Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
SEGUNDA TURMA RECURSAL - PROJUDI

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PROCESSO Nº  0015740-77.2023.8.05.0001

RECORRENTE: HELENA MIRANDA DOS SANTOS

RECORRIDO: HIPERCARD BANCO MULTIPLO S A

ORIGEM: 6ª VSJE DO CONSUMIDOR (VESPERTINO)

RELATORA: JUÍZA MARIA AUXILIADORA SOBRAL LEITE

 

E M E N T A

 

RECURSO INOMINADO. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932 DO CPC). CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER. ALEGAÇÃO DE IMPUTAÇÃO DE PARCELAMENTO DE CARTÃO DE CRÉDITO INDEVIDAMENTE. PARCELAMENTO INDEVIDO. INEXISTÊNCIA DE SALDO DEVEDOR. PARTE AUTORA QUE REALIZOU O PAGAMENTO INTEGRAL DA FATURA. INOBSERVÂNCIA DA RESOLUÇÃO Nº 4.549 DO BANCO CENTRAL. PARCELAMENTO INDEVIDO. CANCELAMENTO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS.  EXCLUSÃO. AUSÊNCIA DE PROVA DE LESÃO SUBJETIVA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.

 

DECISÃO MONOCRÁTICA

 

Vistos, etc.

Trata-se de recurso inominado interposto em face da sentença prolatada no processo epigrafado que julgou improcedentes os pedidos da exordial.

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, dele conheço.

O artigo 15 do novo Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução nº 02/2021 do TJBA), em seu inciso XII, estabelece a competência do relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo colegiado ou já com uniformização de jurisprudência, em consonância com o permissivo do artigo 932 do Código de Processo Civil.

Na origem, alegou a parte autora que em novembro de 2022 recebeu a fatura do cartão de crédito que possui junto ao banco réu no valor de R$ 6.108,09, com vencimento para o dia 16/11/2022, e em razão de motivos pessoais e financeiros, realizou o pagamento parcial da fatura na data do vencimento no valor de R$ 1.929,00, restando um saldo remanescentes de R$ 4.179,09 que a autora pretendia pagar nos próximos dias. Posteriormente, já no dia 21/11/2022, apenas cinco dias após o vencimento da fatura, foram efetuados mais dois pagamentos no valor de R$ 2.900,00, e o último de R$1.279,09, totalizando assim R$ 6.108,09 referente a fatura do mês de novembro. Aduziu ainda que mesmo tendo pago o valor remanescente em apenas cinco dias após o vencimento, a empresa ré parcelou automaticamente o referido valor de R$ 4.179,09 em 12 parcelas com juros extremamente abusivos. Ao final requereu o cancelamento do parcelamento, restituição em dobro da quantia paga e reparação moral.

Analisados os autos, observa-se que tal matéria já se encontra sedimentada no âmbito desta Segunda Turma Recursal, no sentido da regularidade do parcelamento de fatura de cartão de crédito em virtude do não pagamento integral do débito no prazo de 30 dias, nos termos da RESOLUÇÃO Nº 4.549, de 26 de Janeiro de 2017 do BACEN:

Art. 1º O saldo devedor da fatura de cartão de crédito e de demais instrumentos de pagamento pós-pagos, quando não liquidado integralmente no vencimento, somente pode ser objeto de financiamento na modalidade de crédito rotativo até o vencimento da fatura subseqüente. Parágrafo único. O financiamento do saldo devedor por meio de outras modalidades de crédito em condições mais vantajosas para o cliente, inclusive no que diz respeito à cobrança de encargos financeiros, pode ser concedido, a qualquer tempo, antes do vencimento da fatura subsequente.

Art. 2º Após decorrido o prazo previsto no caput do art. 1º, o saldo remanescente do crédito rotativo pode ser financiado mediante linha de crédito para pagamento parcelado, desde que em condições mais vantajosas para o cliente em relação àquelas praticadas na modalidade de crédito rotativo, inclusive no que diz respeito à cobrança de encargos financeiros.

 Ocorre que, no caso em tela, restou comprovado que a parte autora realizou o pagamento integral da fatura, não havendo saldo devedor, e ainda que houvesse não há provas de que a parte autora ultrapassou o prazo de trinta dias do crédito rotativo, sendo indevida a adesão automática ao parcelamento compulsório. Desta feita, merece reforma a sentença para determinar o cancelamento do parcelamento.

Consoante apontado, a compreensão sobre a matéria já está consolidada neste Colegiado, precedentes nºs 0004125-23.2018.8.05.0274 e 0005050-49.2017.8.05.0146, dentre outros.

Contudo, melhor sorte não assiste ao pleito de indenização por danos morais, uma vez que não há prova nos autos de que a situação fática tenha gerado dano extrapatrimonial ao consumidor, vez que dos atos praticados e demonstrados nos autos, não se identifica nenhum deles capaz de ensejar qualquer prejuízo ao bom nome, imagem e honra do consumidor, mas mero contratempo, fato corriqueiro no dia-a-dia, inexistindo dano moral a ser reconhecido no caso de mera cobrança indevida, entendimento amparado na jurisprudência consolidada do E. STJ, como se constata a seguir:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.  (...) 3. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que a devolução em dobro dos valores cobrados somente pode ser determinada na hipótese de pagamento indevido em decorrência de comprovada má-fé, o que não ocorreu no caso, consoante afirmado pelas instâncias ordinárias. Incidência da Súmula 83/STJ.  4. A cobrança indevida de serviço de telefonia, quando inexistente a inscrição em cadastro de inadimplentes, não gera presunção de dano moral, sendo imprescindível a sua comprovação.  5. Agravo regimental provido para reconsiderar a decisão singular anterior proferida às fls. 910/915, e-STJ, e, de plano, conhecer do agravo para dar parcial provimento ao recurso especial. (AgRg no AgRg no AREsp 625.561/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 31/05/2021, DJe 04/06/2021).

 AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO MORAL. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que não conheceu do agravo em recurso especial, em razão da falta de impugnação específica de fundamento decisório. Reconsideração. 2. Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não há falar em dano moral in re ipsa em virtude de cobrança indevida, quando inexistente ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes. Precedentes. 3. No caso, o Tribunal de origem observou que, embora presente o ato ilícito, decorrente da má prestação de serviços de telefonia, não se comprovou a efetiva ocorrência de prejuízo de ordem extrapatrimonial, sobretudo porque não ocorreu a inclusão do nome da empresa autora nos órgãos de proteção ao crédito. A modificação de tal entendimento demandaria o reexame do suporte fático-probatório dos autos, providência inviável em recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 4. Agravo interno provido para conhecer do agravo e negar provimento ao recurso especial. (AgInt no AREsp 1682299/MT, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 21/09/2020, DJe 08/10/2020).

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA RECURSAL DO AUTOR. 1. Esta Corte Superior de Justiça possui jurisprudência no sentido de que "a cobrança indevida de serviço de telefonia, quando não há inscrição em cadastro de inadimplentes, não gera presunção de dano moral, sendo imprescindível a sua comprovação". Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Para alterar as conclusões contidas no decisum e acolher o inconformismo recursal no sentido de verificar se os danos morais foram comprovados, no caso sub judice, seria imprescindível a incursão no conjunto fático e probatório dos autos, providência que atrai o óbice estabelecido pela Súmula 7 do STJ. Precedentes. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1093191/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 30/05/2019, DJe 03/06/2019).

Desse modo, e constatado que a sentença impugnada inobservou o entendimento já consolidado, a mesma deve ser reformada.

Diante do exposto, na forma do art. 15, inciso XII, do Regimento Interno das Turmas Recursais e do art. 932 do Código de Processo Civil, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA para reformar a sentença e JULGAR PROCEDENTE EM PARTE os pedidos da exordial para condenar a parte ré a realizar o cancelamento do parcelamento automático da fatura de cartão de crédito, objeto da presente ação, bem como para suspender as cobranças relacionadas e por fim condenar a parte ré a restituir de forma simples os valores efetivamente pagos pela parte autora, devendo incidir juros, na taxa de 1% ao mês, contados a partir da citação (art. 405 do CC), e correção monetária (pelo INPC) a partir do evento danoso, compartilhando do entendimento consolidado na Súmula 43 do STJ.

Sem custas processuais e honorários advocatícios.

              

 

BELA. MARIA AUXILIADORA SOBRAL LEITE

Juíza Relatora