Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
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5ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO ESTADO DA BAHIA

 

PROCESSO: 0013180-07.2019.8.05.0001

CLASSE: RECURSO INOMINADO

RECORRENTE: LÁZARO MÁRCIO PINTO DOS SANTOS e DANIELA SILVA BRITO

RECORRIDO: OS MESMOS

JUIZ PROLATOR: MAURÍCIO ALBAGLI OLIVEIRA

JUIZ RELATOR: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

 

EMENTA

 

RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS. DIREITO CIVIL. ALEGAÇÃO DE OFENSA À HONRA, PRATICADA POR MEIO DAS REDES SOCIAIS. PROVA DA CONDUTA INADEQUADA, EM INTENSIDADE CAPAZ DE CARACTERIZAR A OFENSA MORAL DA PARTE AUTORA. ILICITUDE CONFIGURADA.  DANOS MORAIS ADEQUADOS, FACE ÀS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS DA DEMANDA. MANUTENÇÃO, NOS SEUS PRÓPRIOS TERMOS, DA SENTENÇA QUE CONDENOU A PARTE RÉ NOS DEVERES DE RETIRADA DOS COMENTÁRIOS OFENSIVOS, E DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E IMPROVIDO. RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO E IMPROVIDO.

 

Dispensado o relatório, nos termos do artigo 46 da Lei Federal 9.099/1995.

 

A parte recorrente se insurge contra a sentença de origem, que teve como parte dispositiva (sic) ¿ ¿Posto isto, julgo parcialmente procedente o pedido para: a. Condenar o(a) Requerido(a) DANIELA SILVA BRITO a, no prazo de 10 (dez) dias, apagar os comentários realizados em desfavor do Requerente LAZARO MARCIO PINTO DOS SANTOS nas suas redes sociais, sob pena do pagamento de multa diária de R$100,00 (cem reais); b. para condenar o(a) Requerido(a) DANIELA SILVA BRITO a pagar ao(à) Requerente LAZARO MARCIO PINTO DOS SANTOS a quantia de  R$1.500,00 (mil e quinhentos reais), a título de danos morais, que deverá ser corrigida monetariamente a partir desta data (Sum. 362 do STJ) e acrescida de juros computados desde o evento danoso. Julgo, por derradeiro, improcedente o pedido contraposto formulado¿.

 

Para tanto, a parte autora afirma ter sido vítima de ofensas à honra, praticadas pela parte ré, por meio do uso das redes sociais. Aduz que manteve relacionamento com a parte ré, por aproximadamente um ano e seis meses, sendo que, desta relação, nasceu uma filha. Relata que, com o fim do relacionamento, arcou com as despesas que pôde, tendo em vista que não aufere renda suficiente para arcar com mais, sem prejuízo de sua própria subsistência. Narra que, mesmo assim, fez o possível para proporcionar um pré-natal digno à sua ex-companheira, então gestante. Acrescenta que, nada obstante, mesmo após todos seus esforços, e apoio financeiro à sua ex-companheira, ela vem denegrindo afrontosamente sua imagem, em suas redes sociais, pois a parte ré, em reiteradas divulgações no site do Facebook, e em seu perfil do Instagram, compartilhou diversas textos denegrindo sua honra, imagem moral e social, com o nítido objetivo de a prejudicar e manchar sua imagem. Por fim, reforça que tentou, junto à Acionada, a resolução administrativa da lide, sem que houvesse qualquer manifestação de interesse da parte ré na resolução de seu problema. Pugnou pela reparação dos danos materiais e morais sofridos.

 

Já a parte ré defende a ausência de conduta ilícita e de responsabilidade civil pelos fatos narrados, não havendo danos a serem reparados, tendo em vista a regularidade jurídica de sua conduta. Ressalta jamais ter praticado os atos a ele atribuídos na inicial. Aduz que todas as provas acostadas ao processo pelo autor são referentes a conversas privadas, onde a parte requerida demonstra imensa preocupação com a sua situação financeira, bem como diante do total desamparo financeiro por parte do requerente, cobrava ao menos que exercesse o seu papel de pai. Acrescenta que nenhuma das fotos foram retiradas de páginas de rede social pública, como alega o autor. Relata ter passado por difícil gestação, parto prematuro, relação não amistosa entre as partes litigantes, inclusive, com a família do autor, face a conduta desidiosa deste em relação a sua filha. Narra, ainda, que apenas diante da possibilidade de prisão civil por dívida alimentar, o autor contratou serviços advocatícios, apresentando sua defesa após sete meses do início da ação de alimentos gravídicos, tendo em vista que se manteve inerte desde a fase inicial até a fase do processo de execução. Conclui, ao final, que apenas investia em tentativas amigáveis de cobrança de alimento para mantença da sua prole. No mais, refuta a pretensão reparatória formulada. Afirma, ainda, não ter agido de forma a ocasionar danos à demandante. Pugnou, ao final, pela improcedência da demanda.

 

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma.

 

VOTO

 

A sentença recorrida, tendo analisado corretamente os aspectos fundamentais do litígio, merece confirmação integral, não carecendo, assim, de qualquer reparo ou complemento dentro dos limites traçados pelas razões recursais, culminando o julgamento do recurso com a aplicação da regra inserta na parte final do art. 46 da Lei Federal 9.099/1995, que exclui a necessidade de emissão de novo conteúdo decisório para a solução da lide, ante a integração dos próprios e jurídicos fundamentos da sentença guerreada.

 

A título de ilustração apenas, e para realçar o feliz desfecho encontrado para a contenda no primeiro grau, alonga-se na fundamentação do julgamento, e, dessa forma, no mérito recursal, a hipótese é de manutenção da sentença impugnada, nos seus próprios termos, e por seus próprios fundamentos.

 

Isto porque, da análise das provas produzidas, verifica-se que a parte autora demonstrou a verossimilhança de suas alegações (que teve atributos de sua personalidade ofendidos, em razão de conduta voluntariamente adotada pela parte ré, causando-lhe prejuízos devidamente respaldados e contabilizados a partir dos fatos e provas processuais, e violando o princípio da boa-fé objetiva, tendo a parte ré se negado a reparar a ilicitude administrativamente, forçando-a à demanda judicial, pois no caso dos autos, forçoso se faz reconhecer que há elementos contundentes capazes de macular a honra, reputação e imagem da parte autora, atributos de sua personalidade, já que, da instrução processual e provas documentais, é possível extrair elementos suficientes a embasar um juízo de certeza a respeito de que a parte acionada efetivamente utilizou-se de rede social para imputar condutas desonrosas ao Acionante, notadamente quanto à sua condição de pai; Inclusive, a Ré confessou em sua defesa ter irrogado tais ofensas, contudo, argumentou tê-las tecido em ambiente privado; A despeito de muitos diálogos terem ocorrido por meio de WhatsApp, o Autor juntou prints de Stories do Instagram da Ré, já no evento processual 1, nos quais o conteúdo ofensivo ganhou visibilidade pública, além de comentário feito em foto, quando o Autor estava com grupo religioso, também com expressões ofensivas em seu desfavor; Outrossim, também se juntou aos autos outro print de Stories do Instagram da Requerida, com a veiculação de matéria intitulada ¿Ostentação nas redes sociais vira prova na Justiça contra caloteiros¿, com os dizeres ¿é mal caráter que chama, né? Principalmente quando se deve um valor tão irrisório¿; Neste diapasão, a Requerida, ao invés de se valer dos meios legais existentes e cabíveis para a satisfação dos alimentos que sua filha fazia jus, inclusive os gravídicos, preferiu desbordar os limites do exercício regular do seu direito, realizando postagens ofensivas em desfavor do Requerente, expondo-o, de modo indevido, em ambiente da alta publicidade; Ou seja, inequívocas as agressões suscitadas pelo Acionante; Muito embora não se ignore os eventuais incômodos  suportado pela Ré durante sua gestação, em relação as necessidades de sua filha e a grande animosidade existente entre as partes litigantes, sua liberdade de expressão não pode violar outros direitos também constitucionais do Demandante e não menos relevantes, tais quais, honra, imagem, dignidade; No caso vertente, não há dúvida de que os fatos apontados na exordial geraram sofrimento, dor e angústia ao Acionante, e, dessa forma, a documentação trazida pela parte autora faz prova contundente de suas assertivas, de forma que inexistem, nos autos, provas capazes de desfazer a presunção formada a partir dos indícios de verossimilhança trazidos pela parte autora, e, assim, na situação concreta, a conduta in concreto da parte ré se revela como prática de ato ilícito, nos termos do art. 186 do Código Civil brasileiro, permitindo-se concluir pelo consequente dever de reparação dos danos causados à parte autora, conforme determina o art. 927, também do CC), enquanto a parte ré falhou em trazer ao processo elementos mínimos de convicção de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do pleito autoral, ou da absoluta impossibilidade de ser responsabilizada pelos danos resultantes da violação a este direito (uma vez que sua resposta processual não trouxe aos autos fundamentos jurídicos válidos para legitimar a conduta por ela adotada, configurando o ato ilícito, pois a parte ré não apresentou suficientes elementos de convicção, capazes de demonstrar que os fatos utilizados na demonstração de verossimilhança dos pleitos autorais deveriam possuir interpretação diversa, e, dessa forma, as alegações da parte autora hão de ser tidas como verossímeis, na medida em que não foram elididas por prova idônea).

 

O dano moral, na hipótese, encontra recepção no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal, e repercussão no art. 186, do Código Civil. Nestes termos, o dano eminentemente moral, sem consequência patrimonial, não há como ser provado, nem se investiga a respeito do animus do ofensor. Consistindo em lesão de bem personalíssimo, de caráter subjetivo, satisfaz-se a ordem jurídica com a demonstração do fato que o ensejou. Ele existe simplesmente pela conduta ofensiva, e dela é presumido, sendo o suficiente para autorizar a compensação indenizatória.

 

Na situação em exame, a parte autora não precisava fazer prova da ocorrência efetiva dos danos morais relacionados aos fatos apurados. Os danos dessa natureza se presumem pelo descaso do ofensor em solucionar o problema, não havendo como negar que ela se desgastou emocionalmente, sofrendo frustração pela aquisição do serviço, angústia e aborrecimento na busca de uma solução sem êxito administrativo, tendo a esfera íntima agredida ante a atividade negligente do ex adverso.

 

Quanto ao valor da reparação, este deve ser arbitrado observando o binômio razoabilidade e proporcionalidade e respeitando o caráter reparatório e inibitório punitivo da condenação, que deve trazer compensação indireta ao sofrimento do ofendido e incutir certo temor no ofensor para que não dê mais causa a eventos semelhantes.

 

Assim, nos termos em que a lide foi apresentada a julgamento, não se pode censurar as conclusões contidas na sentença recorrida, e, portanto, torna-se inafastável o reconhecimento da responsabilidade civil da parte ré, em todos os efeitos declarados na sentença impugnada, inclusive de ofensa ao patrimônio moral da parte autora, cuja incidência se dá in re ipsa em casos como este, limitada apenas pelo postulado da proporcionalidade.

 

Quanto ao valor da reparação, não se distanciando muito das lições jurisprudenciais, deve ser prestigiado o arbitramento do juiz de primeiro grau que, próximo dos fatos, pautado pelo bom senso e atentando para o binômio razoabilidade e proporcionalidade, estabelece quantia que traz compensação indireta ao sofrimento do ofendido e inibe a reiteração do evento ilícito pelo ofensor.

 

In casu, o Juízo a quo respeitou as balizas assinaladas acima, tendo fixado indenização em valor moderado, que, assim, não caracteriza enriquecimento sem causa da parte autora, e não provoca abalo financeiro à parte ré, face ao seu potencial econômico.

 

Por isso, voto por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso da parte autora, e por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso da parte ré, para MANTER a sentença impugnada, por seus próprios fundamentos, e nos seus próprios termos. Sem condenação das partes recorrentes ao pagamento das despesas processuais, porque esta Turma Recursal tem reconhecido esta impossibilidade, quando a sucumbência atinge os beneficiários de gratuidade judiciária.

    

Salvador, Sala das Sessões, em 13 de outubro de 2020.

     

ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

Relatoria e Presidência

 


COJE ¿ COORDENAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS

TURMAS RECURSAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

 

PROCESSO: 0013180-07.2019.8.05.0001

CLASSE: RECURSO INOMINADO

RECORRENTE: LÁZARO MÁRCIO PINTO DOS SANTOS e DANIELA SILVA BRITO

RECORRIDO: OS MESMOS

JUIZ PROLATOR: MAURÍCIO ALBAGLI OLIVEIRA

JUIZ RELATOR: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

 

EMENTA

 

RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS. DIREITO CIVIL. ALEGAÇÃO DE OFENSA À HONRA, PRATICADA POR MEIO DAS REDES SOCIAIS. PROVA DA CONDUTA INADEQUADA, EM INTENSIDADE CAPAZ DE CARACTERIZAR A OFENSA MORAL DA PARTE AUTORA. ILICITUDE CONFIGURADA.  DANOS MORAIS ADEQUADOS, FACE ÀS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS DA DEMANDA. MANUTENÇÃO, NOS SEUS PRÓPRIOS TERMOS, DA SENTENÇA QUE CONDENOU A PARTE RÉ NOS DEVERES DE RETIRADA DOS COMENTÁRIOS OFENSIVOS, E DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E IMPROVIDO. RECURSO DA PARTE RÉ CONHECIDO E IMPROVIDO.

 

ACÓRDÃO

 

Realizado o Julgamento pela 5ª TURMA RECURSAL CÍVEL, CONSUMIDOR, TRÂNSITO E CRIMINAL, composta dos Juízes de Direito ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA, MARIAH MEIRELLES DE FONSECA e ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA, decidiu-se, à unanimidade de votos, por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso da parte autora, e por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso da parte ré, para MANTER a sentença impugnada, por seus próprios fundamentos, e nos seus próprios termos. Sem condenação das partes recorrentes ao pagamento das despesas processuais, porque esta Turma Recursal tem reconhecido esta impossibilidade, quando a sucumbência atinge os beneficiários de gratuidade judiciária.

    

Salvador, Sala das Sessões, em 13 de outubro de 2020.

    

ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

Relatoria e Presidência