Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
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Ação:
Termo Circunstanciado
Recurso nº 0004047-53.2023.8.05.0274
Processo nº 0004047-53.2023.8.05.0274
Recorrente(s):
AURISTELA DOS SANTOS SILVA

Recorrido(s):
ANA MARIA BATISTA DOS SANTOS
CLECIO DIAS DE CIRQUEIRA
ERIC BATISTA DOS SANTOS



EMENTA

 

APELAÇÃO CRIMINAL. JUIZADOS ESPECIAIS. AÇÃO PENAL PRIVADA. CRIME DE DIFAMAÇÃO. ART. 139, CP. QUEIXA CRIME REJEITADA POIS APRESENTADA APÓS O PRAZO DECADENCIAL. ART. 38, CPP. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDIONADA À REPRESENTAÇÃO. CRIME DE AMEAÇA. ART. 147, CP. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELO ARQUIVAMENTO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE PROVAS. ARQUIVAMENTO DA QUEIXA CRIME. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO EM RELAÇÃO AO CRIME DE AMEAÇA. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 101 COMBINADO COM O ENUNCIADO  81 DO FONAJE. ENUNCIADO 101 - É irrecorrível a decisão que defere o arquivamento de termo circunstanciado a requerimento do Ministério Público, devendo o relator proceder na forma do ENUNCIADO 81. RECURSO INCABÍVEL. QUEIXA CRIME EM RELAÇÃO AO CRIME DE DIFAMAÇÃO APRESENTADA APÓS O PRAZO DECADENCIAL. ART. 103, CP. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. EM RELAÇÃO AO CRIME DO ART. 139, CP, RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099/95[1].

Analisando brevemente a lide, registro que a Apelante AURISTELA DOS SANTOS SILVA, suposta vítima dos crimes investigados na ação, pretende a reforma da sentença lançada nos autos, que arquivou o presente feito, nos seguintes termos:

 

Diante do exposto, acolho a manifestação apresentada pelo Ministério Público, determinando o arquivamento dos presentes autos, ante a falta de justa causa bem como a decadência do direito, nos termos do art. 103 do CP. Isto posto, decreto extinta a punibilidade do(s) suposto(s) autor(es) do fato, conforme o quanto preceitua o art. 107, IV, do CPB.

 

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma.  

 

VOTO

 

Recurso inominado recebido como Apelação em razão do princípio da fungibilidade. O princípio da fungibilidade, no Direito Processual, permite que um recurso seja recebido como outro, desde que   não   haja   má-fé   do   recorrente, e   que   os   prazos   do   recurso erroneamente interposto e do recurso que se pretende interpor sejam os mesmos – como ocorre no presente caso.

 

O Recurso não merece acolhimento.

 

Trata-se de Termo Circunstanciado de Ocorrência em que a vítima, ora Recorrente, afirmou ter sido vítima dos crimes de difamação e ameaça, art. 139 e 147, do Código Penal.

 

O crime de difamação, previsto no art. 139, consiste em crime contra a honra do ofendido em que o agente profere informações falsas sobre a vítima no intuito de prejudicar sua reputação e imagem, conforme descrito no CP: “Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação”. O crime tem pena de detenção de três meses a um ano e multa.

 

Já a ameaça, prevista no art. 147, é um crime contra a liberdade pessoal da vítima, consistindo no ato de ameaçar a vítima através de palavras, gestos ou outro meio, a lhe causar algum mal, conforme previsto: “Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave”. O crime tem pena de detenção de um a seis meses ou multa.

 

Ambos são considerados crimes de menor potencial ofensivo, já que a pena máxima prevista não ultrapassa 2 anos, de modo que a competência para julgamento é do juizado especial criminal.

 

Analisando os autos, verifico que se trata de situação de desentendimento entre vizinhos. A vítima relata que tomou conhecimento através de terceiros de que a Autora “Ana Maria”, acreditando ser a suposta vítima pessoa responsável por soltar fogos de artifício durante a madrugada, proferiu xingamentos e afirmações inverídicas a seu respeito para seu marido e para outras pessoas que teriam presenciado o fato. Relata que soube também que a Autora teria enviado os outros dois acusados até a sua casa, e que eles teriam invadido a casa a sua procura, que não estava no local no dia.

 

Relata que soube da situação no dia seguinte, motivo pelo qual decidiu prestar queixa. Os xingamentos e inverdades ditas a seu respeito foram enquadradas no tipo penal difamação, enquanto a invasão a residência foi enquadrada como ameaça.

 

Após audiência de conciliação sem acordo, o TCO foi arquivado pelo juízo de origem, a pedido de Ministério Público, em relação ao crime de ameaça, e, com relação ao crime de difamação, foi constatada a decadência do direito de prestar queixa-crime (evento 66).

 

Em relação ao crime de ameaça, art. 147, CP, o Parquet entendeu pela inexistência de elementos e indícios a respeito da materialidade do crime, opinando pelo arquivamento do TCO - o que configurou ausência de justa causa para propositura da ação penal.

 

A   justa   causa   é   um   dos   pressupostos   para   a   ação penal, consistindo na existência de um crime e de indícios suficientes de autoria.

 

Neste sentido, a materialidade do crime é a prova da existência concreta do crime, ou seja, é a comprovação de que o crime realmente ocorreu. E, no presente caso, o Ministério Público entendeu que não havia provas suficientes da ocorrência do crime de ameaça. Razão pela qual opinou pelo arquivamento do TCO, o que foi acolhido pelo MM Juízo de base.

 

Ademais, enfatize-se a irrecorribilidade da decisão que deferiu o arquivamento do TCO a requerimento do Ministério Público, conforme enunciado 101 do FONAJE:


ENUNCIADO 101 – É irrecorrível a decisão que defere o arquivamento do termo circunstanciado a requerimento do Ministério Público, devendo o relator proceder na forma do ENUNCIADO 81.

Dessa forma, procedo como informa o enunciado 81:


ENUNCIADO 81: O relator, nas Turmas Recursais Criminais, em decisão monocrática, poderá negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, prejudicado, ou julgar extinta a punibilidade, cabendo recurso interno para a Turma Recursal, no prazo de cinco dias.

 

Sendo assim, entendo incabível o presente recuso em relação ao crime de ameaça, não devendo ser conhecido o recurso neste ponto.

 

Já no que diz respeito ao crime de difamação, art. 139, CP, trata-se de delito de ação penal privada, em que a vítima deverá prestar queixa-crime no prazo de 6 meses, contado da data em que tomou conhecimento dos fatos e da Autoria, conforme art. 106, CP:

 

Art. 103 - Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do § 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia.

 

Essa é a disposição também do Código de Processo Penal:

Art. 38.  Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.

 

Verifico que conforme o TCO a suposta vítima tomou conhecimento dos fatos narrados e sua autoria em 21/01/2023, tendo apresentado a queixa-crime apenas em 31/07/2023 (evento 36). Ou seja, ultrapassado o prazo de 6 meses estabelecido na lei, fora do tempo hábil para o exercício do direito.

 

Vale ressaltar que o Apelante apenas se limitou a alegar que a queixa crime foi apresentada dentro do prazo, sem desenvolver qualquer argumento para contrapor tal conclusão.

 

Assim, entendo correta a decisão do juízo de origem, tendo declarado a decadência do direito, de modo que concluo pelo não provimento do recurso nesse ponto.

 

Ante o exposto, voto por NÃO CONHECER do recurso em relação ao crime do art. 147, CP. EM relação ao crime tipificado no art. 139, CP, CONHEÇO DO RECURSO e decido pelo NÃO PROVIMENTO, para manter a sentença de origem em seus exatos termos. Sem custas e honorários.

 

Intimem-se.

Salvador, data certificada pelo sistema.

 

ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA

Juíza Relatora

 

ACÓRDÃO

 

Realizado julgamento do Recurso do processo acima epigrafado, a QUINTA TURMA, composta dos Juízes de Direito, decidiu, à unanimidade de votos, decidiu por NÃO CONHECER do recurso em relação ao crime do art. 147, CP. Em relação ao crime tipificado no art. 139, CP, CONHEÇO DO RECURSO e decido pelo NÃO PROVIMENTO, para manter a sentença de origem em seus exatos termos. Sem custas e honorários.

Salvador-Ba, Sala das Sessões, data registrada no sistema.    

 

ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA

Juíza Relatora

 

 

ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA

Juiz Presidente



[1] Art. 46. O julgamento em segunda instância constará apenas da ata, com a indicação suficiente do processo, fundamentação sucinta e parte dispositiva. Se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.