PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Cível 



ProcessoAPELAÇÃO CÍVEL n. 0001715-47.2011.8.05.0044
Órgão JulgadorSegunda Câmara Cível
APELANTE: DERVANIER TIAGO DE SOUZA LEITE
Advogado(s)ITANNA CARNEIRO RIOS
APELADO: RAISSA DOS SANTOS
Advogado(s):ERITO SILVA MOREIRA

06

ACORDÃO

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO SUPOSTO GENITOR. EXTINÇÃO DO FEITO. IMPOSSIBILIDADE. OCORRÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATA. SENTENÇA ANULADA COM RECONHECIMENTO, EM JUÍZO AD QUEM, DA LEGITIMIDADE ATIVA DO PRETENSO PAI BIOLÓGICO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1.A literalidade da norma insculpida no art. 1.606 do CCB, que dispõe sobre a legitimidade do filho em face do genitor para a investigação de sua paternidade, não exclui a via inversa dessa busca pela verdade biológica, porquanto o interesse sobre o seu reconhecimento é recíproco.

2.Desta forma, inobstante a dicção do artigo 1.606, caput, do Código Civil, são aceitas as demandas ajuizadas pelo suposto pai biológico, não apenas em razão do legítimo interesse dele, mas também em virtude de que interessa ao menor descobrir a verdade sobre sua origem biológica.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível 0001715-47.2011.805.0044, da Comarca de Candeias, em que é apelante DERVANIER TIAGO DE SOUZA LEITE e apelada RAISSA DOS SANTOS, menor representada por sua genitora, Janilda Carvalho dos Santos.

 

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Turma Julgadora da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, à unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.

 

Salvador, data registrada no sistema.

 

 

Paulo Alberto Nunes Chenaud

Relator

 

 

 

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

 SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

 

DECISÃO PROCLAMADA

Conhecido e provido Por Unanimidade

Salvador, 8 de Junho de 2021.

 


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Cível 

Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0001715-47.2011.8.05.0044
Órgão Julgador: Segunda Câmara Cível
APELANTE: DERVANIER TIAGO DE SOUZA LEITE
Advogado(s): ITANNA CARNEIRO RIOS
APELADO: RAISSA DOS SANTOS
Advogado(s): ERITO SILVA MOREIRA

06

RELATÓRIO


 

Trata-se de recurso apelação interposto por DERVANIER TIAGO DE SOUZA LEITE, inconformado com a sentença proferida pelo Juízo Cível da Comarca de Candeias que, nos autos da Ação de Investigação de Paternidade nº 0001715-47.2011.805.0044, ajuizada em face de RAISSA DOS SANTOS, menor representada por sua genitora, Janilda Carvalho dos Santos, extinguiu o feito, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa ad causam

 

Em suas razões recursais, doc. ID 8504727, afirma o apelante a sua legitimidade ad causam para o esclarecimento da verdade dos fatos e repisa as alegações expostas na exordial, em razão das quais acredita ser ele o pai biológico da demandada.

 

Nesses resumidos termos, pugna pelo provimento da sua inconformidade.

 

Contrarrazões ao recurso, ID 8504741, refutando os argumentos do recorrente e pugnando pelo desprovimento do apelo.

 

Parecer Ministerial, ID 974744, pelo provimento do recurso, para:1) reconhecer a preclusão pro judicato no caso, certificando a nulidade da sentença;.2) atestar a legitimação ativa do apelante para ajuizar a investigação de paternidade .

 

É o relatório, que se encaminha à Secretaria desta Egrégia Segunda Câmara Cível, nos termos do art. 931 do Código de Processo Civil, para devida inclusão em pauta de julgamento, ressaltando tratar-se de feito que autoriza sustentação oral (art. 937, I).

 

Salvador, data registrada no sistema.

 

 

Paulo Alberto Nunes Chenaud

Relator


PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL  DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

  Segunda Câmara Cível 



Processo: APELAÇÃO CÍVEL n. 0001715-47.2011.8.05.0044
Órgão Julgador: Segunda Câmara Cível
APELANTE: DERVANIER TIAGO DE SOUZA LEITE
Advogado(s): ITANNA CARNEIRO RIOS
APELADO: RAISSA DOS SANTOS
Advogado(s): ERITO SILVA MOREIRA

 

06 cód.237

VOTO

 

 

Trata-se de recurso apelação interposto por DERVANIER TIAGO DE SOUZA LEITE, inconformado com a sentença proferida pelo Juízo Cível da Comarca de Candeias que, nos autos da Ação de Investigação de Paternidade nº 0001715-47.2011.805.0044, ajuizada em face de RAISSA DOS SANTOS, menor representada por sua genitora, Janilda Carvalho dos Santos, extinguiu o feito, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa ad causam

 

Ab initio, cumpre pontuar que a questão atinente à ilegitimidade ativa ad causam não poderia ter sido analisada pelo magistrado de origem, na medida em que a matéria já tinha sido enfrentada pelo respectivo juízo quando proferido despacho saneador, consoante se infere da decisão ID 8504717, com excerto abaixo transcrito:

 

"(...) Entende-se que, ao afirmar que alguém não é parte legítima significa dizer que o autor não tem pretensão de direito material que deduz em juízo ou que o réu não integra a relação jurídica de direito material invocada pelo autor como supedâneo da sua pretensão. No entanto, resta claro e evidente que no caso em concreto, tem o autor legitimidade para configurar n polo ativo da presente.

Salienta-se, que é reconhecida a possibilidade de utilização das ações vindicatórias do estado de filho, as quais devem se submeter ao procedimento comum ordinário.

Dou o feito por saneado.(...)"

 

Cuida-se a hipótese de preclusão, que impossibilita a rediscussão de temas já decididos no curso do processo.

 

Não se pode olvidar que existe no ordenamento jurídico pátrio a figura da preclusão consumativa, que veda a possibilidade de rediscussão de questões já decididas, consoante prescreve o art. 507 do CPC, in verbis:

 

"Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão."

 

Destarte, com base no instituto da preclusão consumativa, o conteúdo da decisão passa a ser indiscutível, como ensina a doutrina:

 

"Diz-se consumativa a preclusão, quando a perda da faculdade de praticar o ato processual decorre do fato de já haver ocorrido a oportunidade para tanto, isto é, de o ato já haver sido praticado e, portanto, não pode tornar a sê-lo."(NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 447).

 

A preclusão consumativa opera-se com relação às partes e também ao juiz, denominando-se esta última"preclusão pro judicato", de acordo com o que dispõe o artigo 505 do CPC:

 

"Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:

I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;

II - nos demais casos prescritos em lei."

 

Portanto, é defeso ao julgador decidir mais de uma vez a mesma matéria, quando não há modificação fática ou jurídica na demanda, devendo prevalecer a manifestação anterior do juízo, ainda que equivocada na visão das partes.


Nessa diretiva, a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REEXAME DE FATOS E PROVAS E A INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INADMISSIBILIDADE. MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA. QUESTÃO DECIDIDA. PRECLUSÃO PRO JUDICATO. OCORRÊNCIA. SÚMULA 568/STJ. 1. Alterar o entendimento do acórdão recorrido quanto a legitimidade do agravante, baseado no contrato de cessão de crédito celebrado, demandaria desta Corte, inevitavelmente, a incursão na seara fático-probatória e na interpretação de cláusula contratual, o que é vedado em recurso especial pelas Súmulas 5 e 7/STJ. 2. Mesmo as matérias de ordem pública estão sujeitas à preclusão pro judicato, razão pela qual não podem ser revisitadas se já tiverem sido objeto de anterior manifestação jurisdicional. Precedentes. 3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1519038 RJ 2019/0163865-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 10/02/2020, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/02/2020 – grifo nosso) .

 

Mediante tais considerações, deve ser afastada a ilegitimidade ativa ad causam da parte autora e, por conseguinte, anulada a sentença recorrida.

 

Passa-se, assim, à análise, nesta instância ad quem, da matéria de ordem pública suscitada, cerne da questão discutida nesta apelação cível.

 

Como regra, a demanda de investigação de paternidade é proposta pelo filho, que pretende ver regularizada a sua filiação. Porém, em que pese a dicção do precitado artigo 1.606 do Código Civil, a legitimidade ativa para propor ação de investigação de paternidade não pode ser restrita ao filho, tendo em vista a inegável relevância da matéria relativa à ação de estado, em especial, no que diz com a situação jurídica resultante de filiação.

 

Não se mostra razoável permitir-se o ajuizamento da ação de investigação de paternidade, conforme prevê o parágrafo 6º do artigo 2º da Lei n.º 8.560/92, por “quem tenha legítimo interesse de intentar a investigação” e, paralelamente, negar-se a legitimidade ativa ao suposto pai biológico.

 

Portanto, além do filho, pode o suposto genitor biológico aforar a ação pretendendo obter o reconhecimento da paternidade, com amparo no parágrafo 6º do artigo 2º da Lei n.º 8.560/92.

 

Neste sentido, os seguintes procedentes jurisprudenciais:

 

APELAÇÃO CÍVEL. FAMÍLIA. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE AJUIZADA PELO SUPOSTO PAI BIOLÓGICO. LEGITIMIDADE ATIVA CONFIGURADA. Embora, em via de regra, a ação de investigação de paternidade seja proposta pelos filhos, visando conhecer e ter declarada judicialmente a paternidade biológica, o suposto pai biológico não é parte ilegítima para intentar tal ação, com a mesma finalidade. Ademais, considerando que, a demandada, suposta filha do autor, é menor de idade, não se perde de vista que o resultado deste feito está tutelando um direito da própria criança, qual seja, o direito ao reconhecimento do estado de filiação - que, por sinal, é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, conforme preconiza o art. 27 do Estatuto da Criança e do Adolescente.DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME.(TJ-RS - AC: 70071530133 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 09/03/2017, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: 16/03/2017)

 

APELAÇÃO –– AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – LEGITIMIDADE ATIVA DO SUPOSTO PAI – A demanda investigatória de paternidade pode ser ajuizada não apenas pelo suposto filho, mas também pelo pretenso pai biológico, dotado de legítimo interesse, que converge para o princípio da supremacia dos interesses dos menores - Sentença extintiva reformada - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. (TJ-SP - AC: 10233672420198260114 SP 1023367-24.2019.8.26.0114, Relator: Alexandre Coelho, Data de Julgamento: 06/05/2020, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 06/05/2020)

  

Desta forma, tem-se que a literalidade da norma insculpida no art. 1.606 do CCB, que dispõe sobre a legitimidade do filho em face do genitor para a investigação de sua paternidade, não exclui a via inversa dessa busca pela verdade biológica, porquanto o interesse sobre o seu reconhecimento é recíproco.

 

Em assim sendo, tanto há legítimo interesse do pretenso genitor, quanto do menor em descobrir a verdade sobre sua origem biológica.

 

Necessário se faz, portanto, o retorno dos autos para a Vara de origem, possibilitando o processamento e julgamento da Ação de Investigação de Paternidade, manejada pelo ora apelante.

 

Do exposto, e com amparo no parecer da Procuradoria de Justiça, que também adoto como razão de decidir, voto para conhecer do e dar provimento ao recurso, nos termos acima delineados.

 

Salvador, data registrada no sistema.

 

 

Paulo Alberto Nunes Chenaud

Relator