Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
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DECISÃO MONOCRÁTICA
 

RECURSO INOMINADO. O NOVO REGIMENTO DAS TURMAS RECURSAIS, RESOLUÇÃO Nº 02/2021, ESTABELECEU A COMPETÊNCIA DO RELATOR PARA JULGAR MONOCRATICAMENTE MATÉRIAS COM UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA OU ENTENDIMENTO SEDIMENTADO. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. COMPROVAÇÃO DE FATOS CONSTITUTIVOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FATOS IMPEDITIVOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA ACIONADA CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

 
 

A Resolução nº 02, de 10 de fevereiro de 2021, que instituiu o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado da Bahia e da Turma de Uniformização da Jurisprudência, estabeleceu a competência do relator para julgar monocraticamente matérias com uniformização de jurisprudência ou entendimento sedimentado.

WASHINGTON LUIS ALMEIDA CASTRO

 ajuizou AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS em face de BANCO BRADESCO S.A.

, alegando, em síntese que: “é titular de conta bancária junto à acionada, tendo sido surpreendido com transferência bancária indevida, praticada através de coação. Aduz que realizou provocação administrativa logo após as transferências, sem sucesso

”.

Em contestação, a ré alegou ausência de ato ilícito, pugnando pela total improcedência da demanda.

Sentença proferida nos seguintes termos: “Posto isto, e por mais que consta dos autos, nos termos do Art. 6° da lei n° 9.099/95 c/c Art. 487, I, do CPC, JULGO, POR SENTENÇA, PROCEDENTE, EM PARTE, a ação, para:

a) Condenar a acionada, a reembolsar a parte autora no montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), de forma simples, podendo a acionada abater o montante já reembolsado à parte autora referente às transações objeto da lide, corrigido monetariamente (INPC) da data do desembolso, e incidência de juros de 1% a.m. da citação. Frise-se

b) Condeno ainda a parte acionada, a título de danos morais no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) com juros e correção monetária, estipulando o termo inicial da aplicação dos juros a partir do arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ.

 
.”

Irresignada, a acionada apresentou recurso inominado, pugnando pela reforma pra total improcedência (evento 42).

Preliminares já devidamente analisadas e rejeitadas pelo juízo de origem, mantenho a decisão

Entende o STJ que, em se tratando de produção de provas, a inversão, em caso de relação de consumo, não é automática, cabendo ao magistrado a apreciação dos aspectos de verossimilhança da alegação do consumidor ou de sua hipossuficiência, conforme estabelece o art. 6º, VIII, do referido diploma legal.

Pois bem, a teor do art. 373, I, do NCPC, é da parte autora o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito. E, mesmo que se considere como sendo de consumo a relação em discussão, a ser amparada pelo Código de Defesa do Consumidor, a inversão do ônus da prova em benefício do consumidor somente deve ser determinada, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele - o consumidor - hipossuficiente (art. 6º, VIII do CDC).

Em sentido contrário, cabe ao fornecedor do serviço a comprovação de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do art. 373, II, do CPC, ou mesmo a ausência de falha na prestação do serviço e culpa exclusiva de terceiro, nos termos do art. 14 §3 do CDC.

Compulsando os autos, verifica-se que assiste razão à parte autora, tendo em vista as provas colacionadas no ev.01 evidenciam que o vício no produto, denotando assim falha na prestação do serviço da empresa ré.

Assim considerou a sentença de origem: “ Da minuciosamente análise dos autos, verifico que a parte autora acostou documentos diversos que corroboram a versão apresentada na exordial. A acionada, por sua vez, não logrou se desincumbir de provar o que foi alegado, não tendo produzido prova acerca da efetiva atuação para evitar a efetivação da fraude sofrida pelo consumidor, encargo processual este que não representa qualquer espécie de óbice à sua defesa em juízo, uma vez que guarda relação direta com seu objeto.

Em sentido contrário o autor traz aos autos extensa provocação administrativa no intuito de informar a acionada acerca da movimentação indevida de sua conta, tentando assim reverter a transferência.

 Nesse contexto, embora a ré adote a tese no sentido da segurança do sistema, é de se observar que, ainda, assim, não há a eliminação por completo do risco inerente à atividade em questão.

 Cabia ao réu o ônus probatório, colacionando aos autos as provas de que, efetivamente, teria utilizado de seus mecanismos internos para reversão da operação. Deste ônus, quedou-se inerte a acionada.

 

AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. CONSUMIDOR. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS FINANCEIROS. Ação de indenização fundada em defeito dos serviços bancários. Autora que foi vítima de golpe do PIX. Primeiro, reconhece-se a falha da instituição financeira em que a autora mantinha sua conta corrente. Assim que realizou a transferência bancária e notou o golpe, a autora entrou em contato com o banco destinatário (BRB Banco de Brasília S/A) para buscar o bloqueio da quantia. Naquele momento, terminou informada de que o bloqueio seria possível pela instituição que operacionalizou a transferência – em que a autora mantinha sua conta – PAGSEGURO. E, apesar do pedido da autora, PAGSEGURO e BRB BANCO DE BRASÍLIA agiram de forma ineficiente, um atribuindo ao outro o início do bloqueio, o que redundou na ineficácia da tentativa de consumação do golpe. Esses fatos (incontroversos), eram fundamentos bastante para responsabilização dos réus. E segundo, tem-se que o BRB BANCO DE BRASÍLIA não adotou cautelas para abertura da conta corrente que serviu de instrumento para fraude via PIX, deixando de trazer para os autos prova de ação em conformidade com recomendações do BACEN, em especial confirmação do endereço. Violação do regulamento do PIX (art. 39, 88 e 89) na parte das cautelas e riscos das operações via PIX. Aplicação da Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça. Ressarcimento dos danos materiais no valor de R$ 1.500,00. Danos morais configurados. Montante indenizatório fixado em R$ 8.000,00, que atenderá as funções compensatória e inibitória. Precedentes da Turma julgadora e do TJSP. Ação julgada parcialmente procedente em segundo grau. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

 

(TJ-SP - AC: 10505845920218260506 SP 1050584-59.2021.8.26.0506, Relator: Alexandre David Malfatti, Data de Julgamento: 22/11/2022, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/11/2022)

 

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. GOLPE. AUTOR QUE AUTORIZA DISPOSITIVO ALHEIO PARA MOVIMENTAR CONTA BANCÁRIA. TRANSAÇÃO VIA PIX EM VALOR MANIFESTAMENTE ATÍPICO EM RELAÇÃO AO PADRÃO DE CONSUMO DO CORRENTISTA. COMPROVAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA CEF PELO OCORRIDO. DEVER DE SEGURANÇA E RISCO DO EMPREENDIMENTO. RESOLUÇÕES DO BANCO CENTRAL E PRECEDENTES QUE CORROBORAM ALEGAÇÕES DO AUTOR. DANOS MATERIAIS CARACTERIZADOS. INOCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Caso em que a parte autora, após receber mensagem de texto informando compras suspeitas na sua conta bancária, acessa o link enviado por fraudadores e, posteriormente, autoriza dispositivo alheio em caixa eletrônico de agência do banco réu. Caracterização de golpe por meio de "smishing". 2. Após validação do dispositivo de terceiro, ocorre transação via Pix em valor que foge, manifestamente, ao padrão de consumo do correntista, conforme comprovado pelo autor por meio de extratos bancários de período superior a doze meses anteriores ao golpe. 3. Embora o autor tenha corroborado para a perpetração do golpe, a CEF não se desincumbiu do dever de segurança e do risco inerente ao empreendimento, na medida em que permitiu a movimentação atípica. 4. Responsabilidade objetiva da instituição financeira e danos materiais caracterizados. Dispositivos da Resolução BCB n. 1, de 12/08/2020, e precedentes que corroboram alegações do autor. 5. Inexistem, por outro lado, danos morais no caso. 6. Recurso do autor parcialmente provido.

 

(TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50074615520214047209 SC, Relator: GILSON JACOBSEN, Data de Julgamento: 22/03/2023, TERCEIRA TURMA RECURSAL DE SC)

Destaque-se, neste ponto, que uma vez que se está diante de atividade de risco, com a qual as demandadas auferem lucro, o que, portanto, demandaria a adoção de cautela para fornecer ao consumidor um serviço com a segurança que legitimamente dele se espera.

Neste sentido verifica-se que as operações bancárias foram realizadas em reduzido espaço temporal e em quantia vultuosa, não tendo a demandada acionada qualquer mecanismo de segurança, embora as atividades tenham sido realizadas em dia não útil, reduzido intervalo entre as operações e utilizando-se de limite da conta do autor.

Frise-se que a parte acionada, ainda que parcialmente, atuou de forma efetiva para evitar o prejuízo sofrido pelo autor.

A condenação em danos morais não deve ser apenas suficiente para amenizar o sofrimento da vítima, mas principalmente para dissuadir a demandada a praticar novo ilícito perante o reclamante ou outros consumidores. Assim, tem a requerente direito à indenização por danos morais reclamada, que há de ser fixada observando o princípio da razoabilidade e proporcionalidade (art. 8º, CPC), evitando-se o enriquecimento sem causa.

 

Na fixação da indenização a esse título, a lei não estabelece ou fixa um parâmetro previamente definido para se apurar o seu valor. Recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, analisando-se: a) o grau de reprovabilidade da conduta ilícita; b) a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima; c) a capacidade econômica do causador do dano; e d) as condições pessoais do ofendido.

 

Sopesadas essas variantes, condeno o acionado ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 2.000,00 (dois mil reais), quantia esta que, ao longo dos anos, tem cumprido a natureza dúplice do instituto, que é a punição do infrator e a reparação do dano.

Quanto ao pleito de restabelecimento do limite de crédito, anteriormente contratado, entendo ser improcedente o pedido. Não cabe ao judiciário interferir nos procedimentos internos de análises de crédito da instituição financeira, tampouco obrigá-la a realizar contratos ou conceder crédito, motivo pelo qual não há como deferir-lhe o pleito”.

Assim, entendo que não houve prova satisfatória de fato impeditivo do direito do autor, nos termos do art. 373 II do CPC e art. 14 §3 do CDC.

Em relação ao dano moral, via de regra, entende-se que questões meramente patrimonias não dão causa a indenização extrapatrimonial.

Todavia, no presente caso, aplica-se a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor, elaborada pelo jurista Marcos Dessaune, e já encampada pelo STJ (precedentes: REsp nº 1.634.851/RJ; Agravo em REsp nº 1.241.259/SP; Agravo em REsp nº 1.132.385/SP; e Agravo em REsp nº 1.260.458/SP), segundo a qual ficaram caracterizados o ato ilícito e o consequente dever de indenizar, em razão de todo tempo desperdiçado pelo consumidor para a solução de problemas gerados pelos próprios (maus) fornecedores.

Desse modo, considerando as peculiaridades do caso e todo o tempo útil que o consumidor teve que despender para resolução de um simples caso como esse, a indenização arbitrada na origem, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), está condizente com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, bem como respeitando o caráter pedagógico e punitivo da indenização.

Por essas razões, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença de origem em todos os seus termos, pelos próprios fundamentos. Decisão integrativa nos termos do art. 46 da lei 9.099/95. Custas e honorários em 20% sobre o valor da condenação.

 
Salvador-BA, em 26 de Julho de 2024

ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

Relatoria
Presidência