Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
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Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível
Recurso nº 0005900-14.2021.8.05.0001
Processo nº 0005900-14.2021.8.05.0001
Recorrente(s):
ANTONIO MARCOS RAMOS DE MOURA

Recorrido(s):
CASAS BAHIA




EMENTA
 

RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. VICIO DO PRODUTO. TESOURA ADQUIRIDA NO SITE DA REQUERIDA, QUE APRESENTOU VÍCIO NO PRAZO DE GARANTIA. MARKET PLACE. LEGITIMIDADE PASSIVA. PRELIMINAR AFASTADA. CONSUMIDOR QUE FEZ DIVERSAS RECLAMAÇÃOES SEM RETORNO DA COMERCIANTE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. DANOS EVIDENCIADOS. RECLAMAÇÕES ADMINISTRATIVAS NÃO ATENDIDAS. REFORMA DA SENTENÇA PARA JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO, CONDENANDO A DEMANDADA À DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO, BEM COMO DANOS MORAIS FIXADOS EM R$ 3.000,00. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

 

Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/95[1].

 

Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, saliento que o Recorrente ANTONIO MARCOS RAMOS DE MOURA pretende a reforma da sentença lançada nos autos que JULGOU, POR SENTENÇA, IMPROCEDENTE a ação, nos termos do Art. 6° da lei n° 9.099/95 c/c Art. 487, I, do CPC.

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma.

 
VOTO
 

Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva, a mesma fica afastada, eis que a pretensão autoral é baseada na alegação de vício do produto, motivo pelo qual, nos termos do art. 18 do CDC, todos os fornecedores (lato senso), são igualmente responsáveis, não importando se foi mero comerciante ou o fabricante do produto viciado. Nessa seara, embora alegue ter atuado como marketplace, entendo que a empresa ré, ao obter lucro com a atividade expondo produtos para a aquisição de consumidores, atrai para si a responsabilidade solidária.

 
 

No mérito, aduz a parte autora ter adquirido uma TESOURA CORTA VERGALHAO 30¿¿ STARTFER, no valor de R$ 153,90 (centos e cinquenta e três reais e noventa centavos) através do site da requerida. Aduz que o produto apresentou vício de qualidade dentro do prazo de garantia, e que, mesmo após comunicar o fato à requerente, o vício não foi solucionado. Moveu a presente ação pleiteando indenização por danos materiais e morais.

 

A empresa ré alegou ausência de qualquer responsabilidade, alegando preliminar de ilegitimidade passiva e fato de terceiro.

 

A sentença foi de improcedência com recurso da parte autora.

 
Pois bem.
 

Impede analisar a questão posta em juízo à luz dos ônus processuais delineados pela regra do art. 373, incisos I e II, do CPC. Sendo assim, cabe à parte autora provar os fatos constitutivos do seu direito, e, sobre o demandado recai o dever de evidenciar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.

 

As provas anexas ao evento 01, evidenciam a aquisição do produto, bem como, as diversas reclamações administrativas acerca do vício que acometeu o bem adquirido dentro do prazo de garantia legal. Assim, o autor fez prova do vício, e de ter contactado a empresa comerciante, oportunizando o saneamento do defeito.

 

Por sua vez, cabia à empresa ré comprovar que atuou na resolução do problema, no entanto não trouxe qualquer prova de reparo ou troca do produto, ou ainda a devolução da quantia paga pelo consumidor.

 

Assim, entendo que o autor provou fato constitutivo dos seus direitos, e a empresa ré, não opôs qualquer contraprova.

 

Nesse sentido, o prazo máximo de 30 dias para saneamento do vício do produto, previsto no artigo 18 do CDC, deve ser contado desde a primeira manifestação do defeito até o seu efetivo reparo, sem interrupção ou suspensão. Também sob uma perspectiva teleológica, não é possível aceitar a interrupção ou a suspensão do prazo a cada manifestação do vício, pois isso significaria uma subversão à ideia fundamental do CDC de atribuir ao próprio fornecedor os riscos inerentes à atividade econômica exercida.

 

Assim, fato é que a demandada não logrou comprovar a não ocorrência dos fatos narrados na inicial, não se desincumbindo do ônus de demonstrar circunstância capaz de elidir sua responsabilidade, conforme insculpido no art. 14, § 3º, I e II, do CDC.

 

 Noutro passo, restou comprovado que o defeito não foi solucionado dentro do prazo legal ¿ nem ao menos foi solucionado -, o presente caso adapta-se à hipótese descrita no art.18, do CDC, visto que restou demonstrado que o produto fabricado apresentou-se viciado, fazendo jus a parte autora, portanto, a substituição do produto, ou a devolução do valor pago.

 

Por todo o exposto, deve a demandada responder pelos danos sofridos pela parte autora em razão do defeito do produto e da negativa em solucionar o problema, violando, assim, o prazo de 30 dias estabelecido no artigo 18, § 1º, da Lei n.º 8.078/90.

 

Nesse contexto o dano moral restou caracterizado, uma vez que a parte autora adquiriu o produto e não pôde utilizá-lo, havendo mais que mero aborrecimento. Nos autos está claro que houve vício na qualidade do produto e a ação do consumidor em buscar a reparação, devendo responder a empresa pelos danos morais suportados pela parte autora, tendo em vista que o vício na qualidade do produto não foi sanado a contento.

 

No caso em tela, a parte autora sofreu com a frustração da expectativa ao ver sua geladeira adquirida há menos de dois anos apresentar ferrugens e deformações. Neste diapasão, o dano moral resta configurado na hipótese, pois o transtorno sofrido extrapolou o limite da normalidade, a ensejar lesão imaterial passível de compensação. Assim sendo, há dano moral a ser reparado, conforme solidificado entendimento jurisprudencial.

 

Não se pode perder de vista, porém, que à satisfação compensatória soma-se também o sentido punitivo da indenização, de maneira que assume especial relevo na fixação do quantum, como uma forma de evitar a reincidência. Deste modo, arbitro indenização em R$ 3.000,00 (três mil reais), o qual se encontra dentro dos parâmetros desta turma; sendo razoável e proporcional, tendo em vista, inclusive, o valor elevado do aparelho.

 

Ante ao exposto, voto no sentido de CONHECER e DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso interposto pela parte autora, JULGANDO PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO, para condenar a demandada: a) à devolução do valor pago pelo produto R$ R$ 153,90 (centos e cinquenta e três reais e noventa centavos), com juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (Súmula 163 do STF) e correção monetária a partir do desembolso (Súmula 43 do STJ); b) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) com correção monetária contada a partir do arbitramento (súmula 362 STJ), e juros contados da citação; c) fica a reclamada autorizada a recolher o produto viciado no prazo de 15 dias a contar do cumprimento das obrigações determinadas neste acórdão, sob pena de perdimento. Sem custas ou honorários, diante da ausência de recorrente vencido.

 
 
 
Salvador, Sala das Sessões, 10 de agosto de 2021.
 
ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA
Juíza Relatora
 
 
 
 
ACÓRDÃO
 
 

     Realizado o julgamento do recurso do processo acima epigrafado, a QUINTA TURMA, composta dos Juízes de Direito, decidiu, à unanimidade de votos CONHECER e DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso interposto pela parte autora, JULGANDO PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO, para condenar a demandada: a) à devolução do valor pago pelo produto R$ R$ 153,90 (centos e cinquenta e três reais e noventa centavos), com juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (Súmula 163 do STF) e correção monetária a partir do desembolso (Súmula 43 do STJ); b) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) com correção monetária contada a partir do arbitramento (súmula 362 STJ), e juros contados da citação; c) fica a reclamada autorizada a recolher o produto viciado no prazo de 15 dias a contar do cumprimento das obrigações determinadas neste acórdão, sob pena de perdimento. Sem custas ou honorários, diante da ausência de recorrente vencido.

 
 
 

Salvador, Sala das Sessões, 10 de agosto de 2021.

 

ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA

Juíza Relatora
 


[1]Art. 46. O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.