RECURSO INOMINADO. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. DECISÃO MONOCRÁTICA. DIREITO DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. ATRASO EM VIAGEM DE ÔNIBUS DE COARACI-BA A ITABUNA-BA ÀS 18:35H, OCASIONANDO A PERDA DE OUTRO ÔNIBUS COM DESTINO A VILA VELHA-ES, QUE PARTIU DE ITABUNA ÀS 19:30H. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TRANSPORTADOR, NÃO EXIMIDA POR CAUSA EXCLUDENTE. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DESCUMPRIMENTO AO QUANTO DISPOSTO NA RESOLUÇÃO Nº 4.282, DE 17 DE FEVEREIRO DE 2014, NOS INCISOS V E VII, BEM COMO DA LEI Nº 11.975/09. REFORMA DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA PARA, JULGANDO PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO, CONDENAR A DEMANDADA AO PAGAMENTO DE DANOS MORAIS DE R$ 3.000,00. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/951.
Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, saliento que o Recorrente pretende a reforma da sentença lançada nos autos que JULGOU IMPROCEDENTES os pedidos da parte autora E EXTINGO O FEITO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO nos termos do art. 487, I do CPC.
Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma.
No mérito, trata-se de ação indenizatória por danos morais, decorrente do fato de que, conforme alega a parte autora, teria contratado o serviço de transporte terrestre ofertado pela empresa acionada.
A empresa demandada se defende alegando que tratando-se de viagem rodoviária, imprevistos no percurso podem ocasionar alteração da previsão de embarque nas paradas subsequentes. Que no trecho entre o ribeirão preto e belo horizonte não foi possível o cumprimento da previsão, como confessado na exordial, que o embarque ocorreu com atraso. Que a alteração na previsão de embarque foi causada por fato de terceiro não imputável à Reclamada, excludente de responsabilidade, nos termos do artigo 14§ 3º, inciso II do CDC.
Pois bem.
Nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor , a responsabilidade da companhia demandada, prestadora de serviços de transporte rodoviário de passageiros, pelos danos causados aos seus clientes/passageiros, é objetiva. Ou seja, responde, independentemente da existência de culpa, por defeitos relativos à prestação do serviço, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição.
Dita responsabilidade somente é afastada se, prestado o serviço, restar comprovado que o defeito inexiste ou comprovada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (art. 14, § 3º, I e II, do CDC) ou ainda, de acordo com a doutrina e jurisprudência, nas hipóteses em que verificados o caso fortuito ou força maior.
O contrato de transporte de passageiros tem regras próprias estampadas no CC/02.
Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade.
Art. 737. O transportador está sujeito aos horários e itinerários previstos, sob pena de responder por perdas e danos, salvo motivo de força maior.
Na hipótese dos autos, certo é que houve um atraso na realização da viagem contratada pela apelada, o que restou incontroverso. A simples alegação de que em face do atraso havido teria decorrido das más condições da estrada, assim como da quebra elevação da temperatura do veículo, entre outras hipóteses referidas, não exime a responsabilidade da empresa.
Na espécie, em verdade, não restou comprovada qualquer das excludentes do dever de indenizar, ao contrário, decorre do caderno processual que a ré não logrou êxito na comprovação da propalada força maior. O alegado caso fortuito ou força maior não são, no caso, suficientes a afastar a responsabilidade objetiva da demandada, notadamente pela inobservância das regras emitidas pela Agência Reguladora, diante da completa ausência de amparo ao passageiro, conforme prevê a Resolução nº 4.282, de 17 de fevereiro de 2014, nos incisos V e VII, bem como da Lei nº 11.975/09, em seus artigos 3º, 4º e 12,§1º2.
A previsibilidade de atraso em viagem de longo percurso é situação prevista na legislação específica, tanto que o Lei nº 11975/09, que regulamenta o serviço de transporte rodoviário coletivo, em seu artigo 4º, prevê a possibilidade de haver atraso na viagem de até três horas.
Desta forma, restou comprovada a falha na prestação do serviço e o dever da demandada em indenizar os danos causados resulta como decorrência lógica. Incontroverso, portanto, o dano moral sofrido pelo autor, considerando que a demandada agiu com descaso e desrespeito; uma vez que a parte autora foi “esquecida”, perdendo, inclusive, compromissos profissionais.
Com relação ao valor dos danos morais, deve-se levar em conta a necessidade de reparar ou atenuar o desconforto da vítima, bem como dissuadir o causador de praticar novos atos considerados abusivos. Além do mais, o efeito ressarcitório do dano moral deve ser visto também pelo cunho pedagógico, cujo valor arbitrado merece compatibilidade com as circunstâncias do caso concreto. Em outras palavras, deve se prestar a reparar de forma justa e razoável o abalo extrapatrimonial sofrido pelo ofendido, levando-se em conta também as condições próprias da pessoa lesada, assim como a capacidade financeira do causador do dano3.
Inexiste um critério aritmético ou uma tabela à quantificação do dano moral, devendo ser considerados na avaliação e na apuração do valor indenizável vetores como: a natureza da falta cometida, gravidade, eventual contribuição da vítima e a condição econômica das partes envolvidas.
Certo é que o valor não pode ser excessivo a ponto de fomentar o enriquecimento injustificado, tampouco inexpressivo a ponto de ser considerado insignificante sob a ótica reparadora em relação à vítima. Além disso, a indenização tem o caráter dúplice, revestido também do comando punitivo/pedagógico em relação ao ofensor.
Assim, levando-se em conta todas essas variantes, tenho que o valor fixado na sentença em R$ 3.000,00, se mostra razoável para recuperar todos os evidentes danos sofridos pelo requerente. Os juros de mora, em se tratando de relação contratual, o prazo se conta da citação.
Razões pelas quais, decido no sentido de DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, para, reformando a sentença de primeiro grau, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, condenando a demandada ao pagamento de danos morais fixados em R$ 3.000,00 (cinco mil reais), com juros da citação e correção monetária do arbitramento. Sem custas ou honorários, devido à ausência de recorrente vencido.
Salvador, data registrada no sistema.
ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA
Juíza Relatora
Processo julgado com base no artigo nº 15. do Regimento Interno das Turmas Recursais (resolução 02/2021 do TJBA), em seu inciso XII, estabelece a competência do Relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo Colegiado ou já com uniformização de jurisprudência em consonância com o permissivo do art. 932, CPC.
[1] DIDIER, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 13ª ed. Salvador: JusPodium, 2018, p. 513-515.
[2] MARINHO AMARAL, Felipe. A Aplicação da Teoria dos Precedentes Judiciais no Processo do Trabalho, Editora Mizuno, 2021, p. 57.
1Art. 46. O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.
2 APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE PASSAGEIROS. ATRASO EM VIAGEM INTERESTADUAL. QUEBRA DO ÔNIBUS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TRANSPORTADOR. INEXISTÊNCIA DE CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DEVIDA. QUANTUM MANTIDO. O descumprimento do contrato de transporte ou falha na prestação do serviço contratado dá ensejo ao dever de indenizar o dano moral causado ao passageiro. Responsabilidade objetiva do transportador. Art. 14 do CDC. A quantificação pecuniária a título de dano moral deve corresponder à justa reparação da vítima, além de chancelar o infrator com desembolso financeiro pedagógico/punitivo, para que se sinta desestimulado a reiterar práticas lesivas, sem perder de vista a moderação e a proporcionalidade do quantum a ser fixado para não fomentar o enriquecimento injustificado. Mantida a Indenização fixada na sentença em R$ 10.500,00. Não cabimento da devolução do valor pago pela passagem, pois o serviço foi prestado pela ré. Apelo parcialmente provido. (TJ-RS Apelação Cível Nº 70059772293, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Guinther Spode, Julgado em 28/08/2014)
3 Responsabilidade civil. Atraso em viagem interestadual de ônibus que acarretou na perda de compromissos profissionais por parte da passageira. Contrato de transporte. Responsabilidade civil objetiva. Obrigação de resultado. Tráfego intenso devido a feriado. Fato previsível. Risco do negócio. Se a ocorrência de tráfego intenso na rodovia devido a feriado é previsível e faz parte do risco da atividade desenvolvida pela empresa ré, de rigor que esta, ao anunciar a venda de suas passagens, coloque um horário de chegada ao destino maior do que o fixado normalmente. Danos materiais e morais caracterizados. Sentença mantida na íntegra. Apelo não provido. (TJ-SP - APL: 00275860320108260506 SP 0027586-03.2010.8.26.0506, Relator: Roberto Maia, Data de Julgamento: 14/03/2016, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/03/2016)