Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUARTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460




Ação:
Procedimento do Juizado Especial Cível
Recurso nº 0236481-57.2023.8.05.0001
Processo nº 0236481-57.2023.8.05.0001
Recorrente(s):
JAIRO DINIZ DE SANTANA

Recorrido(s):
BANCO DO BRASIL SA



 

 

DECISÃO MONOCRÁTICA

 

RECURSO INOMINADO. PRESSUPOSTOS RECURSAIS ATENDIDOS. DEMANDAS REPETITIVAS. ART. 15, INC. XI, RESOLUÇÃO N° 02/2021 DO TJ/BA. DIREITO DO CONSUMIDOR.RECURSO INOMINADO DA PARTE AUTORA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO CUMULADO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. ABUSIVIDADE DOS JUROS NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE LIMITAÇÃO ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NA COBRANÇA DE JUROS, NA ESTEIRA DO ENTENDIMENTO ESPOSADO POR ESTE COLEGIADO E DO STJ (AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL: AGRG NO RESP 970082 RS 2007/0143110-0).O CONTRATO FIRMADO PELA PARTE AUTORA TEVE TAXA DE PRÓXIMA À MÉDIA MENSAL PARA TAIS OPERAÇÕES DE CRÉDITO, OU SEJA, INFERIOR A TAXA PRATICADA POR INÚMERAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, AINDA QUE SUPERE O PATAMAR DE OUTRAS. POSTERIORMENTE À EDIÇÃO DA MP 1963/2000 É POSSÍVEL A INCIDÊNCIA DE CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS, DESDE QUE EXPRESSAMENTE PACTUADA. DANO MORAL. INOCORRENTE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE VIOLAÇÃO A ESFERA EXTRAPATRIMONIAL DA PARTE AUTORA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

 

 

Vistos, etc…

 

A Resolução nº 02, de 10 de fevereiro de 2021, que instituiu o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado da Bahia e da Turma de Uniformização da Jurisprudência, estabeleceu a competência do relator para julgar monocraticamente matérias com uniformização de jurisprudência ou entendimento sedimentado. É o caso dos autos, conforme se infere da leitura da Súmula 28 da Turma de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais do Estado da Bahia:

 

Sumula nº 28 - Na linha da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o fato de a taxa contratada de juros remuneratórios estar acima da taxa média de mercado, por si só, não configura abusividade (AgInt no AREsp n. 2.093.714/MS).

 

Cuida-se de ação de revisão de contrato aviada por mutuário almejando a revisão dos encargos do contrato de EMPRÉSTIMO que celebrara com instituição integrante do sistema financeiro nacional, sob o argumento da abusividade a ensejar excessiva onerosidade ao consumidor, bem como a condenação da parte ré à compensação de valores.

A ré, em sua contestação, suscita preliminares de incompetência absoluta e impugnação à assistência judiciária gratuita. No mérito, defende a legalidade dos juros pactuados, refutando a pretensão indenizatória formulada.

Após regular instrução, sobreveio sentença improcedência.

Inconformada, a parte autora requer a reforma do julgado, para que a ré seja condenada a revisar os juros estipulados, declarar a abusividade de taxas, bem como indenizar pelos danos morais sofridos.

Sabe-se que a limitação de juros ao dobro da taxa legal não se aplica às instituições financeiras, consoante entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal, inserido na Súmula 596, segundo a qual as disposições do decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o sistema financeiro nacional.

O STJ, entretanto, em sede de julgamento de recurso repetitivo, ao analisar o Resp 1061530-RS, estabeleceu que as taxas de juros cobradas nos contratos de empréstimo bancário somente serão consideradas abusivas, e, portanto, nulas, quando se verificar fixação em patamar dissonante da média de mercado. Confira-se a ementa do julgado:

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO R E P E T I T I V O. J U R O S R E M U N E R A T Ó R I O S. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO Constatada a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, foi instaurado o incidente de processo repetitivo referente aos contratos bancários subordinados ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da ADI n.º 2.591-1. Exceto: cédulas de crédito rural, industrial, bancária e comercial; contratos celebrados por cooperativas de crédito; contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, bem como os de crédito consignado. Para os efeitos do § 7º do art. 543-C do CPC, a questão de direito idêntica, além de estar selecionada na decisão que instaurou o incidente de processo repetitivo, deve ter sido expressamente debatida no acórdão recorrido e nas razões do recurso especial, preenchendo todos os requisitos de admissibilidade. Neste julgamento, os requisitos específicos do incidente foram verificados quanto às seguintes questões: i) juros remuneratórios; ii) configuração da mora; iii) juros moratórios; iv) inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes e v) disposições de ofício. PRELIMINAR O Parecer do MPF opinou pela suspensão do recurso até o julgamento definitivo da ADI 2.316/DF. Preliminar rejeitada ante a presunção de constitucionalidade do art. 5º da MP n.º 1.963-17/00, reeditada sob o n.º 2.170-36/01. I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. ORIENTAÇÃO2 - CONFIGURAÇÃO DA MORA a) O reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descarateriza a mora; b) Não descaracteriza a mora o ajuizamento isolado de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. ORIENTAÇÃO 3 - JUROS MORATÓRIOS Nos contratos bancários, não-regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção. ORIENTAÇÃO 5 - DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO É vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Vencidos quanto a esta matéria a Min. Relatora e o Min. Luis Felipe Salomão. II - JULGAMENTO DO RECURSO REPRESENTATIVO (REsp 1.061.530/RS) A menção a artigo de lei, sem a demonstração das razões de inconformidade, impõe o não-conhecimento do recurso especial, em razão da sua deficiente fundamentação. Incidência da Súmula 284/STF. O recurso especial não constitui via adequada para o exame de temas constitucionais, sob pena de usurpação da competência do STF. Devem ser decotadas as disposições de ofício realizadas pelo acórdão recorrido. Os juros remuneratórios contratados encontram-se no limite que esta Corte tem considerado razoável e, sob a ótica do Direito do Consumidor, não merecem ser revistos, porquanto não demonstrada a onerosidade excessiva na hipótese. Verificada a cobrança de encargo abusivo no período da normalidade contratual, resta descaracterizada a mora do devedor. Afastada a mora: i) é ilegal o envio de dados do consumidor para quaisquer cadastros de inadimplência; ii) deve o consumidor permanecer na posse do bem alienado fiduciariamente e iii) não se admite o protesto do título representativo da dívida. Não há qualquer vedação legal à efetivação de depósitos parciais, segundo o que a parte entende devido. Não se conhece do recurso quanto à comissão de permanência, pois deficiente o fundamento no tocante à alínea "a" do permissivo constitucional e também pelo fato de o dissídio jurisprudencial não ter sido comprovado, mediante a realização do cotejo entre os julgados tidos como divergentes. Vencidos quanto ao conhecimento do recurso a Min. Relatora e o Min. Carlos Fernando Mathias. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, como pactuados, e ainda decotar do julgamento as disposições de ofício. Ônus sucumbenciais redistribuídos.(REsp 1061530/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009 - grifo nosso)

 

À guisa dessas percepções, no caso em testilha, todavia, observa-se que a taxa de juros mensais estipulada no contrato objeto da lide é de 5,57% ao mês enquanto a média do mercado tem variação dentro do mesmo patamar (5,37%), conforme consulta do sítio do BACENhttps://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/legado?url=https:%2F%2Fwww.bcb.gov.br%2Fhtms%2Fopercredito%2FConsolidados.asp. Conforme bem salientou o magistrado a quo: “Conforme documentos juntados, nos eventos nº 1 e 12, percebe-se que o autor contratou empréstimo na modalidade Crédito Direto ao Consumidor, em 20 de junho de 2022, no valor total de R$ 513,63 (quinhentos e treze reais e sessenta e três centavos), a ser pago em 60 parcelas de R$ 29,77 (-).Tomando como base os referidos dados, verifica-se que a taxa de juros mensal aplicada no contrato foi de 5,57%, (https://www3.bcb.gov.br/CALCIDADAO/publico/calcularFinanciamentoPrestacoesFixas.do , acesso em 24/2/2024).Assim, tomando-se em referência a taxa média divulgada para tal operação no período (Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado, vislumbra-se que o percentual correspondente à taxa média do mercado à época da contratação (JUNHO DE 2022) foi de 5,37.(https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores ACESSO EM 24/2/2024)É entendimento sedimentado no STJ que a taxa média de mercado é um valioso referencial para aferir se os juros contratados são abusivos, ou não. Contudo, não é um parâmetro único a ser aplicado em todos os contratos. É, sim, um importante critério para se verificar se as taxas de juros aplicados em contratos são excessivas ou não. Assim, a taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Desse modo, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.Nesse diapasão, a jurisprudência do Corte Superior, tem considerado abusivas taxas superiores, ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.”

Desse modo, não discrepa daquelas praticadas por outras instituições bancárias em contratos de mesma espécie no período, uma vez que a média de taxa de juros mensais ali descrita é de ou seja, superior a taxa fixado no contrato impugnado.

Vale dizer, dentro da liberdade das instituições financeiras em fixar as taxas de juros aplicadas nos contratos de empréstimos que firmam, visto não se sujeitarem à limitação de taxas de juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura, não se vislumbra a alegada abusividade das taxas fixadas no contrato em tela, uma vez que referidos percentuais encontram-se dentro de um patamar razoável quando confrontadas com taxas de juros praticadas por outras instituições no período, conforme dados extraídos do BACEN (http://www.bcb.gov.br/pt-br/#!/c/TXJUROS/).

Por fim, não vislumbro ofensa a direito da personalidade da parte autora, de modo que não subsistem argumentos aptos a embasarem a indenização por dano moral.

Ante o exposto, nos termos do art. 15, inc. XI, do Regimento Interno das Turmas Recursais, NEGO PROVIMENTO ao recurso inominado para manter a sentença por seus próprios fundamentos.

Custas e honorários advocatícios pela recorrente vencida, os últimos arbitrados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, cuja exigibilidade resta temporariamente suspensa em razão da mesma gozar da gratuidade da justiça.

Em havendo embargos de declaração, as partes ficam, desde já, cientes de que "quando manifestamente protelatórios os embargos de declaração, o juiz ou o tribunal, em decisão fundamentada, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a dois por cento sobre o valor atualizado da causa", nos termos do § 2°, art. 1.026, CPC.

 

Em não havendo mais recursos, após o decurso dos prazos recursais, deverá a Secretaria das Turmas Recursais certificar o trânsito em julgado e promover a baixa dos autos ao MM. Juízo de origem.

 

 

 

Salvador/BA, data registrada no sistema.

 

 

MARTHA CAVALCANTI SILVA DE OLIVEIRA

JUÍZA DE DIREITO RELATORA