RECURSO Nº: 0002182-28.2020.8.05.0103
RECORRENTE(S): THAIS RIBEIRO DOS SANTOS
ADVOGADO: IVAN FERRAZ DE ANDRADE FILHO; ULLI MARIANA SILVA SALES
RECORRIDO(S): CLINICA SAUDE VIDA
ADVOGADO: ANTONIO CARLOS SARMENTO JUNIOR; AZENALDO OLIVEIRA BONFIM JUNIOR
JUIZ RELATOR: ALBENIO LIMA DA SILVA HONORIO
ORIGEM: 2ª Vara do Sistema dos Juizados - ILHÉUS
EMENTA
RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. ALEGAÇÃO DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO DE CLÍNICA EM EXAME DE ULTRA-SONOGRAFIA PÉLVICA, QUE TERIA ATESTADO SER A AUTORA PORTADORA DE TUMORAÇÃO EM OVÁRIO, INFORMAÇÃO QUE NÃO TERIA SIDO CONFIRMADA EM EXAME POSTERIOR DE TOMOGRAFIA. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. JULGAMENTO IMPROCEDENTE DOS PEDIDOS. AUSÊNCIA DE PROVA DO DIREITO CONSTITUTIVO ART. 373 I DO CPC/2015. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
relatório
Trata-se de recurso inominado interposto pela acionante contra sentença que julgou improcedentes os pedidos autorais.
¿(...)No caso em comento, repousa a pretensão da acionante em reparação moral por suposto diagnóstico errôneo emitido por profissional liberal que trabalha na clínica ré. No entanto, pela análise dos autos, observa-se que não assiste razão à parte autora, eis que o STJ adota uma posição restritiva acerca da responsabilidade objetiva dos hospitais, fazendo-a dependente da comprovação da responsabilidade subjetiva dos médicos, vejamos: CIVIL. INDENIZAÇÃO. MORTE. CULPA. MÉDICOS. AFASTAMENTO. CONDENAÇÃO. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE. OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1 - A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação técnico-profissional dos médicos que neles atuam ou a eles sejam ligados por convênio, é subjetiva, ou seja, dependente da comprovação de culpa dos prepostos, presumindo-se a dos preponentes. Nesse sentido são as normas dos arts. 159, 1521, III, e 1545 do Código Civil de 1916 e, atualmente, as dos arts. 186 e 951 do novo Código Civil, bem com a súmula 341 - STF (É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.). 2 - Em razão disso, não se pode dar guarida à tese do acórdão de arrimado nas provas colhidas, excluir, de modo expresso, a culpa dos médicos e, ao mesmo tempo, admitir a responsabilidade objetiva do hospital, para condená-lo a pagar indenização por morte de paciente. 3 - O art. 14 do CDC, conforme melhor doutrina, não conflita com essa conclusão, dado que a responsabilidade objetiva, nele prevista para o prestador de serviços, no presente caso, o hospital, circunscreve-se apenas aos serviços única e exclusivamente relacionados com o estabelecimento empresarial propriamente dito, ou seja, aqueles que digam respeito à estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia), etc e não aos serviços técnicos-profissionais dos médicos que ali atuam, permanecendo estes na relação subjetiva de preposição (culpa). 4 - Recurso especial conhecido e provido para julgar improcedente o pedido. (STJ, Relator: Ministro FERNANDO GONÇALVES, Data de Julgamento: 16/06/2005, T4 - QUARTA TURMA). No mesmo sentido: CIVIL. REPARAÇÃO DE DANOS. ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE DO MÉDICO ASSISTENTE E DO HOSPITAL. CONDUTA DANOSA DERIVADA EXCLUSIVAMENTE DA AÇÃO DO MÉDICO ASSISTENTE. NATUREZA SUBJETIVA. A AUSÊNCIA CULPA DO MÉDICO REPERCUTE NA RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL. 1. ¿A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação dos médicos que neles trabalham ou são igados por convênio, é subjetiva, dependendo da demonstração da culpa. Não se pode excluir a culpa do médico e responsabilizar objetivamente o hospital. A responsabilidade objetiva para o prestador do serviço prevista no art. 14 do CDC, no caso o hospital, limita-se aos serviços relacionados ao estabelecimento empresarial, tais como à estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos e serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia).¿ (STJ - AgRg no REsp 1385734/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 01/09/2014) APC 20140710195985 DF 0000987-20.1998.8.07.0007 Relator(a): GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA Julgamento: 19/11/2014 Órgão Julgador: 1ª Turma Cível. TJDFT. Assim, o que se pode extrair é justamente o que aponta a doutrina de Felipe Peixoti Braga Neto (Manual do Direito do Consumidor , 2014, Juspodivm, Salvador, p.203): Existem, portanto, em reação aos hospitais, duas situações em tese possíveis: O dano decorre de fatos e circunstâncias próprias do estabelecimento hospitalar (ausência de equipamentos, equipamentos estragados, ausência de medicamento ou medicamento estragados, más condições de higiene etc.); O dano decorre de erro médico ou dano causado por médico ou enfermeiro. Diante disso, na primeira hipótese a responsabilidade do hospital seria objetiva e na segunda hipótese seria subjetiva, eis que dependente sempre da comprovação da culpa do seu preposto. Por sua vez, culpa demanda falta de dever de cuidado por imperícia, negligência ou imprudência do médico causador do dano. Assim sendo, no caso em tela torna-se absolutamente imprescindível apurar a culpa da médica pediatra que supostamente teria causado o dano à parte autora. Todavia, não há qualquer prova nos autos no sentido de que teria a médica da referida unidade hospitalar causado os alegados transtornos. Cabe registrar, que, mesmo em se tratando de relação de consumo, a parte autora não está isenta de provar, ainda que minimamente, a existência do fato constitutivo sobre o qual fundamenta sua pretensão, consoante preceito insculpido no artigo 373, inciso I do CPC. Humberto Theodoro Júnior no livro Curso de Direito Processual Civil volume 1, pág. 478, 47ª Edição, editora forense dispõe que: ¿Cada parte, portanto, tem o ônus de provar os pressupostos fáticos do direito que pretenda seja aplicado pelo juiz na solução do litígio. Quando o réu contesta apenas negando o fato em que se baseia a pretensão do autor, todo o ônus probatório recai sobre este. Mesmo sem nenhuma iniciativa de prova, o réu ganhará a causa, se o autor não demonstrar a veracidade do fato constitutivo do seu pretenso direito¿. Ao contrário disso, o que se percebe da própria narrativa autoral, é que na sua obrigação de meio, a referida médica pediu exames e realizou certo diagnóstico para obtenção de um fim favorável à paciente, não se obrigando pela cura de eventual doença. Registre-se que a própria acionante confessa que a pediatra prescreveu remédios, ultrassom e tomografia, em razão das queixas de dores abdominais de sua filha que não cessavam. Nessa toada, nas palavras da Ministra Nancy Andrighi, da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, ¿a obrigação de meio limita-se a um dever de desempenho, isto é, há o compromisso de agir com desvelo, empregando a melhor técnica e perícia para alcançar um determinado fim, mas sem se obrigar à efetivação do resultado¿ (STJ - REsp: 1395254 SC 2013/0132242-9, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/10/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/11/2013). Inclusive Sérgio Cavalieri Filho elucida ainda que: Culpa e erro profissional são coisas distintas. Há erro profissional quando a conduta médica é correta, mas a técnica empregada é incorreta; há imperícia quando a técnica é correta, mas a conduta médica é incorreta. A culpa médica supõe uma falta de diligência ou prudência em relação ao que era esperável de um bom profissional escolhido como padrão; o erro é a falha do homem normal, consequência inelutável da falibilidade humana. E, embora não se possa falar em um direito ao erro, será este escusável quando invencível à mediana cultura médica, tendo em vista circunstâncias do caso concreto; (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 382.). Dessa forma, ante a falta de comprovação de culpa por parte do profissional liberal e preposto da ré (art. 14, §4º, do CDC) e de efetivo erro médico, não se pode reputar falho o serviço prestado por ambos, inclusive da pessoa jurídica acionada, o que afasta a responsabilidade pretendida. Nesse sentido também é o entendimento das Turmas Recursais do TJ/BA: RECURSO INOMINADO. CONSUMO. AUTORA ADUZ ERRO NO DIAGNÓSTICO REALIZADO EM EXAME NA CLÍNICA RÉ. TRANSVAGINAL QUE TERIA DETECTADO TUMOR BENIGNO, REALIZADA EM 19/12/2017. EM 20/12/2017 A AUTORA REALIZOU NOVO EXAME EM OUTRA CLÍNICA, SENDO DETECTADO TUMOR, COM NECESSIDADE CIRURGIA PARA A RETIRADA DO ÚTERO, OVÁRIOS E TROMPAS. PROCEDIMENTO REALIZADO COM SUCESSO. INOCORRÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DANOS A PARTE AUTORA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 373, I DO CPC. IMPROVIMENTO DO RECURSO. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. (1ª Turma Recursal - Classe: Recurso Inominado, Número do Processo: 0003549-25.2018.8.05.0211, Relator(a): SANDRA SOUSA DO NASCIMENTO MORENO, Publicado em: 17/04/2019) RECURSOS INOMINADOS SIMULTANEOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATENDIMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL SE RESUME AS CONDIÇÕES DO ESTABELECIMENTO, EQUIPAMENTOS E OUTROS ATOS RELACIONADOS A ESTRUTURA FÍSICA DO HOSPITAL. NÃO INCIDÊNCIA DA RESPONSANBILIDADE OBJETIVA. NECESSIDADE DE PROVA DA CULPA DOS MÉDICOS. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO DESPROVIDO DA AUTORA. RECURSO PROVIDO DA RÉ (3ª Turma Recursal - Classe: Recurso Inominado, Número do Processo: 0074717-04.2019.8.05.0001, Relator(a): KARLA KRISTIANY MORENO DE OLIVEIRA, Publicado em: 23/10/2019).Posto isto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado pela parte autora.¿
VOTO
Inicialmente, da análise dos requisitos extrínsecos de admissibilidade, cumpre-me anotar que o presente recurso preenche os requisitos legais de admissibilidade, razão pela qual o conheço.
A sentença hostilizada é incensurável, por isso merece confirmação pelos seus próprios fundamentos, servindo de acórdão a súmula do julgamento, conforme determinação expressa do art. 46 da Lei n° 9.099/95: ¿O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos seus próprios fundamentos, a súmula de julgamento servirá de acórdão¿.
Assim, voto no sentido de CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, para manter a sentença atacada pelos próprios fundamentos.
Custas e honorários advocatícios pela recorrente vencida, estes últimos arbitrados em 20% do valor da causa. Acaso beneficiário da justiça gratuita, fica provisoriamente isento.
ALBENIO LIMA DA SILVA HONORIO
Juiz Relator