Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460

 



Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível
Recurso nº 0001093-95.2024.8.05.0113
Processo nº 0001093-95.2024.8.05.0113
Recorrente(s):
AIRBNB PLATAFORMA DIGITAL LTDA

Recorrido(s):
JULIANA BRANDAO DE SOUZA


RECURSO INOMINADO. JUIZADOS ESPECIAIS. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932 DO CPC). DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATAÇÃO DE HOSPEDAGEM. HOSPEDAGEM SOLICITADA PELO SITE DA RÉ. AMBIENTE INSALUBRE. FOTOS ACOSTADAS AOS AUTOS. PROPAGANDA ENGANOSA CONFIGURADA. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. APLICAÇÃO DAS NORMAS CONSUMERISTAS. ARTIGO 14 DO CDC. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. SITUAÇÃO QUE SUPEROU OS LIMITES DO MERO TRANSTORNO E/OU ABORRECIMENTO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS E ARBITRADOS COM RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO NÃO PROVIDO. 

 

 

DECISÃO MONOCRÁTICA

Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré em face da r. sentença prolatada nos autos do processo em epígrafe. 

Em síntese, a parte autora alega propaganda enganosa nas fotos divulgadas no site da Acionada quanto ao serviço de hospedagem.

O Juízo a quo, em sentença (Ev. 16), julgou nos seguintes termos: “PARCIALMENTE PROCEDENTES, os pedidos iniciais, para condenar a Acionada a: 1 - INDENIZAR a Autora, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de danos morais, acrescidos de correção monetária pelo INPC a partir desta decisão (arbitramento), conforme Súmula n. 362 do STJ e juros de mora de um por cento ao mês, a partir da citação.”

Irresignada, a parte acionada interpôs recurso inominado (ev. 21).

É o breve relatório, ainda que dispensado pelo artigo 38 da Lei Nº 9.099/95 e Enunciado nº 162 do FONAJE.

 

  

DECIDO

O artigo 15 do novo Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução nº 02/2021 do TJBA), em seu inciso XI, estabelece a competência do relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo colegiado ou já com uniformização de jurisprudência, em consonância com o permissivo do artigo 932 do Código de Processo Civil. 

Conheço do(s) recurso(s) interposto, porquanto preenchidos os seus pressupostos de admissibilidade. 

No que pertine à preliminar recursal de ilegitimidade passiva, rejeito-a, porquanto, com arrimo na teoria da asserção, a legitimidade ad causam deve ser aferida em abstrato, com esteio nas alegações lançadas na exordial. Ademais, a jurisprudência do STJ perfilha-se no sentido da “responsabilidade solidária de toda a cadeia de fornecimento pela garantia de qualidade e adequação do produto perante o consumidor”. (AgInt no AREsp 1183072/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 02/10/2018, DJe 16/10/2018). Portanto, tendo em vista que a relação contratual foi firmada no site da Ré, não há que se falar em ilegitimidade passiva. Rejeito.

Passemos ao mérito.

Consoante exigência da Redação do inciso XI e XII do art. 15 alterada pela Resolução nº 20/2023, do Regimento Interno das turmas recursais dos juizados especiais cíveis, criminais e da fazenda pública do estado da Bahia, Resolução Nº 02/2021, observa-se que a matéria já se encontra sedimentada na jurisprudência do Tribunal de Justiça da Bahia. Precedentes: 0111662-82.2022.8.05.0001; 0111662-82.2022.8.05.0001; 00602958720208050001; 0164592-82.2019.8.05.0001; 0000910-97.2021.8.05.0059, 0001829-84.2022.8.05.0113, 0001931-59.2021.8.05.0043 e 0136607-70.2021.8.05.0001.

Adentrando na análise do mérito recursal, entendo que merece manutenção a decisão do juízo de origem.

Narra a parte autora, em síntese, que reservou um flat pelo site da AIRBNB, mas enfrentou uma série de problemas durante sua estadia: atraso no check-in devido à limpeza em andamento, piscina com pouca água, falta de energia no apartamento e falha no ar condicionado. Após tentativas de solução com o administrador do flat, a família precisou se alojar em outro local, perdendo oportunidades de passeio. Por essa razão, requer indenização por danos morais.

Em sua defesa, o Acionado suscitou preliminarmente ausência de mínimo lastro probatório e a sua ilegitimidade passiva. No mérito, defendeu a legalidade de sua conduta, asseverando que a responsabilidade é única e exclusiva do Anfitrião quanto aos seus anúncios e acomodações. Ao final, pugnou pela improcedência da demanda em questão.

Insculpida no art. 373, I e II do NCPC, compete ao autor comprovar fatos constitutivos do seu direito e ao réu os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.

A documentação acostada com a inicial que a parte autora exibiu prova acerca da falha na prestação de serviços da parte ré, pois demonstrada a grande diferença entre as fotos apresentadas pela Ré e o local da hospedagem (ev. 1.8 e 1.9), além disso comprova ter entrado em contato com a Ré informando as condições da hospedagem (Ev. 1.7)

Conforme bem analisado pelo juízo a quo, o réu não comprova fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, sendo ônus do réu a prova, na forma do art. 373, II, do CPC.

Nessa diapasão, indubitável a configuração de descumprimento da oferta em razão de uma grave infringência ao Dever de Informação (art. 6º, III do CDC).

Segundo o art. 14, do CDC, o prestador do serviço responde, independentemente da existência de culpa, pelos defeitos na prestação do serviço. Aquele que lucra com o negócio não pode se furtar à responsabilização pelo prejuízo, deixando o consumidor prejudicado sem qualquer proteção.

Salienta-se que a Ré não trouxe aos autos quaisquer fatos ou fundamentos capazes de atrair a aplicação das excludentes de responsabilidade civil cristalizadas no artigo 14, §3º do Código de Defesa do Consumidor.

A fragilidade das razões do acionado demonstra e corrobora a veracidade dos fatos apresentados na exordial, e, em consequência, restou evidenciado o ato ilícito praticado pela recorrida.

No caso em análise restou caracterizado o dano moral, haja vista que a parte autora sofreu danos em razão da má prestação do serviço da parte ré.

 Segundo construção jurisprudencial, o valor a ser arbitrado deve obedecer ao binômio razoabilidade e proporcionalidade, devendo adequar-se às condições pessoais e sociais das partes envolvidas, para que não sirva de fonte de enriquecimento da vítima, agravando, sem proveito, a obrigação do ofensor, nem causar frustração e melancolia tão grande quanto a própria ofensa. As características, a gravidade, as circunstâncias, a repercussão e as consequências do caso, a eventual duração do sofrimento, a posição social do ofendido, tudo deve servir de baliza para que o magistrado saiba dosar com justiça a condenação do ofensor.

O "quantum" indenizatório a título de danos morais, este deve representar para o ofendido uma satisfação psicológica que possa pelo menos diminuir os dissabores que lhe foram acarretados, sem causar, evidentemente, o chamado enriquecimento sem causa. Entretanto, deve impingir ao causador do dano um impacto capaz de desestimulá-lo a praticar novos atos que venham a causar prejuízos a outrem.

Embora seja difícil quantificar o dano moral, predomina o entendimento que deve ser fixado observando-se o princípio da razoabilidade e proporcionalidade.

 Nesse sentido, a jurisprudência em casos semelhantes:

RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. HOSPEDAGEM SOLICITADA PELO SITE DA RÉ. AMBIENTE INSALUBRE. PROPAGANDA ENGANOSA CONFIGURADA. RECURSO DA RÉ QUE PLEITEIA IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. DANO MORAL FIXADO EM ATENÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-BA - RI: 00602958720208050001, Relator: MARY ANGELICA SANTOS COELHO, QUARTA TURMA RECURSAL, Data de Publicação: 25/08/2021)

JUIZADO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI E XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932, III, IV e V, DO CPC). CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO DE HOSPEDAGEM. ANÚNCIO PUBLICITÁRIO VINCULADO QUE LEVOU A CONSUMIDORA A INFERIR TRATAR-SE DE DOIS QUARTOS PRIVADO PARA QUATRO ADULTOS. DISPONIBILIZADA ACOMODAÇÃO EM QUARTOS COLETIVOS COM PESSOAS DE AMBOS OS SEXOS. INFRINGÊNCIA AO ART. 30 DO CDC E AO DEVER DE INFORMAÇÃO PREVISTO NO ART. 6º, III DO CDC). DANOS MORAIS CONFIGURADOS E ORA ARBITRADOS EM R$ 5.000,00. INDEVIDO RESSARCIMENTO PELA DIFERENÇA NO PREÇO DAS ACOMODAÇÕES. RECURSO PROVIDO. ( Classe: Recurso Inominado,Número do Processo: 0164592-82.2019.8.05.0001,Relator(a): NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS,Publicado em: 20/03/2023 )

DECISÃO MONOCRÁTICA RECURSO INOMINADO. PRESSUPOSTOS RECURSAIS ATENDIDOS. DEMANDAS REPETITIVAS. ART. 15, INC. XI, RESOLUÇÃO N° 02/2021 DO TJ/BA. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATAÇÃO DE HOSPEDAGEM. HOSPEDAGEM SOLICITADA PELO SITE DA RÉ. AMBIENTE INSALUBRE. FOTOS ACOSTADAS AOS AUTOS. PROPAGANDA ENGANOSA CONFIGURADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DE TODOS OS FORNECEDORES QUE PARTICIPARAM DA CADEIA CAUSAL DO DANO. ART. 7º, § ÚNICO DO CDC. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA VISANDO A REFORMA DA DECISÃO. DANO MORAL CONFIGURADO. SITUAÇÃO QUE SUPEROU OS LIMITES DO MERO TRANSTORNO E/OU ABORRECIMENTO. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ( Classe: Recurso Inominado,Número do Processo: 0111662-82.2022.8.05.0001,Relator(a): ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA,Publicado em: 11/05/2023 )

 Ressalta-se o entendimento firmado no enunciado de Súmula 30 da Turma De Uniformização De Jurisprudência Das Turmas Recursais Do Poder Judiciário Do Estado Da Bahia, que dispõe: “A usurpação do tempo do consumidor na tentativa de solucionar, extrajudicialmente, problema a que não deu causa, pode caracterizar, a depender das circunstâncias do caso concreto, o denominado “desvio produtivo”, do que decorre o dever de indenizar pelo dano causado. (Sessão Ordinária da Turma de Uniformização de Jurisprudência das Turmas Recursais – 21 de julho de 2023).”

Nesse sentido, no caso em apreço, correta e irretocável a sentença que condenou a parte Ré a título de danos morais, ante a evidente falha na prestação de serviço da Acionada e ausência da resolução do imbróglio em tempo hábil para evitar maiores transtornos a parte Autora. Ademais, a sentença impugnada não merece ser reparada, pois respeitou os princípios supracitado e se encontra em patamar geralmente aplicado para casos análogos.

Ademais, mantenho a sentença que determinou juros da mora da condenação por danos morais, incidentes a partir da citação, ante a relação contratual das partes

Assim, e por tudo mais constante dos autos, julgo no sentido de CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO para manter a sentença atacada pelos próprios e jurídicos fundamentos.

Custas e honorários advocatícios pelos recorrentes vencidos, estes últimos arbitrados em 20% do valor da condenação. Acaso seja a parte beneficiária da justiça gratuita, resta provisoriamente suspensa sua exigibilidade, nos termos da lei.

Salvador, data registrada no sistema.

CLAUDIA VALERIA PANETTA

Juíza Relatora