PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Terceira Câmara Cível 



ProcessoAPELAÇÃO CÍVEL n. 8004328-09.2019.8.05.0080
Órgão JulgadorTerceira Câmara Cível
APELANTE: RAMON SANTANA DO VALE
Advogado(s)WALTER FERNANDES JUNIOR
APELADO: R R O AUTO PECAS LTDA
Advogado(s):BRUNO SILVA DE CERQUEIRA

 

ACORDÃO

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA FUNDADA EM CHEQUES PRESCRITOS. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. RESPONSABILIDADE PELO ATRASO NA CITAÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA DA INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSO DESPROVIDO.

I. Caso em exame 1.Recurso de Apelação Cível interposto por Ramon Santana do Vale contra sentença da 7ª Vara de Feitos de Relações de Consumo, Cível e Comerciais da Comarca de Feira de Santana, que o condenou ao pagamento de R$ 11.539,00, acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros moratórios de 1% ao mês desde a data de emissão dos cheques, emitidos entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, que foram devolvidos por insuficiência de fundos. O apelante alega prescrição dos cheques, argumentando que a citação válida ocorreu mais de três anos após o ajuizamento da ação, em razão de desídia da parte autora na promoção das medidas necessárias para viabilizar a citação no prazo legal.

II. Questão em discussão 2. A controvérsia envolve a análise da prescrição da cobrança dos cheques e a responsabilidade pelo atraso na citação. Avalia-se se a mora na citação, atribuída ao autor, impede a retroação da interrupção da prescrição à data da propositura da ação, nos termos do art. 240, §2º, do CPC, ou se deve prevalecer o disposto no §1º do mesmo artigo, com retroação da interrupção à data do ajuizamento. Também se discute a correta data para o início dos juros de mora, considerando a jurisprudência consolidada no Tema Repetitivo 685 do STJ.

III. Razões de decidir 3. O prazo prescricional aplicável é o quinquenal, conforme o art. 206, §5º, I, do Código Civil, contado após o prazo de apresentação do cheque (Lei 7.357/1985, art. 33). Os cheques foram emitidos entre 2016 e 2017, com prescrição ocorrendo entre 2022. 4. A ação foi ajuizada em 2019, dentro do prazo, e a demora na citação se deu por questões administrativas e não por desídia do autor, que tomou providências para viabilizar a citação válida, conforme art. 240, §1º, do CPC. A interrupção da prescrição retroage à data da propositura. 5. Quanto aos juros de mora, o cálculo desde a data de emissão dos cheques está em consonância com o Tema 942 do STJ, aplicando correção monetária desde a emissão e juros de mora desde a primeira apresentação dos cheques.

IV. Dispositivo e tese 6. Recurso desprovido. Mantida a sentença de primeiro grau, rejeitando a prescrição e mantendo os critérios de correção e juros de mora estabelecidos. Tese de julgamento: "1. A interrupção da prescrição retroage à data de propositura da ação quando não houver desídia do autor na promoção da citação. 2. Em ações de cobrança de cheque, a correção monetária incide desde a data de emissão e os juros de mora a partir da primeira apresentação à instituição financeira."

Dispositivos relevantes citados: CC, art. 206, §5º, I; CPC, art. 240, §§1º e 2º; Lei 7.357/1985, art. 33. Jurisprudência relevante citada: Tema 685/STJ; Tema 942/STJ.

 

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da APELAÇÃO8004328-09.2019.8.05.0080 em que figuram como parte recorrente Ramon Santana do Vale e parte recorrida R.R.O. Auto Peças Ltda.

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia, à unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto do Relator.

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e não provido Por Unanimidade

Salvador, 25 de Novembro de 2024.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Terceira Câmara Cível 

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8004328-09.2019.8.05.0080
Órgão Julgador: Terceira Câmara Cível
APELANTE: RAMON SANTANA DO VALE
Advogado(s): WALTER FERNANDES JUNIOR
APELADO: R R O AUTO PECAS LTDA
Advogado(s): BRUNO SILVA DE CERQUEIRA

 

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível8004328-09.2019.8.05.0080 interposta por Ramon Santana do Vale em face da sentença proferida no processo de Ação de Cobrança movido por R.R.O. Auto Peças Ltda (ID. 68292015), oriunda da 7ª Vara de Feitos de Relações de Consumo, Cível e Comerciais da Comarca de Feira de Santana. A decisão impugnada condenou o apelante ao pagamento de R$11.539,00, acrescidos de correção monetária pelo INPC, a partir da data de emissão dos cheques, e de juros moratórios de 1% ao mês, contados da primeira apresentação dos títulos à instituição financeira sacada.

A ação foi proposta com fundamento na cobrança de valores representados por cheques emitidos pelo recorrente, que teriam sido devolvidos por insuficiência de fundos, conforme alegado pela parte autora.

Em suas razões recursais (ID. 68292017), o apelante pleiteia a reforma da sentença, argumentando que os cheques estariam prescritos. Alega que, embora a ação tenha sido proposta em 04 de junho de 2019, a citação válida somente ocorreu em 01 de setembro de 2022, ou seja, mais de três anos após a propositura da demanda. Nesse contexto, o apelante defende que a mora na citação foi causada exclusivamente por desídia da parte autora, que, mesmo tendo sido intimada diversas vezes para fornecer informações para a correta citação, não tomou as providências adequadas. Sustenta que, diante dessa inércia, não se pode aplicar o disposto no art. 240, §1º, do CPC, que prevê a retroação da interrupção da prescrição à data da propositura da ação. Ao contrário, afirma que o caso deve ser regido pelo §2º do mesmo artigo, o qual estabelece que, quando o autor não adota as medidas necessárias para viabilizar a citação no prazo de 10 dias, a interrupção da prescrição não retroage à data do ajuizamento. Assim, considerando que os cheques foram emitidos entre dezembro de 2016 e fevereiro de 2017, defende que o direito de cobrança estaria prescrito à luz do art. 206, §5º, I, do Código Civil, que fixa o prazo de cinco anos para a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumentos particulares, ou ainda conforme o art. 206, §3º, IV, que prevê o prazo de três anos para ressarcimento de enriquecimento sem causa.

Adicionalmente, o recorrente sustenta que a aplicação dos juros de mora desde a data de emissão dos cheques não encontra respaldo jurídico. Invoca a jurisprudência consolidada no Tema Repetitivo 685 do STJ, que dispõe que, em casos de responsabilidade contratual, os juros de mora são devidos somente a partir da citação válida, e não da data de inadimplemento do título, como determinado na sentença de primeiro grau. Dessa forma, pleiteia que os juros de mora sejam aplicados a partir de 01 de setembro de 2022, data da citação válida, e não desde a emissão dos cheques, como estabelecido pela sentença.

Com isso, o recorrente requer o provimento do recurso para que seja reconhecida a prescrição dos cheques e, subsidiariamente, que seja modificada a data de início da incidência dos juros de mora, para que esta passe a contar da citação válida.

Em contrarrazões (ID. 68292019), a apelada, R.R.O. Auto Peças Ltda, refuta as alegações de prescrição, sustentando que os cheques não estão prescritos. Afirmou que a ação foi ajuizada em 04 de junho de 2019, dentro do prazo de dois anos para a cobrança de cheques prescritos, conforme o art. 61 da Lei do Cheque (Lei 7.357/85). Destaca que o cheque mais antigo foi emitido em 02 de dezembro de 2016, o que fixaria o prazo final para propositura da ação em 01 de julho de 2019, ou seja, dentro do prazo legal. A parte autora defende que, nos termos do art. 240, §1º, do CPC, a interrupção da prescrição retroage à data de propositura da ação, e que a alegada demora na citação não afeta tal retroação, de forma que não haveria prescrição a ser reconhecida.

A apelada também impugna as alegações do apelante quanto à autenticidade dos cheques, sustentando que as assinaturas nos cheques são semelhantes àquelas constantes dos documentos assinados pelo recorrente nos autos, não havendo qualquer prova ou alegação consistente de falsidade. Afirma, ainda, que o recorrente não contestou de forma específica os documentos apresentados pela autora, limitando-se a alegar genericamente que não se lembrava de ter assinado os cheques, o que não seria uma justificativa juridicamente válida.

Além disso, a parte apelada argumenta que, em ações de cobrança baseadas em cheques prescritos, como é o caso, não é necessária a comprovação do negócio jurídico subjacente (causa debendi), conforme jurisprudência consolidada no Superior Tribunal de Justiça e outros tribunais. Nesse sentido, defende que o cheque em si já constitui prova suficiente do direito da autora, cabendo ao réu a prova de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor, o que, no presente caso, não foi demonstrado.

Diante disso, a apelada requer o não provimento do recurso e a manutenção da sentença em todos os seus termos, com a condenação do apelante ao pagamento dos valores devidos, acrescidos de correção monetária e juros, conforme determinado pelo juízo de primeiro grau.

É O RELATÓRIO.

Inclua-se em pauta.

Salvador, 13 de novembro de 2024.

 

Adriano Augusto Gomes Borges

Juiz Substituto de 2º Grau - Relator


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Terceira Câmara Cível 



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8004328-09.2019.8.05.0080
Órgão Julgador: Terceira Câmara Cível
APELANTE: RAMON SANTANA DO VALE
Advogado(s): WALTER FERNANDES JUNIOR
APELADO: R R O AUTO PECAS LTDA
Advogado(s): BRUNO SILVA DE CERQUEIRA

 

VOTO

Trata-se de apelação cível interposta por Ramon Santana do Vale em face de R.R.O. Auto Peças Ltda  por meio da qual se discute a ocorrência da prescrição da cobrança e a correta aplicação dos juros e correção monetária em relação aos cheques cobrados na origem.

Inicialmente, cumpre destacar que o prazo prescricional aplicável à cobrança de cheques sem força executiva é o previsto no art. 206, §5º, I do Código Civil, que estabelece o prazo de cinco anos para a cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumentos particulares, como o cheque. É importante lembrar que a contagem do prazo de prescrição só começa após o término do prazo de apresentação do cheque, o que, conforme o art. 33 da Lei 7.357/1985 (Lei do Cheque), é de 30 dias para cheques emitidos na mesma praça.

Portanto, a contagem do prazo prescricional no caso dos autos deve levar em consideração o prazo de apresentação de 30 dias, seguido do prazo quinquenal para a cobrança da dívida. Os cheques em questão possuem as seguintes datas de emissão e, consequentemente, prazos de prescrição:

A ação foi ajuizada em 04/06/2019, dentro do prazo de prescrição de cinco anos, afastando qualquer hipótese de prescrição. Este entendimento é corroborado pela jurisprudência, como no seguinte precedente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - CHEQUE SEM FORÇA EXECUTIVA - FALECIMENTO DO AUTOR - SUCESSÃO PROCESSUAL - LEGITIMIDADE ATIVA DOS HERDEIROS - PRETENSÃO DE COBRANÇA DE CHEQUE - PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL - TERMO INICIAL - DATA DA EMISSÃO DO CHEQUE - CITAÇÃO - DEMORA NÃO IMPUTÁVEL À PARTE AUTORA - PRESCRIÇÃO - INOCORRÊNCIA. [...] Em se tratando de ação de cobrança de cheque sem força executiva, aplica-se o prazo prescricional quinquenal previsto no art. 206, § 5º, I, do Código Civil, já que se trata de dívida líquida constante de instrumento particular. Considera-se a data de emissão do título como termo inicial da prescrição da pretensão de cobrança de cheque sem força executiva. Nos termos do art. 240, § 3º, do CPC, a demora imputável exclusivamente ao Poder Judiciário não pode prejudicar a parte autora." (TJ-MG - Apelação Cível: 50224982820198130672, Relatora: Des(a). Mônica Libânio, Julgamento em 03/10/2024).

Passo, agora, à questão da validade da citação, ponto central para a discussão da prescrição. O apelante alega que a primeira tentativa de citação foi realizada de forma irregular, uma vez que foi recebida por sua esposa, conforme consta no ID 68291972. De fato, o art. 242 do CPC exige que a citação seja pessoal, ou seja, dirigida diretamente ao réu, salvo exceções previstas em lei, o que não ocorreu na primeira tentativa. A citação não pode ser considerada válida quando recebida por terceiros, a menos que expressamente autorizado, o que não é o caso dos autos.

Contudo, ao se constatar a invalidade da primeira citação, o apelado adotou medidas imediatas para regularizar o procedimento. A parte autora, em 26/11/2020, apresentou nova petição (ID 68291982) para promover a citação válida do réu, recolhendo as custas necessárias para a expedição do mandado. A diligência da parte autora é clara, já que tomou todas as providências necessárias dentro do prazo, demonstrando que não houve desídia. O fato de a citação válida ter ocorrido apenas em 31/08/2022 decorreu de atrasos administrativos atribuíveis exclusivamente ao Judiciário, e não à parte autora.

Nos termos do art. 240, §1º, do CPC, a interrupção da prescrição retroage à data da propositura da ação, desde que o autor adote as providências necessárias para a citação no prazo estipulado. No caso, ficou comprovado que o autor não permaneceu inerte e buscou a regularização da citação. Dessa forma, a interrupção da prescrição retroage à data da propositura da ação, ocorrida em 04/06/2019, afastando qualquer alegação de prescrição.

No que se refere à alegação de que a demora na citação deveria acarretar na prescrição, tal argumento não se sustenta. O apelado adotou todas as medidas necessárias para viabilizar a citação pessoal do réu dentro do prazo legal, sendo a demora atribuída ao Poder Judiciário, e não ao autor. Conforme a jurisprudência e o próprio art. 240, §3º, do CPC, a demora processual que não for imputável à parte autora não pode prejudicá-la.

Passo, então, à análise do cálculo dos juros de mora e da correção monetária. A sentença recorrida está em perfeita consonância com o entendimento firmado pelo Tema 942 do STJ, que dispõe que, em ações de cobrança de cheque, a correção monetária deve incidir desde a data de emissão estampada na cártula, e os juros de mora a partir da primeira apresentação do cheque à instituição financeira.

No caso dos autos, a correção monetária foi corretamente aplicada desde a emissão dos cheques, conforme as regras do INPC, e os juros moratórios de 1% ao mês foram devidamente computados a partir da data da primeira apresentação dos títulos, em conformidade com a jurisprudência do STJ.

Dessa forma, conheço do recurso e voto no sentido de NEGAR-LHE PROVIMENTO PARA MANTER A SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU em sua totalidade, não havendo razão para decretação da prescrição e nem para modificar o cálculo dos juros de mora ou da correção monetária, que seguiram os parâmetros legais e jurisprudenciais aplicáveis.

Por fim, majoram-se os honorários advocatícios de sucumbência para 15% do valor da condenação, conforme previsto no art. 85, §11 do CPC, suspensa a sua exigibilidade em razão da concessão da gratuidade de justiça ao apelante.

É como voto.

 

Sala de Sessões, data constante do sistema.

 

PRESIDENTE

 

Adriano Augusto Gomes Borges

Juiz Substituto de 2º Grau - Relator