Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
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DECISÃO MONOCRÁTICA

 

RECURSO INOMINADO. O NOVO REGIMENTO DAS TURMAS RECURSAIS, RESOLUÇÃO Nº 02/2021, ESTABELECEU A COMPETÊNCIA DO RELATOR PARA JULGAR MONOCRATICAMENTE MATÉRIAS COM UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA OU ENTENDIMENTO SEDIMENTADO.AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR OFENSAS E AGRESSÕES À IMAGEM E HONRA NAS REDES SOCIAIS (INSTAGRAM E FACEBOOK). DANO MORAL VERIFICADO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA ACIONADA CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

 
 

A Resolução nº 02, de 10 de fevereiro de 2021, que instituiu o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado da Bahia e da Turma de Uniformização da Jurisprudência, estabeleceu a competência do relator para julgar monocraticamente matérias com uniformização de jurisprudência ou entendimento sedimentado.

 A parte autora ajuizou a presente ação de cobrança alegando “é professora da Rede Municipal de Ensino de Senhor do Bonfim há mais de 25 anos. Afirma que sofreu agressões à sua imagem e honra nas redes sociais (Instagram e Facebook). Aduz que a Requerida, que também é professora da Rede Municipal de Ensino de Senhor do Bonfim, publicou um card contendo a imagem da Autora, juntamente com outras duas servidoras, contendo palavras injuriosas que comprometem sua reputação profissional, além de expô-la perante sua família. Requereu que a Ré retire o card das redes sociais e pagamento de indenização por danos morais”.

Sentença proferida nos seguintes termos:” Em face do exposto, sugiro que seja JULGADO PROCEDENTE EM PARTE OS PEDIDOS para:

a)retirar, de imediato, das redes sociais, a publicação ora combatida, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada ao montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

b) pagar, a título de indenização pelos danos morais sofridos, a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), observando-se que os juros moratórios, de 1% ao mês, devem fluir a partir do evento danoso e a correção monetária, pelo INPC, a partir desta Sentença (art. 398, do CC, e Súmula 54 do STJ)”.

Irresignada, a acionada apresentou recurso inominado, pugnando pela reforma pra total improcedência., subsidiariamente, a redução do valor atribuído a título de dano moral.

Trata-se de litígio que envolve particulares, e que diz respeito a práticas abusivas no contexto de relações profissionais.

Pois bem, a teor do art. 373, I, do NCPC, é da parte autora o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito.

Em sentido contrário, cabe a ao réu a comprovação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do art. 373, II, do CPC.

Analisando as provas produzidas nos autos, conclui-se que a ré, de fato, proferiu as ofensas por meio das redes sociais, notadamente,(Instagram e Facebook, não havendo maiores dúvidas sobre a responsabilidade civil por ofensa à honra da autora, nos termos já confirmados pela sentença de origem.

Idêntica conclusão foi a do juízo de origem: “A parte Acionada acostou contestação no evento nº 20. Alegou que exerce apenas o exercício do seu direito de opinião. Informa que utilizou as redes sociais para manifestar o seu descontentamento com o resultado das negociações salarias para a sua respectiva categoria, ou seja, Professores Municipais de Senhor do Bonfim, sem, contudo, ultrapassar os limites da crítica e da divergência de opiniões acerca das rodadas de diálogos.

Aduz que a mera utilização de expressões como “Traidoras da educação’’ bem como “Incompetência, Perseguição e Humilhação” não são suficientes para afrontar a honra e integridade moral de quem ocupa um cargo público. Nega o dever de indenizar e pugna pela improcedência da ação.

É o relato do essencial.

Vivemos num Estado Democrático de Direito que tem por base fundamental a Constituição Federal de 1988, a qual prevê diversos direitos fundamentais, dentre eles, o direito à liberdade de expressão, invocado pela parte Acionada em sua defesa.

O art. 5º da Constituição Federal, em seu inciso IV, dispõe que: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. O art. 220 do aludido diploma informa que: “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

Não há direito fundamental absoluto. O direito à liberdade de expressão não é absoluto, vez que precisa ser harmonizado com outros direitos fundamentais, tais como os direitos à honra, intimidade e vida privada.

O trabalho de harmonização e ponderação dos direitos fundamentais é exercido, no caso concreto, pelo Poder Judiciário. Desta forma, a presente demanda exige que seja avaliado se o Réu extrapolou o seu direito fundamento à liberdade de expressão e atingiu a honra da parte Autora.

A honra objetiva é o julgamento que a sociedade faz do indivíduo, ou seja, é a imagem que a pessoa possui no seio social, já a honra subjetiva é o conceito que o próprio sujeito tem de si. A violação da honra, seja objetiva ou subjetiva, atinge o indivíduo da mesma forma, qual seja: causando-lhe desconforto e sofrimento moral.

Entendo que, para uma professora, ser acusada de “traidora da educação”, “Judas”, “incompetente”, “perseguidora” é algo que afeta a reputação, atingindo a honra (objetiva e subjetiva). Aliado a isso, a Ré ainda utilizou, sem autorização, a imagem da Autora, desrespeitando mais um direito da personalidade: o direito à imagem.

O Código Civil, por sua vez, classifica o direito de imagem como um direito da personalidade. Em seu artigo 20, o mencionado diploma, dentre outras disposições, veda a exposição ou utilização da imagem de alguém sem permissão, caso o uso indevido atinja sua honra, boa-fama, respeito ou se destine a fins comerciais.

Do print colacionado na exordial, especificamente na página 03, é possível perceber que a conta do Instagram da Ré é/era pública, posto foi possível o acesso de alguém que não faz parte dos seguidores da Ré, o que pode ser concluído “botão” opção de seguir. Isso significa dizer que não é possível mencionar o número de pessoas que tiveram acesso ao card confeccionado pela Ré, o que, a meu ver, agrava o dano devido à extensão.

Outro ponto de destaque é que a Ré é uma educadora, profissão que forma todas as outras profissões, desta forma, na análise no caso concreto, não se pode ponderar, sequer, baixo nível de instrução.

A Ré afirma em sua contestação que “se valeu de uma rede social para manifestar o seu descontentamento com o resultado das negociações salarias para a sua respectiva categoria, ou seja, Professores Municipais de Senhor do Bonfim”. É absolutamente legítima a defesa dos ideais, porém, o bom senso deve ser o norteador da liberdade de expressão. A conduta da Ré é desprovida de razoabilidade, bom senso e ética, devendo ser repudiada.

A violação do direito da personalidade que cause danos a uma pessoa fará com que o agente incorra em responsabilidade civil extracontratual pelo ato ilícito. Ademais, o STJ editou a Súmula 403 à respeito do tema, informando que: “Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.”

Quanto à fixação da indenização a título de danos morais, o juiz deve atender à repercussão econômica do dano e ao porte econômico do causador, de modo que a indenização não seja excessiva a ensejar enriquecimento sem causa, tampouco irrisória em face do porte da demandada a estimular reiteração de conduta ilícita.

Levando-se em conta a extensão do dano, considerando, ainda, o caráter pedagógico e inibitório desta medida, entendo razoável e proporcional a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 5.000.00 (cinco mil reais)”.

Desse modo, considerando as peculiaridades do caso e o fato das ofensas à honra terem sido proferidas em ambiente público, fatos que formam observados por terceiros, a indenização arbitrada na origem, no valor de R$ 5.000,00 está condizente com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como respeitando o caráter pedagógico e punitivo da indenização.

Por essas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença de origem em todos os seus termos, pelos próprios fundamentos. Decisão integrativa nos termos do art. 46 da lei 9.099/95. Custas e honorários em 20% sobre o valor da condenação, com exigibilidade suspensa em razão da gratuidade deferida (evento 39)

Salvador-BA, em 21 de Março de 2023.

Ana Conceição Barbuda Sanches Guimarães Ferreira

Juíza Relatora em Substituição