PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 2ª Turma 



ProcessoAPELAÇÃO CRIMINAL n. 0547867-84.2018.8.05.0001
Órgão JulgadorSegunda Câmara Criminal 2ª Turma
APELANTE: MARCELO SACRAMENTO DE ARAUJO
Advogado(s)LEONARDO RIBEIRO BACELLAR DA SILVA, FERNANDA RAVAZZANO LOPES BAQUEIRO
APELADO: JOSE GONCALVES TRINDADE
Advogado(s):VINICIUS DE SOUZA ASSUMPCAO, MANUELA CORREA DE SAGEBIN CAHU RODRIGUES

 

ACORDÃO

 

APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO DO QUERELANTE. SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. DELITO DE CALÚNIA MAJORADA (Art. 138, §1º, C/C O ART. 141, III, DO CP). FATO OFENSIVO À HONRA OBJETIVA DO QUERELANTE. NECESSIDADE DE IMPUTAR A ALGUÉM A PRÁTICA DE FATO CRIMINOSO CERTO E DETERMINADO, DEVIDAMENTE SITUADO NO TEMPO E ESPAÇO. DA IMUNIDADE PARLAMENTAR DE VEREADOR. OPINIÕES, PALAVRAS E VOTOS DE VEREADORES, DESDE QUE ATRELADOS À ATIVIDADE PARLAMENTAR E À CIRCUNSCRIÇÃO DO MUNICÍPIO, SÃO INVIOLÁVEIS. TEMA 469 DO STF. AUSÊNCIA DE PERTINÊNCIA DOS FATOS COM O EXERCÍCIO DA VEREANÇA.

DOS FATOS APRESENTADOS:

A) DA MENSAGEM APÓCRIFA VIA WHATSAPP. OS DOCUMENTOS APRESENTADOS E OS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS OUVIDAS EM JUÍZO NÃO SE MOSTRAM SUFICIENTES PARA COMPROVAR, DE FORMA CABAL, A AUTORIA E A MATERIALIDADE IMPUTADAS AO APELADO.

B) DO DISCURSO NA CÂMARA MUNICIPAL DE SALVADOR-BA. AFIRMAÇÃO DE QUE O APELANTE PRATICOU OS DELITOS DE CORRUPÇÃO ATIVA E APROPRIAÇÃO INDÉBITA. CARACTERIZAÇÃO DO DELITO CONTRA A HONRA. ANIMUS CALUNIANDI - INTENÇÃO OFENSIVA DEMONSTRADA.

INDENIZAÇÃO MÍNIMA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INSTRUÇÃO ESPECÍFICA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

 

I – Trata-se da interposição de Recurso de Apelação, tendo por objeto sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Crime da Comarca de Salvador, que absolveu, nos termos do artigo 386, inciso III, do Código Penal, o réu JOSÉ GONÇALVES TRINDADE do cometimento do crime de Calúnia.

 

II – O cerne da controvérsia examinada diz respeito ao envio de mensagens e de discurso proferido na Câmara Municipal de Salvador, que supostamente teria ofendido a honra do Apelante.

 

III – Com efeito, de acordo com entendimento pacífico do STF e do STJ, para a configuração do crime de calúnia, urge a imputação falsa a outrem de fato definido como crime. Logo, deve ser atribuído um fato certo e determinado, devidamente situado no tempo e no espaço, definido como crime pela lei penal,  bem como deve ser falsa a imputação.

 

IV – Cumpre sublinhar a comprovação do dolo específico relacionado à configuração dos delitos contra a honra, sendo necessária a demonstração de que existe o declarado intuito por parte do autor da prática criminosa no sentido de atribuir à vítima prejuízo à sua honra objetiva, consubstanciando repercussão negativa no seio social que venha a macular a sua reputação e credibilidade, consoante reiterado entendimento jurisprudencial.

 

V – Do exame dos fólios, percebe-se existir razão para a reforma da sentença absolutória prolatada, por restar presentes os elementos necessários para conduzir à condenação pelo delito de calúnia, quando o Apelado, em seu discurso na Câmara Municipal de Salvador, afirma que o Apelante praticou os delitos de apropriação indébita e corrupção ativa durante sua gestão como Comodoro do Yacht Clube da Bahia.

 

VI- A fixação de valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração exige, além de pedido expresso na inicial, a indicação de valor e instrução probatória específica, de modo a possibilitar ao réu o direito de defesa, o que não ocorreu no caso em tela.

 

VII- DOSIMETRIA:

A) Valoração na primeira fase. Culpabilidade ultrapassando o tipo penal, visto que praticou o delito objetivando prejudicar o Apelante em sua Gestão na condição de Comodoro do Yacht Clube da Bahia. Existem Antecedentes, diante do Processo criminal 0510916-91.2018.8.05.0001, transitado em julgado em 17.08.2023. Com relação às circunstâncias do delito, essas extrapolam o tipo legal pois o delito foi praticado durante o período eleitoral do clube para o Conselho Deliberativo, o qual, por sua vez, elege o Comodoro, conforme dispõe o art. 38, VII, do Estatuto do Clube, razão pela qual fixo a pena-base em 01 (um) ano e 21 (vinte e um) dias de detenção.

 

B) Na segunda fase da dosimetria não incidem agravantes nem atenuantes.

 

C) Na terceira fase, reconhecimento da causa de aumento prevista no §2º do art. 141 do CP, aumentando a pena em 1/3, por ter sido o delito transmitido pela TV CÂMARA SALVADOR, transmissão aberta no canal digital UHF 61.4, OI TV (CANAL 10), SKY TV (CANAL 361.4), bem como por meio da internet, na página oficial do órgão legislativo e na sua respectiva página do Facebook.

 

D) PENA DEFINITIVA: 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 28 (vinte e oito) dias de detenção, em regime aberto, associada ao pagamento de 204 (duzentos e quatro) dias-multa, cada dia à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

 

ACÓRDÃO

 

Relatados e discutidos estes autos da Apelação Criminal nº 0547867-84.2018.8.05.0001 da Comarca de Salvador, sendo Apelante MARCELO DE ARAÚJO SACRAMENTO e Apelado, JOSÉ GONÇALVES TRINDADE.

 

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, à unanimidade de votos, em CONHECER O RECURSO DE APELAÇÃO, DANDO-LHE PARCIAL PROVIMENTO, na forma do Voto da Relatora.

 

Salvador, .

 

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL 2ª TURMA

 

DECISÃO PROCLAMADA

Provido em parte. Unânime.

Salvador, 17 de Outubro de 2024.

 


 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 2ª Turma 

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL n. 0547867-84.2018.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal 2ª Turma
APELANTE: MARCELO SACRAMENTO DE ARAUJO
Advogado(s): LEONARDO RIBEIRO BACELLAR DA SILVA, FERNANDA RAVAZZANO LOPES BAQUEIRO
APELADO: JOSE GONCALVES TRINDADE
Advogado(s): VINICIUS DE SOUZA ASSUMPCAO, MANUELA CORREA DE SAGEBIN CAHU RODRIGUES

 

RELATÓRIO

 

Trata-se da interposição de Recurso de Apelação tendo por objeto sentença proferida pelo Juízo da 4ª Vara Crime da Comarca de Salvador, que extinguiu a punibilidade do réu JOSÉ GONÇALVES TRINDADE, em relação aos crimes dos art. 139, caput e 140, caput do CPB, na forma do art. 107, inciso V, além de absolvê-lo do cometimento do delito capitulado no art. 138, § 1º, daquele diploma legal, nos termos expostos a seguir.

 

“(…) Ante o exposto, declaro, por sentença, extinta a punibilidade do querelado quanto aos fatos narrados na peça incoativa referente aos crimes previstos nos arts. 139, caput, 140, caput, na forma do art. 107, inciso V, do Código Penal Brasileiro.

 

Outrossim, ABSOLVO o acusado JOSÉ GONÇALVES TRINDADE da acusação da prática do delito capitulado no art. 138, § 1º, do Código Penal, por considerar que a conduta invocada é atípica, na forma do artigo 386, III, do CPP (...)”.

 

Em suas razões recursais, o Apelante aduziu ter ajuizado a queixa-crime em desfavor de JOSÉ GONÇALVES TRINDADE, em razão de este ter compartilhado mensagem apócrifa via WhatsApp (fls. 03 do ID nº 61273345), bem como, proferido, em 27/03/2018, discurso na Câmara Municipal de Salvador ofendendo a honra do Apelante.

 

Relatou, ainda, ser inaplicável a imunidade material à conduta do Réu. Ao final, requereu a condenação do Acusado pelo delito previsto no art. 138, §1º, do Código Penal, bem como que seja "arbitrada indenização pelos danos materiais, nos exatos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal".

 

Em suas contrarrazões, o réu JOSÉ GONÇALVES TRINDADE salientou a correta fundamentação da sentença prolatada, apontando que ela deve ser mantida em seus fundamentos. Ainda, relatou a existência de imunidade material que reveste as expressões do Apelado, além de apontar a impossibilidade de pleito indenizatório arguido, unicamente, na via recursal, sem debate em primeira instância. Ao final, pugnou o não provimento do Recurso de Apelação.

 

A Procuradoria de Justiça Criminal manifestou-se pelo desprovimento do recurso de apelação (ID 66065915).

 

É o Relatório, que submeto à apreciação, nos termos regimentais, da Eminente Desa Revisora.

 

Salvador/BA, 02 de outubro de 2024.

 

 Desa. Nágila Maria Sales Brito 

Relatora

 


 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Criminal 2ª Turma 



Processo: APELAÇÃO CRIMINAL n. 0547867-84.2018.8.05.0001
Órgão Julgador: Segunda Câmara Criminal 2ª Turma
APELANTE: MARCELO SACRAMENTO DE ARAUJO
Advogado(s): LEONARDO RIBEIRO BACELLAR DA SILVA, FERNANDA RAVAZZANO LOPES BAQUEIRO
APELADO: JOSE GONCALVES TRINDADE
Advogado(s): VINICIUS DE SOUZA ASSUMPCAO, MANUELA CORREA DE SAGEBIN CAHU RODRIGUES

 

VOTO

I – PRESSUPOSTOS RECURSAIS. TEMPESTIVIDADE REGULARMENTE DEMONSTRADA. CONHECIMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO.

 

Resultam demonstrados os requisitos necessários para autorizar o prosseguimento do recurso interposto. Primordialmente, cumpre examinar a tempestividade da peça de irresignação, por conta de ter sido interposta no dia 09.10.2023 (ID 61273850), tendo sido a sentença absolutória disponibilizada no DJE em 05.10.2023 (ID 61273848).

 

Pode-se atestar, portanto, o cumprimento dos requisitos exigidos pela legislação de regência, autorizando-se a tramitação do apelo.

 

II – DA IMUNIDADE MATERIAL.

 

A Defesa aduziu que o discurso do Apelado na Câmara Municipal de Salvador é dotado de imunidade parlamentar, por ter sido realizado no exercício e no contexto do mandato, considerando que o Yacht Clube da Bahia é área de interesse público.

 

O STF decidiu, em regime de repercussão geral (Tema 469), que "nos limites da circunscrição do Município e havendo pertinência com o exercício do mandato, os vereadores são imunes judicialmente por suas palavras, opiniões e votos". (RE 600063/SP, rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 25.2.2015).

 

Inaplicável, no entanto, a imunidade material parlamentar prevista no artigo 29, VIII, da CF, às hipóteses em que as opiniões, palavras e votos proferidos por vereador, na circunscrição do Município, estejam dissociadas do exercício da atividade parlamentar.

 

Colhe-se acórdão do STJ nesse sentido:

 

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA A HONRA. VEREADOR. IMUNIDADE NA CIRCUNSCRIÇÃO DO MUNICÍPIO E PERTINÊNCIA COM O EXERCÍCIO DO MANDATO. REPERCUSSÃO GERAL STF. TEMA N. 469. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O trancamento do processo criminal em habeas corpus é medida excepcional e somente cabível quando ficarem demonstradas, de maneira inequívoca, a atipicidade da conduta, a absoluta falta de provas da materialidade do crime e de indícios de autoria ou a existência de causa extintiva da punibilidade. 2. Conforme a orientação do Supremo Tribunal Federal, fixada sob a égide da repercussão geral (Tema n. 469), é reconhecida a imunidade dos vereadores por suas palavras, opiniões e votos, nos limites da circunscrição do município, desde que haja pertinência com o mandato. (…) (STJ - AgRg no RHC: 122255 BA 2019/0381891-8, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 13/12/2022, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/12/2022) Grifos nossos 

 

Ademais, o STF no julgado que originou o Tema n° 469, exigiu pertinência das palavras com o mandato de vereador.

 

 

“Nos limites da circunscrição do município e havendo pertinência com o exercício do mandato, garante-se a imunidade do vereador. (STF. Plenário. RE 600063, Rel. para acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 25/02/2015)”.

 

In casu, o Acusado utilizou-se da Tribuna da Câmara de Vereadores de Salvador para perseguir seus interesses individuais, enquanto associado do Yacht Clube da Bahia, empresa de natureza privada, manifestando-se acerca da gestão do Apelante naquele ente privado.

 

Dessa forma, mesmo que o Apelado argumente que suas declarações foram feitas com o intuito de proteger os interesses de uma parte específica de seu eleitorado, tal alegação não deve prosperar pois não possuiu pertinência com o exercício da vereança, não sendo alcançado, portanto, pela almejada imunidade parlamentar. 

 

III – DO MÉRITO. CONCEITO DE CALÚNIA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA INTENÇÃO DE MACULAR A HONRA OBJETIVA DA VÍTIMA. ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL

 

O cerne da controvérsia examinada diz respeito ao teor da mensagem apócrifa via WhatsApp (fl. 03 do ID nº 61273345), bem como um discurso proferido pelo Apelado, em 27/03/2018, na Câmara Municipal de Salvador, que, supostamente, ofendeu a honra objetiva de Apelante.

 

Insta destacar, então, parte do conteúdo da inicial da Queixa-crime ajuizada e que contém o teor da carta e a transcrição do discurso proferido pelo Apelado na Câmara Municipal de Salvador, os quais constituem o núcleo da controvérsia posta em discussão:

 

MENSAGEM APÓCRIFA VIA WHATSAPP“Caro Sócio, O Yatch, mais uma vez, se envolve numa disputa política por força DOS VÍCIOS DE CONDUTA DO SEU COMODORO, O EX-DEPUTADO MARCELO SACRAMENTO. Ele joga toda a sua força para eleger o terço que falta do Conselho a fim de fazer a qualquer custo seu sucessor. Mais uma vez, como na malograda campanha que fez para aprovar a megalomaníaca proposta do estacionamento por um custo absurdo, que suscitou tantas suspeitas da parte dos sócios e o levou ao simbólico recuo, DINHEIRO DO CLUBE TEM SIDO GASTO PARA QUE ELE GARANTA, A QUALQUER CUSTO, MAIORIA NO CONSELHO. É hora, no entanto, de acordarmos, caros sócios. Marcelo não pode fazer o sucessor por um motivo simples: é preciso uma mudança na cabeça do Clube a fim de que se possa PROMOVER UMA DEVASSA NAS CONTAS DO YATCH. Além de se REVELAR QUANTO O SR. COMODORO GASTOU NA TENTATIVA DE FAZER O ESTACIONAMENTO, PRECISAMOS APURAR IMEDIATAMENTE EM QUE MEDIDA A ELEVAÇÃO DO PADRÃO DE VIDA DO SR. COMODORO TEM A VER COM SUA PASSAGEM PELA GESTÃO DO CLUBE. Viagens internacionais com a família, um Audi A4 blindado, uma lancha belíssima e a construção de uma mansão na Ilha em tempo recorde, na qual artistas que tocam no Yatch foram levados para a inauguração e continuam a se apresentar em finais de semana regados exclusivamente a muito VeuveCliquot, são apenas os PRIMEIROS INDÍCIOS DE QUE ALGO DE ESTRANHO OCORRE NO REINO. Como acusar não é suficiente, é necessário apurar. E só poderemos fazer isso se escolhermos conselheiros não alinhados com Marcelo. Nos tempos atuais, em que o país é passado a limpo por tantas operações, PRECISAMOS TAMBÉM FAZER A OPERAÇÃO YATCH, DERROTANDO OS ALIADOS DO COMODORO EXIBICIONISTA E NOVO-RICO PARA SABER O QUE DE FATO TEM OCORRIDO NA ADMINISTRAÇÃO DO CLUBE!Não vote na chapa de Marcelo. Não seja conivente com suspeitas! Movimento Operação Yatch”.

 

DISCURSO NA CÂMARA MUNICIPAL DE SALVADOR-BA “(00:048) “[...]tudo isto por causa de um texto que se pede mais transparência no clube e apuração sobre a descabida e INTRIGANTE EVOLUÇÃO PATRIMONIAL DO COMODORO” (01:09). (01:12) [...]TEXTO QUE RECEBI E REPASSEI A UMA AMIGA A TÍTULO DE LHE COBRAR ESCLARECIMENTOS. (01:18) “quero dizer que não houve crime algum, e suponho que só o medo, inclusive pelo uso da intimidação policial, prova o espirito autoritário, que hoje impera no clube, seja responsável por manifestações anônimas. Qualquer divergência com o comodoro acaba na delegacia, que parece funcionar como apêndice, da gestão do comodoro, talvez por sua ociosidade funcional, ou talvez por não resistir aos convites, e encantos das festas do clube. A sociedade exige transparência dos políticos, mas também exige transparência daqueles que comandam instituições, sejam elas públicas ou privadas, quero me associar a todos aqueles que na defesa de mais transparência no clube, POR QUE TANTA PREOCUPAÇÃO EM ABRIR AS CONTAS, OU SERÁ QUE AS VEUVE CLIQUOT DEGUSTADAS PELO COMODORO TEM NAS SUAS COMPRAS ORIGEM DUVIDOSA?! O QUE VEM OCORRENDO É O DESCABIDO ABUSO DE AUTORIDADE. O COMODORO PASSA DOS LIMITES NO SEU PROJETO DE HEGEMONIA A QUALQUER CUSTO, POR MEIO DE COAÇÃO OU DE TERROR. O clube nunca foi assim, a harmonia sempre imperou e NÃO SE TEM NOTÍCIA QUE NENHUM OUTRO COMODORO ATUASSE DE FORMA TÃO PREPOTENTE E ARROGANTE, ALIÁS, CARATERÍSTICAS MARCANTES DA PERSONALIDADE DO ATUAL BLOQUEANDO O ESPAÇO DA PARTICIPAÇÃO DOS SÓCIOS QUE PENSAM DE FORMA DIFERENTE DA SUA. (03:00) O SENHOR COMODORO QUER UM CLUBE DOMESTICADO E SUBMISSO AOS SEUS CAPRICHOS NÃO RESPEITANDO OS ANSEIOS DOS SÓCIOS. (03:15) Tudo isso tem origem a partir de um projeto mirabolante, megalomaníaco, e milionário de um estacionamento que o comodoro pretendia construir. DIZEM QUE COM UMA SUSPEITA PARCERIA COM SETORES DA PREFEITURA DE SALVADOR, E QUE FOI DERROTADO PELA ESMAGADORA MAIORIA DOS SÓCIOS, MAIS DE 70% DOS ASSOCIADOS DISSERAM “NÃO”, DESCONFIADOS DE SUPOSTOS INDÍCIOS DE IRREGULARIDADES. O PIOR QUE MESMO DERROTADO, O COMODORO CONTINUA BAJULANDO, ALIÁS TAMBÉM UMA DAS SUAS RECONHECIDAS CARACTERÍSTICAS, SETOR DO GOVERNO MUNICIPAL. O processo ainda tramita na SUCOM, não sei com que objetivo, e teve processo indeferido por unanimidade pelo IPAC, apesar do comodoro ter anunciado que o mesmo estava aprovado, COMO SE DIZ NO MEIO JURÍDICO UM AUTÊNTICO 171.FICO A IMAGINAR QUE SEU COMODORO, AO QUERER QUEBRAR MEU SIGILO TELEFÔNICO E DE DADOS TEM POR OBJETIVO ANTECIPAR TODA SUA SUBSERVIÊNCIA OUTRA CARACTERÍSTICA MARCANTE DA SUA PERSONALIDADE-, AOS MEMBROS DA PREFEITURA, EM TROCA DE UM PROMETIDO EMPREGO NA PREFEITURA. QUERO AQUI MANIFESTAR TODO MEU APREÇO AS MULHERES E HOMENS QUE COLOCARAM SEUS NOMES À DISPOSIÇÃO PARA PARTICIPAR DA ELEIÇÃO PARA O CONSELHO, realizado no dia de ontem, todas e todos 35 (trinta e cinco) participantes são pessoas dignas e honradas e todos são vitoriosos. ONTEM SÓ TIVEMOS UM ÚNICO DERROTADO, DERROTADO PELA EMPÁFIA, DERROTADO PELA PREPOTÊNCIA, DERROTADO PELA ARROGÂNCIA, DERROTADO PELA TIRANIA, QUE É O SENHOR COMODORO MARCELO SACRAMENTO E SE A PALAVRA DECÊNCIA FIZESSE PARTE DE SEU DICIONÁRIO, DEPOIS DE ONTEM, ONDE 93% DISSERAM UM SONORO “NÃO” A SUA ADMINISTRAÇÃO, RENUNCIARIA IMEDIATAMENTE AO CARGO. O Yacht pertence a todos os sócios, o Yacht é maior que todos nós! Muito obrigado senhor presidente (...)”.

 

Consoante se depreende da inicial, o Apelante asseverou que o Apelado teria praticado o delito de Calúnia em ambos os momentos.

 

Importa, portanto, examinar os elementos que ensejam a caracterização do delito de Calúnia.

 

1.   Do Delito de Calúnia

 

Para se caracterizar o crime de calúnia, torna-se imprescindível demonstrar que o autor tenha agido com o intuito de atribuir, de modo inverídico, a outrem, a prática de fato descrito como crime, consoante prevê o artigo 138 do Código Penal:

 

Calúnia

 

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

 

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

 

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

 

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

 

Exceção da verdade

 

§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo:

 

I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;

 

II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141;

 

III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível (grifo nosso).

 

A doutrina explica o sentido do crime de calúnia, como se percebe das lições de Luiz Régis Prado[1]:

 

“(…) O bem jurídico tutelado é a honra. A doutrina costuma apontar, quando da definição de honra, dois aspectos distintos e complementares: um de natureza objetiva, outro de cunho subjetivo. Assim, a honra, do ponto de vista objetivo, seria a reputação que o indivíduo desfruta em determinado meio social, a estima que lhe é conferida: subjetivamente, a honra seria o sentimento da própria dignidade ou decoro. A calúnia e a difamação atingiriam a honra no sentido objetivo (reputação, estima social, bom nome); já a injúria ofenderia a honra subjetiva (dignidade, decoro) (…) A conduta típica consiste em imputar (atribuir) a alguém falsamente a prática de fato definido como crime. Faz-se mister, em primeiro lugar, a falsidade da imputação. Condiciona-se a calúnia à falsidade da imputação (presumida). Admite-se, regra geral, a prova da veracidade de seu conteúdo (exceptio veritatis). A falsidade da imputação se verifica não apenas quando o fato imputado não é verdadeiro, mas também quando, embora verdadeiro, tenha sido praticado por outra pessoa. Em síntese: a falsidade pode recair, alternativamente, sobre o próprio fato ou sobre sua autoria (…) (grifo nosso)”.

 

Traz-se, ainda, a opinião abalizada de Guilherme de Souza Nucci[2] a respeito:

 

“(…) Caluniar é fazer uma acusação falsa, tirando a credibilidade de uma pessoa no seio social. Possui, pois, um significado particularmente ligado à difamação. Cremos que o conceito tornou-se eminentemente jurídico, porque o Código Penal exige que a acusação falsa realizada diga respeito a um fato concreto definido como crime. Portanto, a redação feita no art. 138 foi propositadamente repetitiva (fala duas vezes em atribuir: caluniar significa atribuir e imputar também significa atribuir). Melhor seria ter nomeado o crime como sendo “calúnia”, descrevendo o modelo legal de conduta da seguinte forma: “Atribuir a alguém, falsamente, fato definido como crime”. Isto é caluniar. Vislumbra-se, pois, que a calúnia nada mais é do que uma difamação qualificada, ou seja, uma espécie de difamação. Atinge a honra objetiva da pessoa, atribuindo-lhe o agente um fato desairoso, no caso particular, um fato definido como crime. Não pode haver calúnia ao se atribuir a terceiro, falsamente, a prática de contravenção, pois o tipo penal menciona unicamente crime. Trata-se de tipo penal incriminador, de interpretação restritiva. Nesse caso, pode-se falar em difamação. A pena é de detenção, de seis meses a dois anos, e multa (…)” (grifo nosso).

 

Importa transcrever, ademais, o opinativo de Rogério Greco[3] a propósito:

 

“(…) Assim, podemos indicar os três pontos principais que especializam a calúnia com relação às demais infrações penais contra a honra, a saber:

 

a) a imputação de um fato;

 

b) esse fato imputado à vítima deve, obrigatoriamente, ser falso;

 

c) além de falso, o fato deve ser definido como crime.

 

Também ocorrerá o delito de calúnia quando o fato em si for verdadeiro, ou seja, quando houver, realmente, a prática de um fato definido como crime, sendo que o agente imputa falsamente a sua autoria à vítima.

 

Dessa forma, tanto ocorrerá a calúnia quando houver a imputação falsa de fato definido como crime, como na hipótese de o fato ser verdadeiro, mas falsa a sua atribuição à vítima (…).

 

Portanto, para que se configure a calúnia, deve existir sempre uma imputação falsa de um fato, definido como crime (...)”.

 

No mesmo sentido, aduz a jurisprudência ser necessário que o fato imputado à vítima seja certo e determinado, além de estar devidamente situado no tempo e espaço, sendo impossível, portanto, imputar fatos genéricos. Necessária, ainda, a demonstração do dolo específico para o crime de calúnia, como se depreende do precedente do STJ transcrito a seguir:

 

PENAL. CRIME CONTRA A HONRA. ENTREVISTA CONCEDIDA A PORTAL ELETRÔNICO DE NOTÍCIAS. DECLARAÇÕES CRÍTICAS EM RELAÇÃO A ÓRGÃO INSTITUCIONAL, AO SEU CHEFE E AO REPRESENTANTE. AFIRMAÇÕES VAGAS E IMPRECISAS, NO TEMPO, NO ESPAÇO E NO ELEMENTO ANÍMICO. INSUFICIÊNCIA PARA A CARACTERIZAÇÃO DO DELITO CONTRA A HONRA. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. DENÚNCIA REJEITADA. CONTEXTO FÁTICO SUBJACENTE À PERSECUÇÃO PENAL (…) 7. Com efeito, de acordo com entendimento pacífico do STJ, para configuração do crime de calúnia, urge a imputação falsa a outrem de fato definido como crime. Ou seja, deve ser imputado um fato determinado, devidamente situado no tempo e no espaço, bem como tal fato deve ser definido como crime pela lei penal, além de a imputação ser falsa. Portanto, não configura calúnia, em sentido oposto, a alegação genérica de uma conduta eventualmente delitiva. 8. No presente caso, não ficou demonstrada a imputação de um fato determinado, visto que a crítica foi evidentemente genérica ("A. bloqueava tudo"). Em outras palavras, não foi mencionada, pelo denunciado, qual a efetiva conduta praticada pelo Procurador da República, nem quando foi praticada, nem em que local. 9. Da mesma forma, além da menção de uma conduta genérica, é certo que não se caracteriza a imputação de um crime, visto que a conduta de "bloquear" pedidos de deslocamento de competência, por si só, não configura conduta delitiva. (…) 18. De total cabimento a referência, no Voto do eminente Ministro Og Fernandes, à edição número 130 da "Jurisprudência em Teses", que, como referido, traz um resumo do entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre os crimes contra a honra, com as seguintes teses: "1. Para a configuração dos crimes contra a honra, exige-se a demonstração mínima do intento positivo e deliberado de ofender a honra alheia (dolo específico), o denominado animus caluniandi, diffamandi vel injuriandi" e "7) Expressões eventualmente contumeliosas, quando proferidas em momento de exaltação, bem assim no exercício do direito de crítica ou de censura profissional, ainda que veementes, atuam como fatores de descaracterização do elemento subjetivo peculiar aos tipos penais definidores dos crimes contra a honra". (…) Configura-se como injúria, por outro lado, as assertivas genéricas que não consideram fatos específicos, mas simplesmente se referem a afirmações vagas e imprecisas feitas à pessoa do querelante. (…) Sobre o tema, aliás, Luiz Regis Prado subscreve: 'Distingue-se a injúria da calúnia e da difamação por não significar a imputação de um fato determinado - criminoso ou desonroso - mas sim a atribuição de vícios ou defeitos morais, intelectuais ou físicos' (Comentários ao Código Penal: jurisprudência; conexões lógicas com os vários ramos do direito. - 8. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p. 493). A doutrina mais moderna (NUCCI, Guilherme de Souza. Código penal comentado. 14. ed. rev. 36. Em conclusão, não estando demonstrado minimamente o dolo especial de ofender a honra de outrem, tampouco efetuada imputação falsa a outrem de fato determinado, específico e realmente descrito como crime, o caso demanda a REJEIÇÃO DA DENÚNCIA por manifesta falta de justa causa para instauração de Ação Penal. 37. Denúncia rejeitada, nos termos do art. 395, III, do CPP, c.c. o art. 3º, I, da Lei 8.038/1990. (APn n. 990/DF, relator Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/9/2022, DJe de 7/10/2022.) (grifo nosso).

 

Torna-se relevante reforçar, portanto, a necessidade de comprovação de que houve uma imputação falsa de fato certo e determinado, previsto em lei como crime, devidamente situado no tempo e no espaço.

 

Ademais, exige-se dolo específico relacionado à configuração do delito contra a honra, sendo necessária a demonstração de que existe o declarado intuito por parte do autor da prática criminosa no sentido de atribuir à vítima prejuízo à sua honra objetiva, consubstanciando repercussão negativa no seio social que venha a macular a sua reputação e credibilidade.

 

IV – DA AUTORIA E MATERIALIDADE. DO CONTEÚDO DA MENSAGEM APÓCRIFA E DAS DECLARAÇÕES NA CÂMARA MUNICIPAL DE SALVADOR. INTENÇÃO DE OFENDER DEMONSTRADA. NECESSIDADE DE REFORMA DA SENTENÇA.

 

Do exame dos fólios, percebe-se existir razão para a reforma da sentença absolutória prolatada, restando presentes os elementos necessários para conduzir à condenação pelo delito de calúnia, em razão do conteúdo do discurso proferido na Câmara Municipal de Salvador-BA.

 

A autoria e a materialidade delitivas revelam-se incontestes em relação ao discurso proferido em Plenário, considerando não estar o Apelado investido de imunidade material, por não se tratar de assunto relativo à vereança. 

 

A materialidade do delito está provada pelo vídeo (PJEMÍDIA), bem como pelas declarações e depoimentos coligidos na instrução e na fase do inquérito policial. 

 

No que toca à autoria atribuída ao Apelado, ele mesmo confirma, em Juízo, ter feito as manifestações na Tribuna, bem como a testemunha ROBERTO PEREZ DURAN corrobora o que restou provado nos autos. 

 

Quanto à tipicidade, verifica-se que no discurso realizado pelo Apelado na Câmara Municipal de Salvador-BA descreve fatos concretos e individualizados durante a gestão do Apelante como Comodoro no Yacht Clube da Bahia.

 

POR QUE TANTA PREOCUPAÇÃO EM ABRIR AS CONTAS, OU SERÁ QUE AS VEUVE CLIQUOT DEGUSTADAS PELO COMODORO TEM NAS SUAS COMPRAS ORIGEM DUVIDOSA?! O QUE VEM OCORRENDO É O DESCABIDO ABUSO DE AUTORIDADE. O COMODORO PASSA DOS LIMITES NO SEU PROJETO DE HEGEMONIA A QUALQUER CUSTO, POR MEIO DE COAÇÃO OU DE TERROR. (...)Tudo isso tem origem a partir de um projeto mirabolante, megalomaníaco, e milionário de um estacionamento que o comodoro pretendia construir.  DIZEM QUE COM UMA SUSPEITA PARCERIA COM SETORES DA PREFEITURA DE SALVADOR, E QUE FOI DERROTADO PELA ESMAGADORA MAIORIA DOS SÓCIOS, MAIS DE 70% DOS ASSOCIADOS DISSERAM “NÃO”, DESCONFIADOS DE SUPOSTOS INDÍCIOS DE IRREGULARIDADES. O PIOR QUE MESMO DERROTADO, O COMODORO CONTINUA BAJULANDO, ALIÁS TAMBÉM UMA DAS SUAS RECONHECIDAS CARACTERÍSTICAS, SETOR DO GOVERNO MUNICIPAL. (...) TODA SUA SUBSERVIÊNCIA OUTRA CARACTERÍSTICA MARCANTE DA SUA PERSONALIDADE-, AOS MEMBROS DA PREFEITURA, EM TROCA DE UM PROMETIDO EMPREGO NA PREFEITURA (...)COMO SE DIZ NO MEIO JURÍDICO UM AUTÊNTICO 171(...)”

 

Assim, tem-se que o Apelado atribuiu fatos definidos como crimes de apropriação indébita e corrupção ativa, de maneira específica e determinada, devidamente situados no tempo e no espaço, à pessoa do Apelante.

 

Evidenciou-se, portanto, o animus caluniandi com as manifestações do Apelado na Câmara de Vereadores de Salvador, que claramente demonstram a vontade de ofender a honra do Apelante, por fazer oposição ao Apelante na gestão do Clube.

 

Em relação à mensagem apócrifa, os documentos apresentados e os depoimentos das testemunhas ouvidas em Juízo não se mostram suficientes para comprovar, de forma cabal, a autoria e a materialidade imputadas ao Apelado.

 

Assiste-lhe razão, dessa forma, ao afirmar que o simples registro fotográfico da conversa de whatsapp não basta para comprovar o seu envolvimento na sua criação e envio. Seria imprescindível e garantidor da materialidade, ao menos, a lavratura de uma ata notarial em Cartório de Notas ou a apresentação dos metadados da mensagem questionada, o que não ocorreu.

 

Não foi realizada também qualquer perícia no celular dos envolvidos, o que dificulta a comprovação do envio e recebimento das mensagens, considerando que o aplicativo em questão criptografa seu conteúdo de ponta a ponta. Também não foi juntado ao feito relatório técnico e/ou elementos produzidos pela empresa Meta, proprietária do programa de mensagens, acerca da (in)viabilidade da produção de tal prova, que, talvez, não conseguisse ser realizada nem com ordem judicial, pelas caraterísticas da criptografia no envio da troca de mensagens.

 

Dessa forma, necessária a reforma da sentença prolatada para condenar o Apelado pelo cometimento de 01 (um) delito de calúnia.

  

V – DOSIMETRIA DA PENA.

 

No tocante à dosimetria da reprimenda, levando-se em consideração o modelo trifásico de atribuição da penalidade, passa-se ao exame pormenorizado da situação em apreço.

 

Na primeira fase, analisando as diretrizes traçadas pelo artigo 59 do Código Penal, deve-se fixar a pena-base no mínimo legal quando todas as circunstâncias judiciais forem favoráveis ao Réu ou não existirem elementos de aferição.

 

No caso em tela, percebe-se que o Apelado agiu com culpabilidade ultrapassando o tipo penal, visto que praticou o delito objetivando prejudicar o Apelante em sua Gestão na condição de Comodoro do Yacht Clube da Bahia. Existem antecedentes, diante do Processo criminal 0510916-91.2018.8.05.0001, transitado em julgado em 17.08.2023. Em relação a sua conduta social, não há nos autos elementos que possam negativá-la, tal qual a sua personalidade. Quanto aos motivos, estes não extrapolam o tipo penal. Já as consequências do delito, não ultrapassam o tipo penal. Com relação às circunstâncias do delito, essas extrapolam o tipo legal pois o delito foi praticado durante o período eleitoral do clube para o Conselho Deliberativo, o qual, por sua vez, elege o Comodoro, conforme dispõe o art. 38, VII, do Estatuto do Clube. A vítima em nada contribuiu para o crime, razão pela qual fixo a pena-base em 01 (um) ano e 21 (vinte e um) dias de detenção.

 

Na segunda fase da dosimetria não incidem agravantes nem atenuantes.

 

Aplica-se ao caso, ora examinado, a causa de aumento prevista no inciso III do art. 141 do CP, aumentando a pena em 1/3, por ter sido o delito transmitido pela TV CÂMARA SALVADOR, transmissão aberta no canal digital UHF 61.4, OI TV (CANAL 10), SKY TV (CANAL 361.4), bem como por meio da internet, na página oficial do órgão legislativo e na sua respectiva página do Facebook.

 

Dessa forma, a pena definitiva deve ser fixada em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 28 (vinte e oito) dias de detenção, associada ao pagamento de 204 (duzentos e quatro) dias-multa, cada dia à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

  

O regime inicial do cumprimento de pena deve ser fixado no aberto, nos termos do art. 33, §§ 2º e 3º, do CP.

 

  VI - DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA E DO SURSIS.

 

Tendo em vista a presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, a  sanção privativa de liberdade não pode ser substituída por penas restritivas de direitos, nos termos do §2º, do art. 44 do CP, bem como, impossível a aplicação do sursis, por ausência dos requisitos constantes do art. 77 do CP.

 

VII - DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO MÍNIMA

 

O Apelado, na denúncia e no recurso, requereu o pagamento da indenização mínima.

 

Para justificar o pleito indenizatório, era absolutamente imprescindível que o Apelante apresentasse, de maneira clara e detalhada, os valores correspondentes aos alegados danos. Tal apresentação deveria ocorrer mediante a realização de uma instrução específica, a qual garantiria ao Apelado a oportunidade de exercer plenamente seu direito de defesa, bem como de produzir as contraprovas necessárias, o que não ocorreu no caso em tela.

 

Diante da ausência dessa formalização essencial, impõe-se, de maneira inequívoca, a rejeição do pedido indenizatório.

 

CONCLUSÃO

 

Ante o exposto, CONHEÇO O RECURSO DE APELAÇÃO, DANDO-LHE PROVIMENTO PARCIAL para reformar a sentença guerreada e condenar o Acusado JOSÉ GONÇALVES TRINDADE pelo cometimento do delito previsto no art. 138, § 1º, c/c o art. 141, inciso III, ambos do Código Penal, à reprimenda de 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 28 (vinte e oito) dias de detenção,  em regime aberto, associada ao pagamento de 204 (duzentos e quatro) dias-multa, cada dia à razão de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

 



[1]   PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Volume 2 – Parte Especial. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, pp. 222 e 224.

[2]   NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, pp. 662-663.

[3]   GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 5 ed. Rio de Janeiro: Impetus, p. 334.

 

Salvador/BA, 02 de outubro de 2024.

 

 Desa. Nágila Maria Sales Brito

Relatora