PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 1ª Turma 



ProcessoAPELAÇÃO CRIMINAL n. 0507574-72.2018.8.05.0001
Órgão JulgadorSegunda Câmara Criminal 1ª Turma
APELANTE: MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO
Advogado(s)PLACIDO SERRA DE FARIA, SAULO DE ANDRADE BARROS
APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s): 

 

EMENTA

 

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 33, CAPUT,  DA LEI Nº 11.343/2006. DÚVIDA QUANTO À AUTORIA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. POSSIBILIDADE DE QUE OS ENTORPECENTES APREENDIDOS FOSSEM PARA CONSUMO PRÓPRIO. APELANTE QUE SE AUTODECLARA USUÁRIO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO PREVISTO NO ART. 28 DA LEI 11.343/2006. POSSIBILIDADE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. 

1.  A materialidade delitiva resta comprovada por meio do Auto de Prisão em flagrante, do Boletim de Ocorrência, do Auto de Exibição e Apreensão, do Laudo Pericial e do Relatório da autoridade policial.

2. A análise imparcial e cuidadosa da prova produzida revela que subsiste efetiva dúvida quanto à prática do tráfico de drogas na autoria do apelante. 

3. Constata-se que não houve a individualização da quantidade de drogas encontrada com o recorrente. As testemunhas de acusação relataram apenas ter encontrado “uma pequena quantidade de maconha” na posse do recorrente.

4. O apelante reconheceu ser usuário de drogas, condição corroborada pelas testemunhas da acusação ouvidas em juízo, no sentido de que não foi flagrado com nenhum petrecho relacionado ao crime em comento nem em conduta indicativa de tráfico; inexistia denúncia de mercancia de entorpecentes praticada por ele, tão somente a informação de que seria o veículo responsável pelo transporte do coautor.

5. Diante de todo o cenário probatório, a autoria emerge frágil para a prática do crime de tráfico e, por força da aplicação do princípio in dubio pro reo, revela-se possível a desclassificação do crime de tráfico de drogas que é atribuído ao apelante para aquele previsto no art. 28 da Lei 11.343/2006.

6. O prazo prescricional para o delito tipificado no art. 28 da Lei de Drogas, conforme o art. 30 do mesmo diploma legal, é de 2 (dois) anos. A sentença condenatória (ID 41194072) foi proferida em 10/03/2020, e os embargos de declaração (ID 41194072) foram parcialmente acolhidos em 07/07/2020, para fixar o regime inicial de cumprimento da pena no aberto, substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos (prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana), além de conceder o direito de apelar em liberdade. Desse modo, resta claro que a punibilidade do agente foi extinta pelo advento da prescrição, uma vez que se passaram mais de dois anos desde a publicação da sentença condenatória ou dos embargos de declaração até o julgamento do presente recurso de apelação.

RECURSO CONHECIDO, PARCIALMENTE PROVIDO E DECLARADA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO AGENTE EM RAZÃO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL.

 

ACÓRDÃO

 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de n. 0507574-72.2018.8.05.0001, em que figuram como apelante MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO e como apelado o MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA.


ACORDAM os Desembargadores integrantes da Primeira Turma da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, conforme resultado expresso na certidão de julgamento, em conhecer, dar provimento parcial ao recurso
e declarar extinta a punibilidade do agente em razão da prescrição punitiva estatal, nos termos do voto condutor.

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL 1ª TURMA

 

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e provido em parte Por Unanimidade

Salvador, 13 de Março de 2025.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 1ª Turma 

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL n. 0507574-72.2018.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal 1ª Turma
APELANTE: MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO
Advogado(s): PLACIDO SERRA DE FARIA, SAULO DE ANDRADE BARROS
APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):  

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de apelação interposta pelo acusado MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO contra sentença que o condenou à pena 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e ao pagamento de 165 (cento e sessenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, em regime inicial aberto, pela prática da conduta descrita no art. 33, caput, da Lei n° 11.343/2006, tendo sido substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em  prestação de serviços à comunidade e a limitação de finais de semana, concedido o direito de recorrer em liberdade (ID’s 41194072 e 41194086).

O Ministério Público denunciou Douglas Verstappen e Marcelo Rodrigues da Silva Filho, ora apelante, imputando-os a prática do crime descrito no art. 33, caput, c/c art. 35, ambos da Lei n° 11.343/2006 (ID 41192744).

Narra a denúncia que, no dia 08 de janeiro de 2018, no bairro de Stella Maris, em Salvador, policiais militares promoveram uma operação de campana com o intuito de localizar um veículo Renault/Sandero, de cor preta e placa PKB5746, que, segundo denúncias anônimas, era utilizado para transportar drogas da cidade de Lauro de Freitas/BA até a região de Stella Maris.

Consta na denúncia que, ao avistar o citado veículo no local, os agentes realizaram a abordagem e identificaram Marcelo Rodrigues da Silva Filho como o condutor. Durante a ação, foi constatada a posse de uma pequena quantidade de maconha e da quantia de R$ 27,00 (vinte e sete reais) em espécie. Interrogado, Marcelo afirmou que, na oportunidade, transportava drogas destinadas a Douglas Verstappen, também denunciado.

Em seguida, os policiais deslocaram-se até a residência de Douglas, situada na Avenida Brigadeiro Alberto Costa Matos, nº 53-A, casa 05, no bairro Aracui, em Lauro de Freitas/BA. No local, foram encontradas "considerável quantidade de maconha, in natura, com massa bruta de 1.989,009 (um mil novecentos e oitenta e nove gramas); além de 08 (oito) pés de maconha, plantados em vasilhas plásticas", reforçando a acusação de tráfico. Contudo, Douglas conseguiu empreender fuga, evadindo-se da ação policial.

Encerrada a instrução criminal, o pedido deduzido na  denúncia foi julgado parcialmente procedente para absolver ambos os réus do crime descrito no art. 35 da Lei 11.343/2006 e condená-los pela prática da conduta descrita no art. 33, caput, da Lei n° 11.343/2006, à pena 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 165 (cento e sessenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, e concedido o direito de recorrer em liberdade (ID 41194072).

O acusado Marcelo Rodrigues da Silva Filho apresentou embargos de declaração no ID 41194080, o qual foi julgado parcialmente procedente (ID 41194086). Na ocasião, o juízo a quo determinou a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, quais sejam, prestação de serviços à comunidade e a limitação de finais de semana.

Irresignado, o acusado Marcelo apelou (ID 41194091). Em suas razões (ID 42023177), requer absolvição sob alegação de fragilidade do acervo probatório. Subsidiariamente, pleiteia a desclassificação do delito previsto no art. 33 para o art. 28, ambos da Lei nº 11.343/2006.

O Ministério Público rebateu as pretensões defensivas posicionando-se pelo conhecimento e não provimento do apelo (ID 43861301).

Subindo os autos a esta instância, manifestou-se a Procuradoria de Justiça, por meio do parecer de lavra do Dr. Rômulo de Andrade Moreira, pelo conhecimento e provimento do recurso (ID 64636666).

Posteriormente, os autos vieram-me conclusos, nos termos do art. 39, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça.

Necessário que seja registrado que a magistrada subscritora do presente relatório foi convocada para ocupar a vaga do desembargador Jefferson Alves de Assis, em 20 de dezembro de 2024, vindo então o recesso forense, que terminou no dia 06.01.2025.

Examinados, lancei este relatório e o submeti à Revisão.

É o relatório.

 

                                Salvador/BA, data e assinatura registradas no sistema.

 

Nartir Dantas Weber

Relatora


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 1ª Turma 



Processo: APELAÇÃO CRIMINAL n. 0507574-72.2018.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal 1ª Turma
APELANTE: MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO
Advogado(s): PLACIDO SERRA DE FARIA, SAULO DE ANDRADE BARROS
APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DA BAHIA
Advogado(s):  

 

VOTO

 

Trata-se de apelação interposta pelo acusado MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO contra sentença que o condenou à pena 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e ao pagamento de 165 (cento e sessenta e cinco) dias-multa, no valor unitário de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, em regime inicial aberto, pela prática da conduta descrita no art. 33, caput, da Lei n° 11.343/2006, tendo sido substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em  prestação de serviços à comunidade e a limitação de fim de semana, concedido o direito de recorrer em liberdade (ID’s 41194072 e 41194086).

Conheço o recurso, uma vez que preenchidos os requisitos de admissibilidade.

A materialidade delitiva resta comprovada por meio do Auto de Prisão em flagrante (ID 41192745, fl. 2), do Boletim de Ocorrência (ID 41192745, fls. 18/20), do Auto de Exibição e Apreensão (ID 41192745, fl. 5), do Laudo Pericial (ID 41192745, fl. 30) e do Relatório da autoridade policial (ID 41192745, fl. 43/46).

 Registre-se que, de acordo com o referido Auto de Exibição e Apreensão (ID 41192745, fl. 5), foram apresentados à autoridade policial: a) farta quantidade de erva aparentando ser maconha “in natura”; b) 8 (oito) pés da mesma erva plantada em vasos plásticos. 

A natureza e quantidade das drogas restaram definidas no Laudo Pericial do ID 41192745 (fls. 30), o qual atesta que se trata de maconha, com massa bruta equivalente a 1.989,00g (mil novecentos e oitenta e nove gramas).

No que toca à autoria delitiva, a matéria suscitada demanda o revolvimento dos elementos de prova amealhados, notadamente, a prova judicializada.

Acerca dos fatos narrados na exordial acusatória, colhe-se do procedimento inquisitivo que, em 08/01/2018, policiais civis interceptaram o veículo Renault/Sandero, cor preta, placa PKB5746/BA, que há algum tempo era utilizado para o transporte de drogas. Durante a abordagem, identificou-se o condutor, Marcelo Rodrigues da Silva Filho, ora apelante, na posse de uma pequena quantidade de maconha dentro de uma vasilha plástica, além da quantia de R$ 27,00 (vinte e sete reais) em espécie. Ao ser questionado, admitiu que transportava drogas para Douglas Verstappen e levou os agentes até a residência deste, local em que foi encontrada uma grande quantidade de maconha in natura e 8 (oito) pés de maconha de várias espécies plantadas em vasilhas plásticas. 

Perante a autoridade policial, o apelante negou a autoria dos fatos, alegando ser usuário de maconha e ter adquirido o entorpecente em mãos de Douglas. Narrou que trabalha como motorista de Uber e frequentemente fazia o transporte de Douglas, de Lauro de Freitas/BA até Stella Maris, “podendo perceber” que este levava drogas consigo. Por fim, afirmou que recebia o pagamento das corridas em dinheiro, recusando-se a aceitar drogas como meio de pagamento do serviço (ID 41192745, fls. 10/11).

Em Juízo, manteve a negativa de autoria, asseverando que fez duas ou três corridas para Douglas e, ao desconfiar que este transportava drogas, se recusou a continuar prestando o serviço e "cortaram" a amizade. Disse, ainda, que a maconha encontrada em seu veículo se tratava de um “baseado” para consumo próprio. Confira-se (ID 41193989):

[...] que quando foi parado pelos policiais, o interrogado estava fazendo uma corrida de Uber, na companhia de um cliente; que os policiais já chegaram com metralhadora e o algemaram,  depois o colocaram no carro e seguiram para a casa de Douglas; que arrombaram a casa de Douglas, revistaram tudo; que a mãe de Douglas apareceu para entender o que estava acontecendo; que entraram os oito policiais de uma vez, enquanto o interrogado ficou trancado dentro do seu carro; que os policiais fizeram o acusado carregar as plantações de maconha e colocar no carro; que a ação foi toda filmada e transmitida ao vivo no jornal “Bocão”; que os policiais ficaram questionando de quem era a droga, mas o interrogado disse que não sabia, então bateram nele; que o interrogado foi interrogado e o delegado mandou ele assinar, então ele assinou o depoimento sem ler; que a maconha encontrada no seu carro era para consumo próprio; que havia comprado a droga na lagoa; que a quantidade que havia no carro era um baseado, um beck, pouca coisa, para fumar depois do almoço; que já fez corrida de Uber para Douglas para Stella Maris e após duas ou três corridas começou a desconfiar que Douglas levava drogas na mochila, se recusou a continuar e em virtude disso cortaram a amizade; [...] que antes disso não imaginava que Douglas carregava drogas na mochila, pois só queria o dinheiro da corrida; que era caminho para o condomínio que jogava bola no final de semana; que fazia a simulação para ver o valor do Uber e cobrava em cima do valor; que Douglas não parava em outros lugares, deixava próximo à praça do Gran Hotel Stella Maris; que os policiais saíram da casa de Douglas com uma mochila, além dos pés de maconha; que na Delegacia viu a droga na mochila; [...] que hoje em dia não está mais fumando, porque depois dos fatos ficou com medo e meio esquizofrênico, precisou ir até ao psicólogo; [...] que os pés de maconha eram grandes, tanto que não couberam em seu carro, precisou ir com o porta malas aberto; [...] que a droga encontrada em seu carro não era de Douglas, tinha comprado na Lagoa, em Lauro; [...] que não disse o endereço da casa de Douglas, os policiais já o levaram após o algemarem; [...] que durante o depoimento não foi agredido ou sofreu ameaça, apenas antes do depoimento que apanhou do delegado ACM; [...] que nunca vendeu maconha e nunca levou maconha para ninguém; [...]. (Registro audiovisual, PJe mídias).

As testemunhas de acusação, policiais militares que participaram da diligência que resultou na prisão em flagrante do apelante, também foram ouvidas em juízo. Em suma, narraram que localizaram o veículo do recorrente, após informações do seu envolvimento no transporte de drogas de Lauro de Freitas/BA  para  o bairro de Stella Maris, nesta Capital; que durante a abordagem verificaram que o recorrente estava em uma corrida de Uber, porém, portava uma pequena quantidade de maconha; que ao ser questionado, admitiu que realizava o transporte de Douglas com as drogas e conduziu os agentes até a residência deste; que no local foi encontrado uma grande quantidade de maconha, além de plantas da erva. Conforme transcrição (ID’s 41193979 e 41193989):     

DEPOIMENTO DO IPC AMARILDO LEITÃO: [...] que participou da diligência que resultou na prisão do acusado Marcelo e os reconhece nesta audiência; que recebeu denúncia da existência de um veículo, Sandero preto que estava fazendo transporte de drogas de Lauro de Freitas para Stella Maris; que fizeram campana e localizaram o veículo; que ao fazer a abordagem, no interior estava Marcelo e um carona; que com Marcelo foi encontrado uma pequena quantidade de maconha, em um recipiente plástico; que no decorrer da diligência se deslocaram até uma residência em Lauro de Freitas, e ao chegarem perceberam que um indivíduo empreendeu fuga, sendo encontrado no quartinho dos fundos, uma sacola com aproximadamente oito quilos de maconha e oito pés de maconha; que conduziram Marcelo na Delegacia junto com as drogas e apresentaram à Autoridade Policial; que identificaram que a residência morava Douglas e foi este quem empreendeu fuga; que a mãe de Douglas declarou que não sabia do ilícito; [...] que a campana era para identificar o veículo e os ocupantes; que não tinham conhecimento do endereço de Douglas, tendo sido passado por Marcelo; que Marcelo a princípio negou, mas depois informou que fazia o transporte de Uber para Douglas e levou os policiais na casa de Douglas; que os policiais já tinham o nome de Douglas, como responsável pelo tráfico, por meio das denúncias; que Douglas, juntamente com Marcelo, fazia o transporte de drogas de Lauto até Stella Maris; que as denúncias repassaram o nome de Douglas e as características do veículo; que na residência Marcelo informou que fazia o transporte de Douglas até Stella Maris, mas não sabia que ele levava drogas; que tinha aproximadamente seis quilos de maconha in natura em uma mochila e as plantações em um recipiente; [...] que Marcelo alegou que a droga encontrada no carro era para uso próprio; que não conhecia Douglas; que a casa onde foi encontrada a droga é da família de Douglas; [...] que a diligência foi determinada pelo delegado Antônio Carlos Magalhães Santos; [...]. (Registro audiovisual, PJe mídias).

DEPOIMENTO DO IPC JAMES CAMARA BAY: [...] que participou da diligência e reconhece os acusados; que receberam informações, denúncias de que havia tráfico de drogas dentro de alguns condomínios em Stella Maris; que começaram a fazer investigação com mais frequência; que quando surgiu a placa de um carro como sendo aquele que fazia o transporte e que o responsável pelo tráfico seria o filho de um alemão; que no dia do fato, teve um informe de que o carro estava em Ipitanga, e lá encontraram o carro com Marcelo e outra pessoa, em uma corrida de Uber; que foi verificado que a outra pessoa realmente não tinha envolvimento com a atividade; que Marcelo confessou que fazia o transporte e levou os policiais até a casa de Douglas; que Douglas percebeu a chegada da polícia e correu deixando a droga para trás; que no fundo da casa tinha vários pés de maconha e outra grande quantidade em uma sacola; que a sacola com a maconha estava no quarto; que Douglas empreendeu fuga deixando a porta do quarto aberta; que a mãe de Douglas se mostrou surpresa e confirmou que o quarto era de Douglas; que em uma das denúncias foi informado o nome de Douglas, filho de um alemão; que havia informação do condutor; que Marcelo confirmou ao depoente que fazia o transporte de Douglas, e sabia que Douglas estava transportando drogas; que foi encontrada uma quantidade pequena com Marcelo; que não se recorda se foi expedido ordem de missão para esse fato; [...] que só localizaram a casa de Douglas porque Marcelo informou o local; que no dia dos fatos, foi verificado que Marcelo realmente estava trabalhando de Uber e estava em uma corrida; que a denúncias fazia referência a Douglas, filho de um alemão que morava em um condomínio em Stella Maris; que fizeram incursão para localizar Douglas, mas tem um terreno grande abandonado ao redor da casa, então não lograram êxito; que Marcelo disse que levava drogas para Stella Maris; que a genitora de Douglas foi ouvida posteriormente na Delegacia; que a mãe de Douglas disse que desconfiava da atividade do filho, mas não sabia das drogas; [...] (Registro audiovisual, PJe mídias).

DEPOIMENTO DO IPC PAULO MARCELO BALTHAZAR DIAS: [...] que se recorda dos fatos e estava na diligência que resultou na prisão de Marcelo; que estava na região de Lauro de Freitas/BA, fazendo incursões, pois já tinha notícia e características de um veículo que fazia o tráfico de drogas, da região de Lauro de Freitas para Stella Maris; que o carro passou pelos policiais em uma via contrária; que os policiais o alcançaram e deram voz de parada, na entrada de Lauro de Freitas, em uma invasão que tem por perto; que dentro do veículo tinha o condutor e uma outra pessoa; o condutor era Marcelo; que os policiais acreditavam que haveria drogas, conforme as denúncias, mas quando revistaram o carro não tinha as drogas que esperavam; que o Marcelo disse que estava fazendo Uber; que tinha outra pessoa no carro e os policiais acreditavam ser um suposto traficante; que o passageiro foi conduzido até a delegacia, posteriormente, e ele provou atrás do aplicativo que tinha pego o veículo como Uber; que no veículo havia uma pequena quantidade de maconha, na porta; que dando continuidade à diligência, falaram com Marcelo que já sabiam da situação do veículo, envolvido com o tráfico de drogas; que Marcelo os levou até a casa de Douglas, local onde pegava as drogas para fazer o transporte; que no local, no quarto, em cima da cama tinha certa quantidade de drogas; que no fundo da residência, no quintal, tinha alguns pés de maconha plantada; que tinha aproximadamente seis quilos de maconha, já embalada, e no quintal havia aproximadamente de oito pés de maconha; que em cima da casa havia uma residência, tendo sido constatado que quem morava era a mãe de Douglas, possuidor da droga; que Marcelo informou que era usuário e passou a fazer constantemente o transporte da droga; que a casa era da mãe de Douglas, mas Douglas residia na parte de baixo; que quando chegaram na casa, havia carteira aberta e computador ligado, mas não encontraram Douglas; [...] que Marcelo fazia o transporte, distribuindo na região de Stella Maris, o depoente acredita que de forma habitual; [...] que todo o material encontrado foi levado para a delegacia; que não pode afirmar se do local onde a mãe de Douglas reside daria para visualizar o plantio de maconha; que a mãe de Douglas tomou susto sobre as drogas; que a mãe de Douglas não foi conduzida para a Delegacia por não ter ligação direta com o flagrante; que as diligências foram ensejadas por denúncias anônimas; que foi feita diligência a fim de localizar Douglas, mas não logrou êxito; que, pelo o que foi relato, Marcelo era usuário e passou a fazer o transporte das drogas, não foi relatado que Marcelo vendia drogas, tão somente fazia o transporte, junto com Douglas; que não foi encontrada arma de fogo; [...]. (Registro audiovisual, PJe mídias).

A testemunha da defesa do apelante, Elaine Cristina do Nascimento Oliveira, em juízo, narrou que “[...] conhece Marcelo há muito tempo, um menino bom; que os familiares são evangélicos; que Marcelo trabalhava com uber e hoje trabalha em uma escola em Camaçari; que já viu Marcelo fumar cigarro e beber cerveja [...]” (Registro audiovisual, PJe mídias) (ID 41193989).

A análise imparcial e cuidadosa da prova produzida revela que subsiste efetiva dúvida quanto à prática do tráfico de drogas pelo apelante.

Com efeito, da leitura dos autos, constata-se que não foi especificada a quantidade de drogas encontrada com o recorrente, e tampouco existem elementos suficientes e indicativos de que, ao realizar o transporte de Douglas, o apelante tinha conhecimento ou intenção de transportar as drogas.

Observa-se que os policiais militares relataram apenas ter encontrado no veículo “uma pequena quantidade de maconha”, tendo sido acrescentado pelo IPC Marcelo Dias que “acreditavam que haveria drogas, conforme as denúncias, mas quando revistaram o carro não tinha as drogas que esperavam”. Nesse sentido, o próprio apelante, afirmou que a substância apreendida em sua posse correspondia a “um baseado, um beck”, o qual seria para consumo próprio.

Ademais, extrai-se da prova judicial, colhida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, que a operação policial teve início com base em denúncias anônimas sobre o tráfico de drogas na região do bairro de Stella Maris, as quais indicavam que Douglas, morador de um condomínio na área, comercializava entorpecentes e que o recorrente realizava o transporte de Douglas para essa finalidade.

Além disso, tanto as testemunhas de acusação quanto da defesa, representada por Elaine Cristina do Nascimento Oliveira, confirmaram em juízo que o apelante trabalhava como motorista de Uber. Diante desse contexto, não há elementos suficientes que indiquem que, ao realizar o transporte de Douglas, Marcelo tinha conhecimento ou a intenção de transportar as drogas.

Outrossim, é importante destacar que o apelante admitiu ser usuário de drogas, o que foi corroborado pelas testemunhas da acusação ouvidas em juízo. Não foi flagrado com nenhum objeto relacionado ao comércio de drogas nem em conduta indicativa de tráfico. Além disso, não havia denúncia sobre sua participação na comercialização de entorpecentes, sendo a única informação a de que seu veículo era utilizado para o transporte do corréu Douglas.

Em pesquisa no sistema PJe 1º Grau, não foi encontrada a existência de outras ações penais ou inquéritos em contra o recorrente, que responde apenas à presente ação penal.

Diante de todo esse cenário probatório, a autoria emerge fraca para a prática do crime de tráfico e, por força da aplicação do princípio in dubio pro reo, revela-se possível a desclassificação do crime de tráfico de drogas que é atribuído ao apelante para aquele previsto no art. 28 da Lei 11.343/2006. Nesse sentido:

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CONCESSÃO DE ORDEM DE OFÍCIO. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA O ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006.

I. CASO EM EXAME Habeas corpus substitutivo impetrado em favor de Hallan de Sousa Mariano, condenado pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006), à pena de 07 anos, 02 meses e 12 dias de reclusão, em regime fechado. A defesa alega, em síntese, ausência de provas suficientes para a condenação, diante da ausência de autoria do delito imputado, uma vez que foram apreendidos 17 gramas de maconha.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) a inadequação do habeas corpus como substitutivo de recurso próprio;(ii) a existência de flagrante ilegalidade na condenação, que justifique a concessão de ordem de ofício para desclassificação da conduta para o art. 28 da Lei de Drogas.

III. RAZÕES DE DECIDIR O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio ou revisão criminal, conforme entendimento consolidado pelo STJ e STF, exceto em casos de flagrante ilegalidade. No caso concreto, a quantidade ínfima de droga (17 gramas de maconha) e a ausência de elementos indicativos de tráfico, como petrechos ou outros indícios de mercancia, aliados à declaração do paciente de que é usuário de drogas, configuram flagrante ilegalidade na condenação por tráfico. A jurisprudência recente do STF, ao fixar parâmetros para diferenciar usuários de traficantes, também justifica a desclassificação da conduta para o art. 28 da Lei n. 11.343/2006.

IV. DISPOSITIVO Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem de ofício para desclassificar a conduta para aquela prevista no artigo 28 da Lei n. 11.343/2006

(STJ - HC: 940966 SP 2024/0324202-0, Relator: Ministra DANIELA TEIXEIRA, Data de Julgamento: 08/10/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/10/2024).

Nesta linha de entendimento, em razão da aplicação do princípio in dubio pro reo, é imprescindível a desclassificação do crime de tráfico de drogas atribuído ao apelante para aquele previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006.

O prazo prescricional para o delito tipificado no art. 28 da Lei de Drogas, conforme o art. 30 do mesmo diploma legal, é de 2 (dois) anos.

A sentença condenatória (ID 41194072) foi proferida em 10/03/2020, e os embargos de declaração (ID 41194072) foram parcialmente acolhidos em 07/07/2020, para fixar o regime inicial de cumprimento da pena no aberto, substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos (prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana), além de conceder o direito de apelar em liberdade.

Desse modo, resta claro que a punibilidade do agente foi extinta pelo advento da prescrição, uma vez que se passaram mais de dois anos desde a publicação da sentença condenatória ou dos embargos de declaração até o julgamento do presente recurso de apelação.



 CONCLUSÃO

Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso, para desclassificar a conduta imputada a MARCELO RODRIGUES DA SILVA FILHO para o crime previsto no art. 28 da Lei n.º 11.343/2006, e para declarar extinta a punibilidade do agente pelo advento da prescrição, nos termos do art. 30 da citada Lei.

 

                                          Sala das Sessões, data e assinatura registradas no sistema.

 

Nartir Dantas Weber

Relatora