DECISÃO MONOCRÁTICA
RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL DO JUÍZO A QUO RECONHECIDA, EM RAZÃO DA FALTA DE PROVAS DO VÍNCULO JURÍDICO DO DEMANDANTE À COMARCA ELEITA PARA INTERPOSIÇÃO DA AÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. INTELIGÊNCIA DO ENUNCIADO 89 DO FONAJE. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, POR INCOMPETÊNCIA TERRITORIAL. DECISÃO JUDICIAL CONFIRMADA PELOS PRÓPRIOS JURÍDICOS FUNDAMENTOS.ARTIGO 15, INCISOS XI E XII DA RES. 02 DE FEVEREIRO DE 2021 DOS JUIZADOS ESPECIAIS E DO ARTIGO 4º, DO ATO CONJUNTO Nº 08 DE 26 DE ABRIL DE 2019 do TJBA. DESNECESSÁRIA SUSTENTAÇÃO ORAL. ENTENDIMENTO JÁ CONSOLIDADO POR ESTA COLENDA TURMA RECURSAL. AUSÊNCIA DE PROVAS/ARGUMENTOS CAPAZES DE ALTERAR TAL ENTENDIMENTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.
Dispensado o relatório, nos termos do artigo 46 da Lei Federal 9.099/1995.
A parte recorrente se insurge contra a sentença de origem, que teve como parte dispositiva (sic): “de ofício, reconheço a incompetência do juízo, e, diante da incompatibilidade entre os sistemas digitais utilizados nas comarcas, inviabilizando a remessa, por conseguinte, JULGO EXTINTO o presente feito sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, IV, do CPC”.
Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando decisão com a fundamentação aqui expressa, nos termos do art. 15, incisos XI e XII da Res. 02 de fevereiro de 2021 dos Juizados Especiais do TJBA, que dispõem sobre o julgamento realizado monocraticamente de processos em ambiente virtual pelas Turmas Recursais do Sistema dos Juizados Especiais que utilizam o Sistema PROJUDI e/ou a decisão do acórdão faz parte de entendimento já consolidado por esta Colenda Turma Recursal.
DECISÃO MONOCRÁTICA
O novo Regimento Interno das Turmas Recursais (Resolução nº 02/2021 do TJBA), estabelece a competência do relator para julgar monocraticamente as matérias que já tenham entendimento sedimentado pelo colegiado ou com uniformização de jurisprudência, em consonância com o art. 15, incisos XI e XII, da mencionada Resolução e artigo 932 do Código de Processo Civil.
Conheço do recurso, porquanto preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
Passemos ao exame do mérito.
Ab initio, cumpre observar que a matéria já se encontra sedimentada amplamente no âmbito da Turma Recursal.
Sabe-se que precedente é toda decisão judicial, tomada à luz de um caso concreto, cujo elemento normativo poderá servir como diretriz para casos futuros análogos[1].
A aplicação dos precedentes dá concretude à princípios basilares no ordenamento jurídico brasileiro, como segurança jurídica (art. 5º, XXXVI, CF), razoável duração do processo e celeridade (art. 5º, LXXVIII, CF), seja por evitar a proliferação de recursos judiciais, ou até mesmo a propositura de ações, seja por facilitar a conciliação judicial, evitando, desse modo, que o processo judicial se perpetue no tempo, tornando o Poder Judiciário ineficiente[2].
Somado a isso, o Novo Código de Processo Civil, no art. 926, estabelece que “os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente”, e estabelece, em seu art. 932 os poderes do relator. Especificamente no âmbito dos Juizados Especiais, a Resolução nº 02 do TJBA, que estabeleceu o Regimento Interno das Turmas Recursais, em seu art. 15, XI e XII, conferiu ao Relator a atribuição de decidir de forma monocrática o recurso, considerando a jurisprudência dominante das Turmas recursais ou do próprio Juizado – passo a adotar tal permissivo.
Ainda, o STF possui entendimento de que: “A sustentação oral não é ato essencial à defesa, por isso não há prejuízo à parte quando o julgamento em plenário virtual observa a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal”. (STF. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Min. EDSON FACHIN. ED ADI 9930715-69.2011.1.00.0000 DF – DISTRITO FEDERAL. Julgado em: 20/12/2019).
Analisemos o caso concreto.
A sentença recorrida, tendo analisado corretamente todos os aspectos do litígio, merece confirmação, não carecendo, assim, de qualquer reparo ou complemento dentro dos limites traçados pelas razões recursais, culminando o julgamento do recurso com a aplicação da regra inserta na parte final do art. 46 da Lei nº 9.099/95, que exclui a necessidade de emissão de novo conteúdo decisório para a solução da lide, ante a integração dos próprios e jurídicos fundamentos da sentença guerreada.
Isto porque, da análise das provas produzidas, verifica-se que a parte autora falhou em demonstrar a verossimilhança de suas alegações, uma vez que os fatos e provas processuais por ela trazidos não permitem a verificação da competência do juízo de primeira instância para a resolução do meritum causae, tendo em vista a falta de provas de que, efetivamente, reside na comarca escolhida para o ajuizamento da ação e/ou que possui vínculo jurídico com a demanda apresentada.
Com efeito, considerando que a parte autora não reside na Comarca na qual a ação foi intentada, o respectivo Juízo é, concretamente, incompetente para análise do processo, nos termos do Enunciado 89 do FONAJE, segundo o qual a incompetência territorial pode ser reconhecida de ofício, no sistema de juizados especiais cíveis, por isso, no caso sub judice, verifica-se que a parte autora está escolhendo juízo em que se postula, ferindo, portanto, o Princípio do Juiz Natural.
Nos termos da Lei 6.629/79, são documentos válidos a comprovar residência: a) notificação do Imposto de Renda do último exercício ou recibo da declaração referente ao exercício em curso; b) contrato de locação em que figure como locatário; c) conta de luz, condomínio, água, gás ou telefone, ou outros que confiram a segurança correspondente.
O próprio TJ/BA já tem posicionamento próprio consolidado sobre a imperiosa necessidade da juntada de comprovante de residência, em anexo à peça inicial, uma vez que é considerado documento essencial à propositura da ação, sob pena, inclusive, de indeferimento da mesma. Senão vejamos:
PROVIMENTO DA CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA TJ/BA Nº 02/2011: “Art. 1º. Sem prejuízo dos demais requisitos legais, as petições iniciais,contestações, reconvenções, exceções e quaisquer outros incidentes deverão ser protocolados com os nomes completos das partes, estado civil,profissão, filiação, endereço da residência ou do domicílio, se pessoa natural, e da sede, se pessoa jurídica, número do CPF ou RG com indicação do órgão expedidor, quando se tratar de pessoa física, assim como o número de inscrição no CNPJ, quando se tratar de pessoa jurídica, salvo impossibilidade que comprometa o acesso à justiça devidamente justificada e comprovada na petição. (…) “Art. 2º. Não será distribuída a petição inicial que estiver desacompanhada dos documentos mencionados no artigo anterior ou do comprovante do recolhimento de custas judiciais, salvo se houver pedido explícito de gratuidade, aplicando-se esta determinação inclusive às Comarcas do Interior do Estado”. (grifos nossos)
Nesse sentido, vale registrar que, aqui, não há como utilizar-se dos princípios da simplicidade e informalidade que regem o sistema de juizados especiais, que permitem ao juiz conhecer e julgar a pretensão independentemente do conteúdo e forma, já que impossível à análise da pretensão formulada sem as informações e documentos essenciais que caberia a parte autora anexar.
Por esta razão, diante da ausência de provas de que a parte autora possui domicílio nesta Comarca, é imperativa a manutenção da sentença que reconheceu a incompetência territorial do juízo de origem, como corretamente fundamentado pelo magistrado sentenciante que, inclusive, ressaltou: “(...) Ademais importante destacar que o endereço indicado mostra-se discrepante do endereço vinculado ao CPF da parte autora, obtido mediante consulta no(s) sistema(s) SNIPER, constando do cadastro endereço em BETIM/MG, que inclusive coincide com o Estado onde é prestado o serviço pela concessionária de saneamento acionada”.
Desta forma, nos termos em que a lide foi apresentada a julgamento, não se pode censurar as conclusões contidas na sentença recorrida, e, portanto, torna-se inevitável o reconhecimento da incompetência territorial do juízo “a quo”, nos termos do dispositivo sentencial, sem reparos a serem feitos em sede recursal.
Ante o exposto, decido monocraticamente por CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA, para manter a sentença impugnada em todos os seus termos. Custas judiciais e honorários advocatícios de 20% sobre o valor da causa, a cargo da parte autora. Suspenso o pagamento diante da concessão de Justiça Gratuita.
Salvador/BA, data registrada no sistema.
Processo julgado com base no artigo 15. do Regimento Interno das Turmas Recursais (resolução 02/2021 do TJBA), em seu inciso XII, estabelece a competência do Relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo Colegiado ou já com uniformização de jurisprudência em consonância com o permissivo do art. 932, CPC.
[1] DIDIER, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedente, coisa julgada e tutela provisória. 13ª ed. Salvador: JusPodium, 2018, p. 513-515.
[2] MARINHO AMARAL, Felipe. A Aplicação da Teoria dos Precedentes Judiciais no Processo do Trabalho, Editora Mizuno, 2021, p. 57.