PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Quarta Câmara Cível 



ProcessoAPELAÇÃO CÍVEL n. 8018967-36.2023.8.05.0001
Órgão JulgadorQuarta Câmara Cível
APELANTE: KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA e outros
Advogado(s)JULIO CESAR GOULART LANES
APELADO: ESTADO DA BAHIA e outros
Advogado(s):JULIO CESAR GOULART LANES

 

ACORDÃO

 

 


APELAÇÕES SIMULTÂNEAS. DIREITO TRIBUTÁRIO. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS PARA CONSUMIDOR FINAL NÃO CONTRIBUINTE. DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA. LEI COMPLEMENTAR 190/2022. OBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ANUAL. NÃO APLICAÇÃO. OBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. APLICAÇÃO. PORTAL NACIONAL DIFAL DISPONIBILIZADO.  IMPOSSIBILIDADE DE EMISSÃO DA GUIA PARA RECOLHIMENTO DO TRIBUTO. NÃO COMPROVADA.


1. As leis estaduais que instituíram a cobrança do ICMS-DIFAL no âmbito da respectiva unidade federativa dependiam, para surtir efeito, da edição/publicação de lei complementar veiculando as regras gerais sobre a matéria.

2. A LC 190/2022, publicada em 05/01/2022, dispôs, no seu art. 3º, expressa determinação de obediência tão somente ao princípio da anterioridade nonagesimal, logo, produzindo seus efeitos a partir de 05/04/2022.

3. Inexiste, no art. 24-A da Lei Kandir, qualquer determinação de que a cobrança do tributo aconteça tão somente após a unificação/centralização dos portais dos Estados e do Distrito Federal, sendo suficiente que o Portal Nacional permita a apuração do imposto, mesmo que seja através do redirecionamento para o Portal da Unidade Federada desejada

4. Para suspender a exigibilidade de determinado tributo, basta que o contribuinte efetue o depósito extrajudicial do valor integral cobrado a título do imposto, em conformidade com o 151, II, do CTN e com os trâmites descritos nas Leis 9.703/1998 e 12.099/2009.

APELAÇÕES CONHECIDAS E IMPROVIDAS. SENTENÇA MANTIDA.

 

Vistos, relatados e discutidos os autos das APELAÇÕES SIMULTÂNEAS de n. 8018967-36.2023.8.05.0001, em que são apelantes a KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA e o ESTADO DA BAHIA e apelados o ESTADO DA BAHIA e a KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA,

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, em           conhecer e negar provimento a ambos os recursos, nos termos da certidão de julgamento.

 

Salvador, (data registrada eletronicamente).

 

Presidente

 

Des. Angelo Jeronimo e Silva Vita

Relator

 

 

Procurador de Justiça


 


 

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 QUARTA CÂMARA CÍVEL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e não provido Por Unanimidade

Salvador, 4 de Novembro de 2024.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Quarta Câmara Cível 

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8018967-36.2023.8.05.0001
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
APELANTE: KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA e outros
Advogado(s): JULIO CESAR GOULART LANES
APELADO: ESTADO DA BAHIA e outros
Advogado(s): JULIO CESAR GOULART LANES

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de APELAÇÕES SIMULTÂNEAS interpostas pela KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA e pelo ESTADO DA BAHIA contra decisão proferida pelo Juízo da 11ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador nos fólios do Mandado de Segurança 8018967-36.2023.8.05.0001 (ID 63346545), o qual foi impetrado pela empresa KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA com o intento de:

 

(i)              ver suspensa a exigibilidade do ICMS-DIFAL nas operações interestaduais de vendas ou remessas de mercadorias aos consumidores finais não contribuintes no Estado da Bahia, vendas ou remessas já realizadas ou que venham acontecer, até que sejam atendidos os seguintes requisitos, cumulativamente: disponibilização de ferramenta para apuração centralizada e de emissão de guia de recolhimento do aludido imposto, no Portal Nacional do DIFAL, instituído pelo Convênio CONFAZ 235/2021, e vigência de uma nova lei no Estado da Bahia a respeito do DIFAL, sem os vícios na atual existentes, respeitando-se os princípios da anterioridade de exercício e nonagesimal.

 

O Juízo Singular, ao prolatar a sentença (ID 63346545), concedeu parcialmente a segurança pretendida, afastando a cobrança do DIFAL e, por consequência, do respectivo Fundo de Combate à Pobreza (FCP), nas operações de vendas de mercadorias pela parte impetrante a consumidores finais não contribuintes de ICMS situados no Estado da Bahia no período de 01/01/2022 a 05/04/2022.

Inconformado, o ESTADO DA BAHIA apelou requerendo seja a segurança parcialmente denegada com relação à aplicação do princípio nonagesimal ou, subsidiariamente, haja a suspensão do processo até o julgamento do Tema 1.266 (ID 63346550).

Para tanto, anuncia que, com a edição da Lei Complementar 190/2022, estabelecedora das normas gerais sobre a matéria e que entrou em vigor na data de sua publicação (05/01/2022), as legislações dos Estados e Distrito Federal passaram a produzir os seus efeitos no tocante às normas não contrárias às gerais trazidas pela mencionada Lei Complementar.

Em sua resposta (ID 63346571), a parte impetrante aduz que: (i) o princípio da anterioridade tributária jamais foi objeto desta demanda; (ii) no acórdão da ADI 5469 houve a declaração de inconstitucionalidade das Leis estaduais e do Distrito Federal que tratavam do DIFAL; (iii) o entendimento fixado no Tema 1.094 não pode ser aplicado no caso em comento. 

De igual modo recorreu a empresa autora a fim de pleitear a declaração de nulidade da sentença recorrida no que diz respeito à concessão parcial da segurança e a autorização para realização de depósitos judiciais relativos ao ICMS/DIFAL de transações efetuadas a partir de janeiro/2023 (ID 63346559).

Na sua inicial recursal, a parte autora indica que: (i) a sentença foi extra petita, pois julgou matéria alheia à causa de pedir e ao pedido; (ii) na decisão, não foram consideradas as premissas do Tema 1.093 e da ADI 5469, julgados pelo STF, pois o Portal Nacional do DIFAL não funciona, violando o art.24-A da LC 190/2022; (iii) há necessidade de edição de nova Lei local em data posterior à LC 190/2022, vez que a Lei Estadual 14.415/2021 foi declarada inconstitucional no julgamento da ADI 5469.

Ao contrarrazoar (ID 63346567), o ESTADO DA BAHIA diz que: (i) com o julgamento do Tema 1.093 e com a modulação dos efeitos nesse havida para o Exercício de 2022, as suas normas concernentes ao ICMS/DIFAL foram validadas e tornadas eficazes até 31/12/2021; (ii) a edição da Lei 14.415/2021 se deu com estrita observância da nova disciplina introduzida pela LC 190/2022, tendo em vista que tomou como base o Projeto de Lei Complementar 32/2021, aprovado e, 20/12/2021; (iii) o STF, na apreciação dos Temas 171 e 1.094, fixou o entendimento de que as normas editadas antes da LC 114/2002 não seriam inconstitucionais, mas apenas teria, a sua eficácia suspensa até o advento da norma geral nacional e, portanto, a Lei 14.415/20921 ficou com seus efeitos suspensos até 05/04/2022; (iv) o Convênio CONFAZ n. 235, de 27/12/2021,criou o Portal Nacional da Diferença da Alíquota nas transações com consumidor final não-contribuinte, possibilitando aos contribuintes de qualquer unidade federativa calcular o imposto devido e gerar a guia para recolhimento da exação; (v) o STF, em 29/11/2023, concluiu o julgamento das ADIs 770, 7076 e 7078, entendendo pela não aplicação do princípio da anterioridade anual à LC 190/2022, mas apenas da anterioridade nonagesimal; (vi) a impetração do MS ocorreu em 24/01/2021, não cabendo a aplicação da exceção inserta na modulação do Tema 1.093.

Por sua vez, o Ministério Público opinou pela desnecessidade de intervenção ministerial na hipótese.

 

Com este relatório e em ao art. 931 do Código de Processo Civil (CPC) e 167, 1ª Parte, do Regimento Interno desta Corte, encaminho os autos à Secretaria para as providências de inclusão em pauta.



Salvador/BA, 4 de outubro de 2024.


 Des. Angelo Jeronimo e Silva Vita 

Relator


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Quarta Câmara Cível 



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 8018967-36.2023.8.05.0001
Órgão Julgador: Quarta Câmara Cível
APELANTE: KALUNGA COMERCIO E INDUSTRIA GRAFICA LTDA e outros
Advogado(s): JULIO CESAR GOULART LANES
APELADO: ESTADO DA BAHIA e outros
Advogado(s): JULIO CESAR GOULART LANES

 

VOTO

 

Presentes as condições de admissibilidade do recurso, dele conheço e passo a expor minhas razões.

De início, imperioso registrar a inexistência de ordem de sobrestamento das ações que tratem do ICMS-DIFAL em decorrência do Tema 1.266 do STF.

De igual modo, não há que se falar em julgamento extra petita e nem ultra petita pelo Juízo de origem, porquanto a própria parte autora, em sua exordial, pleiteia que o afastamento das cobranças do DIFAL e do Adicional FECP perdurem até a edição da Lei Complementar Federal e, posteriormente, da Lei Estadual, “respeitando-se os princípios da anterioridade de exercício e da anterioridade nonagesimal”, logo, delimitar o afastamento da cobrança com observância da anterioridade nonagesimal não pode ser tida como entrega de jurisdição ultra petita.

Prosseguindo, cumpre consignar que, na data de 29/11/2023, o STF concluiu a apreciação das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs 7066, 7078 e 7070), as quais, por maioria, foram julgadas improcedentes, ficando, por ocasião do mencionado julgamento, reconhecida a constitucionalidade do art. 3º da LC 190/2022, ou seja, exigindo-se, para cobrança do DIFAL, o cumprimento tão somente da anterioridade nonagesimal.

Segundo o Ministro Alexandre de Morais, relator, não houve, na mencionada Lei Complementar, instituição de novo tributo, mas apenas alteração de questões relativas à técnica de recolhimento e repartição do tributo, contudo, de acordo com suas palavras “em que pese não ser criação de tributo, não ser majoração de tributo, noventa dias para que o contribuinte se possa adequar até operacionalmente a realizar esse pagamento agora fracionado”.

Para além disso, concluiu o seu voto estabelecendo que “os estados têm o direito de cobrar, tanto o estado de destino quanto o estado produtor - esse, no caso, a alíquota interna -, noventa dias após a publicação da lei. A lei é de 5 de janeiro de 2022. Após noventa dias, já em 2022, o ICMS dessa nova forma de repartição tributária é possível de cobrança”.

Registre-se que o ESTADO DA BAHIA disciplinou a cobrança do ICMS-DIFAL na Lei Estadual 14.415 de 30/12/2021, com vigência iniciada em 31/12/2021, mas cujo efeito dependia da edição de lei complementar federal contendo as regras gerais a embasar tal imposto, o que ocorreu em 05/01/2022 com a publicação da LC 190/2022.

Esclareça-se, também, que a Lei 14.415/2021 ficou com seus efeitos suspensos até 05/01/2022, voltando a produzir os seus efeitos em 04/04/2022, após o decurso da anterioridade nonagesimal prevista na LC 190/2022 e naquilo que não conflita com o quanto nesta última disposto.

De mais a mais, importante ressaltar que, tendo sido instituída a Lei Estadual 14.415 em 2021, o Estado da Bahia respeitou a anterioridade anual, restando autorizado a cobrar o tributo objeto desta demanda a partir de 05/04/2022.

No tocante ao Portal Nacional DIFAL, percebe-se que este foi instituído pelo Convênio ICMS n. 235, de 27/12/2021, restando disponibilizado a partir de 30/12/2021.

Nota-se, de mais a mais, que o aludido Portal atende ao quanto determinado no art. 24-A da Lei Kandir (LC 87/1996), dispositivo acrescentado pela LC 190/2022.

O citado artigo dispõe caber aos Estados e Distrito Federal a divulgação, em portal próprio, das informações necessárias para o cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, nas operações e prestações interestaduais relacionadas à diferença entre a alíquota interna do ente de destino e a interestadual para consumidor final, não contribuinte do ICMS.

Outrossim, não há, em tal artigo, qualquer determinação de que a cobrança do tributo aconteça tão somente após a unificação/centralização dos portais dos Estados e do Distrito Federal, sendo suficiente que o Portal Nacional permita a apuração do imposto, mesmo que seja através do redirecionamento para o Portal da Unidade Federada desejada.

Interessa, também, consignar que, para considerar o Portal Nacional inoperante, haveria de ser demonstrado que o contribuinte se encontra totalmente cerceado de emitir as guias para o recolhimento do tributo em tela.

Por fim, anote-se que, de acordo com o preceito contido no art. 151, II, do Código Tributário Nacional, o contribuinte possui a faculdade de depositar o valor integral do imposto para assim ter suspensa a sua exigibilidade.

À vista disso, resta evidente que a obtenção da suspensão da exigibilidade de determinado tributo independe de qualquer procedimento judicial, sendo suficiente, para o alcance de tal pretensão, que o contribuinte proceda ao depósito extrajudicial do seu montante integral junto à instituição financeira oficial, nos termos previstos no art. 151, II, do CTN e nas Leis 9.703 /1998 e 12.099/2009.

 

 

Ante todas as ponderações tecidas, voto em conhecer e negar provimento a ambos os apelos, mantendo a sentença recorrida em seus termos.



Salvador/BA, 4 de outubro de 2024.


 Des. Angelo Jeronimo e Silva Vita 

Relator