DECISÃO MONOCRÁTICA
RECURSO INOMINADO. O NOVO REGIMENTO DAS TURMAS RECURSAIS, RESOLUÇÃO No 02/2021, ESTABELECEU A COMPETÊNCIA DO RELATOR PARA JULGAR MONOCRATICAMENTE MATÉRIAS COM UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA OU ENTENDIMENTO SEDIMENTADO. DEMANDAS REPETITIVAS. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDOS. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA EM RAZÃO DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DEMORA EXCESSIVA NO REEMBOLSO COM MÚLTIPLOS CONTATOS COMPROVADOS. DANO MORAL VERIFICADO. SENTENÇA REFORMADA.
A Resolução nº 02, de 10 de fevereiro de 2021, que instituiu o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado da Bahia e da Turma de Uniformização da Jurisprudência, estabeleceu a competência do relator para julgar monocraticamente matérias com uniformização de jurisprudência ou entendimento sedimentado.
Trata-se de ação indenizatória decorrente de vício do serviço. Demora excessiva no reembolso de valores correspondentes a reserva cancelada.
A ré contestou o feito. Nega conduta indevida e dever de indenizar. Roga pela improcedência total dos pedidos ventilados.
A sentença foi proferida nos seguintes termos: “Assim, ante o exposto e tudo mais que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a queixa, para condenar as acionadas, de forma solidária, a pagarem a quantia de R$ 764,00 (setecentos e sessenta e quatro reais), a título de devolução de quantia paga, com correção monetária pelo INPC desde o desembolso e juros de mora de 1% ao mês desde a citação, e extingo o feito, com resolução de mérito, na forma do art. 487, I, do CPC. Sem custas e sem honorários nessa fase processual, por força da Lei nº. 9.099/95. ”.
Irresignada, a autora interpôs recurso, buscando a procedência da condenação pela indenização extrapatrimonial.
No caso concreto, incide o regime da solidariedade entre os fornecedores, conforme disposição do art. 7 e 20 do CDC.
No caso em exame, o consumidor tem o direito de obter, contra a empresa, a compensação pecuniária pelos supostos danos causados aos seus direitos subjetivos da personalidade.
Analisando a contestação apresentada, juntamente com os documentos do ev. 96, concluo que a empresa acionada não produziu provas suficientes a corroborar a tese de cumprimento obrigacional, referentes à informação adequada ao consumidor, bem como os deveres anexos da boa fé.
Na hipótese, a conduta das acionadas contraria dispositivo expresso de lei, violando direito básico do consumidor, conforme já esclarecido: “A alegação da parte autora é de cancelamento da reserva de hospedagem feitos no site da acionada, mas que não recebeu a restituição da quantia paga. Verifico das alegações das partes, que não há controvérsia acerca da comercialização do pacote de turismo e da ausência de sua fruição. Cumpre registrar que ao caso se aplica a Lei Federal nº. 14.046, de 24 de agosto de 2020, com as alterações procedidas pela Lei Federal nº 14.186 de 15 de julho de 2021, que assim prevê: Art. 1º Esta Lei dispõe sobre medidas emergenciais para atenuar os efeitos da crise decorrente da pandemia da covid-19 nos setores de turismo e de cultura. O pedido da parte autora se resume à devolução de quantia paga pela hospedagem, contida no pacote de turismo, pois não fez utilização desse serviço. No que se refere ao pleito de devolução de quantia paga, a legislação de regência determina nos seguintes termos: Art. 2º Na hipótese de adiamento ou de cancelamento de serviços, de reservas e de eventos, incluídos shows e espetáculos, de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2022, em decorrência da pandemia da covid-19, o prestador de serviços ou a sociedade empresária não serão obrigados a reembolsar os valores pagos pelo consumidor, desde que assegurem: I - a remarcação dos serviços, das reservas e dos eventos adiados; ou II - a disponibilização de crédito para uso ou abatimento na compra de outros serviços, reservas e eventos disponíveis nas respectivas empresas. Portanto, conforme a legislação, assiste direito à parte autora à remarcação dos serviços ou à disponibilização de crédito para uso ou abatimento de compra de outros serviços, disponíveis na empresa acionada. Somente nos casos em que estiver impossibilitado de remarcar o serviço/evento ou emitir o crédito, o prestador de serviço deverá restituir os valores pagos pelo consumidor até 31 dezembro de 2022, conforme previsão do art. 2º, § 6º, da mencionada lei: Art. 2º, § 6º O prestador de serviço ou a sociedade empresária deverá restituir o valor recebido ao consumidor somente na hipótese de ficarem impossibilitados de oferecer a remarcação dos serviços ou a disponibilização de crédito a que se referem os incisos I e II do caput nos seguintes prazos: I - até 31 de dezembro de 2022, para os cancelamentos realizados até 31 de dezembro de 2021; Acontece que as rés não trouxeram qualquer prova da remarcação da hospedagem ou da concessão de crédito, o que revela, portanto, impossibilidade de fruição dessas opções pelo consumidor. Nesse caso, de rigor a determinação de devolução da quantia paga. A parte autora comprova ter pago a quantia de R$ 764,00 (setecentos e sessenta e quatro reais), que é o valor a ser devolvido.”.
Em relação à indenização extrapatrimonial, entendo que, em se tratando de questão meramente patrimonial, o descaso com o consumidor e a mora obrigacional não representam uma grave violação a direito da personalidade do autor. Todavia, considerando as peculiaridades do caso, os múltiplos contatos certificados através de emails individualizados (ev. 01), e todo o tempo útil que o consumidor teve que despender para resolução de um simples caso como esse, arbitro a indenização no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), condizente com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como respeitando o caráter pedagógico e punitivo da indenização.
Da análise dos autos, verifico as inúmeras tentativas administrativas para solução do conflito. Desse modo, entendo que uma simples relação ordinária de compra e venda/prestação de serviço não deveria ser um motivo a justificar a propositura de ação judicial, todavia, foi a própria negligência do fornecedor que deu causa à necessidade dessa demanda.
Pelo exposto, dou PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da autora, condenando a acionada nos seguintes termos:
A) Em relação aos danos morais, arbitro a indenização no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), condizente com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como respeita o caráter pedagógico e punitivo da indenização.
B) Quanto à fixação dos juros e correção monetária, aplico o entendimento fixado pelo STJ na súmula 362 e 405 do Código Civil.
Ante o exposto, por vislumbrar que merece reforma a decisão vergastada, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO PARCIAL o recurso interposto, reformando a sentença de origem apenas para o reconhecimento da indenização extrapatrimonial. Sem custas e honorários.
MARY ANGÉLICA SANTOS COELHO
Juíza Relatora