PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Segunda Câmara Cível APELAÇÕES CÍVEIS PRINCIPAL E ADESIVA. DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO CIVIL E DIREITO IMOBILIÁRIO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C PERDA DE UMA CHANCE. VENDA DE IMÓVEL. RECURSO PROVENIENTE DE MOEDA ESTRANGEIRA. EUROS. COMPRADOR ESTRANGEIRO. LIMITAÇÕES IMPOSTAS PELO BANCO CENTRAL E LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. ESCRITURA DE CESSÃO DE DIREITOS DE POSSE E BENFEITORIAS. NÃO SUFICIENTE. DOCUMENTOS DE CERTIDÃO DE MATRÍCULA E CONTRATO DE COMPRA E VENDA EXIGIDO PELA INSTITUIÇÃO NÃO APRESENTADOS PELA AUTORA. DANOS MORAIS E MATERIAIS POR PERDA DE UMA CHANCE NÃO CONFIGURADOS. APELO PRINCIPAL PROVIDO. APELAÇÃO ADESIVA PREJUDICADA. A Escritura Pública é o instrumento jurídico da manifestação de vontade entre uma ou mais pessoas envolvidas, perante um Tabelião ou Escrevente Autorizado do Tabelião, que tem a responsabilidade de formalizar o evento que lhe foi descrito. Esta é indispensável para dar validade formal ao ato de Compra e Venda e proporciona maior segurança jurídica a todos os interessados. Existe uma diferença sobre a compra e venda, pois, o imóvel pode ser uma posse, devemos considerar que a propriedade e posse são direitos distintos. Quando a lavratura da Escritura Pública de Compra e Venda estiver finalizada, basta ir a registro no Cartório de Registro de Imóveis do município da localização do imóvel (segundo o artigo 1.227 e 1.245 do Código Civil) para ser efetuada a transferência de propriedade do referido imóvel. A posse imobiliária, embora goze de anterioridade em relação a propriedade, se apresenta dogmaticamente como uma situação de fato, o que delimita seu menor alcance. Apesar da limitação em relação a propriedade, a posse também alcança o bem imóvel diretamente, em sua individualidade concreta e objetiva, gerando um conjunto de atributos, porém não sintetizados em um título registrável. No tocante a imóveis urbanos, a regra geral é que não há restrição à aquisição da propriedade por estrangeiro, seja ele residente ou não residente no Brasil. A exceção é a aquisição de imóvel da União, nas hipóteses dos arts. 100 e 205 do Decreto-lei nº 9.760, de 15-9-46, nas quais é exigida dos estrangeiros a autorização do Presidente da República. A Autora/Apelada, apenas apresentou uma escrituração de cessão de direitos de posse e benfeitorias e um contrato de compra e venda feito entre particulares com reconhecimento de firma, que na nossa legislação nada garante contra terceiros, conforme Id 15817515 (que no mínimo pode lhe dar uma indenização, a exemplo se ocorrer uma desapropriação ou servir para uma ação de usucapião). A conclusão da operação financeira era precedida e preparada por documentos hábeis a atender as diretrizes normativas do Banco Central e a legislação brasileira como já pontuado. Nesta fase, incumbia a apelada a apresentar os documentos solicitados, o que não se configurou nos autos. Alega a apelada que se passaram 94 dias sem que obtivesse qualquer resposta ou orientação da sua agência bancária, sendo que a Ordem de Pagamento já se encontrava em sua conta no valor de 50.000 (cinqüenta mil euros). Ora, no ID 15817518 verifica-se que o Banco do Brasil esclarece que a liquidação da ordem de pagamento do exterior permanece na dependência da apresentação da documentação que comprove a PROPRIEDADE DO IMÓVEL (MATRÍCULA DO IMÓVEL EMITIDA A MENOS DE 6 MESES) assim como Compromisso de Compra e Venda por meio de Escritura Pública da Transação atual. Importante destacar que todos estes elementos corroboram a tese defendida pelo Apelante, no sentido de que não há o dever de indenizar, pois o mesmo solicitou, a documentação necessária para dar liquidação a ordem de pagamento, pois do contrário poderia agir de maneira temerária, contra legem. Com esteio neste entendimento, impõe-se reconhecer a improcedência total dos pedidos formulados na peça vestibular e adequar o resultado do julgamento, invertendo os ônus de sucumbência. Em razão da decisão favorável ao Apelante Principal, fica a análise do recurso adesivo prejudicada. Vistos, relatados e discutidos estes autos de n. 0545356-55.2014.8.05.0001, em que figuram como apelante BANCO DO BRASIL S/A e outros e como apelada NAIRLENE SILVA DO ESPIRITO SANTO e outros. ACORDAM os magistrados integrantes da Segunda Câmara Cível do Estado da Bahia, por unanimidade, em dar provimento à apelação principal, para reformar a sentença e julgar improcedente os pedidos de indenização por dano moral e material, prejudicada à apelação adesiva, nos termos do voto da Relatora. Salvador, .
Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0545356-55.2014.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Cível
APELANTE: BANCO DO BRASIL S/A e outros
Advogado(s): RICARDO LOPES GODOY, DANIELA ALMEIDA NASCIMENTO, LOUISE CARVALHAL FRANCA SIMOES
APELADO: NAIRLENE SILVA DO ESPIRITO SANTO e outros
Advogado(s):DANIELA ALMEIDA NASCIMENTO, LOUISE CARVALHAL FRANCA SIMOES, RICARDO LOPES GODOY
ACORDÃO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL
DECISÃO PROCLAMADA |
Conhecido e provido Por Unanimidade
Salvador, 5 de Abril de 2022.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Segunda Câmara Cível Cuida-se de recurso de apelação cível interposta pelo Banco do Brasil (Id 15817553) e apelação adesiva interposta por Nairlene Silva do Espirito Santo (Id 15817558) em face sentença prolatada (Id 15817544) pelo Juízo da 1ª Vara de Relações de Consumo, desta Capital, na Ação de Indenização por danos materiais e morais em que contendem as partes. Adoto o relatório da sentença em que a Magistrada a quo julgou procedente em parte os pedidos autorais para condenar o réu a pagar à autora: danos morais, a importância de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), acrescido de juros (desde a citação) e correção monetária (a partir do arbitramento); e danos materiais, o valor equivalente a 50% (cinquenta por cento) do valor total vinculado ao negócio desfeito, qual seja, R$ 82.000,00 (oitenta e dois mil reais), devidamente atualizado, desde a data do efetivo prejuízo, conforme Súmula 43 do STJ, devendo o réu arcar com a integralidade das custas e honorários, estes fixados em 20% sobre o valor da condenação. Foi oposto embargos de declaração pela parte autora (Id 15817546), o qual foi rejeitado na sentença prolatada no Id 15817551. Nas razões recursais do Banco do Brasil - réu, ora apelante, em suma, alega necessidade de indeferimento da petição inicial por inépcia ante a não comprovação de falha na prestação do serviço, vez que para receber ordem de pagamento do exterior ou realizar operações de compra de moeda estrangeira é obrigatório que o cliente declare ao Banco a finalidade (motivo) do recebimento dos recursos. E, que, a partir da finalidade declarada pelo beneficiário da ordem, são solicitados os documentos para respaldar a pretendida operação de câmbio. No mérito, alega não ter configurado ausência de perda da chance, pois a parte não demonstrou a iminente possibilidade de haver o suposto ganho alegado, sendo ainda impossível atribuir a parte recorrente a responsabilidade por qualquer perda ou impossibilidade de ganho ocorrida, o que leva inexistência de dano moral e material. Salientou que a jurisprudência do e. STJ se consolidou no sentido de que, nos casos de responsabilidade contratual em que a obrigação é líquida, os juros de mora fluem desde a data da citação, nos termos da norma do art. 405 do CC/02. Sustentou que a indenização por dano moral afigura-se exorbitante e que a verba sucumbencial deve ser invertida ou, subsidiariamente, que o valor máximo imposto seja definido no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Por fim, requer seja recebido e conhecido o presente recurso e, ao final, dado provimento para julgar improcedente o pedido da autora, bem como condenar a autora em custas e honorários advocatícios. A parte autora, no ID 15817558, interpôs recurso de apelação adesivo, para reformar a decisão do Juízo a quo, a fim de majorar os danos materiais e morais, determinando, ainda, quanto a estes últimos a incidência dos juros a partir da data do evento danoso (29.12.2013). Contrarrazões apresentadas por NAIRLENE SILVA DO ESPIRITO SANTO na ID 15817559 pugnando pelo improvimento do apelo. Contrarrazões apresentadas pelo Banco do Brasil S/A na ID 15817565, alegando, preliminarmente, ausência de dialeticidade recursal e, no mérito, pugnou pelo improvimento do recurso adesivo. Em cumprimento ao art. 931, do CPC/2015, restituo os autos à Secretaria, com relatório, ao tempo em que, solicito dia para julgamento, salientando a possibilidade de sustentação oral, nos termos do art. 937, I, do CPC/2015. Salvador/BA, em 18 de março de 2022. Desa. Lisbete Maria Teixeira Almeida Cézar Santos Relatora 1
Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0545356-55.2014.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Cível
APELANTE: BANCO DO BRASIL S/A e outros
Advogado(s): RICARDO LOPES GODOY, DANIELA ALMEIDA NASCIMENTO, LOUISE CARVALHAL FRANCA SIMOES
APELADO: NAIRLENE SILVA DO ESPIRITO SANTO e outros
Advogado(s): DANIELA ALMEIDA NASCIMENTO, LOUISE CARVALHAL FRANCA SIMOES, RICARDO LOPES GODOY
RELATÓRIO
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Segunda Câmara Cível Como exposto no relatório, cuida-se de recurso de apelação cível interposta pelo Banco do Brasil (Id 15817553) e apelação adesiva interposta por Nairlene Silva do Espirito Santo (Id 15817558) em face sentença prolatada (Id 15817544) pelo Juízo da 1ª Vara de Relações de Consumo, desta Capital, na Ação de Indenização por danos materiais e morais em que contendem as partes. Adoto o relatório da sentença em que a Magistrada a quo julgou procedente em parte os pedidos autorais para condenar o réu a pagar à autora: danos morais, a importância de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), acrescido de juros (desde a citação) e correção monetária (a partir do arbitramento); e danos materiais, o valor equivalente a 50% (cinquenta por cento) do valor total vinculado ao negócio desfeito, qual seja, R$ 82.000,00 (oitenta e dois mil reais), devidamente atualizado, desde a data do efetivo prejuízo, conforme Súmula 43 do STJ, devendo o réu arcar com a integralidade das custas e honorários, estes fixados em 20% sobre o valor da condenação. Antes de adentrarmos as análises dos presentes recursos deve-se estabelecer algumas premissas. A Escritura Pública é o instrumento jurídico da manifestação de vontade entre uma ou mais pessoas envolvidas, perante um Tabelião ou Escrevente Autorizado do Tabelião, que tem a responsabilidade de formalizar o evento que lhe foi descrito. Sendo que o Cartório de Tabelionatos de Notas e seus respectivos representantes estão legalmente dotados de fé pública. Entre os vários tipos de escrituras públicas se tem a compra e venda e cessão de direitos de posse. Esse é indispensável para dar validade formal ao ato de Compra e Venda e proporciona maior segurança jurídica a todos os interessados. Existe uma diferença sobre a compra e venda, pois, o imóvel pode ser uma posse, devemos considerar que a propriedade e posse são direitos distintos. Aquele que compra um imóvel que possui registro imobiliário no Cartório de Registro de Imóveis do município, está adquirindo a propriedade total do imóvel, ou seja, está adquirindo o direito real sobre esse imóvel comprado. Deve-se lavrar, no Cartório de Notas, uma Escritura Pública de Compra e Venda, que é o instrumento jurídico fundamental para a obtenção da propriedade plena. Quando a lavratura da Escritura Pública de Compra e Venda estiver finalizada, basta ir a registro no Cartório de Registro de Imóveis do município da localização do imóvel (segundo o artigo 1.227 e 1.245 do Código Civil) para ser efetuada a transferência de propriedade do referido imóvel. Aquele que compra um imóvel que não possui registro imobiliário no Cartório de Registro de Imóveis do município de localização do imóvel, está adquirindo somente a posse do referido imóvel, isso é, está adquirindo apenas o direito pessoal de exercer a posse desse imóvel comprado. Quando se deseja comprar um imóvel não registrado no Cartório de Registro de Imóvel, deve-se lavrar uma Escritura Pública de Cessão de Direitos de Posse, pois o vendedor ou cedente detém somente a posse do imóvel, mas não é o proprietário. O vendedor ou cedente, cede a posse que lhe pertence ao comprador ou cessionário, que manterá até que possa obter do Poder Judiciário a propriedade plena do imóvel comprado, através de uma Ação de Usucapião. Na lavratura dessa Escritura Pública de Cessão de Direitos de Posse não há incidência do Imposto ITBI. O instrumento fundamental para a obtenção da propriedade integral junto ao Poder Judiciário, através da Ação de Usucapião, é a Escritura Pública de Cessão de Direitos de Posse. O contrato Particular de Compra e Venda, com ou sem o reconhecimento das assinaturas das partes, não tem a fé pública dada pelo Tabelião, portanto, não tem a forma e nem os efeitos jurídicos legais de uma Escritura Pública. A Escritura Pública é a garantia de regularidade na compra de um imóvel e permite enfatizar a frase “Só é dono quem registra”. As referidas Escrituras Públicas (Compra e Venda ou Cessão de Direitos de Posse) lavradas no Cartório de Notas permanecem arquivadas no acervo do cartório por tempo indeterminado, sendo possível a requisição de uma certidão do ato sempre que necessário. Em relação aos bens imóveis, há uma linha divisória bem definida, em razão do sistema dominial que exige título registrado no folio real para admissão da propriedade, circunstancia que concentra a posse na aparência e visibilidade. O Superior Tribunal de Justiça – STJ, no REsp 1739042 - Relatora Min. Nancy Andrighi. Julgamento: 8 set. 2020, reconheceu que existe autonomia entre o direito de propriedade e o direito de posse. O STJ declarou, ainda, que existe expressão econômica do direito possessório, razão pela qual pode a posse ser objeto de partilha, não sendo óbice nem mesmo o fato de o imóvel estar situado em loteamento irregular. O exercício da posse, efetivamente, é um direito com expressão econômica, podendo ser estimado pecuniariamente, sendo assim um direito transmissível inter vivos, por cessão gratuita ou onerosa, ou partilhável, seja em decorrência de divórcio ou de óbito. Qualquer modalidade de partilha, oportuno lembrar, pode ser feita em Tabelionato de Notas, nos termos do Código de Processo Civil, art. 610, § 1º e 733, se os interessados forem capazes e estiverem de acordo e, no caso do divórcio, se não houver filho nascituro ou incapaz. Em um esclarecedor artigo a Tabeliã e Professora Letícia Maculan do estado de Minas Gerais, sustenta que os direitos possessórios são bens incorpóreos suscetíveis de cessão inter vivos ou transmissão causa mortis, mediante escritura pública lavrada pelo tabelião de notas. (ASSUMPÇÃO, Letícia Franco Maculan; RIBEIRO, Paulo Hermano Soares. A Transmissibilidade de Direitos Possessórios por Escritura Pública. Disponível em: https://www.sinoregmg.org.br/post/artigo-a-transmissibilidade-de-direitos-possess%C3%B3rios-por-escritura-p%C3%BAblica.Acesso em: 14 março. 2022). A afirmação de que o citado artigo sobre a posse e a necessidade e possibilidade de levá-lo a cessão de direitos de posse pode ser escriturado é tão clara, que logo após o ano de 2014, esclareço após o ajuizamento da presente ação, a Lei Federal nº 13.097/2015 – conversão em lei da Medida Provisória nº 656/2014 – alterou a Lei nº 7.433/85 e instituiu a concentração dos atos na matrícula do imóvel, objetivando dar maior segurança aos negócios imobiliários, assim atos jurídicos que não estiverem averbados ou registrados na matrícula do imóvel não poderão ser opostos a terceiros de boa-fé. E, vou além nesse intróito, pois o artigo acima citado merece maiores digressões. O império sobre as coisas, posse e domínio são fenômenos que se aproximam um do outro, tanto pela sua complementaridade quanto pela perspectiva que oferecem ao titular e observador, variando essencialmente na sua formalização. A propriedade, ou domínio, alcança o bem imóvel diretamente, em sua individualidade concreta e objetiva, gerando um conjunto de atributos comprimidos no título com assento possível no registro imobiliário. Trata-se de um poder sobre a coisa, chancelado pela norma, cuja natureza de direito real é indiscutível, e transforma todas as demais pessoas em sujeitos passivos universais do direito de propriedade. A posse imobiliária, embora goze de anterioridade em relação a propriedade, se apresenta dogmaticamente como uma situação de fato, o que delimita seu menor alcance. Apesar da limitação em relação a propriedade, a posse também alcança o bem imóvel diretamente, em sua individualidade concreta e objetiva, gerando um conjunto de atributos, porém não sintetizados em um título registrável. O fato da posse cria no ordenamento direitos e obrigações que não existiam até o momento da apreensão, e o Estado assegura tais efeitos – direitos e obrigações emergentes – com o rico rol protetivo que faz cercar a posse imobiliária. Flávio Tartuce defende que “a posse é um direito de natureza especial, o que pode ser retirado da teoria tridimensional do Direito, de Miguel Reale. ” Para esse autor, “se o Direito é fato, valor e norma, logicamente a posse é um componente jurídico, ou seja, um direito.” TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 6ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, p. 917-919. Esse mesmo autor menciona ainda a dissertação de mestrado de Marcos Alberto Rocha Gonçalves, defendida na PUC, que versa sobre a “posse como direito autônomo”, nas p. 919-920. Luiz Edson Fachin assevera que a posse compreendida como mera exteriorização da propriedade “é um fato com algum valor jurídico, mas, como conceito autônomo, a posse pode ser concebida como um direito”. FACHIN, Luiz Edson. A função social da posse e a propriedade contemporânea (uma perspectiva da usucapião imobiliária rural). Porto Alegre: Fabris, 1988, p. 19. No direito positivo vigente, a usucapião é instituto ímpar para revelar a importância da posse como autônoma geradora de direitos a partir de um fato. Nesse prisma, restou demonstrado que a usucapião concretiza a função social da posse à medida que penaliza o proprietário que não cumpre a função social da sua propriedade. Embora não constitua nenhuma alteração substancial, o princípio da função social representa um avanço em prol do alargamento das instituições. FACHIN, Luiz Edson. A função social da posse e a propriedade contemporânea (uma perspectiva da usucapião imobiliária rural). Porto Alegre: Fabris, 1988, p. 95. Certo que o ordenamento reconhece os direitos possessórios, é preciso estabelecer que tais direitos incidem sobre uma coisa corpórea, mas, enquanto direitos estão situados na categoria de bens incorpóreos a integrar o patrimônio de seu titular, compreendendo mais um item do complexo de relações jurídicas de uma pessoa, dotadas de valor econômico (Código Civil de 2002, art. 91). Como aludido acima, logo, não há dúvidas quanto ao espesso conteúdo econômico e patrimonial da posse. A dicção do art. 6º da Lei 8.935/1994 utiliza verbos imperativos como aos notários compete formalizar juridicamente a vontade das partes, e, intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou redigindo os instrumentos adequados. (op.cit Letícia Maculan) O direito de posse possui expressão econômica e é transmissível, tanto entre vivos (cessão onerosa, por doação ou mesmo por partilha decorrente de divórcio), quanto em decorrência da morte. A partilha ou transmissão da posse pode ser feita em Tabelionato de Notas, como expressamente reconhece o Código de Processo Civil nos artes. 610, § 1º (escritura de inventário) e 733 (escritura de divórcio), desde que os interessados sejam capazes e estejam de acordo e, no caso do divórcio, se não houver filho nascituro ou incapaz. Depois da entrada em vigor do CPC, que ocorreu em 18 de março de 2016, o contexto jurídico é no sentido de incentivar o uso da ata notarial e da escritura de cessão de posse, nas hipóteses em que não seja possível a transmissão da propriedade, o que deverá ser examinado detidamente pelo tabelião. A escritura de cessão de posse facilitará muito, no futuro, a usucapião, judicial ou extrajudicial. (op.cit Letícia Maculan) Importante observar que não existe nenhuma norma legal que proíba a lavratura de escritura pública de cessão de posse, sendo que o ato servirá como “prova plena” da manifestação de vontade das partes e dos intervenientes, nos termos do Código Civil, art. 215. Pois bem. Essa introdução fez-se necessária para entendermos a celebração contratual exigida pelo Banco do Brasil, ora apelante, que tem o dever de cumprir com as normas brasileiras no tocante a aquisição de imóvel por estrangeiros. No tocante a imóveis urbanos, a regra geral é que não há restrição à aquisição da propriedade por estrangeiro, seja ele residente ou não residente no Brasil. A exceção é a aquisição de imóvel da União, nas hipóteses dos arts. 100 e 205 do Decreto-lei no 9.760, de 15-9-46, nas quais é exigida dos estrangeiros a autorização do Presidente da República. Portanto, fora da hipótese acima mencionada, é totalmente livre a aquisição da propriedade urbana no Brasil, seja a que título for (compra, doação, herança etc). Livre também é a utilização dessa propriedade, com as mesmas limitações a que estão os brasileiros sujeitos, assim como a aquisição dos frutos dessa propriedade não sofre limitação. A utilização direta da propriedade pelo estrangeiro está sujeita, porém, à permissão de entrada no território nacional pelas autoridades consulares e de fronteiras. Dispõe o art. 6o da Lei no 6.815, de 19-8-1980: “A posse ou a propriedade de bens no Brasil não confere ao estrangeiro o direito de obter visto de qualquer natureza, ou autorização de permanência no território nacional.” à propriedade rural, pode a lei estabelecer limitações. É o que dispõe o art. 190 da Constituição Federal: “Art. 190. A lei regulará e limitará a aquisição ou o arrendamento de propriedade rural por pessoa física ou jurídica estrangeira e estabelecerá os casos que dependerão de autorização do Congresso Nacional.” A lei trata inclusive diferentemente, o estrangeiro residente do estrangeiro não residente no Brasil, o que não cabe maiores explicações no caso dos autos. Ora, no caso dos autos, a Autora/Apelada, conforme Id 15817515, apenas apresentou uma escrituração de cessão de direitos de posse e benfeitorias e um contrato de compra e venda feito entre particulares com reconhecimento de firma, que na nossa legislação nada garante contra terceiros. Tem-se, lado outro, que o Banco do Brasil solicitou a certidão de matrícula com declaração de ônus reais. O cerne da presente ação é entender os atos processuais realizados pelos cartórios, ou seja, Cartório de Registro de Imóveis – que daria a certidão de matrícula, exigida pelo Banco do Brasil ou qualquer outra instituição financeira. Na escritura pública, compete ao tabelião identificar as pessoas, qualificá-las, conferir os dados do imóvel e verificar a representação das partes e, ainda, verificar se os tributos foram recolhidos corretamente. No instrumento particular, não há a intervenção do tabelião e todas essas conferências ficam a cargo do oficial do Registro de Imóvel. O tabelião também realiza a escritura pública de compra e venda; de cessão de direitos de posse e benfeitorias, conforme Id 15817515 (que no mínimo pode lhe dar uma indenização, a exemplo se ocorrer uma desapropriação ou servir para uma ação de usucapião). Não há nos autos qualquer ato ilícito praticado pelo Apelante, vou além, caso a instituição financeira fosse a frente com a celebração contratual entre as partes, estes encontrariam barreiras na vias cartorárias, que inclusive são obrigados a comunicar tais fatos ao COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras, que por sinal sofreu várias modificações nos últimos anos. Percebam, que o documento acostados aos autos, lavrada no Tabelionato de Notas, em 10 de julho de 1990, não consta qualquer registro de matrícula no Cartório de Imóveis, demonstra de fato a posse da Apelada de uma propriedade, situada no lugar denominado Malhadas de Açu da Torre, no município de Mata de São João, além de levar a entender que se trata de um terreno rural, pelo que já possuí limitações na legislação brasileira quando for adquirido por estrangeiro não residente no país e em valor acima de 30 (trinta salários mínimos). Lado outro, a indenização por danos morais e materiais pela teoria da perda de uma chance é reconhecida pelo direito de uma parte a ser indenizada pela conduta negligente de um funcionário, o qual impediu que certo procedimento prosseguisse e, assim, tirou da parte a possibilidade de ganhar o processo. No julgamento do REsp 1.291.247, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino explicou que a teoria foi desenvolvida na França (la perte d'une chance) e tem aplicação quando um evento danoso acarreta para alguém a frustração da chance de obter um proveito determinado ou de evitar uma perda. A Justiça francesa entendeu que a perda da chance para a parte demandante não foi apenas um prejuízo hipotético – embora não houvesse certeza acerca da decisão que seria tomada pelo tribunal no julgamento daquele caso. "Em função disso, a jurisprudência francesa passou a reconhecer a existência de um dano certo e específico pela perda de uma chance, determinando o arbitramento da indenização em conformidade com a maior ou menor probabilidade de sucesso", afirmou. REsp 1291247(2011/0267279-8 de 01/10/2014). Alega a apelada que se passaram 94 dias sem que obtivesse qualquer resposta ou orientação da sua agência bancária, sendo que a Ordem de Pagamento já se encontrava em sua conta no valor de 50.000 (cinqüenta mil euros). Ora, no ID 15817518 verifica-se que o Banco do Brasil esclarece que a liquidação da ordem de pagamento do exterior permanece na dependência da apresentação da documentação que comprove a PROPRIEDADE DO IMÓVEL (MATRÍCULA DO IMÓVEL EMITIDA A MENOS DE 6 MESES) ASSIM COMO Compromisso de Compra e Venda por meio de Escritura Pública da Transação atual. (destaque necessário). Saliento que tais documentos já haviam sido solicitados, conforme e-mail de ID 15817519, sendo juntado a escritura de cessão de direitos de posse, mais uma vez, de 20 de fevereiro de 2014. A conclusão da operação financeira era precedida e preparada por documentos hábeis a atender as diretrizes normativas do Banco Central e a legislação brasileira como já pontuado. Nesta fase, incumbia a apelada a apresentar os documentos solicitados, o que não se configura nos autos. Importante destacar que todos estes elementos corroboram a tese defendida pelo Apelante, no sentido de que não há o dever de indenizar, pois o mesmo solicitou, a documentação necessária para dar liquidação a ordem de pagamento, pois do contrário poderia agir de maneira temerária, contra legem. Com esteio neste entendimento, impõe-se reconhecer a improcedência total dos pedidos formulados na peça vestibular e adequar o resultado do julgamento, invertendo os ônus de sucumbência. Em razão da decisão favorável ao Apelante Principal, fica a análise do recurso adesivo prejudicada, inclusive a preliminar de ausência de dialeticidade recursal. Isso posto, dá-se provimento à apelação principal, para reformar a sentença e julgar improcedente os pedidos de indenização por dano moral e material, prejudicada à apelação adesiva. Inverto os ônus sucumbenciais, cabendo à autora/apelante adesiva o pagamento de 20% das custas, inclusive recursais, e dos honorários advocatícios que deixo de majorar por já se encontrar no limite fixado, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. Suspendo a exigibilidade dessas verbas quanto à autora/apelante adesiva, em face da gratuidade judicial deferida em primeira instância. Salvador/BA, Desa. Lisbete Maria Teixeira Almeida Cézar Santos Relatora 1
Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0545356-55.2014.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Cível
APELANTE: BANCO DO BRASIL S/A e outros
Advogado(s): RICARDO LOPES GODOY, DANIELA ALMEIDA NASCIMENTO, LOUISE CARVALHAL FRANCA SIMOES
APELADO: NAIRLENE SILVA DO ESPIRITO SANTO e outros
Advogado(s): DANIELA ALMEIDA NASCIMENTO, LOUISE CARVALHAL FRANCA SIMOES, RICARDO LOPES GODOY
VOTO