Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460




Ação:
Procedimento do Juizado Especial Cível
Recurso nº 0127631-06.2023.8.05.0001
Processo nº 0127631-06.2023.8.05.0001
Recorrente(s):
TRANSPORTES AEREOS PORTUGUESES SA

Recorrido(s):
NADIR ESQUIVEL FERNANDEZ




(EMENTA)      

RECURSO INOMINADO. JUIZADOS ESPECIAIS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDOS. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932 DO CPC). DEMANDAS REPETITIVAS. TRANSPORTE AÉREO. COMPRA DE PASSAGENS. CANCELAMENTO OCASIONADO PELA PANDEMIA DA COVID-19.REEMBOLSO QUE ATÉ A DATA DE AJUIZAMENTO DA AÇÃO NÃO TINHA OCORRIDO. DESRESPEITO À LEI 14.034/2020, A QUAL, EM SEU ART. 3º, PREVÊ PRAZO DE 12 (DOZE) MESES. VIOLAÇÃO DO ART. 3º, §2º, DA LEI 14.034 DE 2020. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.CARÁTER DIDÁTICO-PREVENTIVO E COMPENSATÓRIO. FRUSTRAÇÃO DE LEGÍTIMA EXPECTATIVA. SENTENÇA MANTIDA ANTE A VEDAÇÃO DO REFORMATION IN PEJUS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

 
 

DECISÃO MONOCRÁTICA

 

Trata-se de recurso inominado interposto pela parte ré em face da r. sentença prolatada nos autos do processo em epígrafe.  

Em síntese, a parte autora afirma que adquiriu passagens aéreas com data do voo prevista para 23/03/2020, o voo a parte autora foi cancelado em razão da Pandemia,respeitando o prazo para resolução do problema (de até 12 meses), conforme MP/925/2020, a Requerente aguardou por todo o período supra, devolução do valor pago, contudo, sem êxito. Assim ajuizou a presente demanda buscando indenização por danos materiais e morais.

Em contestação, a acionada, por sua vez, alegou que não incorreu em qualquer ilegalidade. Sustenta que seguiram as diretrizes previstas na legislação e nos termos da contratação. Aduz que o reembolso foi feito nos moldes solicitados pela autora.

O Juízo a quo, em sentença, julgou parcialmente procedente os pedidos da exordial, nos seguintes termos:

“(...) Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE, em parte, o pedido para condenar que a ré pague à autora a importância de R$ 3.096,49 (três mil, noventa e seis reais e quarenta e nove centavos), a título de indenização por danos materiais, corrigida monetariamente da data do vencimento, com juros de 1% a.m. da citação, bem como condenar o Réu a pagar à parte autora, a título de indenização por danos morais, a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com incidência de juros moratórios à razão de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, bem como correção monetária a partir da presente data (...)”.

Foram acolhidos Embargos de declaração:          “Isto posto, ACOLHO os embargos opostos, para corrigir a sentença impugnada, excluindo a condenação por danos materiais ali consignada.”

 

Irresignada, as partes  interpuseram recursos inominados

Recurso da parte autora foi considerado deserto

É o breve relatório.

 

DECIDO

 
 

Nos termos do art. 15, incisos XI e XII da Resolução no 02, de 10 de fevereiro de 2021, que instituiu o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado da Bahia e da Turma de Uniformização da Jurisprudência, são atribuições do Juiz Relator, em cada Turma Recursal negar seguimento ou dar provimento, em decisão monocrática, baseando-se o seu entendimento em súmula ou jurisprudência da Turma Estadual de Uniformização de Jurisprudência; do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia; ou dos Tribunais Superiores, conforme redação dada pela Resolução nº 20/2023 (DJE 14/12/2023).

 

Conheço do recurso interposto, porquanto preenchidos os seus pressupostos de admissibilidade.

 

Passemos ao mérito.

 

Analisados os autos observa-se que a matéria já se encontra sedimentada no âmbito da 1ª Turma Recursal. Precedentes desta turma: 0144522-73.2021.8.05.0001; 0022005-57.2020.8.05.0080; 0056489-10.2021.8.05.0001, 0053500-31.2021.8.05.0001; 0000767-04.2021.8.05.0223; 0089928-12.2021.8.05.0001;0004182-98.2020.8.05.0103 . 

 Pois bem, em petição inicial, a parte autora afirma que, embora seus voo previsto para 23/03/2020 tenha sido cancelado com antecedência em virtude da pandemia, a acionada estaria se rejeitando a proceder com o reembolso.

Da leitura atenta dos autos verifica-se que não há controvérsia acerca do direito da autora de ter o reembolso de suas passagens, isso porque todas as partes concordam que a requerente faz jus à restituição. Entretanto, se de um lado a autora alega ter solicitado o reembolso à requerida e, mais de um ano após o cancelamento do voo, não o ter recebido; de outro a ré, a princípio afirmou que o reembolso teria sido feito no cartão de crédito, no entanto, na tela apresentada há a disponibilização de voucher.

Ora, apesar da ré afirmar que o direito ao reembolso apenas surge no prazo de 12 meses após o cancelamento, nada obstante já se tenha transcorrido mais de dois anos desde a data marcada para a viagem, até a presente data não há nos autos prova da devolução integral da quantia despendida na compra dos bilhetes.

Em que pese a opção de remarcação da viagem seja uma das alternativas possíveis de acordo com os parágrafos que seguem o supracitado artigo 3º da Lei nº 14.034/2020, note-se que cabe ao consumidor optar pela opção que melhor se encaixa a sua situação específica e não ao fornecedor, como ocorreu no caso em concreto e se demonstra pelos e-mails

Explico, o voucher é uma opção do consumidor, não cabendo a CIA aérea a imposição do mesmo.Assim, entendo devido à autora o reembolso do valor pago pelas passagens aéreas. No entanto, como apenas a demandada interpôs recurso inominado, a sentença será mantida, ante a vedação do reformation in pejus.

Assim, é inevitável constatar a evidente falha na prestação do serviço da acionada.

Nesse sentido:

 

CERCEAMENTO DE DEFESA – Inocorrência – Prova documental suficiente – Preliminar afastada. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS – Transporte aéreo internacional – Cancelamento de voo – Responsabilidade objetiva da cia. aérea pelos danos provocados – Autores que, em razão do cancelamento do voo correspondente a trecho da viagem, solicitaram o reembolso em dinheiro das passagens – Ré que disponibilizou apenas "voucher" para proveito futuro na aquisição de novas passagens – Descabimento – Danos materiais devidamente comprovados e passíveis de ressarcimento – Falha na prestação do serviço configurada – Cancelamento de trecho da viagem e indefinição quanto ao reembolso das passagens que trouxeram aos autores angústia e sofrimento – Danos morais caracterizados – Indenização fixada em R$ 10.000,00, para cada autor (total de R$ 20.000,00), em observância aos critérios de significância, razoabilidade e proporcionalidade – Sentença de improcedência reformada – Recurso provido, em parte. (TJ-SP - Apelação Cível: 1023834-40.2022.8.26.0003, Relator: Lígia Araújo Bisogni, Data de Julgamento: 18/03/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/03/2024)

 

Ação indenizatória. Cancelamento de voo internacional em razão de restrições sanitárias da Covid-19. Parcial procedência. Apelo das partes. Dever informacional violado pela ré após o cancelamento do voo. Art. 6º, III, do CDC. Aquisição de passagens por outra companhia aérea após espera de quase dois meses sem solução para o caso. Afronta ao disposto pelo art. 3º, § 1º da Lei nº 14.034/2020. Reembolso devido à míngua de provas de que o voucher ofertado pela ré foi utilizado pela demandante. Possibilidade de cancelamento do voucher, inclusive, ressalvada pela r. sentença com vistas a se coibir enriquecimento ilícito. Danos materiais bem reconhecidos. Desvio produtivo, angústia e sofrimento inequívocos durante o lapso temporal de quase dois meses sem o convívio de sua família, na Itália. Danos morais configurados. Montante indenizatório adequadamente arbitrado em primeiro grau. Razoabilidade e proporcionalidade. Recursos improvidos" (TJSP, Apelação n. 1067171-16.2021.8.26.0100, rel. Luis Fernando Camargo de Barros Vidal, 14a Câmara de Direito Privado, j. 23/10/2023).

 

JUIZADO ESPECIAL. RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI E XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932, III, IV e V, DO CPC).  DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. VOO CANCELADO. REEMBOLSO NEGADO. TRANSCURSO DE MAIS DE 12 MESES DESDE A DATA PREVISTA PARA VOOS CANCELADOS, SEM QUE A ACIONADA COMPROVE O REEMBOLSO DAS PASSAGENS. VIOLAÇÃO DO PRAZO PREVISTO NO ART. 3º DA LEI 14.046/2020. VÍCIO DO SERVIÇO. CARÁTER DIDÁTICO-PREVENTIVO E COMPENSATÓRIO. FRUSTRAÇÃO DE LEGÍTIMA EXPECTATIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS FORNECEDORAS, NOS TERMOS DO ART. 18, CDC. DANOS MORAIS IN RE IPSA ARBITRADO PELO JUÍZO A QUO EM QUANTIA MODERADA E EM CONFORMIDADE COM O PATAMAR MÉDIO DESTA PRIMEIRA TURMA RECURSAL (R$ 7.000,00). RECURSO IMPROVIDO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDAJUIZADO ESPECIAL. RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI E XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932, III, IV e V, DO CPC).  DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. VOO CANCELADO. REEMBOLSO NEGADO. TRANSCURSO DE MAIS DE 12 MESES DESDE A DATA PREVISTA PARA VOOS CANCELADOS, SEM QUE A ACIONADA COMPROVE O REEMBOLSO DAS PASSAGENS. VIOLAÇÃO DO PRAZO PREVISTO NO ART. 3º DA LEI 14.046/2020. VÍCIO DO SERVIÇO. CARÁTER DIDÁTICO-PREVENTIVO E COMPENSATÓRIO. FRUSTRAÇÃO DE LEGÍTIMA EXPECTATIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DAS FORNECEDORAS, NOS TERMOS DO ART. 18, CDC. DANOS MORAIS IN RE IPSA ARBITRADO PELO JUÍZO A QUO EM QUANTIA MODERADA E EM CONFORMIDADE COM O PATAMAR MÉDIO DESTA PRIMEIRA TURMA RECURSAL (R$ 7.000,00). RECURSO IMPROVIDO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA

 

JUIZADO ESPECIAL. RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS. DECISÃO MONOCRÁTICA (ART. 15, XI E XII, DO REGIMENTO INTERNO DAS TURMAS RECURSAIS E ART. 932, III, IV e V, DO CPC).  DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. VOO CANCELADO. REEMBOLSO NEGADO. TRANSCURSO DE 20 MESES DESDE O CANCELAMENTO DO VOO PARA QUE A RESTITUIÇÃO EFETIVAMENTE ACONTECESSE, INCLUSIVE APÓS DETERMINAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO DO PRAZO DE 12 MESES PREVISTO NO ART. 3º DA LEI 14.046/2020. VÍCIO DO SERVIÇO. CARÁTER DIDÁTICO-PREVENTIVO E COMPENSATÓRIO. FRUSTRAÇÃO DE LEGÍTIMA EXPECTATIVA. DANOS MORAIS IN RE IPSA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARA DETERMINAR O PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DE R$ 5.000,00.( Classe: Recurso Inominado,Número do Processo: 0089928-12.2021.8.05.0001,Relator(a): NICIA OLGA ANDRADE DE SOUZA DANTAS,Publicado em: 16/03/2023 )

Caracterizada a má prestação do serviço pela ré, restou comprovado que houve perda do tempo produtivo do consumidor. Não há dúvidas de que o consumidor diligenciou de forma insistente para resolver administrativamente a contenda, sem obter sucesso, culminando com o fato de que necessitou acionar o já abarrotado Poder Judiciário para alcançar a tutela de seu direito.

Sobre o desvio produtivo do consumidor, Marcos Dessaune1 concretiza, em abalizada doutrina, que o tempo é um bem econômico, essencial, possivelmente um dos mais valiosos que dispomos, quando comparável à vida humana, à saúde mental, eis que com ele o homem se organiza e exerce seu trabalho, afazeres. Leciona com ineditismo o renomado autor o seguinte:

É o que enuncia, em poucas palavras, o antigo brocardo latino raritas pretium facit, ou seja ¿a escassez faz o preço¿. Significa dizer que, quanto mais abundante é um bem no mercado, tanto menor tende a ser seu valor. Afinal, como se viu é a escassez ¿ relativa à demanda o critério que, através dos séculos, vem determinando o preço daquilo que as pessoas valorizam. Considerando-se, então, que o tempo é um recurso produtivo necessário para o desempenho de qualquer atividade, e que as pessoas querem sempre mais tempo ¿ principalmente para investir na ¿qualidade de vida¿ ¿ do que o quinhão que nela recebem, conclui-se , mediante a aplicação direta da Lei da Oferta e da Procura, que o tempo é um bem escasso em relação à demanda por ele existente. Mas a escassez ¿ que também se pode denominar limitação ou finitude - não é a única característica definitiva do tempo. Conforme se viu no tópico anterior, ele também é algo que não se consegue tocar nem parar, tampouco reverter. Essa intangibilidade, ininterrompibilidade e irreversibilidade fazem do tempo um recurso que, diferentemente dos bens materiais, não se pode acumular nem recuperar durante a vida. Possuindo essa combinação singular de características - limitação, inacumulabilidade e irrecuperabilidade -, pode-se asseverar que o tempo revela-se o bem econômico primordial e, possivelmente, mais valioso de que cada pessoa humana dispõe em sua existência ¿ só comparável à sua saúde física e mental, necessária a gozá-lo plenamente.

Pablo Stolze Gabliano, comentando a obra de Marcos Dessaune, aqui mencionada, afirma que ¿diversas são as situações de dano apontadas pelo autor, merecendo destaque uma delas, que ilustra, com as nítidas cores da perfeição, o intolerável abuso de que é vítima o consumidor, obrigado a esperar em casa, sem hora marcada, pela entrega de um produto novo, pelo profissional que vem fazer um orçamento ou um reparo, ou mesmo por um técnico que precisa voltar para fazer o conserto malfeito¿3.

O acatamento da tese do desvio produtivo é uma realidade na jurisprudência pátria, verbis:

APELAÇÃO CÍVEL ¿ DESVIO PRODUTIVO ¿ SÚMULA Nº 127 E 192 DO TJRJ ¿ FATURA QUITADA ¿ CORTE INDEVIDO ¿ SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL ¿ DANO MORAL IN RE IPS ¿ O ponto nodal da presente demanda é saber se a parte autora/Apelado estava inadimplente com fatura referente ao mês de agosto/2013 e, por conseguinte, se o corte do serviço de fornecimento de água foi devido ou não. A parte autora/Apelado demonstrou que quitou o débito referente a fatura que ensejou o aviso de corte,e-fls. 010 (fls. 15). Prosseguindo, no artigo 14, § 3º, do CDC está disposto que a parte ré/Apelante só não será responsabilizada quando provar alguma excludente de sua responsabilidade previstas nos incisos I e II do mencionado dispositivo legal. Depreende-se da análise dos autos que a parte ré/Apelante sequer apresentou sua peça de defesa, tanto é assim que sofreu os efeitos da revelia. Portanto, a falta do cumprimento do disposto no artigo 14, § 3º, II, do CDC e do artigo 333, II, do CPC, torna verossímil as alegações da parte autora/Apelado, bem como imputa a aplicação do artigo 14, caput, e 22, do CDC, no julgamento da presente lide. O desvio produtivo evidencia-se quando o fornecedor, ao descumprir sua missão e praticar ato ilícito, independentemente de culpa, impõe ao consumidor um relevante ônus produtivo indesejado por este, onerando indevidamente seus recursos produtivos. Por isso, aplicando-se o método bifásico, deve o valor da indenização por dano moral ser mantido para R$ 5.000,00 (cinco mil reais), eis que reputo ser condizente com a situação fática da presente demanda. Desprovimento do recurso. (TJRJ ¿ Ap 0006131-55.2013.8.19.0058 ¿ 24ª C.Cív. ¿ Relª Andrea Fortuna Teixeira ¿ DJe 16.10.2017). (grifamos). (grifamos).

 

APELAÇÃO CÍVEL ¿ RELAÇÃO DE CONSUMO ¿ AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZATÓRIA ¿ Alegam os autores que foram compulsoriamente obrigados a arcar com pagamento da taxa de interveniência, quando da aquisição do imóvel constituído pelo apartamento 702 do bloco 01 do Edifício Porto Cervo, integrante do Residencial Sardenha, no contrato de cessão de direitos de imóvel, celebrado pelo promitente comprador, ora autor e apelante, com terceiro, promitente vendedor em favor da interveniente fiduciária, ora ré e apelada. Pretendem os autores ser indenizados nas esferas moral e material, bem como a condenação da ré nas custas e honorários. Sentença de improcedência. Apelo dos autores. Cobrança abusiva e coibida pelo princípio da boa-fé, que ora vigora no nosso direito contratual. Inexistência de comprovação de qualquer despesa realizada pelo Interveniente Fiduciário, ora apelado, na transação imobiliária. Clausula abusiva. Cobrança que não se justifica. Devolução em dobro, com a aplicação do art. 42, parágrafo único, do CDC. Infere-se evidente a frustração da legítima expectativa do consumidor, que ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, além de ter perdido seu tempo livre em razão da conduta abusiva praticada pela Ré, da qual resulta o dever de indenizar, com base na responsabilidade objetiva atrelada à teoria do risco do empreendimento. Perda do tempo livre do autor. Desvio produtivo do consumidor apto a configurar danos morais. Reforma da sentença. Falha na prestação do serviço configurada. Quantum fixado em R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada autor diante das peculiaridades do caso. Apelante sucumbiu em parte ínfima, as custas e honorários correrão às expensas do apelado, conforme regra do parágrafo único do art. 86 do CPC/2015. RECURSO A QUE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. (TJRJ ¿ Ap 0014225-24.2013.8.19.0209 ¿ 24ª C.Cív. ¿ Relª Ana Célia Montemor Soares Rios Gonçalves ¿ DJe 19.10.2017).A circunstância fática gerou outras conseqüências além do desvio produtivo do consumidor. (grifamos).

Ademais, destaca-se a Súmula 30, em que as Turmas Recursais dos Juizados Especiais consolidam a aplicação da teoria do desvio produtivo.

       Diz o texto: "A usurpação do tempo do consumidor na tentativa de solucionar, extrajudicialmente, problema a que não deu causa, pode caracterizar, a depender das circunstâncias do caso concreto, o denominado `desvio produtivo`, do que decorre o dever de indenizar pelo dano causado."

Como sabido, a indenização por danos morais é um meio de mitigar o sofrimento, sob forma de conforto, e não o pagamento de um preço pela dor ou humilhação, não se lhe podendo atribuir a finalidade de enriquecimento, sob pena de transformar em vantagem a desventura ocorrida.

 O quantum fixado deve observar o grau de culpa do agente (gravidade da conduta), o potencial econômico e características pessoais das partes, a repercussão do fato no meio social e a natureza do direito violado, obedecidos os critérios da equidade, proporcionalidade e razoabilidade.

Assim, prevalece a narrativa autoral e sua presunção de boa-fé não desconstituída pela acionada (art. 4º, I, e art. 6º, VIII, da Lei 8.078/90), pois verossímil o quanto trazido pela parte demandante.

Em relação à forma de fixação do valor de indenização por danos morais, o Des. Luiz Gonzaga Hofmeister do TJ-RS no proc. 595032442, esclarece de forma meridiana:

¿O critério de fixação do valor indenizatório, levará em conta tanto a qualidade do atingido, como a capacidade financeira do ofensor, de molde a inibi-lo a futuras reincidências, ensejando-lhe expressivo, mas suportável, gravame patrimonial.¿

O próprio STJ firmou entendimento neste sentido:

¿A concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato de violação (damnum in re ipsa). Verificado o evento danoso surge a necessidade de reparação, não havendo que se cogitar da prova do prejuízo, se presentes os pressupostos legais para que haja a responsabilidade civil (nexo de causalidade e culpa)¿ (STJ ¿ 4ª T. ¿ REL CESAR ARFOS ROCHA ¿ RT 746/183).

Ainda nesse sentido, apresento o julgado abaixo:

¿CIVIL ¿ DANOS MORAIS ¿ FIXAÇÃO DO QUANTUM DEBEATUR ¿ RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. Mantém-se o quantum fixado quando observados os critérios da razoabilidade e proporcionalidade. 2. O dano moral deve compensar a ofensa sofrida e ao mesmo deve servir como fonte de desestímulo para que o seu causador evite a repetição da conduta, observadas as peculiaridades de cada caso concretamente. 2.1. No entanto, não pode ser fonte de enriquecimento, sob pena de ensejar novo dano.¿ (APC 20050111307374, Terceira Turma Cível, Rel. Des. João Egmont, TJDF DJ 26.04.2007, pág. 90)

Com base nessas premissas, considerando-se a circunstância de que a indenização deve ter, sim, caráter punitivo, penalizando a conduta imprópria, desleixada e negligente, como a adotada pela parte ré, desestimulando a prática de novos atos ilícitos, é de se entender que o valor da condenação arbitrado em R$ 2.000,00 (dois mil reais) se mostra tímido ao caso em tela. Contudo, como apenas a demandada interpôs recurso inominado, a sentença será mantida, ante a vedação do reformation in pejus.

Por isso, julgo por CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos.

 Custas e honorários de 20% sobre o valor da condenação pelo recorrente.

CLAUDIA VALERIA PANETTA

JUÍZA RELATORA