PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Seção Criminal 



ProcessoCONFLITO DE JURISDIÇÃO n. 8002524-44.2023.8.05.0022
Órgão JulgadorSeção Criminal
SUSCITANTE: JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS
Advogado(s) 
SUSCITADO: JUIZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARREIRAS - BA
Advogado(s): 

Classe: CONFLITO DE JURISDIÇÃO (325)

Processo nº: 8002524-44.2023.8.05.0022

Órgão Julgador: Seção Criminal

SUSCITANTE: JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS/BA

SUSCITADO: JUÍZO CRIMINAL DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARREIRAS/BA

 

Relator designado: Des. NILSON CASTELO BRANCO 

ACORDÃO

 

EMENTA

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER E 1ª VARA CRIMINAL. COMARCA DE BARREIRAS. CRIME DE ROUBO (ART. 157, caput, CP) PRATICADO CONTRA TRÊS ADOLESCENTES. INCIDÊNCIA DO ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE (ECA), DA LEI Nº 13.431/2017, DA LEI ESTADUAL Nº 10.825/2007 E DA RESOLUÇÃO Nº 18 DE 22 DE NOVEMBRO DE 2023 do TJBA. COMPETÊNCIA DA VARA ESPECIALIZADA. CONFLITO IMPROCEDENTE.

1.O presente processo se dirige à análise do mérito do conflito negativo de competência suscitado, para melhor apreciação do contexto fático e normativo subjacente à discrepância manifestada pelas partes e conseguinte identificação do critério decisório mais apropriado para a sua resolução.

2. A esse respeito convém explicitar que comungo do entendimento no sentido de que deve ser preconizada a aplicação conjunta do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Lei nº 13.431/2017, da Lei Estadual nº 10.825/2007, bem como da Resolução nº 18 de 22 de novembro de 2023 do TJBA e do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça.

3. Inicialmente, destaca-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 145[1], determina a criação de varas especializadas para o julgamento de ações envolvendo crianças e adolescentes.

4. Ocorre que, consoante o art. 23, parágrafo único, da Lei 13.431/2017[2], até a implementação de uma vara especializada em determinado local, o julgamento das causas envolvendo crianças e adolescentes ficará “a cargo dos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins”.

5. A temática mencionada foi pacificada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, conforme noticiado no Informativo nº 765, de 07.03.2023, cujo conteúdo indica que “A partir da entrada em vigor da Lei n. 13.431/2017, nas comarcas em que não houver Vara Especializada em crimes contra a criança e o adolescente, compete à vara especializada em violência doméstica julgar as ações penais que apurem crimes envolvendo violência contra crianças e adolescentes, independentemente de considerações acerca do sexo da vítima ou da motivação da violência, ressalvada a modulação de efeitos realizada no julgamento do EAREsp 2.099.532/RJ”.

6. Além disso, consoante se extrai do entendimento firmado pela Corte Infraconstitucional, a tramitação de ações penais envolvendo crianças e adolescentes, nas varas especializadas de violência doméstica, independe de considerações sobre idade, sexo da vítima ou motivação da violência. Confira-se: STJ - EAREsp n. 2.099.532/RJ, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 26/10/2022, DJe de 30/11/2022.

7. Conforme Denúncia disposta no ID 52121712, a ação originária apura crime ocorrido em 04 de abril de 2023, tipificado no art. 157, caput, do Código Penal, por três vezes, supostamente praticado pelo réu CARLOS SOUZA, em face dos três adolescentes individualizado nos autos.

8. Em síntese, descreve a Exordial que, no dia 04 de abril de 2023, por volta das 20h30min, na Rua Marechal Deodoro, Carlos Souza subtraiu, mediante grave ameaça, simulando porte de arma de fogo, os aparelhos celulares das vítimas.

9. A denúncia foi oferecida perante o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA, que declinou a competência, registrando que, na verdade, a competência para julgamento da referida ação penal pertence à Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, por se tratar de crimes contra adolescentes.

10. Por sua vez, o Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, suscitou o presente conflito de competência, por entender que a situação de vulnerabilidade em razão da idade das vítimas não foi condição necessária para a prática delito.

11. Conforme mencionado, o critério decisório empregado para determinar a competência para julgar ações que envolvem violência contra crianças e adolescentes, nos locais em que não existem varas especializadas para isso, é objetivo: dar-se-á preferência aos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins.

12. Cumpre frisar que, em relação à estruturação da Comarca de Barreiras, a Resolução nº 18/2023 prevê, no art. 1º[3], que a 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA possui competência para julgar causas não atribuídas a outro Juízo. Por outro lado, o art. 2º[4] do mesmo dispositivo alterou competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras para Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher.

13. No contexto delineado, afere-se que a competência para julgar a lide em questão, que envolve vítimas adolescentes, é, de fato, do Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, ora suscitante, ante a inexistência da mencionada vara especializada em crimes contra criança e adolescente na localidade.

14. No contexto fático e procedimental delineado, entendo que o conflito deve ser julgado improcedente, para que a ação de origem seja apreciada e julgada pelo MM. Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA.

15. Parecer da Procuradoria de Justiça pela improcedência do presente conflito.

16. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA IMPROCEDENTE. MANTIDA A COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE.

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito de Competência de n. 8002524-44.2023.8.05.0022, suscitado pelo Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA em face Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA.

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, à unanimidade, em conhecer do conflito e, por maioria de votos, por julgá-lo improcedente, para manter a competência do Juízo suscitante (Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA) para o processamento e julgamento da causa, nos termos do voto condutor.



[1] Art. 145. Os estados e o Distrito Federal poderão criar varas especializadas e exclusivas da infância e da juventude, cabendo ao Poder Judiciário estabelecer sua proporcionalidade por número de habitantes, dotá-las de infra-estrutura e dispor sobre o atendimento, inclusive em plantões. (Grifo nosso).

[2] Art. 23. Os órgãos responsáveis pela organização judiciária poderão criar juizados ou varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente. Parágrafo único. Até a implementação do disposto no caput deste artigo, o julgamento e a execução das causas decorrentes das práticas de violência ficarão, preferencialmente, a cargo dos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins.

[3] Art. 1º Compete à 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras processar e julgar as causas os crimes e as contravenções não expressamente atribuídos a outro Juízo, nos termos do art. 83, da Lei nº 10.845 de 27 de novembro de 2007 – Lei de Organização e Divisão Judiciária do Estado da Bahia.

[4] Art. 2º Fica alterada a denominação e a competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras para Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Barreiras, com competência para processar e julgar, privativa e exclusivamente, os feitos decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Parágrafo único. Na área cível, a competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras abrange apenas o processo e a execução de Medidas Protetivas de Urgência, definidas nos arts. 22 a 24 da Lei Federal n° 11.340/06 (Lei Maria da Penha).

 


 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 SEÇÃO CRIMINAL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Julgou-se Improcedente o conflito, por maioria, nos termos do voto divergente do Desembargador Nilson Soares Castelo Branco, que restou designado para lavrar o acórdão. Acompanharam o relator: Desa Ivete Caldas Silva Freitas Muniz , Des Eserval Rocha, Desa. Nágila Maria Sales Brito , Des. Julio Cezar Lemos Travessa e Desa. Soraya Moradillo Pinto. Acompanharam a divergência: Des. Mario Alberto Hirs, Desa. Inez Maria Brito Santos Miranda, Des Pedro Augusto Costa Guerra, Des Aliomar Silva Britto, Desa Ivone Bessa Ramos, Desa. Rita De Cássia Machado Magalhães, Desa. Aracy Lima Borges, Des. Antonio Cunha Cavalcanti e Des. Geder Luiz Rocha Gomes

Salvador, 4 de Dezembro de 2024.

 


 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Seção Criminal 


Processo: CONFLITO DE JURISDIÇÃO n. 8002524-44.2023.8.05.0022
Órgão Julgador: Seção Criminal
SUSCITANTE: JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS
Advogado(s): 
SUSCITADO: JUIZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARREIRAS - BA
Advogado(s): 


RELATÓRIO


Cuida-se de conflito negativo de competência suscitado pelo MM. Juízo da VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS, também competente para julgar CRIMES CONTRA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE, no bojo da ação penal de mesmo número instaurada em face de Carlos Souza.

 

Narra a denúncia que, no dia 04 de abril de 2023, por volta das 20h30min, na Rua Marechal Deodoro, mais precisamente próximo ao Sacola Cheia do Cais, Centro, Barreiras-BA, o denunciado Carlos Souza, subtraiu para si coisa alheia móvel mediante grave ameaça, tendo como vítimas as adolescentes Ana Beatriz Ramos Oliveira; Thaina Dias Lima; Brenda Rodrigues da Silva.

Segundo se apurou, na data dos fatos, as vítimas – todas estudantes – estavam retornando da sorveteria Zorzo para o Colégio Estadual Prisco Viana quando foram abordadas pelo denunciado, esse que trajava bermuda e camiseta, e anunciou o assalto mediante grave ameaça, consistente em colocar a mão na cintura, por baixo das vestes, simulando o porte de arma de fogo.

Ao apreciar o feito, o juízo suscitado declinou a competência, registrando que a VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS detém a competência para julgamento de processos criminais por se tratar de crime contra a criança e o adolescente.

Por sua vez, o Juízo da VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS suscitou o presente conflito de competência, por entender que a situação de vulnerabilidade em razão da idade da vítima não foi condição necessária para a prática delito.

O feito, então, subiu a esta Superior Instância.

Encaminhados os autos para a Procuradoria de Justiça, colheu-se parecer de Id 72446027, no sentido de julgar improcedente o conflito, declarando-se o Juízo Suscitante como o competente para o processamento da causa.

 

É o relatório.

Salvador/Ba, 5 de novembro de 2024.


 Des. Carlos Roberto Santos Araújo Seção Criminal 

Relator


 

Classe: CONFLITO DE JURISDIÇÃO  

Processo nº: 8002524-44.2023.8.05.0022 

Órgão Julgador: Seção Criminal  

SUSCITANTE: JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS/BA 

SUSCITADO: JUÍZO CRIMINAL DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARREIRAS/BA 

Relator: Des. Carlos Roberto Santos Araújo  

 

RELATÓRIO

 

Cuida-se de conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, em face do Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA, a fim de estabelecer o juízo competente para processar e julgar os autos da Ação Penal de nº 8002524-44.2023.8.05.0022.

Inicialmente, o Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor de Carlos Souza, pela suposta prática do crime previsto no art. 157, caput, do Código Penal, por três vezes, cujas vítimas foram três adolescentes, perante o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA (ID 52121712).

Ao apreciar o feito, o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA, ora suscitado, declinou a competência, registrando que, na verdade, a competência para julgamento da referida ação penal pertence à Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, por se tratar de crime contra adolescente (ID 70779095).

Argumenta que, consoante o art. 23, parágrafo único, da Lei 13.431/2017[1], a competência para julgar ações envolvendo violência contra crianças e adolescentes, nos locais em que não há uma vara especializada, será das “varas especializadas em violência doméstica e temas afins”.

Por sua vez, o Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA suscitou o presente conflito de competência, por entender que a situação de vulnerabilidade em razão da idade das vítimas não foi condição necessária para a prática delito (ID 70779099).

Instaurado o Conflito Negativo, os autos foram distribuídos, por livre sorteio, ao Eminente Desembargador Relator Carlos Roberto Santos Araújo.

Instada a se manifestar, a Douta Procuradoria de Justiça opinou pela IMPROCEDÊNCIA DO CONFLITO, determinando que o feito siga em curso perante o Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, por se tratar de crime praticado contra adolescentes e inexistir na Comarca de Barreiras uma vara especializada para julgar demandas que envolvem violência em desfavor de menores de idade (ID 70779095).

Iniciada a Sessão de Julgamento, o Eminente Des. Relator Carlos Roberto Santos Araújo proferiu voto no sentido de conhecer do conflito e, no mérito, julgá-lo procedente, para que fosse declarado competente o Juízo Suscitante. Acompanharam Exmo. Relator Originário  os Eminentes Desembargadores Eserval Rocha, Ivete Caldas Silva Freitas Muniz, Nágila Maria Sales Brito, Julio Cezar Lemos Travessa e Soraya Moradillo Pinto.

Na sessão de julgamento apresentei divergência, no que fui seguido pelos demais integrantes do Colegiado, motivo pelo qual fui designado para lavrar o Acórdão, nos termos da certidão de ID 74353048.

É o relatório.

 

VOTO

 

Trata-se de conflito que tem por objeto a definição da competência para o processo e julgamento dos autos de n° 8015159-43.2024.8.05.0080, que envolve a prática do delito de roubo, previsto no art. 157, caput, do Código Penal, por três vezes, supostamente praticado pelo réu Carlos Souza, em face de três adolescentes.

O presente processo se dirige à análise do mérito do conflito negativo de competência suscitado, para melhor apreciação do contexto fático e normativo subjacente à discrepância manifestada pelas partes e conseguinte identificação do critério decisório mais apropriado para a sua resolução.

A esse respeito convém explicitar que comungo do entendimento no sentido de que deve ser preconizada a aplicação conjunta do Estatuto da Criança e do Adolescente, da Lei nº 13.431/2017, da Lei Estadual nº 10.825/2007, bem como da Resolução nº 18 de 22 de novembro de 2023 do TJBA e do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Inicialmente, destaca-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente, no art. 145, determina a criação de varas especializadas para o julgamento de ações envolvendo crianças e adolescentes:

 

Art. 145. Os estados e o Distrito Federal poderão criar varas especializadas e exclusivas da infância e da juventude, cabendo ao Poder Judiciário estabelecer sua proporcionalidade por número de habitantes, dotá-las de infra-estrutura e dispor sobre o atendimento, inclusive em plantões. (Grifo nosso).

 

No art. 146 do mesmo diploma legal, define-se ainda que:

 

Art. 146. A autoridade a que se refere esta Lei é o Juiz da Infância e da Juventude, ou o juiz que exerce essa função, na forma da lei de organização judiciária local. (Grifo nosso).

 

Ocorre que, consoante o art. 23, parágrafo único, da Lei 13.431/2017[2], até a implementação de uma vara especializada em determinado local, o julgamento das causas envolvendo crianças e adolescentes ficará “a cargo dos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins”.

A temática mencionada foi pacificada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, conforme noticiado no Informativo nº 765, de 07.03.2023, cujo conteúdo indica que “A partir da entrada em vigor da Lei n. 13.431/2017, nas comarcas em que não houver Vara Especializada em crimes contra a criança e o adolescente, compete à vara especializada em violência doméstica julgar as ações penais que apurem crimes envolvendo violência contra crianças e adolescentes, independentemente de considerações acerca do sexo da vítima ou da motivação da violência, ressalvada a modulação de efeitos realizada no julgamento do EAREsp 2.099.532/RJ”.

Além disso, consoante se extrai do entendimento firmado pela Corte Infraconstitucional, a tramitação de ações penais envolvendo crianças e adolescentes, nas varas especializadas de violência doméstica, independe de considerações sobre idade, sexo da vítima ou motivação da violência. Confira-se:

 

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL ACERCA DA COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR CRIME DE ESTUPRO PERPETRADO CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE NO CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR. CRITÉRIO ETÁRIO INAPTO A AFASTAR A COMPETÊNCIA ESTABELECIDA NA LEI N. 11.340/2006. ADVENTO DA LEI N. 13.431/2017. COMPETÊNCIA DA VARA ESPECIALIZADA EM CRIMES CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE E, DE FORMA SUBSIDIÁRIA, DA VARA ESPECIALIZADA EM VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL A QUO RESTABELECIDO.

1. A Lei n. 11.340/2006 não estabeleceu nenhum critério etário para incidência das disposições contidas na referida norma, de modo que a idade da vítima, por si só, não é elemento apto a afastar a competência da vara especializada para processar os crimes perpetrados contra vítima mulher, seja criança ou adolescente, em contexto de violência doméstica e familiar.

2. A partir da entrada em vigor da Lei n. 13.431/2017, estabeleceu-se que as ações penais que apurem crimes envolvendo violência contra crianças e adolescentes devem tramitar nas varas especializadas previstas no caput do art. 23, no caso de não criação das referidas varas, devem transitar nos juizados ou varas especializados em violência doméstica, independentemente de considerações acerca da idade, do sexo da vítima ou da motivação da violência, conforme determina o parágrafo único do mesmo artigo. Assim, somente nas comarcas em que não houver varas especializadas em violência contra crianças e adolescentes ou juizados/varas de violência doméstica é que poderá a ação tramitar na vara criminal comum.

3. Embargos acolhidos para fixar a tese de que, após o advento do art. 23 da Lei n. 13.431/2017, nas comarcas em que não houver vara especializada em crimes contra a criança e o adolescente, compete à vara especializada em violência doméstica, onde houver, processar e julgar os casos envolvendo estupro de vulnerável cometido pelo pai (bem como pelo padrasto, companheiro, namorado ou similar) contra a filha (ou criança ou adolescente) no ambiente doméstico ou familiar.

Restabelecido o acórdão exarado na Corte de origem.

4. A tese ora firmada terá sua aplicação modulada nos seguintes termos:

a) nas comarcas em que não houver juizado ou vara especializada nos moldes do art. 23 da Lei 13.431/2017, as ações penais que tratam de crimes praticados com violência contra a criança e o adolescente, distribuídas até a data da publicação do acórdão deste julgamento (inclusive), tramitarão nas varas às quais foram distribuídas originalmente ou após determinação definitiva do Tribunal local ou superior, sejam elas juizados/varas de violência doméstica, sejam varas criminais comuns;

b) nas comarcas em que não houver juizado ou vara especializada nos moldes do art. 23 da Lei 13.431/2017, as ações penais que tratam de crimes praticados com violência contra a criança e o adolescente, distribuídas após a data da publicação do acórdão deste julgamento, deverão ser obrigatoriamente processadas nos juizados/varas de violência doméstica e, somente na ausência destas, nas varas criminais comuns.

(STJ - EAREsp n. 2.099.532/RJ, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 26/10/2022, DJe de 30/11/2022.)

 

Tendo como ponto de partida o critério jurídico apresentado, cabe analisar o contexto fático que ensejou o presente conflito.

Conforme Denúncia disposta no ID 52121712, a ação originária apura crime ocorrido em 04 de abril de 2023, tipificado no art. 157, caput, do Código Penal, por três vezes, supostamente praticado pelo réu CARLOS SOUZA, em face dos três adolescentes individualizado nos autos.

Em síntese, descreve a Exordial que, no dia 04 de abril de 2023, por volta das 20h30min, na Rua Marechal Deodoro, Carlos Souza subtraiu, mediante grave ameaça, simulando porte de arma de fogo, os aparelhos celulares das vítimas.

A denúncia foi oferecida perante o Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA, que declinou a competência, registrando que, na verdade, a competência para julgamento da referida ação penal pertence à Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, por se tratar de crimes contra adolescentes. Veja-se o teor da decisão:

 

A denúncia expõe que o acusado "subtraiu para si coisa alheia móvel mediante grave ameaça, tendo como vítimas as adolescentes Ana Beatriz Ramos Oliveira; Thaina Dias Lima; Brenda Rodrigues da Silva", contra as quais supostamente" anunciou o assalto mediante grave ameaça, consistente em colocar a mão na cintura, por baixo das vestes, simulando o porte de arma de fogo".

Trata-se de um caso claro, pela perspectiva abstrata da narrativa acusatória, de crime praticado com grave ameaça contra adolescentes, conceituando-se essa grave ameaça no conceito de violência psicológica (Lei nº 13.431/17, art. 4º, II, letra "a").

Definiu claramente o STJ, ao julgar o EAREsp nº 2099532/RJ (rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, j. 26/10/2022, DJe 30/11/2022):

(...)

2. A partir da entrada em vigor da Lei n. 13.431/2017, estabeleceu-se que as ações penais que apurem crimes envolvendo violência contra crianças e adolescentes devem tramitar nas varas especializadas previstas no caput do art. 23, no caso de não criação das referidas varas, devem transitar nos juizados ou varas especializados em violência doméstica, independentemente de considerações acerca da idade, do sexo da vítima ou da motivação da violência, conforme determina o parágrafo único do mesmo artigo. Assim, somente nas comarcas em que não houver varas especializadas em violência contra crianças e adolescentes ou juizados/varas de violência doméstica é que poderá a ação tramitar na vara criminal comum.

(...)

4. A tese ora firmada terá sua aplicação modulada nos seguintes termos:

a) nas comarcas em que não houver juizado ou vara especializada nos moldes do art. 23 da Lei 13.431/2017, as ações penais que tratam de crimes praticados com violência contra a criança e o adolescente, distribuídas até a data da publicação do acórdão deste julgamento (inclusive), tramitarão nas varas às quais foram distribuídas originalmente ou após determinação definitiva do Tribunal local ou superior, sejam elas juizados/varas de violência doméstica, sejam varas criminais comuns;

b) nas comarcas em que não houver juizado ou vara especializada nos moldes do art. 23 da Lei 13.431/2017, as ações penais que tratam de crimes praticados com violência contra a criança e o adolescente, distribuídas após a data da publicação do acórdão deste julgamento, deverão ser obrigatoriamente processadas nos juizados/varas de violência doméstica e, somente na ausência destas, nas varas criminais comuns.

Não se diga que a questão não vale para crimes de roubos praticados contra adolescentes, porque em precedente específico (e oriundo do TJBA, inclusive), assim se posicionou o STJ:

HABEAS CORPUS. ROUBO PRATICADO CONTRA ADOLESCENTES. COMPETÊNCIA. VARA ESPECIALIZADA. INCOMPETÊNCIA DA VARA COMUM RECONHECIDA. (...)

3. O art. 23 da Lei n. 13.431/2017 preceitua que "[o]s órgãos responsáveis pela organização judiciária poderão criar juizados ou varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente".

4. O art. 85 do Regimento Interno do TJ-BA atribui às Varas dos Feitos Criminais praticados contra Criança e Adolescente a competência para para processar e julgar, indistintamente, "os crimes e as contravenções penais, cujas vítimas sejam crianças e adolescentes".

5. Nos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes, esta Corte já decidiu que "somente nas comarcas em que não houver varas especializadas em violência contra crianças e adolescentes ou juizados/varas de violência doméstica é que poderá a ação tramitar na vara criminal comum." (EAREsp n. 2.099.532/RJ, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 26/10/2022, DJe de 30/11/2022). Havendo juízo especializado, portanto, este deve prevalecer sobre os demais. Estendendo tal entendimento à hipótese dos autos, em que há varas criminais especializadas para apurar e julgar crimes praticados contra criança e adolescente, é esta a competente para julgar a Ação Penal n. 0371797-91.2013.8.05.0001.

(...)

(HC nº 807617/BA, rel. Min. RIBEIRO DANTAS, j. 11/04/2023, DJe 18/04/2023)

(…)

No caso dos autos, o fato e a distribuição da ação penal são posteriores a 30/11/2022, sendo de concluir-se, portanto, pela competência da Vara de Violência Doméstica Contra a Mulher de Barreiras.

Pelo exposto, DECLINO DA COMPETÊNCIA para a Vara de Violência Doméstica Contra a Mulher de Barreiras, nos termos do art. 109 do CPP. (ID 70779095).

 

Por sua vez, o Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA suscitou o presente conflito de competência, por entender que a situação de vulnerabilidade em razão da idade das vítimas não foi condição necessária para a prática delito. Confira-se a decisão:

 

Analisando os autos, verifica-se que não há elementos que permitam auferir que a situação das vítimas serem adolescentes caracterize perspectiva de gênero ou violência psicológica no âmbito doméstico em relação às vítimas. O caso em tela refere-se a um crime de roubo em que o fato de as vítimas serem adolescentes não contribuiu para a prática delitiva, nem foi determinante para a sua execução.

É importante ressaltar que esta Vara não é especializada para julgar crimes em face de crianças e adolescentes, mas sim casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. O fato narrado na denúncia não se inclui nas hipóteses de competência desta Vara, conforme estabelecido pela Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).

Observa-se que a decisão juntada aos autos, utilizada como paradigma para a fixação de competência, refere-se a uma vara especializada no julgamento de crimes contra crianças e adolescentes em razão desta condição específica. Tal decisão não abrange todo e qualquer delito praticado contra pessoas menores de idade, mas sim aqueles em que a condição de vulnerabilidade da criança ou do adolescente é elemento determinante para a prática criminosa.

No caso em apreço, o crime de roubo, embora tenha sido praticado contra adolescentes, não teve como motivação ou agravante esta condição. Trata-se de crime comum, cuja competência para processamento e julgamento é da Vara Criminal comum.

(…)

Diante do exposto, considerando que não há elementos que justifiquem a competência desta Vara especializada em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para o processamento e julgamento do feito, SUSCITO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA em face da 1ª Vara Criminal de Barreiras, com fulcro no art. 115 do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao processo penal por força do art. 3º do Código de Processo Penal.

Determino a remessa dos autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Bahia para dirimir o conflito, nos termos do art. 953 do Código de Processo Civil. (ID 70779099)

 

Pois bem. Conforme mencionado, o critério decisório empregado para determinar a competência para julgar ações que envolvem violência contra crianças e adolescentes, nos locais em que não existem varas especializadas para isso, é objetivo: dar-se-á preferência aos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins.

Cumpre frisar que, em relação à estruturação da Comarca de Barreiras, a Resolução nº 18/2023 prevê, no art. 1º[3], que a 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras/BA possui competência para julgar causas não atribuídas a outro Juízo. Por outro lado, o art. 2º[4] do mesmo dispositivo alterou competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras para Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher.

No contexto delineado, afere-se que a competência para julgar a lide em questão, que envolve vítimas adolescentes, é, de fato, do Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA, ora suscitante, ante a inexistência da mencionada vara especializada em crimes contra criança e adolescente na localidade.

Adicione-se que o parecer da Eminente Procuradoria de Justiça está em consonância com a conclusão aqui exposta. Veja-se:

 

 

(…) Diante do cenário legislativo referido, resta evidente que os processos que apurem delitos perpetrados contra criança ou adolescente devem tramitar na vara especializada, caso devidamente implementada. Não existindo a mencionada especializada, a apreciação dos casos desse jaez será da responsabilidade dos juizados ou das varas de violência doméstica.

(…)

Diante desse cenário, nota-se que o juízo competente para apreciação do delito em comento é, de fato, o Juízo Suscitante, ante a inexistência da mencionada vara especializada, em sintonia com o entendimento fixado pelo Tribunal da Cidadania, como bem pontuou o juízo Suscitado.

(…)

Destarte, opina-se pela IMPROCEDÊNCIA do presente conflito, determinado que o feito siga em curso perante o JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS, ora suscitante. (ID 72446027).

 

No contexto fático e procedimental delineado, data vênia do Voto apresentado pelo Exmo. Des. Relator, entendo que o conflito deve ser julgado improcedente, para que a ação de origem seja apreciada e julgada pelo MM. Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA.

 

Conclusão

 

Ante o exposto, divergindo do posicionamento adotado pelo Eminente Relator originário, voto pelo julgamento IMPROCEDENTE do conflito, mantendo a competência do Juízo da Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Barreiras/BA.

 

 

É como voto.

 

Nilson Soares Castelo Braco – Seção Criminal

Relator designado p/ Acórdão

 



[1] Art. 23. Os órgãos responsáveis pela organização judiciária poderão criar juizados ou varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente. Parágrafo único. Até a implementação do disposto no caput deste artigo, o julgamento e a execução das causas decorrentes das práticas de violência ficarão, preferencialmente, a cargo dos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins.

[2] Art. 23. Os órgãos responsáveis pela organização judiciária poderão criar juizados ou varas especializadas em crimes contra a criança e o adolescente. Parágrafo único. Até a implementação do disposto no caput deste artigo, o julgamento e a execução das causas decorrentes das práticas de violência ficarão, preferencialmente, a cargo dos juizados ou varas especializadas em violência doméstica e temas afins.

[3] Art. 1º Compete à 1ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras processar e julgar as causas os crimes e as contravenções não expressamente atribuídos a outro Juízo, nos termos do art. 83, da Lei nº 10.845 de 27 de novembro de 2007 – Lei de Organização e Divisão Judiciária do Estado da Bahia.

[4] Art. 2º Fica alterada a denominação e a competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras para Vara de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Barreiras, com competência para processar e julgar, privativa e exclusivamente, os feitos decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Parágrafo único. Na área cível, a competência da 2ª Vara Criminal da Comarca de Barreiras abrange apenas o processo e a execução de Medidas Protetivas de Urgência, definidas nos arts. 22 a 24 da Lei Federal n° 11.340/06 (Lei Maria da Penha).

 

 

 


 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Seção Criminal 



Processo: CONFLITO DE JURISDIÇÃO n. 8002524-44.2023.8.05.0022
Órgão Julgador: Seção Criminal
SUSCITANTE: JUÍZO DA VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS
Advogado(s): 
SUSCITADO: JUIZO DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARREIRAS - BA
Advogado(s): 


VOTO


O Juízo suscitado verificando que as vítimas do suposto fato criminoso se tratavam de menores de idade, declinou de sua competência, aduzindo tratar-se de demanda afeta à Vara de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, também competente para apreciar os feitos nos quais a vítima seja criança ou adolescente.

O Juízo suscitante – VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER, por não haver vislumbrado que o suposto crime tenha se verificado devido a circunstância de ser as vítimas adolescentes, suscitou o conflito negativo de competência.

Após exame criterioso das peças encartadas aos autos, entendo que há de se julgar procedente o presente conflito. De fato, assiste razão ao Juízo Suscitante.

Impende destacar, inicialmente, que a 2ª Vara Crime da Comarca de Barreiras teve sua competência definida (Lei de Organização e Divisão Judiciária do Estado da Bahia), que lhe conferiu a atribuição, no art. 131, parágrafo único, para julgar também os crimes praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher e também contra a Criança e Adolescente (diante da inexistência de Vara Especializada em Crimes Contra Criança e Adolescente, nesta comarca).

Por sua vez, o art. 85 da Lei de Organização e Divisão Judiciária do Estado da Bahia define a competência dos Juízes das Varas dos Feitos Criminais praticados contra Criança e Adolescente:

 

Art. 85 – Aos Juízes das Varas dos Feitos Criminais praticados contra Criança e Adolescente compete processar e julgar os crimes e as contravenções penais, cujas vítimas sejam crianças e adolescentes, bem como os incidentes processuais atinentes, ressalvada a competência das Varas do Júri, de Acidente de Veículos e do Juizado Especial Criminal.

Parágrafo único – Aos Juízes das Varas dos Feitos Criminais praticados contra Criança e Adolescente incumbe, ainda, exercer as demais atribuições que lhes forem conferidas por lei, regimento ou outro ato normativo.

 

Com efeito, o que se pondera para fins de definir a competência da VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER – Juízo Especializado, não é apenas a idade que a vítima tinha quando da ocorrência do crime, mas a existência ou não da efetiva vulnerabilidade.

Da análise do conjunto probatório, em especial dos depoimentos colhidos durante a fase inquisitorial, não se colhe qualquer circunstância apta a atrair a competência da Vara Especializada, uma vez que o crime foi supostamente praticado sem ter como causa preponderante a vulnerabilidade do adolescente.

As vítimas adolescentes, quando das suas declarações em Delegacia (fls. 45/59, Id 52121713), não narraram nenhum elemento que trouxesse a sua vulnerabilidade, na condição de menores de idade, como fator determinante para a ação criminosa.

Com efeito, na hipótese, o que se verifica é que o acusado visava subtrair os celulares das vítimas, por acaso menores de idade.

Não há provas de que a ação do agente tenha sido motivada por serem adolescentes. Nada leva a crer que se o agente soubesse que, ao invés dos menores, estariam vítimas adultas, a prática delitiva não teria sido executada.

Destarte, imperioso concluir que a natureza do crime imputado a ambos os denunciados não teve como causa decisiva a idade da vítima.

Certo é que a competência da VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER, também competente para julgar Crimes Praticados Contra Criança e Adolescente não pode ser definida, tão somente, pela idade da vítima.

A competência do Juízo Especializado só se justificaria se houvesse elementos aptos a indicar que o fato das vítimas serem adolescentes teria sido determinante para a ação criminosa.

Nesta linha de intelecção, constatando-se que a idade da vítima não foi condição fundamental para a prática delitiva, inexiste razão para que o julgamento da causa ocorra na VARA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER DA COMARCA DE BARREIRAS.

Não basta a confirmação da menoridade de um dos ofendidos para o feito ser processado e julgado perante juízo especializado, ou perante aquele que acumule atribuição afeita aos delitos que tenham como vítimas crianças e adolescentes.

Afigura-se imperioso, portanto, para fins de deslocamento de competência, que a fragilidade do menor seja condição determinante para a prática do delito, como objetiva a norma insculpida no art. 85 da Lei Estadual 10.845/2007.

 

No mesmo sentido, vem decidindo os Tribunais pátrios:

 

PENAL. PROCESSO PENAL, CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. CRIME DE ROUBO MAJORADO. VÍTIMA MENOR DE IDADE. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO NÃO EXIGE VÍTIMA ESPECÍFICA. INEXISTÊNCIA DE VULNERABILIDADE APTA A JUSTIFICAR O PROCESSAMENTO NA JUSTIÇA ESPECIALIZADA. NÃO SE DENOTA QUE O DELITO FOI PRATICADO EM RAZÃO DA IDADE DA VÍTIMA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE PARA ATUAR NO FEITO ORIGINÁRIO. PARECER DA DOUTA PROCURADORIA GERAL DE JUSTIÇA NESSA LINHA. UNANIMIDADE.(Número do Processo: 0500173-43.2017.802.0000; Relator(a): Des. João Luiz Azevedo Lessa; Comarca: Foro de Maceió; órgão Julgador: Câmara Criminal; Data de Julgamento: 07/03/2018; Data de registro: 09/03/2018)

 

Em caso similar, já decidiu em igual sentido esta Seção Criminal:

 

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. VARA DOS CRIMES CONTRA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE E VARA COMUM. CONEXÃO ENTRE OS CRIMES DE RECEPTAÇÃO E CORRUPÇÃO DE MENORES. CRIME DE CORRUPÇÃO DE MENORES É SECUNDÁRIO EM RELAÇÃO AO PRINCIPAL. DELITO PRINCIPAL (RECEPTAÇÃO) PRATICADO COM O AUXÍLIO EFETIVO DO MENOR. MENORIDADE PRESCINDÍVEL PARA A REALIZAÇÃO DO DELITO. COMPETÊNCIA DA VARA CRIMINAL COMUM. Nos conflito de competência em que há crimes conexos envolvendo menores, define-se a atribuição pela vara comum, quando a menoridade não for determinante para a realização do delito (Classe: Conflito de Jurisdição, Número do Processo: 0512618-14.2014.805.0001, Relator(a): Nágila Maria Sales Brito, Seção Criminal, Publicado em: 17/06/2015)

 

CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do conflito e, no mérito, julgá-lo procedente, para fixar a competência da 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE BARREIRAS.

 

É como voto.

 

Salvador, de de 2024.

 

DES. CARLOS ROBERTO SANTOS ARAÚJO

RELATOR