.


 

Salvador/BA, 24 de fevereiro de 2022.

 

 José Edivaldo Rocha Rotondano

Corregedor-Geral da Justiça

Relator

JR18


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Conselho da Magistratura 



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8000973-13.2021.8.05.0244
Órgão Julgador: Conselho da Magistratura
APELANTE: BANCO RCI BRASIL S.A
Advogado(s):  
APELADO: 2º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SENHOR DO BONFIM/BA
Advogado(s):  

 

VOTO

Na espécie, a instituição financeira recorrente solicitou o registro do contrato de penhor mercantil de veículos automotores, firmado entre as empresas La France LTDA, Renault do Brasil S/A e Banco RCI Brasil S/A, junto ao 2º Ofício de Imóveis da comarca de Senhor do Bonfim, sendo este pedido negado por se tratar de ato a ser inscrito no Ofício de Registro de Títulos e Documentos.

 

Nos termos do art. 1.431 do Código Civil, “Constitui-se o penhor pela transferência efetiva da posse que, em garantia do débito ao credor ou a quem o represente, faz o devedor, ou alguém por ele, de uma coisa móvel, suscetível de alienação”.

 

Trata-se, portanto, de direito real de garantia em que é transferida a posse do bem ao credor para assegurar o pagamento da dívida.

 

Por sua vez, quando a situação referir-se a penhor rural, industrial, mercantil ou de veículos, a posse direta do bem continua com o devedor, que terá a responsabilidade pela sua conservação, transferindo-se ao credor apenas a posse indireta. É o que dispõe o parágrafo único do art. 1.431 acima referido:

 

Art. 1.431. [...]

Parágrafo único. No penhor rural, industrial, mercantil e de veículos, as coisas empenhadas continuam em poder do devedor, que as deve guardar e conservar”.

 

A situação em exame comporta diferenciação entre a modalidade de penhor mercantil, que envolva automóveis dados em garantia, daquela específica de veículos automotores.

 

Neste último, além da garantia em si, o bem móvel é o próprio objeto da contratação, ou seja, o devedor, ao ofertar o veículo, visa assegurar a dívida contraída para sua própria aquisição. De outro lado, no penhor mercantil, o oferecimento da garantia relaciona-se ao exercício da atividade econômica da empresa, podendo ser, como no caso, referente a comercialização de veículos automotores.

 

Por esse ângulo, analisando as cláusulas contratuais (ID 16438656 – p. 13 e seguintes), percebe-se, claramente, que se trata de um penhor mercantil, não só porque faz referência a essa nomenclatura, mas, sobretudo porque os veículos foram ofertados em garantia de dívida contraída para manutenção da atividade comercial da empresa.

 

A propósito, confira-se o que prevê a primeira cláusula da avença:

 

CONSIDERANDO QUE, a Concessionária contratou com a RCI linha de crédito cujos recursos são destinados preponderantemente à aquisição de Veículos Novos, veículos usados e peças de reposição, sendo referido empréstimo formalizado por meio de Cédula de Crédito Bancário de emissão da Concessionária (a “CCB”);

[…]

 

1.1. A fím de garantir o integral e pontual cumprimento das obrigações de pagamento da Concessionária (i) à Renault ou a seus eventuais sucessores, relativas Direitos de Crédito relativos aos veículos adquiridos pela Concessionária com Prazo Diferenciado de Pagamento, nos termos do Anexo 15 (as “Obrigações Garantidas Veículos”): (ii) à RCI, relativas à tinha de crédito aberta por meio da CCB (as “Obrigações Garantidas CCB”). incluindo, mas não se limitando a obrigação de pagar as parcelas de principal, juros remuneratórios, juros e encargos moratórios eventualmente aplicáveis (as “Obrigações Garantidas”) e sem prejuízo de outras eventuais garantias já constituídas ou a serem constituídas, a Concessionária, neste ato, dá em penhor mercantil às Partes Garantidas e a seus sucessores na condição de titulares dos Direitos de Crédito, nos termos dos artigos 1.447 e seguintes do Código Civil Brasileiro, os Veículos Novos relacionados no Anexo I deste Contrato de Penhor (os “Veículos Estoque Empenhados”), e, em caso de venda dos mesmos, até que esses sejam substituídos nos termos da Cláusula 1.1.1 a seguir, o produto da referida venda (o “Penhor” e os “Bens Empenhados”, respectivamente)”.

 

Extraída a natureza mercantil do penhor, então, aplica-se a disciplina do art. 1.448 do Código Civil, que prevê a necessidade de consignação desta espécie de garantia no Cartório de Registro de Imóveis. Eis o texto legal:

 

Art. 1.448. Constitui-se o penhor industrial, ou o mercantil, mediante instrumento público ou particular, registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição onde estiverem situadas as coisas empenhadas”.

 

Em caso análogo, assim se posicionou o Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo:

 

DUVIDA - REGISTRO DE IMÓVEIS - INSTRUMENTO PARTICULAR DE CONSTITUIÇÃO DE PENHOR MERCANTIL - VEÍCULOS AUTOMOTORES QUE CONSTITUEM O ESTOQUE DE REVENDA AUTORIZADA DA MERCEDES-BENZ - PENHOR QUE GARANTE DÍVIDA ORIUNDA DE LINHA DE CRÉDITO OBTIDA PELA EMPRESA REVENDEDORA JUNTO AO BANCO RECORRENTE -/BÍVIDA RESULTANTE DA PRÓPRIA ATIVIDADE DA REVENDEDORA NATUREZA DA DÍVIDA QUE DEFINE O PENHOR COMO MERCANTIL - INCIDÊNCIA DOS ARTIGOS 1.447 E 1.448 DO CÓDIGOICWIL RECURSO PROVIDO.

(TJSP; Apelação Cível 0017222-73.2013.8.26.0309; Relator (a): Xavier de Aquino; Órgão Julgador: Conselho Superior de Magistratura; Foro de Jundiaí - 1ª. Vara Cível; Data do Julgamento: 15/12/2015; Data de Registro: 03/02/2016)

 

Merece acolhimento, portanto, a irresignação da parte interessada.

 

Conclusão.

 

Ante o exposto, o voto é no sentido de dar provimento ao recurso, reformando a sentença para reconhecer a possibilidade de registro do contrato em debate no 2º Ofício de Registro de Imóveis da comarca de Senhor do Bonfim.

 

 José Edivaldo Rocha Rotondano

Corregedor-Geral da Justiça

Relator

JR18