PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Quarta Câmara Cível V PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXECUÇÃO. TÍTULO EXTRAJUDICIAL. IMÓVEL OFERECIDO EM GARANTIA REAL HIPOTECÁRIA. ÚNICO IMÓVEL DA FAMÍLIA. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. ÁREA TOTAL INFERIOR A 04 (QUATRO) MÓDULOS RURAIS. INCIDÊNCIA DO TEMA 961 DO STF. IMPENHORABILIDADE. RECONHECIMENTO. DECISÃO DE PENHORA E LEILÃO. REFORMA. I - O artigo 5°, XXVI da Constituição da República, bem como o artigo 833, VIII, do Código de Processo Civil e o artigo 1° da Lei 8.009/90, determinam que o imóvel rural que constitui pequena propriedade familiar não pode ser penhorado. II - O Supremo Tribunal Federal admitiu o ARE 1038507 – Tema 961, como representativo da controvérsia, fixando a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” III – Na hipótese, preenchidos tais requisitos, cabível o reconhecimento da impenhorabilidade do imóvel descrito nos autos, com o cancelamento da penhora e do leilão designado. RECURSO PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 8036240-94.2024.8.05.0000, de Juazeiro, em que figuram como Agravantes CARLOS MUNDES DIAS DE SANTANA e OUTROS e como Agravado BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A. ACORDAM os Senhores Desembargadores componentes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, por unanimidade, DAR PROVIMENTO AO RECURSO pelos fundamentos que integram o voto condutor. Sala das Sessões, data registrada no sistema. Zandra Anunciação Alvarez Parada Juíza Substituta de Segundo Grau – Relatora
Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 8036240-94.2024.8.05.0000
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
AGRAVANTE: CARLOS MUNDES DIAS DE SANTANA e outros (11)
Advogado(s): MAXIMILIANO MIGUEL RIBEIRO GUIMARAES
AGRAVADO: BANCO DO NORDESTE DO BRASIL SA
Advogado(s):SANDRA MARIA DE BARROS SOARES
ACORDÃO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
QUARTA CÂMARA CÍVEL
DECISÃO PROCLAMADA |
Conhecido e provido Por Unanimidade
Salvador, 4 de Novembro de 2024.
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Quarta Câmara Cível V CARLOS MUNDES DIAS DE SANTANA e OUTROS interpõem agravo de instrumento contra decisão proferida nos autos da Execução de Título Extrajudicial nº 0000400-47.2003.8.05.0146, em trâmite na 3ª Vara Cível da Comarca de Juazeiro, proposta pelo BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A, que indeferiu a alegação de impenhorabilidade do bem imóvel dos Agravantes. Relatam que a Ação de Execução de Título Extrajudicial foi ajuizada em 2003 contra seus pais, Edmundo Dias de Santana e esposa, sendo que após cerca de vinte anos de tramitação, em 19/07/2023, requereram habilitação como sucessores dos executados originais, o que foi deferido pelo Juízo Precedente. Afirmam que, em 17/05/2024, arguiram, a título de matéria de ordem pública, a impenhorabilidade do imóvel garantidor da execução, invocando a aplicação do TEMA 961 do STF, vez que sua área é inferior a 04 (quatro) módulos fiscais da cidade de Uauá (que é de 50ha), ou seja, possui área inferior a 200ha (duzentos hectares), conforme atestado, inclusive, pela certidão atualizada do imóvel juntada aos autos pelo próprio Banco Exequente/Agravado. Asseveram que o Juízo Singular indeferiu o pedido, primeiro sob o fundamento de que não fora comprovada a exploração econômica familiar do bem, o que alegam ter sido prontamente suprido pelos Agravantes com a juntada de diversos documentos e vídeos comprovando tal atividade. Defendem que mesmo com as provas colacionadas e pedido de reconsideração formulado pelos Agravantes, o Juízo a quo manteve o indeferimento, inovando de forma teratológica na fundamentação, no sentido de que a parte Executada, de forma espontânea, dera o referido imóvel em garantia, não cabendo aos herdeiros arguir a impenhorabilidade absoluta do bem, privilégio do qual o de cujus teria aberto mão. Sustentam que a decisão é teratológica, por não reconhecer a legitimidade e/ou o interesse processual dos herdeiros do executado original de arguirem a impenhorabilidade de um imóvel rural que lhes pertence enquanto legítimos sucessores, só porque o genitor deu em garantia como única forma de conseguir um financiamento para alavancar a sua atividade produtiva. Alegam que a decisão recorrida ofende o TEMA 961, do STF, segundo o qual, a pequena propriedade rural consubstancia-se no imóvel com área entre 01 (um) e 04 (quatro) módulos fiscais, ainda que constituída de mais de 01 (um) imóvel, não podendo ser objeto de penhora, sendo, ainda, indisponível a garantia da impenhorabilidade, assegurada como direito fundamental do grupo familiar, não se desnaturando pela gravação do bem com hipoteca. Argumentam que o leilão extrajudicial foi designado para o dia 10/06/2024 e pedem a concessão de efeito suspensivo ao recurso. Ao final, o provimento do recurso. Em decisão identificada pelo ID 63522936 foi deferida a suspensão dos efeitos da decisão recorrida e determinada a suspensão do leilão designado para o dia 10/06/2024. O Banco Agravado apresentou contrarrazões e pediu a manutenção da decisão agravada (ID 65062159). Recurso apto a julgamento, encaminho à Secretaria, com este relatório, em atendimento às regras insertas nos artigos 931 do Código de Processo Civil, e 167, 1ª parte, do Regimento Interno desta Corte, para inclusão em pauta. Salvador, data registrada no sistema. Zandra Anunciação Alvarez Parada Juíza Substituta de Segundo Grau – Relatora
Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 8036240-94.2024.8.05.0000
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
AGRAVANTE: CARLOS MUNDES DIAS DE SANTANA e outros (11)
Advogado(s): MAXIMILIANO MIGUEL RIBEIRO GUIMARAES
AGRAVADO: BANCO DO NORDESTE DO BRASIL SA
Advogado(s): SANDRA MARIA DE BARROS SOARES
RELATÓRIO
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA Quarta Câmara Cível V Submete-se à apreciação desta Corte a pretensão de reforma da decisão que indeferiu o reconhecimento da impenhorabilidade sobre imóvel da parte Executada, motivo da irresignação no presente recurso. A decisão recorrida rejeitou a alegação de impenhorabilidade do imóvel, em razão da não comprovação de requisitos capazes de afastar a constrição. Contudo, evidenciados a probabilidade de direito e o perigo de dano, merece chancela a pretensão recursal. Inicialmente, observa-se que a suscitada impenhorabilidade tem proteção do aparato legislativo, como se pode verificar no disposto nos artigos 5º, XXVI da Constituição Federal e 649, VIII do Código de Processo Civil, in verbis: “Art. 5º (…)” “XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;” - Grifei. “Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:” “VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;”(Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006) - Grifei. Sobretudo, o art. 4º, II da Lei nº 4.504/1964 (Estatuto da Terra), complementando o alcance dos mencionados dispositivos legais, define o labor familiar rural da seguinte forma: “Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se:” “II - "Propriedade Familiar", o imóvel rural que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com a ajuda de terceiros;” Acerca da temática ora em análise, o Supremo Tribunal Federal em julgamento em sede de Repercussão Geral admitiu o ARE 1038507 – Tema 961, como representativo da controvérsia, fixando a seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização” (ARE 1038507, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 21-12-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-049 DIVULG 12-03-2021 PUBLIC 15-03-2021) Tal entendimento assinala que “A garantia da impenhorabilidade é indisponível, assegurada como direito fundamental do grupo familiar, e não cede ante gravação do bem com hipoteca”. Segundo a intelecção da jurisprudência: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULAS DE PRODUTO RURAL. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. IMÓVEL DADO EM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BEM TRABALHADO PELA FAMÍLIA COM ESCOPO DE GARANTIR SUA SUBSISTÊNCIA. IMPENHORABILIDADE. RECONHECIMENTO. TEMA DE REPERCUSSÃO GERAL N.º 961 DO STF. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a quatro módulos fiscais do município de localização. Tema n.º 961 do STF. 2. Tendo em vista o reconhecimento de que a propriedade rural tem área entre um e quatro módulos fiscais e está sendo trabalhada pela família com escopo de garantir a sua subsistência, forçoso reconhecer a impenhorabilidade do bem, ainda que tenha sido dado como garantia de dívida contraída em prol da atividade produtiva. 3. Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 2402553 SC 2023/0221347-0, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 27/05/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/05/2024) “APELAÇÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. PENHORA SOBRE IMÓVEL RURAL. BEM DE FAMÍLIA. POSSIBILIDADE. EXCEÇÃO DA LEI 8.009/90, ART. 3º, I. BEM OFERECIDO EM GARANTIA REAL HIPOTECÁRIA PELA ENTIDADE FAMILIAR. IMPENHORABILIDADE AFASTADA. APELAÇÃO PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. No tocante à temática versada no Recurso Extraordinário, o Supremo Tribunal Federal, constatando a repercussão geral da matéria, qual seja, “à luz do art. 5º, inc. XXVI, da Constituição da República, a possibilidade de penhora de pequena propriedade rural familiar, que não seja o único imóvel dessa natureza pertencente à família.”, admitiu o ARE 1038507 – Tema 961, como representativo da controvérsia, fixando a seguinte tese: TEMA 961: É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização. (TJ-BA - Apelação: 00056197320098050229, Relator: JOSE ALFREDO CERQUEIRA DA SILVA, 2ª VICE-PRESIDÊNCIA, Data de Publicação: 12/09/2024) Compulsando os autos, vislumbram-se os requisitos para afastar a penhorabilidade, a priori, do imóvel objeto da lide. Acrescente-se que, observada a certidão atualizada da propriedade (ID 433869816 - autos de origem), o imóvel rural penhorado possui 180ha (cento e oitenta hectares), dentro, portanto, do limite estabelecido pelo TEMA 961, ou seja, inferior a 04 (quatro) módulos fiscais de Uauá/BA (200ha). Sobretudo, enfatize-se que os demais documentos, a exemplo das fotografias, vídeos, Declaração de Aptidão ao Pronaf, entre outros cadastros e registros, demonstram que os Agravantes residentes no imóvel objeto da penhora são agricultores familiares, o que caracteriza a área como pequena propriedade rural trabalhada pela família, albergada pela impenhorabilidade de que tratam o art. 833, inciso VIII, do CPC, e o TEMA 961. Ademais, repise-se que ter sido o bem dado pelo executado em garantia do título executado e da própria execução não afasta a indisponibilidade do imóvel, pois, como reconhecido pelo STF: “A garantia da impenhorabilidade é indisponível, assegurada como direito fundamental do grupo familiar, e não cede ante gravação do bem com hipoteca”. Seguindo o entendimento do Precedente do STF (STF - ARE: 1038507 PR 0038191-11.2014.8.16.0000): “PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. ART. 5º, XXVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. As regras de impenhorabilidade do bem de família, assim como da propriedade rural, amparam-se no princípio da dignidade humana e visam garantir a preservação de um patrimônio jurídico mínimo. 2. A pequena propriedade rural consubstancia-se no imóvel com área entre 01 (um) e 04 (quatro) módulos fiscais, ainda que constituída de mais de 01 (um) imóvel, e que não pode ser objeto de penhora. 3. A garantia da impenhorabilidade é indisponível, assegurada como direito fundamental do grupo familiar, e não cede ante gravação do bem com hipoteca. 4. Recurso extraordinário não provido, com fixação da seguinte tese: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de 01 (um) terreno, desde que contínuos e com área total inferior a 04 (quatro) módulos fiscais do município de localização”. [...] 29. Com efeito, é possível perceber que a impenhorabilidade do bem é matéria de ordem pública, logo, indiscutivelmente não é passível de preclusão. 30. Dito isso, está devidamente acompanhado essa inicial de documentos que demonstram que o Reclamante é um pequeno produtor rural, e a sua propriedade mede menos de 4 (quatro) módulos, e consequentemente é impenhorável, tendo uma negativa jurisdicional nas esferas inferiores, não restando saída para se não, o ajuizamento da presente reclamação.” Destarte, provada a condição de imóvel residencial da família e, portanto, impenhorável, motivo da reforma da decisão agravada, para determinar o cancelamento da penhora realizada no imóvel de matrícula nº 278, fls. 80 do Livro 213, do Registro Geral do Cartório do Registro de Imóveis e Hipotecas de Uauá-Ba, e, por conseguinte, o cancelamento do leilão designado sobre o imóvel. Nestes termos, DOU PROVIMENTO AO RECURSO. É o voto. Sala das Sessões, data registrada no sistema. Zandra Anunciação Alvarez Parada Juíza Substituta de Segundo Grau – Relatora
Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 8036240-94.2024.8.05.0000
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
AGRAVANTE: CARLOS MUNDES DIAS DE SANTANA e outros (11)
Advogado(s): MAXIMILIANO MIGUEL RIBEIRO GUIMARAES
AGRAVADO: BANCO DO NORDESTE DO BRASIL SA
Advogado(s): SANDRA MARIA DE BARROS SOARES
VOTO