Tribunal de Justiça do Estado da Bahia
PODER JUDICIÁRIO
QUARTA TURMA RECURSAL - PROJUDI

PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA
ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460




Ação:
Procedimento do Juizado Especial Cível
Recurso nº 0001168-73.2022.8.05.0059
Processo nº 0001168-73.2022.8.05.0059
Recorrente(s):
COMPANHIA DE ELETRICIDADE DO ESTADO DA BAHIA COELBA

Recorrido(s):
JOA ALVES PARANHOS



DECISÃO MONOCRÁTICA



RECURSO INOMINADO. O NOVO REGIMENTO DAS TURMAS RECURSAIS, RESOLUÇÃO No 02/2021, ESTABELECEU A COMPETÊNCIA DO RELATOR PARA JULGAR MONOCRATICAMENTE MATÉRIAS COM UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA OU ENTENDIMENTO SEDIMENTADO. DEMANDAS REPETITIVAS. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. DIREITO DO CONSUMIDOR. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. COELBA. AÇÃO COMINATÓRIA E INDENIZATÓRIA EM RAZÃO DE DEMORA NA LIGAÇÃO NA UNIDADE DA CONSUMIDORA. NOVA REDAÇÃO DO DECRETO Nº 11.111, DE 2022. SENTENÇA REFORMADA PARA TOTAL IMPROCEDÊNCIA.







A Resolução no 02, de 10 de fevereiro de 2021, que instituiu o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado da Bahia e da Turma de Uniformização da Jurisprudência, estabeleceu a competência do relator para julgar monocraticamente matérias com uniformização de jurisprudência ou entendimento sedimentado. No presente caso, a matéria narrada na exordial trata do programa “luz para todos”, matéria que já se encontra sedimentada no entendimento que se expõe a seguir.

Trata-se de ação indenizatória por conta de atraso na instalação da rede elétrica na residência do consumidor – LUZ PARA TODOS.

Síntese da inicial: “vem vivenciando o mesmo problema, tendo inclusive que provocar a máquina do judiciário e, só apenas após a determinação deste para ENTÃO SEREM CONTEMPLADOS APÓS ANOS DE ESPERA PELO SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA do programa LUZ PARA TODOS. Outrossim, ressalta-se que a energia elétrica é serviço essencial, sem contar que o PROGRAMA LUZ PARA TODOS, veio para erradicar a escuridão do homem no campo, o que no caso em tela tornou-se objeto de angústia resultando em lide, pois a Acionada não cumpre com o seu dever de prestar com eficiência um serviço essencial.”.

A sentença de procedência parcial foi proferida nos seguintes termos: "Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para:  a)  CONCEDER A TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA e determinar que a ré CUMPRA OBRIGAÇÃO DE FAZER E INSTALE, no prazo de 30 (trinta) dias, a rede de energia elétrica na propriedade do autor, sob pena de multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), limitada a R$ 6.000,00 (seis mil reais).  b) condenar a requerida a pagar ao autor indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com incidência de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação (arts. 405 e 406, do Código Civil), e correção monetária a partir da data do arbitramento, pelo INPC (Súmula 362, do STJ).  Consequentemente, julgo extinto o processo com resolução do mérito.".

Irresignada, a acionada interpôs recurso inominado, pugnando pela reforma da sentença impugnada.

Merece reforma a sentença impugnada.

Analisando os autos, verifica-se que a consumidora pleiteia a ligação de energia elétrica no seu imóvel rural, com base no programa Luz para Todos. No mesmo sentido, a base decisória da sentença recorrida: "O "Programa Luz para todos" compõe uma política pública e, por isso, tem a sua execução pautada pela disponibilidade de recursos governamentais, mas não se afigura razoável a demora (mais de 5 anos) para a concessão da energia elétrica, imprescindível à população rural, tanto que instituído para o propósito de contemplar todos e não quase todos.  Além disso, a ré apenas suscita que questões ambientais estariam impedindo a implantação do programa, mas não impugnou o fato invocado pelo autor de que imóveis a menos de 2 km de distância já possuem energia elétrica.   Ademais, nos termos da Resolução 414 da Aneel, o prazo para fornecimento de serviço essencial foi extrapolado pela requerida, especialmente por tratar-se de proprietária rural, que depende da energia elétrica para realizar seus trabalhos e garantir o seu sustento e de sua família.  A defesa apresentada pela ré, limitou-se a justificar a omissão, imputando a responsabilidade ao Governo Federal quanto à prestação do serviço. No entanto, na qualidade de concessionária, é solidariamente responsável quanto ao fornecimento da energia elétrica aos consumidores e recebe contraprestação financeira suficiente para o desempenho dos serviços. [...] Considerando que a concessionária já extrapolou o prazo concedido no Plano de Universalização, deve ser acolhido o pleito de obrigação de fazer, inclusive a título de tutela provisória de urgência, com o objetivo de impedir que a parte autora continue aguardando o processamento de toda ação, com a interposição de recursos, conduta muito adotada pela ré, quando a probabilidade do seu direito está mais do que caracterizada e o tempo só transcorre em prejuízo à autora.   Quanto aos danos morais, vale ressaltar que estabelece a Constituição Federal como um dos fundamentos da República, que se constitui em Estado Democrático de Direito, "a dignidade da pessoa humana" (artigo 1.º, inciso III). ".

Na hipótese em comento, observa-se que foram estabelecidos novos prazos para conclusão da universalização, a partir do Decreto nº 11.111, de 2022, que altera o DECRETO Nº 7.520, DE 8 DE JULHO DE 2011:

https://in.gov.br/en/web/dou/-/decreto-n-11.111-de-29-de-junho-de-2022-411265829

Art. 1º Fica instituído o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica - “LUZ PARA TODOS”, até 31 de dezembro de 2026, destinado a propiciar o atendimento com energia elétrica à parcela da população do meio rural que não possua acesso a esse serviço público. (Redação dada pelo Decreto nº 11.111, de 2022)

Uma vez que houve dilação dos prazos para cumprimento da obrigação, não caberia ao judiciário obrigar a concessionária à realização de obras antes do termo final.

Nesse sentido, o recente posicionamento do STJ:

A interferência do Poder Judiciário em regras de elevada especificidade técnica do setor elétrico por meio de liminar configura grave lesão à ordem e à economia pública. STJ. Corte Especial. SLS 2.162-DF, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 02/05/2022 (Info 739).

Ante o exposto, por vislumbrar que merece reforma a decisão vergastada, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO o recurso interposto pela acionada, reformando a sentença de origem para a total improcedência. Sem custas e honorários.

Salvador-BA, data registrada no sistema.



MARY ANGÉLICA SANTOS COELHO

Juíza Relatora