PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Quinta Câmara Cível 



ProcessoAPELAÇÃO CÍVEL n. 0099846-26.2010.8.05.0001
Órgão JulgadorQuinta Câmara Cível
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s) 
APELADO: VISION MED ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA
Advogado(s):ANDRE MAGNO SILVA BEZERRA

EMENTA

Apelação Cível. Ação Civil Pública. Sentença que julgou improcedentes os pedidos iniciais “em razão da ausência de previsão legal que determine o custeio dos exames laboratoriais e demais serviços de apoio diagnóstico solicitados por nutricionistas para os usuários da ré”. Mérito. Há previsão legal para que os nutricionistas possam solicitar exames laboratoriais necessários ao acompanhamento dietético, conforme expressa previsão do art. 4º, VIII, da Lei 8.234/1991. Contudo, inexiste previsão legal que obrigue a operadora a custear referidos exames (solicitados por nutricionista), bem como, no presente caso, também inexiste previsão contratual que garanta o dever de cobertura, assim, interpretar esse artigo de forma extensiva, para incluir os nutricionistas, significa inovar no mundo jurídico legal em substituição ao Poder Legislativo. Assim não há dúvida que, nos termos da Lei 8.234 de 17.09.1991, é atividade de nutricionistas solicitar exames laboratoriais, mas nem por isso a ANS está obrigada a incluir tal atividade no rol de procedimentos e eventos em saúde das pessoas jurídicas que operam planos de assistência à saúde. Igualmente entendeu, o STF em recentíssima decisão (09 de agosto de 2024), no julgamento da ADI 7552, que entendeu que os planos de saúde não são obrigados a cobrir exames pedidos por nutricionistas. Essa decisão foi tomada em resposta à lei que visava obrigar os planos a custear tais exames, assim, o Supremo Tribunal Federal (STF) conseguiu obter a maioria dos votos para derrubar a obrigatoriedade dos planos de saúde em cobrir exames pedidos por nutricionistas, sendo esta lei declarada inconstitucional em julgamento realizado no plenário virtual da Suprema Corte. Atualmente, encontra-se em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 5881/2019, que pretende alterar a Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, para incluir, na cobertura de atendimento os exames complementares solicitados por nutricionistas, quando necessários ao acompanhamento dietoterápico. A proposta de alteração da Lei corrobora o entendimento de que os nutricionistas não foram contemplados pelo legislador, inexistindo, pelo menos por enquanto, previsão de cobertura obrigatória de exames por eles solicitados, não sendo possível, portanto, conceder o pedido formulado pelo apelante. Sobre o pedido de inconstitucionalidade, nota-se que, após a interposição do Apelo, o Supremo Tribunal Federal prolatou decisões definitivas nas ADIs, reconhecendo a constitucionalidade da norma impugnada, pelo que verificada sua desnecessidade. Apelo improvido.

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 QUINTA CÂMARA CÍVEL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e não provido Por Unanimidade

Salvador, 23 de Setembro de 2024.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Quinta Câmara Cível 

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0099846-26.2010.8.05.0001
Órgão Julgador: Quinta Câmara Cível
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):  
APELADO: VISION MED ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA
Advogado(s): ANDRE MAGNO SILVA BEZERRA

 

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por apelante MINISTÉRIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA contra Sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito da 8ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Salvador, que, nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA, tombada sob o n.º 0099846-26.2010.8.05.0001, ajuizada pela ora apelante MINISTÉRIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA, que julgou improcedentes os pedidos exordiais, nos seguintes termos: “(...)Desse modo, prevalece na jurisprudência nacional o entendimento de que é impossível considerar como de cobertura obrigatória os exames e procedimentos solicitados por profissional que não o médico, ante a inexistência de previsão legal para tanto. Assim, em razão da ausência de previsão legal que determine o custeio dos exames laboratoriais e demais serviços de apoio diagnóstico solicitados por nutricionistas para os usuários da ré, julgo improcedente a ação. (...) Com esses argumentos, e considerando tudo mais que dos autos consta, extingo o processo sem resolução do mérito, em relação ao pedido de declaração de inconstitucionalidade do artigo 12, I, b da Lei dos Planos de Saúde, pela inadequação da via eleita, ante o descabimento de pedido de arguição de inconstitucionalidade de dispositivo de lei em ação civil pública, e, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, forte no art. 487, I, do CPC. Não obstante a manifesta improcedência da demanda, não está claramente evidenciado que o autor tenha atuado de má-fé, descabendo assim a verba honorária, nos termos do art. 17 da Lei 7.347/1985.

Irresignado, o apelante MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA apresentou recurso de apelação – ID. 53976358 – fazendo uma breve síntese fática, e alegando que o Juízo adotou posicionamento equivocado, visto ser patente que o pedido de declaração de inconstitucionalidade é incidental, não sendo o principal, e em complemento, que os exames e demais serviços requisitados pelo nutricionista devem ser incluídos no rol de cobertura obrigatória da VISION MED ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA

Entende que não é admissível que as operadoras de planos e seguros de saúde, à sua escolha, não custeiem os exames laboratoriais requisitados por nutricionistas, visando tão somente reduzir os gastos em busca de maiores lucros e em prejuízo dos usuários do sistema.

Afirma que a partir do momento que as Operadoras se responsabilizam por desempenhar o fornecimento de assistência à saúde suplementar, não podem se furtar ao dever de melhor desempenhar a prestação do serviço, como a obrigação de arcar com todos os custos e gastos necessários para a realização de exames requisitados por todo e qualquer profissional competente, destacando-se nesta ação o nutricionista, ex vi art. 4º, inciso VIII, da Lei n.º 8.234/1991.

Aduz que “Diante da relevância manifesta do bem jurídico em comento, argumenta-se que nas relações contratuais de plano ou seguro de saúde não devem ser possíveis restrições indevidas quanto à cobertura de moléstias detectadas pela ciência. Ademais, negativas infundadas para a realização dos procedimentos e tratamentos médicos considerados como necessário..”

Argui que a declaração de inconstitucionalidade perseguida está no espectro do controle difuso, cujo exercício e efetivação pode ser operado por qualquer órgão jurisdicional, com efeitos inter partes, ou seja, entre as partes presentes na contenda. Além disso, o pedido veiculado está na modalidade incidental e não principal, discrepando do quanto aduzido pelo Juízo a quo. É notório o asseverado, sendo comprovado em breve leitura aos pedidos definitivos de Exordial5 ..”

Defende que, com a declaração de inconstitucionalidade, a perda da validade da norma multicitada para os usuários da VISION MED ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA e também para que esta deixe de utilizar a referida norma para negar cobertura aos exames e demais serviços requisitados por nutricionistas.

Assinala que se reputa como inconsistente a linha de intelecção de que o pedido pela declaração incidental de inconstitucionalidade é impossível juridicamente e formulado em via inadequada, pois é escorreitamente plausível a veiculação do pedido na modalidade difusa e com efeitos limitados às partes, sejam substituídas ou não no processo, e a via eleita é adequada, dado o fato de que a ação constitucional em curso não está substituindo a ação direta de inconstitucionalidade.

Sustenta que “Não há o que ponderar entre o direito do consumidor ao custeio dos multicitados exames e a autonomia privada do fornecedor diante do caráter fundamental do primeiro e do menor potencial do segundo – sem desconsiderar que a proteção do consumidor integra o rol de princípios da Ordem Econômica Brasileira.”

Argui que “o art. 3o , inciso VIII, da Lei no 8.234/91, dispõe que, dentre as atividades privativas dos Nutricionistas, encontram-se a assistência dietoterápica hospitalar, ambulatorial e a nível de consultórios, de nutrição e dietética, prescrevendo, planejando, analisando, supervisionando e avaliando dietas para enfermos. O 4o , inciso VIII, da citada lex, reza também que os Nutricionistas podem, dentre outras atividades, solicitar exames laboratoriais necessários ao acompanhamento dietoterápico, desde que relacionados com alimentação e nutrição humana..”

Informa que restringir a cobertura obrigatória à avaliação médica impossibilita ao usuário o pleno acesso ao controle da sua alimentação e o combate de moléstias a esta vinculada, em especial aquelas detectadas pelo nutricionista.

Aponta que, se é atribuição do nutricionista a solicitação de exames, por prerrogativa conferida pela Lei n.º 8.234/91, a cobertura de despesas de atendimento é obrigatória para os planos de saúde, tornando-se irrazoável a recusa ao custeio dos exames solicitados pelos profissionais sobreditos

Obtempera que o precedente mencionado é passível de ser modificado, seja no Tribunal a quo com o retorno dos autos, assim como, surgindo uma nova violação à legislação federal em novo acórdão, ser alterado pelo Tribunal Superior ad quem.

Assevera que “com o reconhecimento da exigibilidade de cobertura obrigatória dos exames e demais serviços solicitados pelo nutricionista, outros pleitos ministeriais também se tornam exigíveis. Um destes é a repetição do indébito, consoante propugnado em Exordial. Nessa esteira, os consumidores que foram indevidamente cobrados pelos exames e demais serviços solicitados pelos nutricionistas, com negativa apresentada pela Apelada, devem ser ressarcidos.”

Aponta que se torna imperiosa a condenação em indenização por danos materiais e morais aos consumidores que tiveram a negativa de custeio das despesas com os exames e demais serviços de apoio diagnóstico requisitado pelo nutricionista.

Ao fim, requer o RECEBIMENTO desta Apelação e pelo PROVIMENTO, in totum, do presente instrumento recursal, com a adoção das seguintes providências: 1) REFORMA DA SENTENÇA, com o reconhecimento da procedência dos pedidos, face à suficiência do lastro probatório carreado aos autos pelo Ministério Público, de maneira que a Apelada seja compelida: 1.1) A custear os exames laboratoriais e demais serviços de apoio de diagnóstico, para fins dietoterápicos, requisitados pelos nutricionistas, em prol dos usuários dos planos de saúde, individuais ou coletivos, integrantes de quaisquer das segmentações previstas na Lei n. 9.656/98, geridos pela mesma, cujos contratos tenham sido firmados antes ou após este diploma legal; 1.2) A não criar quaisquer obstáculos para que os citados usuários de planos de saúde, individuais ou coletivos, integrante de quaisquer das segmentações legais, firmados antes ou após a Lei n. 9.656/98, realizem os exames laboratoriais e sejam submetidos aos demais serviços de apoio diagnóstico requisitados por nutricionistas; 1.3) Encaminhar correspondência para os mencionados usuários de planos de saúde, informando-lhes sobre o custeio dos exames laboratoriais e demais serviços de apoio diagnóstico requisitados por nutricionistas; 1.4) Remeter também correspondência para os laboratórios comunicando-lhes sobre o custeio dos exames laboratoriais e demais serviços de apoio diagnóstico requisitados por nutricionistas; 1.5) A declaração incidenter tantum da inconstitucionalidade do art. 12, inciso I, da Lei n. 9.656/98, eis que viola os ditames constitucionais vigentes; 1.6) A restituir, em dobro e de forma atualizada, os valores pagos pelos usuários para a realização de serviços de apoio diagnóstico, requisitado pelo nutricionista, em razão da não cobertura por parte da Ré; 1.7) A indenizar os consumidores que sofreram danos materiais e morais decorrentes da prática adotada pela Ré em negar-se a custear as despesas com o serviço de apoio diagnóstico requisitado por nutricionista; 1.8) A efetivar o pagamento de indenização no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) em razão dos danos causados à sociedade de forma difusa, dada as práticas abusivas cometidas e os efeitos negativos gerados em face dos contratantes, a ser revertida para o Fundo de que trata a Lei n. 7.347/85;.”

Devidamente intimada, a apelada apresentou contrarrazões ao recurso de apelação – ID. 53976362, alegando em síntese que, as alegações do apelante foram devidamente analisadas pelo juízo a quo, que corretamente indeferiu o pedido de declaração de inconstitucionalidade do art. 12, inciso I, da Lei 9.656/98 e afastou as pretensões de imposição de obrigação de fornecimento de cobertura para exames laboratoriais prescritos por nutricionistas.

Alega que a sentença demonstra o correto entendimento da vedação legal para os nutricionistas prescrevam exames laboratoriais, inexistindo razões para que o art. 12, I, ‘b’ da Lei 9656/98 seja declarado inconstitucional.”

Informa que, ao contrário do que argumenta o apelante, o art. 12, I, ‘b’ da Lei 9.656/98 visa, na verdade, garantir direitos ao consumidor dos planos de saúde, pois o mesmo atende as condições basilares do chamado “plano-referência”, cujo conceito deriva do art. 10 da mesma lei 9656/98

Argui que Não havendo inconstitucionalidade do art. 12, I, ‘b’ da Lei 9.656/98, não há como ser reformada a sentença para acolher o pedido de repetição de indébito, considerando também a natureza do instituto como totalmente inadequada para a situação versada..”

Aponta que não se pode atribuir à apelada qualquer responsabilidade pelos supostos danos morais sofridos pela coletividade, mormente porque a discussão posta em juízo limita-se ao limitado contingente dos usuários dos planos de saúde oferecidos pela apelada.

Assinala que a parquet alega constrangimento pela negativa de cobertura para exames e serviços de diagnósticos solicitados por nutricionistas, mas o que ocorreu foi apenas o exercício regular do direito, já que a apelada negou o fornecimento da cobertura com base no art. 12, I, ‘b’ da Lei 9.656/98..”

Firme nestas razões, requereu o improvimento do recurso.

Devidamente intimada, a Douta Procuradoria de Justiça, emitiu Pronunciamento de ID. 56695518, opinando pelo provimento do apelo, nos seguintes termos: “seguindo o quanto recomendado pelo CNMP, reitera integralmente as razões de apelação oferecidas no fólio, manifestando-se pelo PROVIMENTO do apelo interposto, por se tratar de medida da mais lídima justiça.”

Desta feita, com fulcro no art. 931 do CPC, restituo os autos, com o presente relatório, à Secretaria, para inclusão em pauta de julgamento; oportunidade na qual será facultada às partes a sustentação oral, na forma prevista no art. 937, do CPC.

Salvador, 28 de agosto de 2024.

 

 

DES. JOSÉ CÍCERO LANDIN NETO

                     Relator


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Quinta Câmara Cível 



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0099846-26.2010.8.05.0001
Órgão Julgador: Quinta Câmara Cível
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):  
APELADO: VISION MED ASSISTÊNCIA MÉDICA LTDA
Advogado(s): ANDRE MAGNO SILVA BEZERRA

 

VOTO

Inicialmente cabe destacar que a Lei 9.961 de 28.01.2000 que criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS dispõe que:

Art. 4o Compete à ANS:

(...)

III - elaborar o rol de procedimentos e eventos em saúde, que constituirão referência básica para os fins do disposto na , e suas excepcionalidades;

(...)

Como se vê, “o rol de procedimentos e eventos de saúde” elaborado pela Agência Nacional de Saúde é somente para os fins do disposto na Lei 9.656 de 03.06.1998, assim essa lei dispõe sobre “planos e seguros privados de assistência à saúde”, ficando estabelecido que exames serão aqueles solicitados por médico assistente e não por nutricionistas:

Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:

I - quando incluir atendimento ambulatorial:

a) cobertura de consultas médicas, em número ilimitado, em clínicas básicas e especializadas, reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina;

b) cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente;

....

II - quando incluir internação hospitalar:

(...)

d) cobertura de exames complementares indispensáveis para o controle da evolução da doença e elucidação diagnóstica, fornecimento de medicamentos, anestésicos, gases medicinais, transfusões e sessões de quimioterapia e radioterapia, conforme prescrição do médico assistente, realizados ou ministrados durante o período de internação hospitalar;

(...);

A Resolução Normativa – RN nº 338 de 21.10.2013 (que revogou a Resolução – RN 211/2010), regulamentou a Lei 9.661/2000 e atualizou “rol de procedimentos e eventos em saúde”, não podendo evidentemente incluir “nutricionistas” – porque isso não está previsto no art. 12 da Lei 9.656/1998:

Art. 4º Os procedimentos e eventos listados nesta Resolução Normativa e nos seus Anexos poderão ser executados por qualquer profissional de saúde habilitado para a sua realização, conforme legislação específica sobre as profissões de saúde e regulamentação de seus respectivos conselhos profissionais, respeitados os critérios de credenciamento, referenciamento, reembolso ou qualquer outro tipo de relação entre a operadora de planos privados de assistência à saúde e prestadores de serviço de saúde.

Parágrafo único. Os procedimentos listados nesta Resolução Normativa e nos seus Anexos serão de cobertura obrigatória quando solicitados pelo médico assistente, conforme disposto no artigo 12 da Lei nº 9.656 de 1998, com exceção dos procedimentos odontológicos e dos procedimentos vinculados aos de natureza odontológica – aqueles executados por cirurgião-dentista ou os recursos, exames e técnicas auxiliares necessários ao diagnóstico, tratamento e prognóstico odontológicos – que poderão ser solicitados ou executados diretamente pelo cirurgião dentista.

Conforme pontuado, há previsão legal para que os nutricionistas possam solicitar exames laboratoriais necessários ao acompanhamento dietético, conforme expressa previsão do art. VIII, da Lei 8.234/1991, segundo o qual:

Art.  Atribuem-se, também, aos nutricionistas as seguintes atividades, desde que relacionadas com alimentação e nutrição humanas:

(...) VIII - solicitação de exames laboratoriais necessários ao acompanhamento dietoterápico;
Contudo, inexiste previsão legal que obrigue a operadora a custear referidos exames (solicitados por nutricionista), bem como, no presente caso, também inexiste previsão contratual que garanta o dever de cobertura. Assim, interpretar esse artigo de forma extensiva, para incluir os nutricionistas, significa inovar no mundo jurídico em substituição ao Poder Legislativo.

Assim não há dúvida que, nos termos da Lei 8.234 de 17.09.1991 é atividade de nutricionistas solicitar exames laboratoriais, mas nem por isso a ANS está obrigada a incluir tal atividade no “rol de procedimentos e eventos em saúde” das pessoas jurídicas que operam planos de assistência à saúde:

Art. 4º Atribuem-se, também, aos nutricionistas as seguintes atividades, desde que relacionadas com alimentação e nutrição humanas:

(...)

VIII - solicitação de exames laboratoriais necessários ao acompanhamento dietoterápico;

(...).

A Lei 9.656/1998 é posterior a Lei 8.234/1991. Se ela quisesse incluir os nutricionistas, teria feito expressamente. Não se admite agora incluí-los, criando, na prática, uma cobertura de atendimento pelas operadoras de plano de saúde não prevista em lei.

Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ROL DE PROCEDIMENTOS E EVENTOS EM SAÚDE. EXAMES SOLICITADOS POR MÉDICO ASSISTENTE E NÃO POR NUTRICIONISTA. 1."O rol de procedimento e eventos de saúde" elaborado pela Agência Nacional de Saúde em cumprimento da Lei 9.961/2000 é somente para os fins do disposto na Lei 9.656 de 03.06.1998. Essa lei dispõe sobre "planos e seguros privados de assistência à saúde", ficando estabelecido que exames diagnósticos serão aqueles solicitados por médico assistente e não por nutricionistas. 2. Não há dúvida que, nos termos da Lei 8.234 de 17.09.1991 é atividade de nutricionistas solicitar exames laboratoriais, mas nem por isso a Agência/ré está obrigada a incluir tal atividade no "rol de procedimentos e eventos em saúde" das pessoas jurídicas que operam planos de assistência à saúde. 3. A Lei 9.656/1998 é posterior à Lei 8.234/1991. Se ela quisesse incluir os nutricionistas, teria feito expressamente. Não se admite agora incluí-los, criando, na prática, uma cobertura de atendimento pelas operadoras de plano de saúde não prevista em lei. 4. Apelação da ANS/ré provida. (TRF-1 - AC: 00545830320104013400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NOVÉLY VILANOVA, OITAVA TURMA, Data de Publicação: 03/08/2018)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA E REEMBOLSO DE EXAMES SOLICITADOS POR NUTRICIONISTA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.ALEGAÇÃO DE QUE HÁ COBERTURA CONTRATUAL E QUE A LEGISLAÇÃO PERMITE AO NUTRICIONISTA SOLICITAR EXAMES. NÃO ACOLHIMENTO. LEI Nº 9656/98 QUE PREVÊ COMO DE COBERTURA OBRIGATÓRIA APENAS EXAMES SOLICITADOS POR PROFISSIONAL MÉDICO. DISPOSIÇÃO REPRODUZIDA NO ROL DE PROCEDIMENTOS DA ANS E NO CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES. NEGATIVA QUE NÃO SE MOSTRA ILEGÍTIMA. SENTENÇA MANTIDA.RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. Vistos. (TJPR - 9ª C.Cível - 0075621-42.2020.8.16.0014 - Londrina - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU GUILHERME FREDERICO HERNANDES DENZ - J. 02.12.2021) (TJ-PR - APL: 00756214220208160014 Londrina 0075621-42.2020.8.16.0014 (Acórdão), Relator: Guilherme Frederico Hernandes Denz, Data de Julgamento: 02/12/2021, 9ª Câmara Cível, Data de Publicação: 14/12/2021)

Igualmente entendeu, o STF em recentíssima decisão (09 de agosto de 2024), no julgamento da ADI 7552, que entendeu que os planos de saúde não são obrigados a cobrir exames pedidos por nutricionistas.

Essa decisão foi tomada em resposta à lei que visava obrigar os planos a custear tais exames, assim, o Supremo Tribunal Federal (STF) conseguiu obter a maioria dos votos para derrubar a obrigatoriedade dos planos de saúde em cobrir exames pedidos por nutricionistas, sendo esta lei declarada inconstitucional em julgamento realizado no plenário virtual da Corte.

Com a invalidação pelo STF, a lei estadual perde a validade e os planos de saúde passam a não mais ser obrigados a cobrir os exames solicitados por nutricionistas no estado de Alagoas.

O Ministro Gilmar Mendes ressaltou que a regulação dos planos de saúde e seguros privados é matéria de direito civil e, portanto, de competência legislativa privativa da União (artigo 22, incisos I e VII, da Constituição Federal), e explicou que a competência suplementar dos estados para legislar sobre proteção do consumidor não alcança a disciplina das relações contratuais para obrigar uma das partes a remunerar serviços diferentes dos previstos.

Ressaltou, ainda, que operadoras estão sujeitas à Lei federal 9.656/1998, que restringe a cobertura obrigatória às requisições de exames feitas por médicos e odontólogos, consoante informativo:

Informativo 1145

ADI 7552 / AL

Órgão julgador: Tribunal Pleno

Relator(a): Min. LUIZ FUX

Julgamento: 09/08/2024 (Virtual)

Ramo do Direito: Constitucional

Matéria: Repartição de Competências; Direito Civil; Política de Seguros

Solicitação de exames laboratoriais para acompanhamento por nutricionistas e criação de obrigações para operadoras de planos de saúde

Resumo

É inconstitucional — por violar a competência privativa da União para legislar sobre direito civil e política de seguros (CF/1988, art. 22, I e VII) — lei estadual que dispõe acerca das diretrizes para a solicitação de exames laboratoriais para acompanhamento dietoterápico por nutricionista com cobertura obrigatória pelas operadoras de planos de saúde.

Esta Corte já reconheceu a inconstitucionalidade formal de norma semelhante que estabelecia obrigações para empresas operadoras de planos de saúde referentes à cobertura de exames laboratoriais prescritos por nutricionistas (1).
Nesse contexto, deve-se aplicar a mesma interpretação jurídica adotada recentemente pelo Plenário, à luz dos princípios da segurança jurídica, da igualdade e da eficiência na administração da justiça.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da Lei nº 8.880/2023 do Estado de Alagoas (2).”

Nesse sentido ementado de julgamento idêntico na ADI 7.376:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 11.081, DE 12.4.2022, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL: COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA LEGISLAR PRIVATIVAMENTE SOBRE DIREITO CIVIL E POLÍTICA DE SEGUROS. VIOLAÇÃO À ISONOMIA E À LIVRE-INICIATIVA. 1. As regras de distribuição de competências legislativas são alicerces do federalismo e consagram a fórmula de divisão de centros de poder em um Estado de Direito. Princípio da predominância do interesse. 2. A Constituição Federal de 1988, presumindo de forma absoluta para algumas matérias a presença do princípio da predominância do interesse, estabeleceu, a priori, diversas competências para cada um dos entes federativos, União, Estadosmembros, Distrito Federal e Municípios, e, a partir dessas opções, pode ora acentuar maior centralização de poder, principalmente na própria União (CF, art. 22), ora permitir maior descentralização nos Estadosmembros e nos Municípios (CF, arts. 24 e 30, inciso I). 3. É formalmente inconstitucional a Lei 11.081, de 12.4.2022, do Estado do Rio Grande do Norte, pela qual se estabelecem obrigações referentes a cobertura de exames laboratoriais prescritos por nutricionistas: matéria de direito civil e concernente à política de seguros, de competência legislativa privativa da União (incisos I e VII do art. 22 da Constituição da República). Precedentes. 4. Operadoras de saúde sujeitas à Lei Federal 9.656/1998, que dispõe sobre a cobertura e estabelece exigências mínimas para a oferta de planos privados de assistência à saúde. 5. Ação Direita de Inconstitucionalidade julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei 11.081/RN.”

Embora as decisões do STF tenham abordado especificamente a lei de Alagoas e do Rio Grande do Norte, a questão reflete sobre a competência dos estados para legislarem sobre matérias reguladas pela União, como é o caso dos planos de saúde.

É importante que os profissionais de saúde compreendam que, enquanto as necessidades de saúde dos pacientes são primordiais, a sustentabilidade financeira do sistema de saúde é igualmente crucial.

Imperioso ressaltar que se encontra em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 5881/2019, que pretende alterar a Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, para incluir, na cobertura de atendimento os exames complementares solicitados por nutricionistas, quando necessários ao acompanhamento dietoterápico.

A proposta de alteração da Lei corrobora o entendimento de que os nutricionistas não foram contemplados pelo legislador, inexistindo, pelo menos, por enquanto, previsão de cobertura obrigatória de exames por eles solicitados, não sendo possível, portanto, conceder o pedido formulado pelo autor/apelante.

Sobre o pedido de inconstitucionalidade, nota-se que, após a interposição do Apelo, o Supremo Tribunal Federal prolatou decisões definitivas nas ADIs, reconhecendo a constitucionalidade da norma impugnada, pelo que verificada sua desnecessidade.

Frisa-se que há vedação ao uso da ação civil pública para alcançar a declaração de inconstitucionalidade com efeitos erga omnes, admitindo-se apenas que a inconstitucionalidade constitua causa de pedir, mas não pedido da ação.

Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso de Apelação interposto, mantendo-se a sentença recorrida em todos os seus termos.

Sala das Sessões da 5ª Câmara Cível,           de                       de 2024.

 


PRESIDENTE

 


DES. JOSÉ CÍCERO LANDIN NETO

                     RELATOR

 


PROCURADOR DE JUSTIÇA